Papel das agências reguladoras na regulação do capitalismo brasileiro contemporâneo

28/06/2016 às 22:17
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Este trabalho acadêmico realizado na disciplina de Direito Administrativo resulta em um apanhado geral sobre as características jurídicas das agências reguladoras e sua influência na regulação do capitalismo brasileiro contemporâneo.

1. INTRODUÇÃO

Após a redemocratização na década de 1980, o Brasil retornou ao cenário democrático internacional. Com essa abertura, houve uma ampliação do mercado consumidor brasileiro e uma crescente demanda por intensificar as relações de consumo e diminuição da intervenção estatal na economia.

A partir da década de 1990 o capitalismo brasileiro ganhou força no cenário político-econômico nacional com a desestatização maciça de grandes empresas públicas de vários setores, desde comunicações até mineração. Com isso, foi necessário suprir o poder regulador do governo com a criação de órgãos reguladores que foram chamados de Agências Reguladoras.

Com o desenvolvimento democrático essas agências tem ganhado força no país ao regular desde relações de consumo, até a fiscalização da atuação industrial, comercial e de exploração em geral. Portanto, as agências reguladoras crescem em contrapartida a diminuição da participação do Estado na economia.

Hodiernamente as agências reguladoras tem papel fundamental no desenvolvimento econômico de um país de matriz capitalista como o Brasil equilibrando as forças entre o poder empreendedor e o desenvolvimento sustentável.

2. ORIGEM DAS AGÊNCIAS REGULADORAS

Segundo Oliveira (2015), as agências reguladoras brasileiras se assentaram nas matrizes da common law, espelhando-se mais especificamente nos EUA e seu modelo de regulação estatal. Isso se fez necessário numa visão de laissez-faire cujo ao Estado cabe apenas a regulação da iniciativa privada, que será realizado através das agências reguladoras.

Ainda com o Oliveira (2015), após a crise de 1929, e a proposição do New Deal de Keynes, as agências reguladoras passam a ganhar mais notoriedade no cenário norte-americano.

“O Estado utilizou-se do modelo das agências reguladoras para promover uma intervenção enérgica na ordem econômica e social, corrigindo as falhas do mercado. Buscava-se, com tal modelo, especializar a atuação estatal (reconheciam-se ampla discricionariedade técnica e o controle judicial sobre os atos das agências era restrito) e neutralizar (ou amenizar) a influência política na regulação de setores sensíveis (mediante, v.g., a previsão de estabilidade para os dirigentes) ”.

Bom levantar antes da conclusão que vemos então um paradoxo, segundo Oliveira (2015), pois “[...] enquanto nos Estados Unidos as agências se multiplicam no momento de fortalecimento do Estado, no Brasil as agências são instituídas em período de diminuição do intervencionismo estatal”. No entanto, ambos se assemelham enquanto países que buscam um melhor equilíbrio de suas economias, um que estava em situação de livre mercado equivocada para o momento (crise de 1929), e o Brasil, buscando maior liberalização da economia.

Então podemos dizer que resumidamente as agências reguladoras são resultado da não intervenção regulatória do Estado na economia, causando a mínima interferência no laissez-faire mercadológico, atuando apenas no fomento ao equilíbrio econômico do país, de acordo com políticas regulamentando ou desregulamentando a forma e o grau de intervenção estatal.

3. BREVE HISTÓRICO BRASILEIRO

Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, o caminho para o liberalismo foi reaberto no Brasil. O terreno fértil devido a uma ingestão estatal e forças políticas liberais que ascenderam ao poder tornou possível a desestatização de várias empresas públicas brasileiras e com isso passou a tomar forma o que chamamos de agências reguladoras.

