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A investigação criminal e o Ministério Público

10/04/2004 às 00:00
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O tema em epígrafe diz respeito a uma das mais importantes atribuições do Ministério Público e, muitas das vezes, de fundamental importância para a persecução criminal: a investigação de infrações penais.

O tema em epígrafe diz respeito a uma das mais importantes atribuições do Ministério Público e, muitas das vezes, de fundamental importância para a persecução criminal: a investigação de infrações penais.

Nada obstante opiniões em contrário, o certo é que tal atribuição transparece suficientemente possível à luz da Constituição Federal e de textos legais, como procuraremos demonstrar a seguir.

Com efeito, diz o art. 129 da Constituição Federal que são funções do Ministério Público, dentre outras:

"II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia." (grifo nosso).

"VI - expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva." (grifo nosso).

"VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais;

"IX - exercer outras funções que lhe sejam conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas." (idem).

Como se nota pelo inciso II acima transcrito, a Carta Magna permite que o Ministério Público promova as medidas que sejam necessárias para a garantia dos direitos assegurados por ela própria que não estejam sendo respeitados pelos Poderes Públicos e pelos serviços de relevância pública; assim, por exemplo, quando um agente público, abusando de poder ou de sua autoridade, transgride o direito à liberdade de um cidadão, verbi gratia, prendendo-o ilegalmente, é evidente que permitido será ao parquet, constitucionalmente, "promover medidas necessárias para a garantia do direito à liberdade" desrespeitado pelo agente do Poder Público.

Já o inciso VI, refere-se expressamente à expedição de notificações "nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los." Pergunta-se: para que serviriam tais notificações ou as informações e os documentos requisitados se não fossem para instruir procedimento administrativo investigatório? É evidente que nenhuma lei traz palavras ou disposições inúteis (é regra de hermenêutica), muito menos a Lei Maior.

Comentando este inciso, afirma Marcellus Polastri Lima:

"Trata-se, à saciedade, de coleta direta de elementos de convicção pelo promotor para elaborar opinio delicti e, se for o caso, oferecimento de denúncia, uma vez que, como já asseverado, não está o membro do Ministério Público adstrito às investigações da Polícia Judiciária, podendo colher provas em seu gabinete ou fora deste, para respaldar a instauração da ação penal.

"Portanto, recebendo o promotor notícia de prática delituosa terá o poder-dever de colher os elementos confirmatórios, colhendo declarações e requisitando provas necessárias para formar sua opinio delicti." (1)

Que não se diga tratar-se tal procedimento administrativo do inquérito civil preparatório para a ação civil pública, pois desta matéria já cuida o anterior inciso III. Portanto, este outro dispositivo (VI) ao se referir a "procedimentos administrativos" não faz alusão ao inquérito civil (que também é um procedimento administrativo), este já tratado no item anterior; neste mesmo sentido pensa Hugo Nigro Mazzilli, para quem "se os procedimentos administrativos a que se refere este inciso (VI) fossem apenas em matéria cível, teria bastado o inquérito civil de que cuida o inciso III. O inquérito civil nada mais é que uma espécie de procedimento administrativo ministerial. Mas o poder de requisitar informações e diligências não se exaure na esfera cível; atinge também a área destinada a investigações criminais." [2]

Já com o inciso VIII surge a seguinte indagação: se se pode o mais (requisitar diligências investigatórias), como não se pode o menos, id est, fazê-las motu proprio.

Se não bastassem tais preceitos há ainda o quarto deles consubstanciado no inciso IX, este a permitir o exercício de funções outras que forem atribuídas ao Ministério Público e que sejam compatíveis com suas finalidades: a Lei Federal n.º 8.625/93 concede ao Ministério Público a possibilidade de instaurar procedimentos administrativos investigatórios, como veremos a seguir.

