Reconhecimento de período empregatício na Justiça do Trabalho e seus efeitos previdenciários.

Crítica ao posicionamento da Justiça Federal

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A sentença trabalhista não possui eficácia plena quanto aos seus efeitos previdenciários, tendo em vista norma editada pelo legislador ordinário, ratificada pela jurisprudência federal, restritiva à ampla proteção social do trabalhador brasileiro.

Resumo: A criação da Justiça do Trabalho representou um marco histórico aos trabalhadores brasileiros, que constantemente sofriam com os abusos dos empregadores movidos pela necessidade de produção em massa por influência da Revolução Industrial, que sedentos pelo capitalismo não respeitavam sequer a dignidade do ser humano. A Previdência Social também surgiu com o intuito de garantir a proteção social a todos os trabalhadores brasileiros, garantido aos mesmos o direito ao seguro social por intermédio da prestação de benefícios previdenciários, daí decorrendo uma grande afinidade entre o Direito do Trabalho e o Direito Previdenciário. No entanto, a sentença trabalhista, no tocante aos seus efeitos previdenciários, não possui eficácia plena em razão de norma procedimental editada pelo legislador ordinário, que foi ratificada pela jurisprudência federal. Sendo assim, pretende-se averiguar as dificuldades de se ter uma ampla proteção social do trabalhador em face da referida restrição legislativa de forma a estabelecer uma opinião crítica ao atual posicionamento da Justiça Federal com relação ao assunto. Para esse desiderato, busca-se analisar o novo sistema processual, os direitos sociais e fundamentais do trabalhador, assim como as regras e os princípios basilares do Direito do Trabalho e do Direito Previdenciário.

Palavras-chave: Justiça do Trabalho. Reconhecimento de Período Empregatício. Eficácia da Sentença Trabalhista. Contagem de tempo de Contribuição.

Sumário: 1.Introdução. 2. Reconhecimento do Vínculo Empregatício na Justiça do Trabalho. 2.1. A Competência da Justiça do Trabalho. 2.2. A Comprovação da Relação de Emprego na Justiça do Trabalho. 2.2.1. Da Comprovação por Meio da CTPS. 2.2.2. Outros Meios de Prova. 2.3. Princípio da Proteção e Princípio da Primazia da Realidade. 2.4. A Relevância da Conciliação e suas Consequências no Processo Trabalhista. 2.5. Execução dos Créditos Previdenciários pela Justiça do Trabalho. 3. A Posição da Justiça Federal. 3.1. A Prova do Tempo de Contribuição. 3.2. Reconhecimento do Tempo de Filiação. 3.3. Efeitos das Decisões Trabalhistas Frente ao INSS: A Relevância do Art. 55, §3º da Lei nº 8.213/91 (LBPS). 3.4. O Regramento Criado pela Instrução Normativa INSS/PRES nº 45/2010. 4. Crítica. 4.1. A Contradição do Ordenamento Jurídico em Matéria de Direitos Sociais Fundamentais. 4.2. Princípio da Universalidade da Cobertura Previdenciária. 4.3. O Custeio do Sistema Previdenciário e Equilíbrio Financeiro. 4.4. Questões Processuais. 5. Considerações Finais. Referências.


1. INTRODUÇÃO

No limiar do presente estudo, verificar-se-á que através das transformações sociais o direito passou a ser enxergado sob uma nova perspectiva, pois os trabalhadores que viviam no reino da falta, que eram forçados a laborar em condições completamente contrárias ao que hoje preceitua o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, passaram a exigir um novo posicionamento estatal, que incialmente movia-se por um regime de não ingerência e que depois passou a atuar positivamente em prol da concretização dos direitos sociais que contribuíram para a formação da democracia atual.

Esse movimento histórico que desencadeou uma intervenção jurídica do Estado contribuiu para a edição de leis que limitassem o poder do empregador e preservassem os direitos básicos dos empregados, considerados fundamentais à dignidade do ser humano.

Assim, em 1930, criou-se a Justiça do Trabalho com o objetivo de dirimir as controvérsias entre os trabalhadores e empregadores, e, com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, este novo ramo do Judiciário foi fortalecido e distribuído para todos os Estado da Federação com a finalidade de melhor promover a proteção do trabalhador brasileiro.