Por conseguinte, surgiram várias mudanças legislativas para “fertilização” do ambiente político e jurídico brasileiro. Com isso, segundo Oliveira (2015), vemos as seguintes mudanças no cenário nacional:

“a)abertura ao capital estrangeiro na Constituição de 1988 (CRFB):

a.1) Emenda Constitucional n.º 6/1995: i) suprimiu o art. 171 da CRFB, que conceituava a empresa brasileira e admitia a outorga a elas de benefícios especiais e preferências; ii) alterou a redação do art. 176, § 1.º, para permitir que a pesquisa e lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais de energia elétrica sejam concedidos ou autorizados às empresas constituídas sob as leis brasileiras, não exigindo o controle do capital nacional;

a.2) Emenda Constitucional n.º 7/1995: alterou o art. 178 da CRFB, para deixar de exigir que a navegação de cabotagem e interior seja privativa de embarcações nacionais e a nacionalidade brasileira dos armadores, proprietários e comandantes e, pelo menos, de dois terços dos tripulantes;

a.3) Emenda Constitucional n.º 36/2002: modificou o art. 222, § 1.º, da CRFB e passou a admitir a participação do capital estrangeiro, no limite de até 30%, nas empresas jornalísticas e de radiodifusão;

b) atenuação dos monopólios estatais:

b.1) Emenda Constitucional n.º 5/1995: a nova redação do art. 25, § 2.º, da CRFB permitiu que os Estados-membros concedam às empresas privadas a exploração dos serviços públicos locais de gás canalizado (antes, a concessão só poderia ser feita à empresa estatal);

b.2) Emenda Constitucional n.º 8/1995: o art. 21, XI, da CRFB passou a permitir a delegação dos serviços de telecomunicações às entidades privadas (até a Emenda, a delegação só poderia ser feita à empresa sob controle acionário estatal) e previu a criação de um “órgão regulador”; essa flexibilização já existia em relação aos serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens;

b.3) Emenda Constitucional n.º 9/1995: a alteração do art. 177, § 1.º, da CRFB autorizou a União a contratar de empresas estatais e privadas para executarem diversas atividades ligadas à exploração do petróleo;

c) Programa Nacional de Desestatização (PND), instituído pela Lei n.º 8.031/1990, substituída, posteriormente, pela Lei n.º 9.491/1997”.

Com todas essas alterações, vemos claramente que na diminuição da participação do Estado na economia, então optou-se pela criação das agências reguladoras mesmo que a própria Carta Magna não tenha definido em seu texto, expressamente, esta opção.

4. CARACTERÍSTICAS JURÍDICAS DAS AGÊNCIAS REGULADORAS

4.1. aSPECTOS GERAIS

Para Alexandre e Deus (2015),

“as agências reguladoras são pessoas jurídicas de direito público, com natureza jurídica de autarquias de regime especial, cuja função é regulamentar, controlar e fiscalizar determinado setor econômico ou atividades que constituem objeto de delegação de serviço público ou de concessão para exploração de bem público”.

Di Pietro (2014), define que

“Agência reguladora, em sentido amplo, seria, no direito brasileiro, qualquer órgão da Administração Direta ou entidade da Administração Indireta com função de regular a matéria específica que lhe está afeta. Se for entidade da Administração indireta, ela está sujeita ao princípio da especialidade, [...], significando que cada qual exerce e é especializada na matéria que lhe foi atribuída por lei. Aliás, a ideia de especialização sempre inspirou a instituição das agências norte-americanas, como também foi uma das inspiradoras da instituição de autarquias no direito europeucontinental”.CA

No caso, regular significa “organizar determinado setor afeto à agência, bem como controlar as entidades que atuam nesse setor” (Di Pietro, 2014). Com Calixto Salomão Filho apud Di Pietro (2014), a regulação,

“[...] em sentido amplo, engloba toda forma de organização da atividade econômica através do Estado, seja a intervenção através da concessão de serviço público ou o exercício de poder de polícia”. [...] Na verdade, o Estado está ordenando ou regulando a atividade econômica tanto quando concede ao particular a prestação de serviços públicos e regula sua utilização – impondo preços, quantidade produzida etc. - como quando edita regras no exercício do poder de polícia administrativo”.

