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O ônus da prova e sua inversão no Código de Defesa do Consumidor

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15/03/2004 às 00:00
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CONCLUSÃO

É certo que cada parte deve se desincumbir do ônus da prova de acordo com seu interesse em vencer a demanda ou demonstrar uma situação jurídica favorável.

Se o fornecedor tem interesse em que o consumidor perca a demanda, deve trazer as provas que detém e os elementos técnicos de que dispõe para prosperar a improcedência do pedido.

Não se nega a possibilidade da inversão do ônus da prova ser utilizada irregularmente. É possível que uma pretensão, apesar de verossímil, traga em si o objeto de desmoralizar o produto do fornecedor-demandado, traduzindo um conluio reprovável de seus concorrentes, obrigando-o a desenvolver toda atividade probatória para não correr o risco de sofrer uma sentença desfavorável. Porém, acreditamos que a posição aqui adotada garante maior efetividade processual, sem falar na agilidade processual que pode trazer.

Crê-se que, em alguns anos, será possível avaliar os resultados da inversão do ônus da prova e a posição aqui defendida representa a expectativa de que o virtual cerceamento de defesa do fornecedor não supere os reais benefícios advindos da efetiva proteção dos direitos do consumidor.


EXEMPLOS QUE CONFIRMAM A TESE

Para a demonstração do quanto exposto, interessante é o exame das possíveis situações, a partir de casos bases, de acordo com o ônus da afirmação e o ônus da prova.

Exemplo: O consumidor A promove demanda em face de B alegando ter adquirido eletrodoméstico por ele fornecido e que, em certo dia, por defeito, incendiou-se, ferindo sua mão.

Constituem as alegações de A: a) o produto x apresentou defeito; b) ocorreu um incêndio no aparelho; c) este defeito gerou um incêndio, tendo sofrido dano físico.

Poderá ao fornecedor B, em sua contestação, oferecer defesa de mérito direta (negando o fato que constitui o direito do autor ou, mesmo que admita a existência do fato constitutivo, nega as conseqüências que o autor pretende ver produzidas) ou indireta (apesar de concordar com o fato constitutivo do autor, apresenta fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor).

São as seguintes possibilidades:

Caso 1: Alegação de B: não é fornecedor do produto x (é apenas o distribuidor).

Hipótese A: A faz prova de que B é fornecedor e B nada prova. Não há dúvida. Julgamento procedente.

Hipótese B: A comprova que B é fornecedor e B comprova que não é. Situação de dúvida. Poderes instrutórios. Análise da hipossuficiência e da verossimilhança. Se continuar em dúvida: valoração das provas apresentadas pelas partes, onde o juiz poderá julgar pela procedência ou improcedência de acordo com seu convencimento.

Hipótese C: A não prova que B é fornecedor do produto x; B comprova que não é fornecedor do produto x. Não há dúvida. Julgamento improcedente, sem que se utilize regra de experiência ou de distribuição do ônus da prova.

Hipótese D: A não prova que B é fornecedor do produto x; B não comprova satisfatoriamente que não era fornecedor do produto x. Situação de dúvida. Análise da verossimilhança e da hipossuficiência. Se o juiz aceitar como verdadeira a hipossuficiência ou a verossimilhança e sendo falha a prova do fornecedor: julgamento procedente. Caso contrário: julgamento improcedente, diante da aplicação das regras do ônus da prova.

Caso 2: Alegação de B: confirma que é fornecedor do produto x, (mas não o colocou no mercado o produto está em circulação por ter sido furtado).

Hipótese A: A faz prova de que B colocou o produto no mercado, e este não prova que não colocou o produto no mercado. Não há dúvida. Julgamento procedente.

Hipótese B: A faz prova de que B colocou o produto no mercado, e este faz prova contrária, dizendo que não colocou (prova que o produto foi furtado). Situação de dúvida, utilizando o juiz seus poderes instrutórios, analisando a hipossuficiência e verossimilhança das alegações. Julgamento procedente ou improcedente de acordo com o resultado da valoração das provas no espírito do julgador.

Hipótese C: A não faz prova de sua alegação e B também não o faz. Situação de dúvida; verificação da verossimilhança da alegação e hipossuficiência. Se dispensar o autor da prova: Julgamento procedente. Se não dispensar: julgamento improcedente, com base nas regras de distribuição do ônus da prova.