Ao mesmo momento, criou-se a Previdência Social que também foi aperfeiçoada pela Constituição cidadã, também com o objetivo de garantir a proteção social aos trabalhadores, fornecendo-lhes através de um regime contributivo e de filiação obrigatória, um seguro social através da prestação de benefícios previdenciários.

Desta forma, estabeleceu-se um estreito laço entre a existência de uma relação de emprego e a obrigatoriedade das contribuições previdenciárias, que tem como responsável tributário os empregadores, e consubstancia-se em uma decorrência legal e lógica da formalização de uma relação empregatícia.

Por outro lado, com o surgimento de uma sociedade moderna cada vez mais complexa, com intricado desenvolvimento das relações econômicas, surgiram situações em que os empregadores passaram a burlar o sistema trabalhista através da contratação de serviços informais com características de relação de emprego, não efetuando, portanto, o devido registro na CTPS do trabalhador e, consequente, não recolhendo as respectivas contribuições previdenciárias.

A Justiça do Trabalho, ao ser provocada, passou a reconhecer mediante sentença a existência de uma relação de emprego, condenando o empregador a realizar o registro da relação na CTPS do empregado, bem como ao ônus de todos os efeitos trabalhistas e previdenciários, dentre eles o recolhimento das contribuições devidas à Previdência Social.

No entanto, a sentença trabalhista absurdamente não produz efeitos previdenciários imediatos, ou seja, o reconhecimento de uma relação de emprego pela Justiça Laboral não vincula a Previdência Social em promover imediata conversão do tempo de serviço reconhecido em tempo de contribuição, mesmo tendo o Direito do Trabalho e o Direito Previdenciário um estreito relacionamento.

Desta forma, grande parte deste trabalho se dedicará a analisar as peculiaridades do processo trabalhista e suas consequências na esfera previdenciária, o procedimento criado pelo legislador ordinário no tocante a produção dos efeitos previdenciários da sentença trabalhista, bem como posicionamento da jurisprudência federal acerca do assunto.

Para tanto, buscou-se a pesquisa bibliográfica, colhendo dados por meio da legislação, doutrina e jurisprudência. O tipo de pesquisa utilizada para a abordagem do tema será a revisão de literatura. Assim, o trabalho divide-se em três seções.

Primeiramente, abordar-se-á de maneira sucinta o surgimento histórico do Direito do Trabalho com a consequente criação da Justiça Laboral e sua expansão após o advento da Carta Magna de 1988, destacando-se a competência material da Justiça Trabalhista, os meios de prova de uma relação de emprego, os princípios que funcionam como pilar para aptidão da prova no processo trabalhista, a importância da criação da conciliação como meio resolutor das lides, e a maneira como se executam as contribuições previdenciárias nesta justiça especializada.

Logo depois, serão analisados os meios de prova do tempo de contribuição com base nos aspectos da legislação, bem como o procedimento para o cômputo das contribuições previdenciárias decorrentes do reconhecimento de vínculo empregatício pela Justiça do Trabalho criado através do § 3º do art. 55. da Lei n°. 8.213/91, ratificado pela Instrução Normativa do INSS n°. 45/2010 e pelo posicionamento jurisprudencial da Justiça Federal comum.

Por fim, na última seção, será construída uma crítica à regra procedimental criada pelo § 3º do art. 55. da Lei n°. 8.213/91, bem como ao posicionamento da jurisprudência federal quanto ao tema, momento em que serão expostos os fundamentos constitucionais e processuais que consolidam o entendimento de que a sentença trabalhista que reconhece vínculo empregatício deverá produzir efeitos previdenciários imediatos de maneira que aquele tempo de serviço reconhecido seja imediatamente vinculado aos dados do CNIS como tempo de contribuição do segurado.

Este, portanto, é o objeto do presente trabalho: discutir a possibilidade da sentença trabalhista de período empregatício produzir efeitos previdenciários de maneira que o tempo de serviço reconhecido seja imediatamente computado como tempo de contribuição pela Previdência Social, assim como construir um estudo crítico acerca do posicionamento da Justiça Federal quanto ao tema.


2. RECONHECIMENTO DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO NA JUSTIÇA DO TRABALHO

2.1. A Competência da Justiça do Trabalho

A Justiça do Trabalho é o ramo do Poder Judiciário Federal que cuida de dirimir as controvérsias entre trabalhadores e empregados, além de outras oriundas da relação de trabalho. Surgiu como uma reação às aviltantes condições impostas aos trabalhadores em decorrência da Revolução Industrial.

