INTRODUÇÃO
A presente obra vem discorrer sobre os limites e dispositivos legais que regem sobre o corpo humano a fim de obter uma visão geral sobre o assunto e assim propor questionamento e também os respondê-los para uma melhor compreensão da questão.
No primeiro tópico deste trabalho, falaremos da relação presente entre o direito e a capacidade de exercer plenamente, ou não os direitos a respeito do próprio corpo por cada um de nós, tratando ainda da extensão que tem o domínio exercido pela sociedade sobre o indivíduo.
Dando continuidade, trataremos então de um assunto que gera ainda certa polêmica, que é o assunto da prostituição, será discutido como a mesma é vista perante os olhos da lei e ainda as implicações sociais que esta atividade traz para quem a exerce.
No ultimo tópico daremos continuidade ao assunto do domínio ao corpo falando agora do assunto das barrigas de aluguel, também tratando de como esta é analisada pelo ordenamento jurídico bem como os fatores que levam à existência da mesma.
1 O DIREITO E SUA RELAÇÃO COM DOMÍNIO SOBRE O CORPO
Desde o principio a humanidade vem lutando para estabelecer os limites do próprio direito e principalmente sobre aquilo que lhe pertence. Neste ponto é comum o grande foco dado apenas a objetos ou ainda direitos subjetivos visto de uma perspectiva individualista ou não, por exemplo, quando na verdade, em alguns casos, nos esquecemos de algo que também deveria ser o ser foco de nossa atenção: quais os direitos que possuo em relação ao meu corpo?
Embora o corpo humano seja algo que obrigatoriamente, e obviamente, todos nós possuímos e usufruímos, seja para o prazer ou para o simples fato de tê-lo funcionando e com isso assegurando nossa sobrevivência, o mesmo não se pode dizer com relação aos direitos sobre o mesmo. Não são poucos os dispositivos legais que tentam reger o que cada ser humano pode fazer com seu próprio corpo, exemplo disso são as leis que proíbem a prostituição em determinados países ou ainda, para assim não sairmos de exemplos mais próximos e existentes no Brasil, o exemplo das barrigas de aluguel.
Os exemplos anteriormente citados são exemplos claros das limitações impostas pelo ordenamento jurídico com relação ao que cada um pode ou deve fazer com o próprio corpo. Esta intervenção do Estado nesta matéria levanta o questionamento acerca de qual seria a validade ou ainda justificativa plausível para intervir em algo, que ao menos a primeira vista deveria ser tratada como de domínio pessoal e, portanto, foras dos limites de atuação estatal. “Qual, então, o justo limite à soberania do indivíduo sobre si próprio? Onde começa a autoridade da sociedade? Quanto da vida humana se deve atribuir à individualidade, quanto à sociedade?” (MILL, 1942, p. 135)
Em seu livro “Ensaio sobre a liberdade” (1942), John Stuart Mill diz que a sociedade cabe intervir quando as interações do indivíduo digam respeito a outro, mas que não é exatamente dever da mesma reger sobre o domínio individual do corpo, ainda que o faça através de determinadas sanções, que como apresenta este trabalho podem ser sociais ou até mesmo legais.
2 O COMÉRCIO SEXUAL DO CORPO
A Constituição da República Federativa do Brasil, em seu preâmbulo, institui um Estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos. A liberdade é fundamental para a dignidade humana, e a partir do momento que ela lhe é retirada, é quando se perde a própria dignidade.
Toda pessoa é dona de seu próprio corpo. Isso quer dizer que ela pode usá-lo da maneira que bem entender. A prostituição, em si, não é considerada crime. Porém, tirar proveito dela, de qualquer forma que seja, é. A legislação brasileira não prevê a primeira situação. Porém a segunda se encontra no artigo 229 do Código Penal que prevê pena de dois a cinco anos de cadeia, além de multa, para quem cometer a ação de “manter, por conta própria ou de terceiro, casa de prostituição ou lugar destinado a encontros para fim libidinoso, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente”. Esse dispositivo tem por fim tentar impedir que locais destinados a esse tipo de atividade sejam criados e mantidos. Desta forma, tem-se em vista o interesse da sociedade, que espera por moralidade pública e bons costumes. Porém, se alguém quiser dispor de seu corpo, com a finalidade de obter lucro, por conta própria, não é alcançado pelo dispositivo acima citado.