Hipótese D: A não faz prova de sua alegação e B comprova que não colocou o produto no mercado. Não há situação de dúvida sendo desnecessária a utilização de máximas de experiência ou regras de distribuição do ônus da prova. Julgamento improcedente.

Caso 3: Alegação de B: confirma que é fornecedor do produto x, mas o mesmo não apresenta qualquer defeito (exemplo: o aparelho não apresenta nenhuma peça defeituosa).

Hipótese A: A comprova que tem defeito e B deixa de comprovar que não tem defeito. Não há dúvida. Julgamento procedente.

Hipótese B: A comprova que tem defeito e B comprova que não tem. Situação de dúvida. Poderes instrutórios do juiz. Dúvida persistente. Análise de verossimilhança e hipossuficiência. O julgamento será procedente ou improcedente dependendo da repercussão da valoração da prova no convencimento do julgador.

Hipótese C: A não comprova que tem defeito e B não comprova que não te defeito. Situação de dúvida. Poderes instrutórios do juiz. Dúvida persistente. Análise da verossimilhança e hipossuficiência. Se aplicar regras de experiência: julgamento procedente.

Hipótese D: A não comprova que tem defeito e B comprova que não tem. Não há dúvida. Julgamento improcedente, sem utilização das regras de distribuição do ônus da prova.

Caso 4: Alegação de B: confirma que é fornecedor do produto x, mas a culpa pelo incêndio é exclusiva do consumidor (o incêndio ocorreu em razão de um curto circuito no sistema elétrico ao qual estava ligado o eletrodoméstico).

Hipótese A: A comprova a culpa de B e este não prova a culpa exclusiva da vítima. Não há dúvida. Responsabilidade objetiva. Julgamento procedente.

Hipótese B: A comprova que o incêndio ocorreu por culpa de B e este, admite sua parcela de culpa e comprova também que A é culpado. Não há dúvida. A responsabilidade é objetiva, não se livrando b da culpa concorrente. Julgamento procedente.

Hipótese C: A não comprova que o incêndio ocorreu por culpa de B e este não comprova que o incêndio ocorreu por culpa exclusiva de A. Análise da verossimilhança e hipossuficiência. Não há dúvida. Responsabilidade objetiva. Julgamento procedente.

Hipótese D: A não comprova que o incêndio ocorreu por culpa de B e este comprova a culpa exclusiva de A ou de terceiro. Não há situação de dúvida. Julgamento improcedente.

Conclui-se, portanto, que poderá o réu eximir de sua responsabilidade desde que: a) comprove a ocorrência das excludentes do art. 13, §3° e art. 14, § 4° do CDC; b) deixe o demandante de apresentar prova que fundamente seu direito, não sendo determinada a inversão do ônus em seu favor.

Em raciocínio contrário, o demandante terá agasalhado seu pedido se: a) apresentar prova que fundamente seu direito; b) o demandado não oferecer contraprova e houver dispensa a seu favor do encargo da prova, em razão de sua hipossuficiência ou da verossimilhança de suas alegações.


EXEMPLO PRÁTICO

Para explicar de forma sucinta, suponha-se que um automóvel, com grave defeito de fabricação das rodas de liga leve, cuja fabricação tem que obedecer a rígidos requisitos ditados pelo CONTRAN (Resolução nº545/78) venha a capotar e causar sérios danos pessoais ao usuário, além de outros, materiais, exatamente em decorrência da fratura de uma delas.

O primeiro aspecto a analisar é a questão individual daquele adquirente/consumidor/usuário do veículo e, no caso, ainda vige em sua plenitude, até a passar a vigorar o Código sob exame, o teor do art. 159 do Código Civil, segundo o qual a responsabilidade decorre do fato, aliado ao elemento subjetivo consistente em dolo em determinada ação ou omissão, ou então culpa (negligência, imprudência ou imperícia).

Desta forma, a vítima tem que provar, além do dano, do nexo causal entre esse e a atitude do fabricante/montador do carro, sua culpa, no caso por presunção de não ter tido o cuidado suficiente de escolher (in eligendo) adequadamente a roda que ia colocar no veículo, ou então por não tê-la submetido a rigoroso controle de qualidade, já que se trata de item de segurança, tudo para eventualmente fazer jus o consumidor a uma indenização.

Já com a inversão do ônus da prova, aliada à chamada "culpa objetiva", não há necessidade de provar-se dolo ou culpa, valendo dizer-se que o simples fato de se colocar no mercado um veículo naquelas condições que acarrete, ou possa acarretar danos, já enseja uma indenização, ou procedimento cautelar para evitar referidos danos, tudo independentemente de se indagar de quem foi à negligência ou imperícia, por exemplo.