Ante a necessidade de alterar a ordem social e econômica, buscando manter o equilíbrio entre as forças produtivas, fez-se necessária a intervenção jurídica do Estado que, abandonando a postura passiva dos moldes liberais clássicos, passou a produzir leis que limitassem o poder do empregador e preservassem os direitos básicos dos empregados, como o descanso semanal, as férias anuais, o justo salário, a proteção à vida, à segurança física e à saúde, dentre tantos outros. 1

No Brasil, a Justiça do Trabalho foi implantada no final da década de 1930, como órgão administrativo do Poder Executivo, permanecendo sob a égide do governo federal até a Constituição democrática de 1946, quando foi elevada ao Poder Judiciário.2 Fortaleceu-se com a Constituição de 1988, que determinou a criação, em cada Estado da Federação, de pelo menos um Tribunal Regional do Trabalho. 3

Nos termos do art. 114. da Carta Magna em vigor, tem-se definida a competência da Justiça do Trabalho, da seguinte forma:

Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

I – as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

II – as ações que envolvam o exercício do direito de greve;

III – as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores;

IV – os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição;

V – os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art. 102, I, o;

VI – as ações de indenização por danos morais ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;

VII – as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho;

VIII – a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;

IX – outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei.

Dos incisos elencados no artigo acima transcrito sobressai, inconteste, a relevância das atribuições conferidas no inciso I, face à amplitude dos casos por ele abrangidos, vez que, nas palavras de Renato Saraiva, a “Relação de trabalho corresponde a qualquer vínculo jurídico por meio do qual uma pessoa natural executa obra ou serviços para outrem, mediante o pagamento de uma contraprestação”. 4

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2.2. A Comprovação da Relação de Emprego na Justiça do Trabalho

Da vasta gama de litígios relacionados à relação de emprego, interessa, em particular, ao presente trabalho enfocar aqueles relacionados à existência e duração do vínculo laboral, face à necessidade de comprovação do tempo de serviço do trabalhador para fins da concessão da aposentadoria, benefício previdenciário por excelência, destinado a proteger o indivíduo dos riscos decorrentes da perda ou redução das condições de obter seu próprio sustento.

2.2.1. Da Comprovação por meio da CTPS

No que tange à comprovação do vínculo laboral, convém ressaltar as determinações contidas no Título II da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT 5, que trata das normas gerais de tutela do trabalho. Segundo estas, A Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS é o documento emitido pelas Delegacias Regionais do Trabalho ou por órgãos federais, estaduais e municipais (art. 14), obrigatório para o exercício de qualquer emprego, inclusive o rural, ou aquele exercido por conta própria, relativo à atividade profissional remunerada (art. 13).

A CTPS deverá conter, dentre outros elementos, o número, a série, a data da emissão e folhas destinadas às anotações atinentes ao contrato de trabalho (art. 16). Em caso de imprestabilidade ou esgotamento do espaço destinado às anotações, deverá ser providenciada outra, com o mesmo número e série da anterior (art. 21).

De sumo interesse, no entanto, é o comando posto no art. 29. do diploma legal em comento, que trata, especificamente, do registro dos vínculos laborais:

Art. 29. A Carteira de Trabalho e Previdência Social será obrigatoriamente apresentada, contra recibo, pelo trabalhador ao empregador que o admitir, o qual terá o prazo de quarenta e oito horas para nele anotar, especificamente, a data da admissão, a remuneração e as condições especiais, se houver, sendo facultada a adoção de sistema manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções a serem expendidas pelo Ministério do Trabalho.

(...)

§ 2.° As anotações na Carteira de Trabalho serão feitas:

a) na data base;

b) a qualquer tempo, por solicitação do trabalhador;

c) no caso de rescisão contratual, ou

d) necessidade de comprovação perante a Previdência Social.

§ 3.° A falta de cumprimento pelo empregador do disposto neste artigo acarretará a lavratura do auto de infração, pelo Fiscal do Trabalho, que deverá, de ofício, comunicar a falta de anotação ao órgão competente, para o fim de instaurar o processo de anotação. (...)

A recusa do empregador em fazer as anotações na CTPS, ou mesmo devolvê-la ao empregado, enseja a reclamação perante Delegacia Regional do Trabalho ou órgão autorizado (art. 36) que, a depender da apuração dos fatos, poderá determinar, administrativamente, o registro dos dados na carteira do denunciante, aplicando, em paralelo, a multa cabível (arts. 36. a 39).