Em relação à prostituição, há dois posicionamentos muito importantes e divergentes. O primeiro afirma que a atividade faz com que a pessoa se afaste de uma vida com valores e dignidade, por contrariar os bons costumes:
A prostituição caracteriza-se pelas atitudes de desrespeito à dignidade humana. O prazer, a alegria, o acolhimento desinteressado, a amizade, o carinho o amor são momentos de doação mútua, livres e espontâneos; quando comercializados (sexo por sexo), tornam-se depressivos, dependentes e degradantes, de um lado, por alguém que é oprimido e de outro, pelo opressor. Visto sob este prisma, podemos afirmar que toda violação de si, da individualidade, em busca de uma recompensa é um ato prostituído. (PIRES, 1983, p. 155)
Por outro lado, há aqueles que acreditam que a liberdade está acima de tudo e é inerente à pessoa. E a prostituição, portanto, quando acontece por escolha própria, deve ser respeitada, assim como a de seus clientes. A prostituição, para essa corrente, é vista como uma profissão qualquer, desde que exercida por espontânea vontade. É preciso, também, respeito por parte da sociedade. Pois, desta forma, estaria respeitando, tanto a liberdade de escolha, como consequentemente a dignidade das pessoas.
3. A BARRIGA DE ALUGUEL E AS LACUNAS DA LEGISLAÇÃO
Outro assunto importante quando tratamos dos direitos referentes ao próprio corpo esta nos casos das já conhecidas barrida de aluguel. Com o advento das técnicas de reprodução assistida, está cada vez mais nas mãos das pessoas a escolha de ter um filho ou não, podendo escolher a hora que isso vai acontecer, e quantos filhos serão gerados. Tal fato trouxe muitos benefícios, principalmente para aquelas mulheres que sempre desejaram ter um filho, mas não poderiam realizar esse sonho com o seu corpo.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) é considerado infértil o casal que tenta conceber um filho, através do método natural, durante dois anos. A partir do momento em que a esterilidade é comprovada, são realizados exames com o intuito de encontrar qual o tipo de problema que o casal possui, para enfim, decidir qual a técnica de Reprodução Assistida mais adequada para o caso. (FERNANDES, 2005, p.20)
Um dos métodos utilizados por quem não consegue engravidar é a inseminação artificial. Esta consiste na junção do óvulo com o espermatozoide, mas não da maneira convencional. Ela é usada como uma forma de supera alguma fase da reprodução normal que, por alguma razão, não consegue ser completa. (FERNÁNDEZ, 2000, p.148)
Outro método utilizado para quem não consegue engravidar é aquele conhecido como fertilização in vitro. Este é muitas vezes realizado através da doação de espermas, caso o homem não tenha espermatozóides ou a quantidade seja mínima, ou até mesmo de óvulos de outra mulher. Há a mistura de óvulo e sêmen dentro de uma proveta, até que se alcance uma fecundação.
A “barriga de aluguel” consiste em uma mulher carregar em seu útero um feto que foi gerado com óvulo e sêmens de outras pessoas. Isso ocorre quando o útero da mãe biológica não desenvolve normalmente o óvulo fecundado ou se uma gravidez puser em risco a vida dela. A Resolução 1.358/1992 do Conselho Federal de Medicina estabelece que, se a mulher estiver casada, ou em relação estável, é necessária a aprovação do cônjuge ou companheiro para que o procedimento seja efetivado.
Essa resolução também só autoriza as doadoras temporárias do útero que sejam pertencentes à família da doadora genética e cuja relação de parentesco seja até de segundo grau, pois como se trata da mesma família, existe uma relação de afeto, e então a possibilidade de interesse lucrativo com tal prática seria nulo.