É evidente, entretanto, que não será em qualquer caso que tal se dará, advertindo o mencionado dispositivo, como se verifica de seu teor, que isso dependerá, a critério do juiz, da verossimilhança da alegação da vítima e segundo as regras ordinárias de experiência.

Ou melhor, explicando e socorrendo-nos mais uma vez de exemplos: se o acidente se verificou não por imprudência do motorista ou por um buraco na pista, fatores tais que eventualmente também poderiam ter causado a quebra da roda, é evidente que se pressupõe desde logo que aquilo se deu pela má qualidade de sua fundição, cabendo ao fabricante da própria roda, ou então montador do veículo, aí sim, provar que não colocou o veículo no mercado, ou então que a culpa foi de terceiro, e assim por diante.

O que normalmente, ainda na conclusão do exemplo dado, se espera, é que o veículo, em condições normais, não apresente tal anomalia. Todavia, se as condições de trânsito são normais, se o motorista não agiu com uma das formas de culpa já elencadas, etc., a quebra da roda somente poderia ser em decorrência da péssima forma de fundição, donde a responsabilidade do fabricante/montador.


JURISPRUDÊNCIA

CONSUMIDOR – ÔNUS DA PROVA – INVERSÃO – FACULDADE CONCEDIDA AO JUIZ, QUE IRÁ UTILIZÁ-LA NO MOMENTO EM QUE ENTENDER OPORTUNO, SE E QUANDO ESTIVER EM DÚVIDA, GERALMENTE POR OCASIÃO DA SENTENÇA – INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 6°, VIII, DA LEI N° 8.078/90.

A inversão do ônus da prova, prevista no art. 6°, VIII, do CDC, é uma faculdade concedida ao Juiz, que irá utiliza-la a favor do consumidor no momento que entender oportuno, se e quando estiver em dúvida, geralmente por ocasião da sentença. (1° TAC 3ª Câm.; AI n° 912.726-8- SP; Rel. Juiz Roque Mesquita; j. 04/04/2000; v.u.) RT 780/278 BAASP, 2204/186 –m, de 26/03/01.

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  • CDC – art. 6º VIII
  • CPC – art. 333, I; 526

NOTAS

1. Comportam as garantias do cidadão quatro fases de evolução. Em uma primeira etapa, referia-se às liberdades públicas, limitadas aos direitos individuais, de origem natural, reconhecida através da Revolução Francesa de 1789. Já em sua segunda fase, após a Constituição Alemã de 1919, afirmam-se os direitos econômicos e sociais, deixando ao Estado sua feição passiva – característica da primeira fase para, então, assegurar, através de uma atuação positiva, os direitos básicos da primeira geração. Após a Segunda Guerra Mundial e por iniciativa da ONU e da UNESCO, a preocupação volta-se para os direitos meta-individuais. Vivencia-se, atualmente, a quarta geração dos direitos, onde a solidariedade se projetará mundialmente, como ocorre com a Unificação Européia. Assim CAPPELLETTI, Mauro, "O acesso dos consumidores à Justiça" in RePro 16 (62); 205-220, abr. /jun. 1991 (Revista Forense 86 (310) 53-63, abr. /jun. 1990).

2. De um modo equivalente, acompanhou a ciência processual a evolução dos direitos e garantias. Da ideologia liberal burguesa dos séculos XVIII e XIX – ligada ao processo como via formal de demandar em juízo, para satisfação de interesses individuais – chegamos ao sistema da efetividade do processo, proclamado seu caráter instrumental a serviço da Justiça. Por outro lado, também o perfil da Constituição se renova. De início, a fase da dimensão constitucional resguardara os direitos fundamentais para, a seguir, a dimensão transnacional criar um núcleo de leis aceitas universalmente pela maioria das nações, a exemplo da Declaração dos Direitos Humanos de 1948. Na etapa atual, chamada de dimensão social, as constituições buscam assegurar e promover a igualdade social e os direitos individuais e meta-individuais, de acordo com os princípios já erigidos nas fases anteriores. Constata-se, deste modo, o entrelaçamento entre a evolução dos direitos, do processo e do modelo constitucional.

3. CAPPELETTI, Mauro e GARTH, Bryant, Acesso à Justiça, Porto Alegre, Sérgio Antonio Fabris Editor, 1998. No mesmo sentido está MORELLO, Augusto Mário, "Las nuevas exigencias de tutela" in RePro 8 (31); 210-220, jul. /set. 1983.