Nos casos de dissídio entre empregado e empregador, determina, ainda, a CLT (art. 40), que as CTPS`s regularmente emitidas e anotadas servirão de prova, perante a Justiça do Trabalho, no que se refere a salário, férias ou tempo de serviço.

2.2.2. Outros Meios de Prova

A despeito do comando legal que fixa a obrigatoriedade do registro, pelo empregador, do vínculo empregatício na CTPS do empregado, diversas são as situações nas quais esse registro não é efetuado, forçando o trabalhador a buscar a concretização de seus direitos junto ao Poder Judiciário, mais especificamente na Justiça especializada – Justiça do Trabalho – que detém, nos termos do art. 114, I da CF/88, retro mencionado, a competência para processar e julgar as ações oriundas das relações de trabalho.

Nessa esteira, sendo perquirida a declaração da existência de uma relação jurídica, impede ao operário manejar a ação declaratória, em consonância com os ditames do art. 19, I do Novo Código de Processo Civil.

Art. 19. O interesse do autor pode se limitar à declaração:

I – da existência, da inexistência ou do modo de ser de uma relação jurídica;

II – da autenticidade ou falsidade de documento.

Como, em juízo, interessa o convencimento do magistrado, impende a comprovação dos fatos alegados por meios documentais (contracheques, recibos de pagamento, declarações do empregador, fotografias, etc.), ou testemunhais, desde que respeitadas exigências legais.

No âmbito do processo laboral, entretanto, a prova testemunhal adquire especial relevância, posto que, em muitas ocasiões, é o único meio de prova de que dispõe o empregado, considerado hipossuficiente na relação de trabalho, para corroborar suas afirmações.

Merece destaque, ainda, a prova obtida por meio de confissão, segundo a dicção do art. 389. do Novo Código de Processo Civil:

Art. 389. Há confissão, judicial ou extrajudicial, quando a parte admite a verdade de fato contrário ao seu interesse e favorável ao do adversário.

2.3. Princípio da Proteção e Princípio da Primazia da Realidade

Para a ciência jurídica, princípios são preceitos estruturais que mantém o ordenamento coeso e íntegro, tanto na ausência de norma expressa, como diante da necessidade de interpretá-la.

Assim, preconiza o art. 8.° da CLT:

Art. 8.°. As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

Parágrafo único. O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste.

Tendo, cada ramo do Direito, seus próprios princípios, convém trazer à baila os princípios reguladores do Direito do Trabalho. Nas palavras de Amauri Mascaro do Nascimento 6:

No período inicial da doutrina justrabalhista os princípios eram confundidos com regras de interpretação (...) A primeira grande construção jurídica dos princípio do direito do trabalho é do jurista uruguaio Américo Plá Rodrigues

(...).

Sustenta Plá Rodrigues que no direito do trabalho há um princípio maior, o protetor, diante da sua finalidade de origem, que é a proteção jurídica do trabalhador, compensadora da inferioridade em que se encontra no contrato de trabalho, pela sua posição econômica de dependência ao empregador e de subordinação às sua ordens de serviço.

Prossegue o doutrinador, calcado na construção de Plá Rodrigues, afirmando que, do princípio protetor, derivam subprincípios, dos quais se destaca o princípio da realidade, também chamado princípio da primazia da realidade, que “visa à priorização da verdade real diante da verdade formal. Entre os documentos sobre a relação de emprego e o modo efetivo como, concretamente, os fatos ocorreram, devem-se conhecer estes em detrimento dos papéis”. 7

Tais princípios, no entanto, não se limitam a nortear o direito material, encontrando eco em normas processuais que buscam proteger o trabalhador, como acentua Renato Saraiva 8, repetindo autores consagrados como Wagner Giglio, Carlos Henrique Bezerra Leite e Sérgio Pinto Martins. Exemplificando, cita o autor os dispositivos abaixo:

  • · A gratuidade da justiça (...) e a assistência judiciária na Justiça do Trabalho são destinadas, exclusivamente, aos trabalhadores e não aos empregadores;

  • · A inversão do ônus da prova implementada no âmbito processual laboral também aproveita, exclusivamente, ao trabalhador, mediante presunções que lhe são favoráveis (ver Súmula 212 do TST);