Efetivamente, a Lei n.º 8.625/93 (Lei Orgânica da Instituição), no seu art. 26, dispõe caber ao Ministério Público (os grifos são nossos):

"I - instaurar inquéritos civis e outras medidas e procedimentos administrativos pertinentes e, para instruí-los: (omissis);"

"II - requisitar informações e documentos a entidades privadas, para instruir procedimentos ou processo em que oficie;"

"V - praticar atos administrativos executórios, de caráter preparatório;"

Comentando este artigo, e mais especificamente o seu inciso V, assim se pronunciou Pedro Roberto Decomain:

"Trata-se de todas as providências preliminares que possam ser necessárias ao subseqüente exercício de uma função institucional qualquer. Providências administrativas de âmbito interno poderão ser de rigor para o melhor exercício de alguma função institucional, em determinadas circunstâncias. Por força deste inciso, está o Ministério Público habilitado a tomá-las. Aliás, nem poderia ser diferente. É claro que a Instituição está apta a realizar todas as atividades administrativas que sejam indispensáveis ao bom desempenho de suas funções institucionais. Tal será uma direta conseqüência do princípio de sua autonomia administrativa, que orienta não apenas o funcionamento global da Instituição, mas também a sua atuação em cada caso concreto que represente exercício de suas funções institucionais." (Grifo nosso). (3)

Por sua vez, adverte Polastri dirimindo dúvidas:

"A exemplo do disposto na CF/88, entendemos que o estabelecido no item I do art. 26 da Lei 8.625/93, refere-se não só aos inquéritos civis, como a quaisquer outros procedimentos, sendo a expressão pertinente atinente a medidas e procedimentos condizentes com as funções do Ministério Público, e não somente aos inquéritos civis, conforme estabelecido no caput do art. 26." (4)

Continuando a análise da Lei Orgânica temos no seu art. 27, verbo ad verbum (por nós sublinhado):

"Art. 27 - Cabe ao Ministério Público exercer a defesa dos direitos assegurados nas Constituições Federal e Estadual, sempre que se cuidar de garantir-lhe o respeito:

"I - pelos poderes estaduais e municipais;

"II - pelos órgãos da Administração Pública Estadual ou Municipal, direta ou indireta;

"(omissis).

"Parágrafo único. No exercício das atribuições a que se refere este artigo, cabe ao Ministério Público, entre outras providências:

"I - receber notícias de irregularidades, petições ou reclamações de qualquer natureza, promover as apurações cabíveis que lhes sejam próprias e dar-lhes as soluções adequadas;

"II - zelar pela celeridade e racionalização dos procedimentos administrativos;

"(omissis)."

Vemos, destarte, que não há dificuldades em se admitir a instauração de procedimentos administrativos investigatórios de natureza criminal no âmbito do próprio Ministério Público, desde que haja a necessidade da apuração de determinado fato que, por sua vez, enquadre-se no leque institucional das atribuições ministeriais.

Portanto, não podemos conceber, em que pese a autoridade dos que pensam contrariamente, que se diga ser defeso ao Ministério Público a investigação e a coleta de provas para o Processo criminal, pois tal atribuição é permitida perfeitamente, principalmente levando-se em conta a lição doutrinária amplamente conhecida, segundo a qual o inquérito policial é peça prescindível à instauração da ação penal, conclusão esta retirada do próprio Código de Processo Penal, arts. 4º., parágrafo único, 12, 27, 39, § 5º. e 46, § 1º.

Com razão afirma Mazzilli:

"Tanto na área cível como criminal, admitem-se investigações diretas do órgão titular da ação penal pública do Estado. Para fazê-las, não raro se valerá de notificações e requisições." (5) E, complementa: "Em matéria criminal, as investigações diretas ministeriais constituem exceção ao princípio da apuração das infrações penais pela polícia judiciária; contudo, há casos em que se impõe a investigação direta pelo Ministério Público, e os exemplos mais comuns dizem respeito a crimes praticados por policiais e autoridades." (6)

Costuma-se opor ao entendimento acima esposado o art. 144, § 4º. da Constituição Federal, cuja redação diz caber à Polícia Civil a apuração de infração penal, exceto a de natureza militar, ressalvada, também, a competência da União.

Ocorre que esta atribuição constitucional não é exclusiva da Polícia Civil, sendo esta a correta interpretação deste dispositivo constitucional.

Não se deve interpretar uma norma jurídica isoladamente, mas, ao contrário, deve-se utilizar o método sistemático, segundo o qual cada preceito é parte integrante de um corpo, analisando-se todas as regras em conjunto, a fim de que possamos entender o sentido de cada uma delas.