4. É preciso afastar a visão formal do processo, utilizando-o como meio de eliminação dos conflitos do cidadão comum, servindo como instrumento de ruptura do pouco eficaz sistema moderno, assumindo a feição de canal político de realizações e transformações.

5. Com relação ao direito do consumidor, relacionou Mauro Cappelletti as principais soluções para a renovação: a) Ministério Público independente, ativo e especializado; b) instituição de órgãos públicos de defesa do consumidor; c) ampliação do conceito de legitimidade para agir; d) reformulação do sistema de reparação de danos; e) instituição do modelo da ação popular ("O acesso dos consumidores" cit). in RePro 16 (62): 208-211).

6. Sobre estes temas veja MOREIRA, José Carlos Barbosa, "Notas sobre o problema da efetividade do processo", in Estudos de Direito Processual em homenagem a José Frederico Marques, S. Paulo, Saraiva, 1982, pp. 77-94 e Cândido Rangel Dinamarco. A instrumentalidade do processo, S. Paulo, Ed. RT 1987.

7. Sobre os direitos individuais e meta-individuais, FERRAZ, Rodolfo de Camargo, Interesses difusos, S. Paulo, Ed. RT, 1988; FERRAZ, Antonio Augusto Mello de Camargo, "Interesse público, interesse difuso e defesa do consumidor" in Justiça 49 (137): 49-53 jan. /mar. 1987; NERY, Nelson Junior, "O processo civil no Código de Defesa do Consumidor" in Re Pro 16 (61): 24-35 jan. /mar. 1991; MAZZILLI, Hugo Nigro, A defesa dos interesses difusos em juízo, S. Paulo, Ed. RT, 1992; MATOS, Cecília, "O Ônus da prova no Código de Defesa do Consumidor", dissertação de mestrado apresentada na Faculdade de Direito da Universidade de S. Paulo, 1993, pp. 139-165.

8. A Expressão de WATANABE, Kazuo, "Filosofia e características básicas do Juizado Especial de Pequenas Causas" in Juizado Especial de Pequenas Causas, S. Paulo, Ed. RT, 1985, 1985, p. 2.

9. O aspecto multidisciplinar do CDC evidencia-se nos princípios e institutos de diversos ramos do Direito, entre os quais, do Direito Civil, Processual Civil, Comercial, Tributário, Administrativo, como já salientou PÓLO, Eduardo in La protección Del consumidor em el Derecho privado, Madri, Editorial Civitas, pp. 21-24.

10. Comentando a fragilidade do consumidor, ALMEIDA, Carlos Ferreira, Os direitos dos consumidores, Coimbra, Libraria Almedina, 1982, p. 156, nota 4: "no caso do consumidor contra a empresa, é como se, contra uma espada, o consumidor lutasse com as mãos", onde a desigualdade entre as partes, de acordo com o sistema tradicional, faria com que o consumidor não alcançasse seu direito, restando-lhe apenas, o pagamento das despesas processuais.

11. Sobre os conceitos de faculdades, direitos, poderes, deveres, ônus, sujeições e obrigações, Carnelutti, Sistema di diritto processuale civile, Padova, Cedam, 1936, pp. 44 e ss. E Liebman, Manual de Direito Processual Civil, Rio de Janeiro, Forense, 1985, p. 23 e ss.

12. Segundo a lição de MOREIRA, José Carlos Barbosa, "Julgamento e ônus da prova" in Temas de Direito Processual, S. Paulo, Saraiva, 2. ª série, 1988, p. 74, "parte-se da premissa, explicita ou implícita, de que o maior interessado em que o juiz se convença da veracidade de um fato é o litigante a quem aproveita o reconhecimento dele como verdadeiro, por decorrer daí a afirmação de um efeito jurídico favorável a esse litigante, ou a negação de um efeito jurídico a ele desfavorável".

13. Sobre ônus da prova, importantes são as obras ROSEMBERG, Leo, La carga de la prueba, Buenos Aires, Ediciones Jurídicas Europa-America, 1956, tradução de Ernesto Krotoschin, Gian Antonio Micheli, L’onere della prova, Padova, Cedam, 1966 e Giovanni Verde, L’onere della prova nel processo civile, Napoli, Jovene Editore, 1974.