  • · O impulso oficial nas execuções trabalhistas (art. 878. da CLT), em que o juiz do trabalho pode, de ofício, impulsionar a execução, favorece, evidentemente, ao credor trabalhista (trabalhador requerente)

  • · A ausência do reclamante à audiência importa tão somente no arquivamento da reclamação trabalhista (art. 844. da CLT), evitando a apresentação da defesa e possibilitando ao obreiro ajuizar nova ação trabalhista;

  • · A obrigatoriedade de depósito recursal em caso de eventual recurso objetivando garantir futura execução (art. 889, § 1.°, da CLT), é comando destinado exclusivamente ao reclamado;

  • · O dispositivo previsto no art. 651. da CLT determina que a reclamação trabalhista deve ser proposta na localidade em que o empregado (...) efetivamente prestou os seus serviços, também protegendo o obreiro, principalmente facilitando a produção de provas pelo trabalhador, como também diminuindo as sua despesas.”

No que tange ao princípio da primazia da realidade, prossegue informando que a CLT, em seu art. 765, franqueou aos juízes e tribunais do trabalho ampla liberdade na direção do processo, devendo estes velarem pelo andamento rápido das causas, podendo determinar qualquer diligência necessária ao seu esclarecimento. 9

2.4. A Relevância da Conciliação e Suas Consequências no Processo Trabalhista

Como é cediço, “o Estado moderno avocou para si o monopólio da jurisdição, ou seja, o poder-dever de dizer o direito. Todavia, a função jurisdicional deve ser, em regra, provocada”, sendo “implementada por meio da ação”. Dessa forma, “a pessoa dita lesada ou prejudicada tem o direito ao acesso ao órgão do Poder Judiciário competente para dirimir o conflito de interesses, não havendo, no entanto, direito assegurado ao resultado favorável do processo”.10

No ordenamento jurídico brasileiro, o direito de ação encontra-se assegurado no art. 5.°, XXXV, inserido no Título relativo aos direitos e garantias fundamentais do cidadão. No entanto, “o direito de ação não se esgota com a propositura da peça vestibular, mas estende-se ao direito de tramitação regular do processo, com a observância dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa”.11

No âmbito do processo trabalhista, segundo os ditames estabelecidos na CLT, a conciliação deve ser sempre buscada. Por essa razão, diversamente do que ocorre no processo civil, a resposta do réu é apresentada em audiência, nunca antes de intentada, pelo juízo, o estabelecimento de um acordo entre as partes (art.846).

Frustrada a primeira tentativa de conciliação, seguirá a fase de instrução processual, com a apresentação das provas (art. 848). Terminada a instrução, é facultado às partes aduzir suas razões finais, renovando, em seguida, o juízo, a proposta de conciliação. Sendo esta novamente frustrada, proferirá o magistrado de primeiro grau sua decisão (art. 850).

Ao presente trabalho interessa, no entanto, de forma precípua, destacar os casos nos quais a primeira tentativa de conciliação é bem sucedida, ou seja, aqueles em que não houve instrução probatória. Para tanto, convém lembrar a regra instituída no dispositivo legal a seguir transcrito:

Art. 846. Aberhta a audiência, o juiz ou presidente proporá a conciliação.

§ 1.° Se houver acordo lavrar-se-á termo, assinado pelo presidente e pelos litigantes, consignando-se o prazo e demais condições para seu cumprimento.

§ 2.° Entre as condições a que se refere o parágrafo anterior, poderá ser estabelecida a de ficar a parte que não cumprir o acordo obrigada a satisfazer integralmente o pedido ou pagar uma indenização convencionada, sem prejuízo do cumprimento do acordo. (g. n.)

Acerca do termo lavrado em decorrência do acordo, o Tribunal Superior do Trabalho, por meio da Súmula 259, firmou entendimento no sentido de que, este valerá como sentença irrecorrível, ou seja, atacável, apenas, por ação rescisória.

259. Termo de Conciliação. Ação rescisória.

Só por ação rescisória é impugnável o termo de conciliação previsto no parágrafo único do art. 831. da CLT.

Percebe-se, portanto, que é plenamente viável ao trabalhador, ajuizada a ação declaratória para o reconhecimento de vínculo empregatício, ter seu direito assegurado, independente da instrução probatória, por meio de acordo firmado com o empregador, homologado pelo juízo competente.