A partir dessa fala Di Pietro (2014) divide a atividade regulatória:

“a) as que exercem, com base em lei, típico poder de polícia, com a imposição de limitações administrativas, previstas em lei, fiscalização, repressão; é o caso, por exemplo, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) , criada pela Lei n2 9. 782, de 26-1 -99, da Agência Nacional de Saúde Pública Suplementar (ANS), criada pela Lei n2 9.961, de 28-1-00, da Agência Nacional de Águas, criada pela Lei n2 9.984, de 1 7-7-00;

b) as que regulam e controlam as atividades que constituem objeto de concessão, permissão ou autorização de serviço público (telecomunicações, energia elétrica, transportes etc.) ou de concessão para exploração de bem público (petróleo e outras riquezas minerais, rodovias etc.).

As primeiras assemelham-se a outros órgãos já existentes como o Cade, Receita Federal, CVM, Banco Central, etc. Enquanto as últimas que são a real “novidade” oriunda da privatização de várias empresas estatais brasileiras.

4.2. cARACTERÍSITICAS PRINCIPAIS

É bom frisar também que o estudo das Agências reguladoras remetem a algumas características. Uma delas é que a União, Estados, Municípios e o Distrito Federal também podem criar suas próprias agências respeitando o limite constitucional quanto à competência de cada ente federativo.

Podemos elencar também mais aspectos, segundo Alexandre e Deus (2015), que são:

“[...] seu poder regulador para editar normas técnicas nas áreas em que atuam e a existência de certa independência dessas entidades em relação aos órgãos do Poder Executivo aos quais se encontram vinculadas. O primeiro aspecto (poder regulador) é a razão de ser da agência; o segundo (independência), tem caráter instrumental, servindo para possibilitar o adequado exercício das atribuições institucionais da agência, sendo percebido principalmente pelo mandato fixo e relativa estabilidade dos dirigentes da instituição, ou seja, eles não são exoneráveis ad nutum, somente podendo ser desligados antes do fim do mandato quando verificadas as condições previstas na lei”.

Outro aspecto a ser lembrado é que antes da Constituição Federal Brasileira de 1988 já existiam órgãos reguladoras e fiscalização. O que realmente foi novo para alguns autores, foi a utilização do termo “agências” segundo Alexandre e Deus (2015). Lembrando que a maioria delas, as agências, encontram-se dispersas na legislação, estando apenas previstas na Carta Constitucional, a Anatel – Agência Nacional de Telecomunicações (CF, art. 21, XI) e a ANP – Agência Nacional de Petróleo (CF, art. 177, § 2.º).

4.3. regime jurídico

A definição teórica é que as Agências Reguladoras são autarquias em regime especial. Mas o que isso significa? As autarquias são entidades ligadas à Administração Indireta com personalidade jurídica (diferente do poder concedente) podendo contrair direitos e obrigações de forma autônoma. Então, as agências reguladoras entram nesse cenário como resultado da descentralização política do Estado brasileiro. No entanto, estas possuem peculiaridades “especiais” que o remetem a tal classificação, pois as diferencia das outras autarquias governamentais.

Segundo Bandeira de Mello (2013),

“Nos últimos anos, como fruto da maltramada “Reforma Administrativa”, surgiram algumas autarquias qualificadas como “autarquias sob regime especial”. São elas as denominadas “agências reguladoras”. Não havendo lei alguma que defina genericamente o que se deva entender por tal regime, cumpre investigar, em cada caso, o que se pretende com isto. A ideia subjacente continua a ser a de que desfrutariam de uma liberdade maior do que as demais autarquias. Ou seja: esta especialidade do regime só pode ser detectada verificando-se o que há de peculiar no regime das “agências reguladoras” em confronto com a generalidade das autarquias.

É o que se fará em seguida, registrando-se, por ora, que a única particularidade marcante do tal regime especial é a nomeação pelo Presidente da República, sob aprovação do Senado, dos dirigentes da autarquia, com garantia, em prol destes, de mandato a prazo certo.

Cabe, entretanto, anotar desde já que tal garantia não pode ser entendida como capaz de ultrapassar o período de governo da autoridade que procedeu às nomeações, pois isto violaria prerrogativas constitucionais de seu sucessor. Os demais traços que são apontados nas leis disciplinadoras de algumas das agências reguladoras para caracterizar o regime especial nada lhes agregam de peculiar em relação a quaisquer outras autarquias”.