Alguns autores acreditam que esse procedimento vai de encontro às leis brasileiras visto que, de acordo com o Código Civil, um negócio jurídico não pode ter como objeto parte do corpo humano. Então só essa afirmação já seria suficiente para não fosse aceito esse “aluguel” do útero. A própria Constituição Federal, em seu artigo 199, veda a comercialização de qualquer órgão, tecido e substâncias humanas. Viola o artigo 13 do CC. Acredita-se que se trata de um crime pelo fato da placenta, que protege o feto e garante que funções vitais a ele sejam exercidas, é considerado um órgão, que seria, portanto utilizada somente durante a gestação e depois descartada. Isso caracterizaria um crime.
Como visto, o caso da barriga de aluguel é um tema que apresenta grande controvérsia por tratar de uma disposição do corpo que não é aceito pela nossa legislação. Porém se for interpretado como tendo a finalidade de construir uma família, pode se então ser considerado aceitável, desde que se respeitem os direitos da gestante e dos pais biológicos juridicamente.
CONCLUSÃO:
Com este trabalho, tivemos o objetivo de percorrer pelos mais variados assuntos que dizem respeito ao direito do próprio corpo, partindo primeiramente da correlação base para este fato que é da imposição da sociedade sobre o indivíduo quando o assunto é o corpo do mesmo ainda que este devesse dizer respeito apenas a seu possuidor já que como Jon Stuart Mill nos fala o ideal é apenas a intervenção da sociedade quando a relação exigir a cobertura de mais de um individuo, quando este sofrer algum tipo de mazela (1942. p. 135).
Propomos ainda uma discussão a respeito de um assunto “tabu”, embora venha perdendo esta força características nos últimos anos, na sociedade brasileira, o da prostituição, assunto que levanta uma questão importante dentro do assunto apresentado neste trabalho: o da venda do próprio corpo. Neste tópico tivemos a intenção de deixar de forma clara os dispositivos legais que tratam desta matéria bem como falar, ainda que brevemente sobre a atividade e as consequências sociais sob as quais ela está submetida.
Por fim, trouxemos a idéia de outro tipo de venda corporal, a das barrigas de aluguel. Estas, que em suma tem o propósito de aumentar a vida – entenda-se aqui a gestação de um novo ser humano – podem ainda adquirir um caráter repreensivo por parte do ordenamento jurídico que consegue ver além desta idéia mais “amigável” inclusive tendo em vista que nestes assuntos é comum o literal aluguel, utilizando-se de pagamentos, dos úteros de mulheres.
Por fim, gostaríamos de deixar claro que a proposta final deste trabalho é agregar mais conhecimento a discussão de até onde se estende o direito de cada um, tratado aqui não só de um ponto de vista social, mas principalmente jurídico, trazendo trechos do ordenamento e assim visando o levantamento de uma análise objetiva sobre o assunto.
REFERÊNCIAS:
FERNÁNDEZ, Javier Gafo [tradução: Maria Luisa Garcia Prada]. 10 Palavras Chave em Bioética: Bioética, Aborto, Eutanásia, Pena de Morte, Reprodução Assistida, Manipulação Genética, AIDS, Drogas, Transplantes de Órgãos, Ecologia. São Paulo: Editora Paulinas. 2000.
FERNANDES, Silvia da Cunha. As Técnicas de Reprodução Humana Assistida e a Necessidade de Sua Regulamentação Jurídica. Rio de Janeiro: Editora Renovar. 2005.
MILL, John Stuart. Ensaio sobre a liberdade. São Paulo: Cia. Nacional. 1942.
RIZZATO NUNES, Luiz Antônio. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Doutrina e jurisprudência. 3ª ed. São Paulo: Editora Saraiva. 2010.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: parte geral. V. 1. São Paulo: Atlas. 2007.
Existe um direito fundamental de dispor sobre o próprio corpo?. Disponível em <http://direitosfundamentais.net/2008/11/03/existe-um-direito-fundamental-de-dispor-sobre-o-proprio-corpo/>. Acesso em: 08 mar. 2012.