A questão, no entanto, não está pacificada na doutrina e na jurisprudência, visto que o reconhecimento do vínculo empregatício do trabalhador traz consigo consequências de ordem prática, relativas à Previdência Social, em particular no que tange ao recolhimento das contribuições sociais, tanto por parte do empregado como por parte do empregador.

2.5. Execução dos Créditos Previdenciários pela Justiça do Trabalho

Para uma melhor compreensão acerca da competência material da Justiça do Trabalho para executar a contribuição previdenciária decorrente de relações de emprego reconhecidas mediante sentença por ela proferida, é de suma importância traçar uma breve evolução histórica de forma a contextualizar as alterações ocorridas no texto constitucional e infraconstitucional.

A lei n°. 7.787/89 representou um marco para a Justiça do Trabalho, pois com a promulgação do referido texto legal, a justiça obreira passou a ter competência para cuidar do recolhimento das contribuições previdenciárias decorrentes de sentenças de reconhecimento de vínculo empregatícios por ela proferidas, bem como em decorrência de acordo entre as partes, senão vejamos o que preleciona o seu art. 12:

Art. 12. Em caso de extinção de processos trabalhistas de qualquer natureza, inclusive a decorrente de acordo entre as partes, de que resultar pagamento de vencimentos, remuneração, salário e outros ganhos habituais do trabalhador, o recolhimento das contribuições devidas à Previdência Social será efetuado incontinenti.

Parágrafo único. A autoridade judiciária velará pelo fiel cumprimento do disposto neste artigo.

No entanto, como bem observado pela jurista Ana Freitas12 a edição da citada lei funcionou apenas como um divisor de águas no que tange a execução das contribuições previdenciárias pela Justiça do Trabalho, pois como se pode observar no texto do referido artigo 12 apenas é conferido à justiça obreira o dever cuidar do recolhimento das contribuições previdenciárias, mas, sem qualquer poder de coerção, uma vez que o devedor sequer procedia com a comprovação dos recolhimentos nos autos.

No mesmo sentido, foi editado o Plano de Custeios e Benefícios da Previdência Social, Lei n°. 8.212/91, que originariamente previa em seu art. 43:

Art. 43. Em caso de extinção de processos trabalhistas de qualquer natureza, inclusive a decorrente de acordo entre as partes, de que resultar pagamento de remuneração ao segurado, o recolhimento das contribuições devidas à Seguridade Social será efetuado incontinenti.

Ora, sem qualquer demérito à intenção do legislador infraconstitucional, do que adiantaria conferir a Justiça do Trabalho o poder/dever de velar pelas contribuições previdenciárias decorrentes do reconhecimento judicial de vínculo empregatício se a ela não foi conferido poder de coerção capaz de obrigar o sucumbente a promover o respectivo recolhimento. Não soa arrazoado que o trabalhador arque com o ônus da desídia de seu empregador em recolher esse tributo que transpassa de uma obrigação legal, mas que tem um caráter eminentemente social.

No entanto, com base nessa linha de raciocínio os artigos 43 e 44 da Lei n°. 8.212/91 foram alterados pela Lei nº. 8.620, de 05 de janeiro de 1993, e a partir de então os magistrados do trabalho passaram a ter o poder/dever não só de determinar o recolhimento das contribuições previdenciárias, mas também de cuidar se o recolhimento realmente foi efetuado, sob pena de responsabilidade, devendo notificar o Instituto Nacional do Seguro Social, dando-o ciência dos termos da sentença ou do acordo celebrado, para que, caso o sucumbente não comprove o regular recolhimento do respectivo tributo nos autos da ação trabalhista, possa executá-lo perante a Justiça Federal comum.

Ocorre que, conforme observado pela jurista Ana Freitas13, diante desta sistemática a situação se torna bem mais cômoda ao empregador que deseje driblar a obrigação legal de recolher as contribuições previdenciárias, pois mesmo sendo condenado em ação trabalhista, ele só seria cobrado pelo Fisco em ação específica na Justiça Federal comum.

Por outro lado, não se pode deixar de considerar o fato de que muitas vezes o INSS mesmo sendo citado em ação trabalhista para tomar ciência da condenação do devedor no recolhimento das contribuições previdenciárias, só vem se atentar de que não houve o efetivo recolhimento do referido tributo no momento em que o segurado vai requerer o seu benefício de aposentadoria.