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4.4. regime jurídico especial

Di Pietro (2014) define em seu livro que as agências reguladoras,

“Sendo autarquias, sujeitam-se às normas constitucionais que disciplinam esse tipo de entidade; o regime especial vem definido nas respectivas leis instituidoras, dizendo respeito, em regra, à maior autonomia em relação à Administração Direta; à estabilidade de seus dirigentes, garantida pelo exercício de mandato fixo, que eles somente podem perder nas hipóteses expressamente previstas, afastada a possibilidade de exoneração ad nutum; ao caráter final das suas decisões, que não são passíveis de apreciação por outros órgãos ou entidades da Administração Pública”.

Podemos aferir que cada agência reguladora possui sua própria lei. Não existe um regime unificado para todas as agências. No entanto, segundo Alexandre e Deus (2015), é possível entender que existem características em comum entre as agências reguladoras que caracterizam seu regime jurídico, sendo elas:

  1. Poder normativo técnico: “competência para editar normas técnicas concernentes aos setores que regulam, que encontra limites na lei”;
  2. Autonomia decisória: “decidem em última instância administrativa os conflitos existentes no âmbito das atividades reguladas”;
  3. Independência administrativa: “dirigentes possuem mandato por tempo determinado e gozam de relativa estabilidade”;
  4. Autonomia econômico-financeira: “possuem recursos próprios”.
4.4.1. poder normativo

A discussão aqui resume-se na possibilidade das Agências Reguladoras de editar normas. As mesmas, devido a seus quadros técnicos, são autorizadas por lei a editarem normas que aprofundem a legislação aprovada no Congresso. Isto é, às agências reguladoras, é permitido detalhar uma lei de acordo com o caráter técnico de cada agência.

Esses regulamentos possuem certas características segundo Alexandrino e Paulo (2014),

“a) sua edição está expressamente prevista na lei cuja regulamentação eles devam estabelecer; e

b) nas matérias de natureza técnica, eles não se limitam a dar "fiel execução" à lei (não são os regulamentos de execução a que se refere o art. 84, IV, da Constituição); eles complementam as disposições da lei, observados as diretrizes gerais e os limites nela traçados”.

A posição majoritária brasileira é que as agências reguladoras também possuem poder normativo. Sendo este uma espécie de delegação a partir de uma lei já criada. Nesse diapasão, o poder normativo, segundo Alexandrino e Paulo (2014)

“[...] não é competência constitucional exclusiva do Chefe do Poder Executivo, mas alcança outros órgãos e entidades que exerçam função administrativa, em todos os Poderes. Admitimos dessarte com razoável tranquilidade, o exercício de poder normativo pelas agências reguladoras”.

No entanto, a celeuma maior é saber quais os limites à regulação delegada às agências. Para Alexandrino e Paulo (2014)

“Como resultado da complexidade das relações atuais, especialmente as que dizem respeito aos setores produtivos, verifica-se uma tendência à aceitação de que órgãos ou entidades especializados em determinado assunto editem normas, de natureza estritamente técnica, sobre tal assunto, desde que exista uma lei que expressamente autorize essa elaboração normativa, estabeleça claramente as matérias sobre as quais ela poderá ser exercida e fixe as diretrizes, os parâmetros e as metas que devem ser observados pelo órgão ou entidade técnicos. O desempenho dessa competência normativa pelo Poder Executivo tem sido denominado exercício de ‘discricionariedade técnica’”.

Por isso, a lei estabelecerá os regramentos gerais relativos à seara da agência reguladora, e a partir dessas diretrizes, que deverão ser editadas as normas das agências em sentido estrito. À lei é necessário possuir um núcleo normativo essencial que apenas será complementado pelas normas da respectiva agência. Sem olvidar da reserva legal constitucional.

