O artigo segundo da nossa Constituição Federal fala poderes harmônicos e independentes. Cada qual com suas atribuições e deveres e, vezes quando necessário há a intervenção de um noutro. Veja:
Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
Sabemos que o Legislativo é representado pelo Congresso Nacional (deputados estaduais e federais e senadores), responsável pela elaboração das leis que vigoraram em nosso país.
O Executivo é a parte administradora, função gerencial da máquina pública, exatamente responsável pela manutenção executória e financeira para o bem-estar social.
Por fim o Legislativo é o guardião das leis criadas pelo Legislativo e administrada pelo Executivo. Sua função, como todos sabem, é ser munido de jurisdição para a aplicação da lei àqueles que dela necessitar.
Porém há um equívoco quando falamos em divisão de poderes. Para saber, o poder a qual se refere sempre, é o poder uno e indivisível emanado da União. Essa é quem detém todo o poder e os outros entes participantes do princípio federativo (leia-se Estados-membros, Distrito Federal e Municípios) são subordinados a ela.
Interpretando gramaticalmente o artigo destacado, em um primeiro momento vemos que o legislador atribui a palavra poder para caracterizar as funções organizacionais da União.
Michel Temer indaga que Carlos Ayres de Britto com grande magnitude identificou os sentidos da palavra poder na Constituição, veja:
a) Poder enquanto Revelação da Soberania (art. 1º, parágrafo único da CF); b) Poder enquanto Órgão do Estado (art. 2º da CF); c) Poder enquanto Função (art. 44, 76 e 92 da CF). (TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. Editora Malheiros. 22ª Edição. Ano 2008. Pág. 119-120).
Quando falamos em “tripartição de poderes” na verdade nos equivocamos, razão essa por não serem poderes distintos entre si. O poder de julgar é do Estado. O poder de criar leis é do Estado. O poder de administrar é do Estado. Sendo assim o poder maior, uno e único é o poder do Estado. Dentro desse poder soberano há essas funções previamente existentes e estabelecidas para manter a ordem social de uma nação. Tal poder uno tinha que ser explicitado de forma simples para haver o entendimento social de Estado entre o povo. Descentralizado esse poder, atribuiu-se ao órgão Legislativo a função de criar leis, ao Executivo a função de administrar o Estado e ao Judiciário a função de julgar a lei ao caso concreto.
Sendo assim temos então a “tripartição de funções” do poder uno do Estado em diferentes órgãos responsáveis um por cada função. Aqui, importante destacar que todos, como diz a redação constitucional são independentes. Grava-se aqui essa palavra que será de extrema valia ao decorrer deste.
Essa separação fazia-se necessária para a manutenção da ordem tendo em vista que não se poderia confiar totalmente, pois a formula de um poder uno que decido por tudo poderia gerar desigualdades e injustiças.
Agora, porém, nem tudo pode ser tão perfeito quanto parece. Órgãos independentes entre si só funcionam em um Estado Democrático de Direito quando o povo exerce de verdade a democracia que lhe é dada. Fala-se em funções independentes e imparciais, contudo não passa de falácias que são mascaradas para esconder a verdadeira intenção de se manipular toda a República.
O modo não democrático de escolha e nomeação do judiciário superior fere o princípio da isonomia, o qual também é ferido com a política que existe entre legislativo e executivo na administração do Estado. Isso se deve ao que a constituição chama de cargos de confiança e em comissão.
O modo pelo qual se entra no setor público é através de prévia aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos. Vejamos adiante que o artigo 37 das Constituição a que se refere o fato narrado, tem mais incoerência do que igualdade como é supracitado. Artigo 37, inciso II:
II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvada as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;
A primeira parte do artigo é perfeita e narra totalmente as condições necessárias e igualitárias para ser investido em determinado cargo público. Porém a segunda parte do mesmo artigo peca quando permite em forma de exceção a entrada pela “porta dos fundos” no setor público. Isso é grave e precisa ser corrigido. A maioria das corrupções deste Estado que hoje podemos chamar de cleptocrata está nos cargos de confiança e em comissão. Abre-se precedente para nepotismo indireto e várias possibilidades de fraude.
Além do mais, se analisarmos friamente o artigo veremos que a escolha e nomeação de um ministro, seja do executivo ou judiciário, é indiretamente um cargo de confiança, pois não há imparcialidade, não há igualdade e têm-se aí a pessoalidade direita ou indireta. Quebra-se novamente outro princípio constitucional da administração pública.
Conclui-se com essas informações que definitivamente o poder é uno e não há o que se falar em separação de poderes, isso porque poderes são independentes como um todo sem a necessidade de interferência do outro para a manutenção dos seus próprios pares. Veja que aqui nada tem a ver com a harmonização de tais funções, pois essa é apenas a forma de integrar uma a outra para fazer cumprir o princípio constitucional da eficiência ou celeridade processual.