Assim, diante de um cenário de grande evasão fiscal, bem como diante da inefetividade do INSS em fiscalizar o efetivo recolhimento da contribuição previdenciária, mesmo tomando ciência da sentença condenatória ou acordo trabalhista, editou-se a emenda constitucional n°. 20, de 15 de dezembro de 1998, que deu nova redação ao art. 114. da CF/88, a qual passou a dispor:

Art. 114. (...).

§ 3º. Compete à Justiça do Trabalho executar, de ofício, as contribuições sociais previstas no art. 195, I, a e II, e seus acréscimos legais, decorrente das sentenças que proferir.

Desta maneira, a legislação constitucional conferiu à Justiça do Trabalho a competência material para executar as contribuições previdenciárias provenientes da folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa que presta serviços, mesmo que sem vinculação empregatícia, e do trabalhador e demais segurados da Previdência Social14, decorrentes das sentenças que proferir.

Diante deste cenário, no dia 25 de outubro de 2000, foi editada a lei nº. 10.035 que deu nova redação ao parágrafo único do art. 831, § 3º e § 4º do art. 832, e parágrafo único do art. 876. da CLT, ao estabelecer um procedimento executório da contribuição social perante a Justiça do Trabalho, vejam-se:

Art. 831. (...).

Parágrafo único. No caso de conciliação, o termo que for lavrado valerá como decisão irrecorrível, salvo para a Previdência Social, quanto às contribuições que lhe forem devidas.

Art. 832. (...).

§ 3º As decisões cognitivas ou homologatórias deverão sempre indicar a natureza jurídica das parcelas constantes da condenação ou do acordo homologado, inclusive o limite de responsabilidade de cada parte pelo recolhimento da contribuição previdenciária, se for o caso.

§ 4º A União será intimada das decisões homologatórias de acordos que contenham parcela indenizatória, na forma do art. 20. da Lei no 11.033, de 21 de dezembro de 2004, facultada a interposição de recurso relativo aos tributos que lhe forem devidos.

Art. 876. (...).

Parágrafo único. Serão executados ex ofício os créditos previdenciários devidos em decorrência de decisão proferidas pelos Juízes e Tribunais do Trabalho, resultantes de condenação ou homologação de acordo.

Pouco tempo depois, com a edição da EC n°. 45/2004, o legislador concedeu previsão constitucional à execução ex ofício perante a Justiça do Trabalho das contribuições sociais decorrentes das sentenças que proferir, ao dar nova redação ao inciso VIII do citado art. 114. da CF/88:

Art. 114. Compete a Justiça do Trabalho processar e julgar:

(...);

VIII. a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;

Ao analisar o arcabouço normativo constitucional e infraconstitucional acima transcrito verifica-se que a Justiça do Trabalhou passou a ter competência para executar de ofício as contribuições sociais oriundas das parcelas pecuniárias de natureza salarial deferidas na sentença. No entanto, nada foi dito sobre as contribuições previdenciárias oriundas de relações de trabalho informais reconhecidas pela Justiça do Trabalho, mesmo sem ter havido a condenação ao pagamento de salários desse período.

Foi pensado nesta situação que o legislador infraconstitucional editou a lei n°. 11.457, de 16 de março de 2007, que alterou diversos dispositivos da CLT, notadamente o parágrafo único do art. 876, que passou a ter a seguinte redação:

Art. 876. (...).

Parágrafo único. Serão executadas ex-officio as contribuições sociais devidas em decorrência de decisão proferida pelos Juízes e Tribunais do Trabalho, resultantes de condenação ou homologação de acordo, inclusive sobre os salários pagos durante o período contratual reconhecido.

O Tribunal Superior do Trabalho, inclusive, editou entendimento sumulado quanto a questão específica referente ao recolhimento de contribuições previdenciárias incidentes sobre remunerações já pagas durante vínculo de emprego posteriormente reconhecido pela Justiça do Trabalho, senão vejamos a redação original da súmula 36815:

DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS E FISCAIS. COMPETÊNCIA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO. FORMA DE CÁULCULO. (conversão das Orientações Jurisprudenciais ns. 32, 141 e 228 da SDI-1). I. A Justiça do Trabalho é competente para determinar o recolhimento das contribuições previdenciárias e fiscais provenientes das sentenças que proferir. A competência da Justiça do Trabalho para execução das contribuições previdenciárias alcança as parcelas integrantes do salário de contribuição, pagas em virtude de contrato de emprego reconhecido em juízo, ou decorrentes de anotação da Carteira de Trabalho e Previdência Social – TST, objeto de acordo homologado em juízo. (ex-OJ n. 141, inserida em 27 de novembro de 1998). (...).