Por fim, concordando com Floriano Azevedo Marques Neto apud Alexandrino e Paulo (2014), o qual define a posição majoritária adotada no Brasil grife-se:

“Se bem é verdade que a atividade regulatória não pode prescindir de uma forte e bem articulada base legal, certo também é a impossibilidade de que todo o arcabouço regulatório seja editado pelo Parlamento. A especialidade, a complexidade, a multiplicidade e a velocidade de surgimento das questões regulatórias determinam a necessidade de que parcela significativa da regulação estatal seja delegada ao órgão regulador.

(...)

A relação das agências reguladoras com o Direito se dá em face de uma nova legalidade: a lei define as metas principais e os contornos da atividade do órgão regulador, cometendo-lhe (nestes limites e sob controle do Judiciário e do próprio Legislativo) ampla margem de atuação. Atuação, esta, que segue um novo tipo de discricionariedade, pautado fundamentalmente pelos objetivos definidos na lei para serem implementados no setor regulado”.

4.4.2. autonomia decisória

Com Alexandre e Deus (2015), a autonomia decisória permite que as agências reguladoras possam decidir em última instância administrativa, suas lides que envolvam as atividades que estas regulem. Portanto, não é possível propor recurso “dirigido à autoridade da pessoa federada ao qual está vinculada a respectiva autarquia (recurso hierárquico impróprio)”, sendo que a única solução seria através de uma ação judicial adequada para satisfação de seus interesses.

4.4.3. independência administrativa

Ainda com Alexandre e Deus (2015) temos que a independência administrativa diz respeito aos seus dirigentes serem determinados por tempo determinado, gozando de estabilidade relativa, não sofrendo tanto com interesses políticos. Isso porque os dirigentes são indicados pelo Poder Executivo, mas passa pelo crivo do Legislativo.

Di Pietro (2014), lembra que

Com relação aos dirigentes, a Lei nº 9.986, de 1 8-7-00, que dispõe sobre a gestão de recursos humanos das Agências Reguladoras, veio uniformizar as normas sobre seu provimento, ao determinar que os mesmos serão escolhidos pelo Chefe do Poder Executivo, porém dependendo, a escolha, de aprovação
pelo Senado Federal. De acordo com o artigo 4º, "as Agências serão dirigidas em regime de Colegiado, por um Conselho Diretor ou Diretoria composta por Conselheiros ou Diretores, sendo um deles seu Presidente ou o Diretor-Geral ou Diretor-Presidente". Por sua vez, o artigo 5º estabelece que "o Presidenteou o Diretor-Geral ou Diretor-Presidente e os demais membros do Conselho Diretor ou da Diretoria serão brasileiros, de reputação ilibada, formação universitária e elevado conceito no campo de especialidade dos cargos para os quais serão nomeados, devendo ser escolhidos pelo Presidente da República e por ele nomeados, após aprovação do Senado Federal, nos termos da alínea f do inciso III do artigo 52 da Constituição Federal". De acordo com o artigo 6º, o mandato dos Diretores será o estabelecido pela lei instituidora de cada agência. O artigo 8º previu a chamada "quarentena", de conteúdo moralizador, ao proibir o ex-dirigente de exercer atividade ou prestar qualquer serviço no setor regulado pela respectiva agência, por um período de quatro meses, contados da exoneração ou do término de seu mandato. No período de impedimento, o ex-dirigente continua vinculado à Agência, fazendo jus à remuneração compensatória equivalente à do cargo de direção que exerceu.

Já em relação aos servidores, estes estarão sujeitos ao regime estatutário. Com Di Pietro (2014),

“Quanto aos servidores, o seu regime jurídico foi definido pela Lei nº 9.986, de 18-7-00, que dispõe sobre a gestão de recursos humanos das Agências Reguladoras. Ocorre que os artigos 1º, 2º e parágrafo único, 12 e § 1º, 13 e parágrafo único, 15, 24 e inciso 1, 2 7 e 30 dessa lei, que determinavam que as agências reguladoras teriam suas relações de trabalho regidas pela Consolidação das Leis do Trabalho, foram liminarmente suspensos pelo STF na ADI 2310, tendo em vista o entendimento de que a função que desempenham constitui atividade típica do Estado, com a qual é incompatível o regime celetista. Essa ADI acabou por perder o seu objeto, tendo em vista que a Lei nº 9.868/00 foi alterada pela Lei nº 10.871, de 20-5-04, que substituiu o regime celetista pelo estatutário, extinguiu os empregos públicos que haviam sido criados e criou cargos públicos sujeitos ao regime jurídico estabelecido pela Lei nº 8.112, de 1 1-12-90”.

