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A continência enseja, sempre, a reunião dos processos?

Análise do panorama no novo CPC

04/07/2016 às 14:48

Resumo:


  • O novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015) trouxe mudanças significativas, incluindo a abordagem da continência e a possibilidade de reunião de processos para julgamento conjunto, visando evitar decisões contraditórias e promover a economia processual.

  • A continência, anteriormente tratada como causa de modificação da competência, agora pode funcionar tanto como modificadora da competência relativa quanto como hipótese de litispendência, dependendo da ordem de proposição das ações (continente e contida).

  • De acordo com o novo CPC, a reunião de processos para julgamento conjunto não é automática e depende do juízo de conveniência do magistrado, podendo ser dispensada caso uma das ações já tenha sido julgada ou em outras situações avaliadas pelo julgador.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Nem sempre a continência ensejará a reunião dos processos para julgamento conjunto: se a ação continente for deduzida anteriormente, a ação contida será extinta sem resolução de mérito; se a ação continente for contemporânea à ação contida, haverá a reunião dos processos para julgamento conjunto.

O novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei 13.105, de 16 de março de 2015, promoveu modificações em vários institutos, obrigando a revisão bibliográfica daqueles afetados pela nova ideologia, a qual assegura, em especial, a primazia ao julgamento do mérito do conflito, a celeridade, economia e efetividade processuais.

É nesse contexto que o presente ensaio pretende revisitar a continência e seu principal efeito, a reunião de processos para julgamento conjunto perante o juízo prevento, respondendo ao seguinte questionamento: a continência enseja, sempre, a reunião de processos? A questão, evidentemente, suscita o debate sobre a natureza da continência.

A continência, na vigência do CPC de 1973, era concebida como uma causa de modificação (ou prorrogação) legal da competência, por força do disposto no art. 105 daquele diploma legal, segundo o qual “havendo conexão ou continência, o juiz, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, pode ordenar a reunião de ações propostas em separado, a fim de que sejam decididas simultaneamente”.

A solução legal aventada justificava-se porque a continência envolve relação de continente para conteúdo, “[…] de modo que todos os elementos da causa menor se fazem também presentes na maior. Envolve a continência, pois, os três elementos da lide: sujeitos, objeto e causa petendi” [1].

Além do que a reunião dos processos evita decisões contraditórias, contribuindo para a uniformização dos julgamentos do Poder Judiciário. Aliás, com esse espírito, o § 3º do art. 55 do NCPC facultou ao magistrado a reunião de processos para julgamento conjunto quando houver risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos individualmente, mesmo sem conexão entre eles.

É bem verdade, todavia, que a jurisprudência do STJ orienta-se no sentido de que a junção dos processos para julgamento conjunto não é automática, passando pelo crivo do magistrado. Vale dizer,

[…] A reunião dos processos por conexão configura faculdade atribuída ao julgador, sendo que o art. 105 do Código de Processo Civil concede ao magistrado certa margem de discricionariedade para avaliar a intensidade da conexão e o grau de risco da ocorrência de decisões contraditórias.

3. Justamente por traduzir faculdade do julgador, a decisão que reconhece a conexão não impõe ao magistrado a obrigatoriedade de julgamento conjunto.

4. A avaliação da conveniência do julgamento simultâneo será feita caso a caso, à luz da matéria controvertida nas ações conexas, sempre em atenção aos objetivos almejados pela norma de regência (evitar decisões conflitantes e privilegiar a economia processual).

5. Assim, ainda que visualizada, em um primeiro momento, hipótese de conexão entre as ações com a reunião dos feitos para decisão conjunta, sua posterior apreciação em separado não induz, automaticamente, à ocorrência de nulidade da decisão […][2].

Certamente, por isso, a Súmula 235 do STJ registra que “a conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado”.

O CPC de 2015 tratou dos efeitos da continência no art. 57, dispondo que “quando houver continência e a ação continente tiver sido proposta anteriormente, no processo relativo à ação contida será proferida sentença sem resolução de mérito, caso contrário, as ações serão necessariamente reunidas”.

É possível perceber, da simples leitura do dispositivo, que a nova Codificação não alberga, em sua integralidade, a concepção dominante, de que a continência é causa de modificação de competência. “Isso porque, quando a continência se dá sendo a ação mais abrangente proposta antes da menor, o que ocorre, de rigor, é litispendência”[3].

De fato,

Essa identidade de elementos faz a continência aproximar-se da figura da litispendência. Não se confundem, todavia, posto que se nota uma diferença quantitativa entre as causas ligadas pela continência, eis que na maior o pedido só é parcialmente igual ao da menor. Já na litispendência, a igualdade das duas causas, em todos os elementos da lide, há de ser total.[4].

O momento em que se verifica a referida distinção, na nova ideologia processual, produz resultados diferentes. Consequentemente, “não deve ocorrer, invariavelmente, a reunião dos processos para julgamento conjunto”[5].

Enfim, nem sempre a continência ensejará a reunião dos processos para julgamento conjunto, sendo imprescindível verificar qual das demandas foi proposta em primeiro lugar: se a ação continente for deduzida anteriormente, a ação contida será extinta sem resolução de mérito; se a ação continente for contemporânea à ação contida, haverá a reunião dos processos para julgamento conjunto.

Assim, a continência ora funciona como causa de modificação de competência relativa, ora como hipótese de litispendência.


Notas

[1] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I: Teoria Geral do Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento. 55ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 718.

[2] STJ, REsp 1.255.498/CE, 3ª T. rel. Min. Massam Uyeda, rel. p/ acórdão Ricardo Villas Boas Cueva, j. 19.06.2012, DJe 29.082012.

[3] WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogério Licastro Torres. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil: Artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 125. 

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[4] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I: Teoria Geral do Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento. 55ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 718.

[5] BUENO, Cássio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 79.  

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Sobre o autor
Renato Pessoa Manucci

Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Especialista em Direito Civil e Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Professor Tutor do curso de Pós-Graduação em Direito Processual Civil da Estácio/CERS no período de abril de 2015 a janeiro de 2018. Professor Universitário. Procurador Jurídico da Câmara Municipal de Bragança Paulista. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MANUCCI, Renato Pessoa. A continência enseja, sempre, a reunião dos processos?: Análise do panorama no novo CPC. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4751, 4 jul. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/50276. Acesso em: 22 dez. 2024.

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