14. Sobre os conceitos jurídicos em branco, ver MOREIRA, José Carlos Barbosa, "Regras de experiência e conceitos juridicamente indeterminados" in Revista Forense 74 (261): 13-19, jan. /mar. 1978 e "As presunções e a prova" in Temas de Direito Processual, 2. ª série, S. Paulo, Saraiva, 1977, pp. 55-71, e CRESCI, Elicio Sobrinho, "O juiz e as máximas de experiência" in Revista Forense 82 (296): 430-436 out. /dez. 1986.

15. Calamandrei, "Verità e verosimiglianza nel processo civile" in Rivista di Diritto Processuale (10): 170-171, estabelece os graus de conhecimento de um fato: "possibileè ciò che può esser vero. Probabile sarebbe, etimologicamente, ciò Che si può provare come vero... queste ter qualificazioni (possible, verosimile, probabile) constituicono, in quest’ordine, uma graduale approssimazione, uma progressiva accentuazione verso il riconoscimento di ciò Che è vero". (grifo original)

16. A interpretação de que a hipossuficiência liga-se apenas a critérios econômicos encontra sua origem na elaboração legislativa do CDC. Com efeito, em seu anteprojeto, a hipossuficiência do consumidor não estava prevista, rezando o art. 6. º, inc. VIII que "a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com inversão, a seu favor, do ônus da prova no processo civil, quando verossímil a alegação do consumidor, segundo as regras ordinárias de experiência". O acréscimo posterior, incluindo a hipossuficiência, não teria se revestido de melhor técnica, mas ainda assim permite o entendimento de que dois são os critérios para a facilitação dos direitos do consumidor. O primeiro, subjetivo, baseado na verossimilhança das alegações, segundo as regras ordinárias de experiência, conduz a inversão da prova. O segundo, objetivo, fundado na hipossuficiência, que poderá ser verificada, inicialmente, segundo os critérios da Lei 1.060/50 e sobre o qual não incide a experiência do julgador e acarreta uma dispensa do encargo de provar. De acordo com a vontade da lei extraída de sua elaboração, entende-se que interpretar o conceito de hipossuficiência para além do critério econômico é propiciar uma melhor e mais ampla tutela ao consumidor, sem impor restrições.

17. Echandia, teoria Geral de La Prueba Judicial, v. I. , n. 126, p. 441.

18. Temas de Direito Processual, Segunda Série, ob. Cit., p. 76.

19. Código de Processo Civil e Legislação Processual Extravagante, RT, 1994, p. 1.209.

20. Motivação da decisão.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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NASCIMENTO, Tupinambá. Comentários ao Código do Consumidor, Rio, Aide Ed., 1991.

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DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 2. ed. São Paulo: RT, 1990.

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MATOS, Cecília. O ônus da prova no Código de Defesa do Consumidor. Revista do Consumidor, n. 11, p. 161/169.

CALDEIRA, Mirella D’Angelo. Inversão do ônus da prova. Revista do Consumidor, n.38, p. 166/367.

GAULIA, Cristina Tereza. A inversão do ônus da prova no Código de Defesa do Consumidor. Revista do Consumidor, Doutrina Nacional, n. 40, p. 77/92.

MONTEIRO SILVEIRA, Simone M., Revista do Consumidor, n.14, Jurisprudência Comentada, p. 114/120.

AGUIAR JR., Ruy Rosado de. "Cláusulas Abusivas no Código de Defesa do Consumidor", in Estudos sobre a proteção do consumidor no Brasil e no Mercosul. Porto Alegre: Livraria do Advogado.

GRAU, Eros Roberto. "Interpretando o Código de Defesa do Consumidor; algumas notas", in Revista do Direito do Consumidor 05, janeiro – março de 1993.

BORTOWSKI MOREIRA, Marco Aurélio. A Carga Probatória Segundo a Doutrina e o Código de Defesa do Consumidor. Revista do Direito do Consumidor n. 7, p. 101/117.

SANTOS, Moacir Amaral. Prova Judiciária no Cível e Comercial, vol. I, editora Saraiva 1993.

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Sobre a autora
Maria Carolina Genaro Saran

advogada em Campinas (SP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SARAN, Maria Carolina Genaro. O ônus da prova e sua inversão no Código de Defesa do Consumidor. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 251, 15 mar. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4986. Acesso em: 26 abr. 2024.

Mais informações

Trabalho apresentado como exigência parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Ciências Jurídicas da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, sob a Orientação do Prof. Dr. Manuel Carlos Cardoso.

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