Com a edição da citada súmula n°. 368, o TST ratificou a competência da Justiça Laboral para executar os créditos previdenciários inclusive sobre o reconhecimento do vínculo empregatício declarado em sentença, colocando, portanto, um ponto final nas acaloradas discussões acerca do assunto.

Ocorre que, conforme apontado pela jurista Ana Freitas16 em seu estudo:

(...) embora a Justiça do Trabalho executasse a contribuição previdenciária, inflando os cofres públicos, esses valores não eram individualizados no Cadastro Nacional de Informação Social – CNIS, banco de dados da Previdência Social, com as informações de todos os salários de contribuição e meses de competência do trabalhador.

Sendo assim, muito embora a Justiça do Trabalho tenha contribuído consideravelmente para o aumento da arrecadação das contribuições previdenciárias ilegalmente sonegadas pelos empregadores, ela estava sendo utilizada apenas como um mero órgão arrecadador do Fisco, sendo, portanto desviada da sua principal finalidade que é a proteção do trabalhador, uma vez que estes não tinham a sua contribuição social, recolhida em razão de reconhecimento de contrato de emprego por meio de sentença trabalhista ou acordo homologado, vinculada ao CNIS da Previdência Social.

Como bem asseverou Marcelo Souto Maior17 a arrecadação foi tamanha que no de 2002 a Justiça Laboral respondeu por 49% (quarenta e nove por cento) da arrecadação nacional da Procuradoria do INSS, o que resultou em um convênio de cooperação técnica para cadastramento das ações trabalhistas e desenvolvimento de mecanismos de controle da execução.

Diante de tais circunstâncias o TST, por meio da Resolução de nº. 138. resolveu alterar o inciso I da citada súmula 36818, mudando o entendimento em relação à competência da Justiça do Trabalho em relação aos créditos previdenciários sobre o vínculo declarado em sentença:

DESCONTOS PREVIDENCIÁRIOS E FISCAIS. COMPETÊNCIA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO. FORMA DE CÁLCULO (redação do item II alterada na sessão do Tribunal Pleno realizada em 16.04.2012) - Res. 181/2012, DEJT divulgado em 19, 20 e 23.04.2012

I - A Justiça do Trabalho é competente para determinar o recolhimento das contribuições fiscais. A competência da Justiça do Trabalho, quanto à execução das contribuições previdenciárias, limita-se às sentenças condenatórias em pecúnia que proferir e aos valores, objeto de acordo homologado, que integrem o salário de contribuição. (ex-OJ nº 141 da SBDI-1 - inserida em 27.11.1998 ). (...).

É bem verdade que, com a modificação da referida súmula adotando o entendimento de que a Justiça do Trabalho tem competência para determinar o recolhimento previdenciário das sentenças que proferir, e consequentemente executá-las, mas não tem para executar as contribuições previdenciárias decorrentes dos vínculos empregatícios que declara, a suprema corte trabalhista reconheceu o desprestígio de sua atuação, em razão do fato do INSS não repercutir de forma direta e imediata o conteúdo das declarações de vínculo realizadas às suas sentenças19.

Como bem assevera Ana Freitas20 “o que se observa é o próprio Judiciário Trabalhista, por intermédio do entendimento de alguns magistrados, repelir a competência que lhe foi dada pelo Poder Legislativo”, ao passo que os trabalhadores que tem declarado seu vínculo empregatício em sede de ação trabalhista ficam a deriva ante a inércia do INSS, e, muitas vezes arcam com o prejuízo no momento em que vão requerer o seu benefício de aposentadoria.

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Sobre os autores
Renato Henrique Barbosa de Oliveira Filho

Graduado em Direito pela Faculdade Boa Viagem.<br>Pós Graduando em Direito Público Municipal pela Escola Paulista de Direito. <br>Advogado desde 2013. <br>Experiência em licitações e contratos administrativos, bem como no contencioso e consultivo das áreas relacionadas ao direito civil, administrativo, constitucional e previdenciário.

Ana Regina Guedes Gondim

Servidora Pública Federal lotada na Defensoria Pública da União (DPU)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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