"Não se encontra um princípio isolado, em ciência alguma; acha-se cada um em conexão íntima com outros. O Direito objetivo não é um conglomerado caótico de preceitos; constitui vasta unidade, organismo regular, sistema, conjunto harmônico de normas coordenadas, em interdependência metódica, embora fixada cada uma no seu lugar próprio." (7)

Aliás, segundo Luiz Alberto Machado "o criminalista ortodoxo pensa e age, sem confessar e até dizendo o contrário, como se coexistissem dois ordenamentos jurídicos: um ordenamento jurídico-criminal e outro ordenamento para as demais ciências jurídicas." [8]

Partindo-se desse pressuposto, resta claro que não deu a Constituição exclusividade na apuração de infrações penais apenas a uma Instituição. Observa-se que um outro artigo da mesma Carta (art. 58, § 3º.) dá poderes às Comissões Parlamentares de Inquérito para investigação própria e, adiante, como já demonstrado, concede a mesma prerrogativa ao Ministério Público. Não nos esquecemos que ao dar exclusividade ao Ministério Público para a propositura da ação penal pública (art. 129, I), a Constituição Federal implicitamente concedeu à Instituição a possibilidade de investigar para respaldar a respectiva peça acusatória.

Bem a propósito, veja a lição de Diego Diniz Ribeiro:

"Sendo assim, respaldando-se na teoria dos poderes implícitos, conclui-se que, se o constituinte atribuiu a uma determinada instituição uma atividade-fim, também está ele, ainda que implicitamente, outorgando-lhe a atividade-meio, pois, do contrário, aquela atividade restaria prejudicada, não passando a disposição legal que a previu de uma determinação vazia e sem efetividade prática. Sendo assim, de tal assertiva se extrai a conclusão lógica de que se o parquet pode o mais, que é a interposição da ação penal pública, também pode ele, ainda que de forma implícita, o menos, qual seja, a investigação criminal pré-processual, pois, do contrário, o permissivo constitucional que outorga ao MP a função titular da ação penal seria totalmente inócuo, não passando de mero discurso retórico." (Boletim do IBCCrim nº. 121, dezembro/2002).

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A esse respeito escreveu Tourinho Filho:

"O parágrafo único do art. 4º. (CPP) deixa entrever que essa competência atribuída à Polícia (investigar crimes) não lhe é exclusiva, nada impedindo que autoridades administrativas outras possam, também, dentro em suas respectivas áreas de atividades, proceder a investigações. As atinentes à fauna e flora normalmente ficam a cargo da Polícia Florestal. Autoridades do setor sanitário podem, em determinados casos, proceder a investigações que têm o mesmo valor e finalidade do inquérito policial." (9)

Da mesma forma pensa o já citado Marcellus Polastri Lima:

"Obviamente, não sendo a Polícia Judiciária detentora de exclusividade na apuração de infrações penais, deflui que nada obsta que o MP promova diretamente investigações próprias para elucidação de delitos.

"Como já salientamos, de há muito Frederico Marques defendia que o MP poderia, como órgão do Estado-administração e interessado direto na propositura da ação penal, atuar em atividade investigatória.

"O art. 4º. do CPP já dispunha, em seu parágrafo único, inteiramente recepcionado pela nova ordem constitucional, que a atribuição para apuração de infrações penais não exclui a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a função." [10] (grifo nosso).

Aliás, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 1517 (tendo como requerente a ADEPOL – Associação dos Delegados de Polícia do Brasil), tendo como Relator o Ministro Maurício Corrêa , em julgamento do dia 30 de abril de 1997 (DJ de 22/11/2002, p. 55), expressamente deixou consignado em determinado trecho que "competindo ao Judiciário a tutela dos direitos e garantias individuais previstos na Constituição, não há como imaginar-se ser-lhe vedado agir, direta ou indiretamente, em busca da verdade material mediante o desempenho das tarefas de investigação criminal, até porque estas não constituem monopólio do exercício das atividades de polícia judiciária." (Informativo STF nº. 69, de 07 de maio de 1997, p. 02, com grifo nosso).