4.4.4. autonomia ecônomico-financeira

Alexandre e Deus (2015) tratam o assunto ditando que essas autarquias de regime especial tem recursos próprios destinados a elas. Bem como cobrança de taxas para além da dotação orçamentária para o cumprimento de suas funções.

Bom lembrar também que as agências reguladoras seguem as regras gerais de licitação previstas na Lei 8.666 de 1993. No entanto a Lei 9.472 de 1997 (Lei da Anatel) previu uma especificidade quanto a modalidades de licitação para esta agência reguladora que ainda não existiam que são o pregão e a consulta. No entanto após 2000 com o advento da Lei 9.986, essas modalidades se estenderam a outras agências reguladoras federais.

Bom ressaltar que a modalidade de pregão foi não só estendida às agências reguladoras, mas a toda a Administração Pública através da Medida Provisória 2.026 de 2000 e com a Lei 10.520 de 2002. No entanto, a modalidade consulta continua privativa das agências reguladoras federais.

4.5. agências reguladoras

Segundo Alexandrino e Paulo (2014), podemos elencar as Agências Reguladoras em:

“1) Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), criada pela Lei 9.427, de 26.12.1996, vinculada ao Ministério de Minas e Energia, com a finalidade de regular e fiscalizar a produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica, em conformidade com as políticas e diretrizes do governo federal;

2) Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL), criada pela Lei 9.472, de 16.07.1997 (Lei Geral de Telecomunicações), vinculada ao Ministério das Comunicações, com a função de entidade reguladora das telecomunicações e a finalidade de implementar, em sua esfera de atribuições, a política nacional de telecomunicações;

3) Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), criada pela Lei 9.478, de 06.08.1997, vinculada ao Ministério de Minas e Energia, com a finalidade de promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo, do gás natural e dos biocombustíveis;

4) Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), criada pela Lei 9.782, de 26.01.1999, vinculada ao Ministério da Saúde, com a finalidade de promover a proteção da saúde da população, por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, inclusive dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles relacionados, bem como o controle de portos, aeroportos e de fronteiras;

5) Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), criada pela Lei 9.961, de 28.01.2000, vinculada ao Ministério da Saúde, com a função de entidade de regulação, normatização, controle e fiscalização das atividades que garantam a assistência suplementar à saúde e a finalidade de promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde, regulando as operadoras setoriais, inclusive quanto às suas relações, com prestadores e consumidores, contribuindo para o desenvolvimento das ações de saúde no País;

6) Agência Nacional de Águas (ANA), criada pela Lei 9.984, de 17.07.2000, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de implementar, em sua esfera de atribuições, a Política Nacional de Recursos Hídricos, integrando o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos;

7) Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), criada pela Lei 10.233, de 05.06.2001, vinculada ao Ministério, dos Transportes, com a finalidade de implementar, regular e supervisionar, em sua esfera de atuação (transportes terrestres), as políticas formuladas pelo Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte e pelo Ministério dos Transportes;

8) Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ), criada pela Lei 10.233, de 05.06.2001, vinculada à Secretaria de Portos da Presidência da República (Lei 12.815/2013), com a finalidade de implementar, regular e supervisionar, em sua esfera de atuação (transportes aquaviários), as políticas formuladas pelo Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte e pela Secretaria de Portos da Presidência da República;

9) Agência Nacional do Cinema (ANCINE), criada pela MP 2.228-1, de 06.09.2001, vinculada ao Ministério da Cultura, com a função de entidade de fomento, regulação e fiscalização da indústria cinematográfica e videofonográfica;

10) Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), criada pela Lei 11.182, de 27.09.2005, vinculada à Secretaria de Aviação Civil da Presidência da República (art. 49 da Lei 12.46212011), com a função de regular e fiscalizar as atividades de aviação civil e de infraestrutura aeronáutica e aeroportuária, devendo, no exercício de suas competências, observar e implementar as orientações, diretrizes e políticas estabelecidas do governo federal;

11) Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC), criada pela Lei 12.154, de 23.12.2009, vinculada ao Ministério da Previdência Social, com a função de entidade de fiscalização e de supervisão das atividades das entidades fechadas de previdência complementar e de execução das políticas para o regime de previdência complementar operado pelas entidades fechadas de previdência complementar”.