Ainda no Supremo Tribunal Federal, no julgamento do habeas corpus nº. 83157, em 1º.de julho de 2003, foi suscitado o papel do Ministério Público nas investigações criminais. O Ministro-Relator, Marco Aurélio, entendeu que a instituição não tem poderes para tomar depoimentos e conduzir as investigações em matéria criminal, somente podendo agir assim nos inquéritos de natureza civil, conforme prevê a Constituição Federal. Na oportunidade, o Procurador-Geral da República, Dr. Claudio Fonteles declarou que "não há ilegalidade alguma em um procurador da República tomar o depoimento de alguém no seu gabinete. É até melhor que assim seja do que em delegacia de polícia. As razões são óbvias". Segundo o chefe do Ministério Público Federal, o parquet tem legitimidade para investigar fatos criminosos, "e isso não significa dizer que termina o serviço da polícia", devendo esta atividade "ser sempre controlada pelo Poder Judiciário". Ainda nesta sessão, o Ministro Marco Aurélio destacou em seu voto o posicionamento da 2ª Turma da Suprema Corte que entendeu somente caber ao Ministério Público "promover o inquérito civil". Segundo o Relator, "como titular da ação penal pública, acusador, impossível é conferir atividade investigatória, a presidência de audiências para a oitiva de testemunhas. Há de lançar mão, o Ministério Público, do que previsto no inciso VIII, do artigo 129, da Constituição Federal, requisitando ‘diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de manifestações processuais". A ministra Ellen Gracie acompanhou o voto do Relator, acrescentando que ao Ministério Público cabe promover a investigação quando se trata de inquérito civil, "não devendo o mesmo acontecer no inquérito penal, onde atuará, mais tarde, como acusador". Para a Ministra o Ministério Público não pode acumular essas duas tarefas: a de acusador e a de inquisidor. Nesta oportunidade, colheu-se também o voto do Ministro Carlos Velloso que ressaltou "não considerar ilegal o fato de a testemunha ter prestado o seu depoimento perante o membro do Ministério Público". Para este Ministro, "não obstante a importância do Ministério Público no contexto social, pensa que as investigações correm por conta da polícia. É o que está na Constituição, mas não chego ao ponto de impedir que o Ministério Público em certos casos, como neste, tome o depoimento de alguém e oriente as provas em que ele vai se basear para oferecer a denúncia e instaurar a ação penal da qual participou." Também em sentido oposto à tese do Relator, o Ministro Joaquim Barbosa afirmou não concordar com a ilegitimidade do Ministério Público para atuar nas investigações criminais. Segundo ele, "a Constituição não criou o Ministério Público para ser um órgão inerte", logo "deve investigar sempre que fatos delituosos chegarem ao seu conhecimento"

E não se diga que, sendo parte, não pode o Promotor de Justiça ser considerado autoridade para efeito de instauração de procedimento administrativo na forma permitida pelo parágrafo único do art. 4º. do Código de Processo Penal; tal argumento também é rebatido pelo autor por último citado, ao afirmar, depois de se apoiar nas lições de Hely Lopes Meirelles, que:

"Não resta dúvida que, estando o Ministério Público regido por lei orgânica própria, detendo funções privativas constitucionalmente e possuindo seus agentes independência funcional, além de preencher os demais requisitos elencados pela doutrina, os seus membros são agentes políticos, e como tal exercem parcela de autoridade."

"Portanto, indubitavelmente, exerce o MP parcela de autoridade e, administrativamente, pode proceder às investigações penais diretas na forma da legislação em vigor." (11)

Mirabete não pensa diferente:

"Os atos de investigação destinados à elucidação dos crimes, entretanto, não são exclusivos da polícia judiciária, ressalvando expressamente a lei a atribuição concedida legalmente a outras autoridades administrativas (art. 4º., do CPP). Não ficou estabelecido na Constituição, aliás, a exclusividade de investigação e de funções da Polícia Judiciária em relação às polícias civis estaduais. Tem o Ministério Público legitimidade para proceder investigações e diligências, conforme determinarem as leis orgânicas estaduais", citando, então, várias hipóteses em que outras autoridades administrativas, que não Delegados de Polícia, podem e devem proceder a investigações: Lei de Falências, arts. 103 e segs., as já referidas Comissões Parlamentares de Inquérito, a Lei n. 4.771/65 (art 33, b), o art. 43 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, etc. [12]

Espínola Filho, por sua vez, já advertia "que o inquérito não é atribuição exclusiva da autoridade policial, é ponto assente, muito comuns sendo os inquéritos administrativos.