5. PAPEL DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NA REGULAÇÃO DO CAPITALISMO BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO

Atualmente percebemos que o Estado participa cada vez menos da economia através da realização de uma série de privatizações, concessões, encerramento de atividades de empresas públicos, fechamento de autarquias, etc. Isso tudo abre espaço para a iniciativa privada.

As experiências históricas das várias crises econômicas do mundo capitalista mostraram que é necessária, ainda que moderada, ao mínimo uma “observação” do Estado ante as atividades desenvolvidas em seu território, quer sejam econômicas ou não, para proteção não só de sua economia, mas também da própria seguridade de sua nação.

Percebe-se então uma grande relevância no fortalecimento das agências reguladoras para controlar os serviços prestados à população. Por exemplo vemos recorrentemente a intervenção da Anatel para manter um patamar mínimo de qualidade dos serviços já prestados pelas empresas em relação a telefonia e internet quanto para coibir abusos por parte das mesmas em face de seus clientes. Temos outra agência importante, que é a ANAC que auxilia no controle do espaço aéreo brasileiro, serviço de extrema importância na segurança nacional. Outra, a ANCINE atua no fomento à produção artística cinematográfica brasileira investindo na produção tanto de curta quanto longametragens. A Anvisa no controle dos processos de produção de alimentos, condições sanitárias de ambiente, etc., atuando no auxílio ao controle da saúde pública.

Logo, de grande importância a presença das agências reguladoras em um ambiente como o do Brasil, posto que o crescimento desordenado e o desrespeito às legislações vigentes reiteradamente tornam extremamente necessário a atuação das agências reguladoras para preservar um patamar mínimo de civilidade na produção não só econômica, mas também impor uma espécie de freios na busca por resultados. As agências então devem ser tratadas como autarquias essenciais no desenvolvimento sustentável do país e do sistema econômico adotado pelo Brasil.

6. considerações finais

Com esse trabalho foi possível observar a importância do estudo das Agências Reguladoras no cenário nacional e internacional no sentido de descentralizar a gestão do governo e equilibrar a relação entre intervenção e não-intervenção do Estado nos aspectos econômicos.

Atualmente as agências tem exercido papel de evidência no sentido de fiscalizar e regular vários aspectos da vida não só empresarial produtiva, mas também cotidiana. Podemos elencar a ANEEL, a ANATEL como exemplos mais práticos quando temos problemas com o fornecimento de energia elétrica ou então quando temos dificuldades em termos serviços de telefonia prestados de satisfatória.

Essas autarquias de regime especial tornam-se então essencial no desenvolvimento de uma sociedade capitalista que fomenta a não intervenção estatal na economia. Elas auxiliam na busca do equilíbrio entre a vontade de ter o máximo proveito na iniciativa privada e os limites em que a sociedade impõe a esse desenvolvimento.

7. referências bibliográficas

Di Pietro, M. S. (2014). Direito administrativo. São Paulo/SP: Atlas.

Marcelo Alexandrino, V. P. (2014). Direito administrativo descomplicado. São Paulo/SP: Método.

Mello, C. A. (2013). Curso de Direito Administrativo. São Paulo/SP: Malheiros.

Ricardo Alexandre, J. d. (2015). Direito Administrativo Esquematizado. São Paulo/SP: Método.

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Sobre o autor
André Porto

Bacharel em Direito da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Servidor Público do Estado do Espírito Santo.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Este é um trabalho acadêmico elaborado para o curso de Direito Administrativo I do curso de Direito da UFES durante o semestre de 2016/1.

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