"O Código de processo penal, no art. 4º., parágrafo único, ressalva, do modo mais claro, a pertinência desses inquéritos extrapoliciais, acentuando que a competência dada no inquérito à polícia judiciária, exercida por autoridades policiais, não exclui a de autoridades administrativas, para promoverem inquéritos, quando a isso legalmente autorizadas." (13)

O Superior Tribunal de Justiça assim já se manifestou:

"Como procedimento meramente informativo que é, o inquérito policial pode ser dispensado se o titular da ação penal dispuser de elementos suficientes para o oferecimento da denúncia." (DJU, 08/06/92, p. 8.594).

O Supremo Tribunal Federal também já decidiu:

"A inexistência de inquérito policial não impede a denúncia, se a Promotoria dispõe de elementos suficientes para a formulação da demanda penal – Existência, no caso, de indícios suficientes para afastar a alegação de falta de justa causa para a denúncia. Habeas Corpus indeferido." (STF, Habeas Corpus n.º 70.991-5, Rel. Min. Moreira Alves).

Especificamente sobre o poder investigatório do Ministério Público veja-se:

"O MP tem legitimidade para proceder a investigações ou prestar tal assessoramento à Fazenda Pública para colher elementos de prova que possam servir de base a denúncia ou ação penal. A CF/88, no art. 144, § 4º., não estabeleceu com relação às Polícias Civis a exclusividade que confere no § 1º., IV, à Polícia Federal para exercer as funções de Polícia Judiciária." (RT, 651/313).

Recentemente o Superior Tribunal de Justiça decidiu no mesmo sentido:

"Ministério Público. Procedimento investigatório. Policiais. A Turma denegou a ordem de habeas corpus com o entendimento de que, em se tratando de procedimento com o fito de apurar fatos reputados delituosos e cuja autoria é atribuída a integrante da organização policial, cuja atividade é controlada externamente pelo Ministério Público, em tese não existirá antinomia para que o Parquet promova a investigação. Ressalte-se que, mesmo no caso de eventual irregularidade por invasão das atribuições da Polícia Judiciária pelo Ministério Público, ainda assim em nada estaria afetada a ação penal porque objeto de apuração de delito cometido por agente de autoridade policial. Precedentes citados do STF: RHC 66.428-PR, DJ 2/9/1988, e RE 205.473-9-AL, DJ 19/3/1999. (RHC 10.947-SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado em 19/02/2002).

"Não obstante o disposto no artigo 144, § 4º, da CF, o Parquet não é absolutamente proibido de praticar atos investigatórios. Não faria sentido, sendo essa instituição responsável, exclusivamente, pela ação penal pública – artigo 129, I da CF -que não pudesse praticar qualquer ato tendente à elucidação dos fatos. Se para o oferecimento da denúncia se exige um embasamento concreto quanto à materialidade e autoria do delito, isso significa que a atividade do órgão acusador depende diariamente de uma reconstituição bem feita do quadro fático. Sendo assim, não se pode negar sua competência para a prática de fatos investigatórios, embora não lhe seja permitido instaurar, formalmente, inquérito policial, pois esta é atividade atribuída à polícia judiciária. Não por acaso, a Súmula, 234/STJ dispõe que ‘a participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia’". (STJ – Ac. unânime da 5ª T, publicado em 18/3/2002 – RO - HC 10.974 – SP - Rel. Min. Felix Fischer - Paciente Nelson Latif Fakhouri - Adv. Vagner da Costa).

"A Turma negou provimento ao recurso, considerando o MP como detentor da competência para efetuar diligências, colher depoimentos, investigar os fatos a fim de poder oferecer denúncia. Entendeu que não há qualquer ilegalidade de o MP, em processo investigatório, requerer a expedição de mandado de busca e apreensão, não ficando à espera de informações fornecidas, única e exclusivamente, pela polícia judiciária. Além de que havia a possibilidade de desaparecimento de provas documentais pertinentes." (RMS 12.357-RJ, Rel. Min. Vicente Leal, julgado em 19/11/2002).

"STJ – HABEAS CORPUS Nº 18.060 – PR (2001/0097707-4) (DJU 26.08.02, SEÇÃO 1, P. 271, J. 07.02.02)

RELATOR: MINISTRO JORGE SCARTEZZINI

IMPETRANTE: J.C.C.G.F. E OUTROS

IMPETRADO: PRIMEIRA TURMA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

PACIENTE: C.D.B.C.J.

EMENTA: PENAL E PROCESSO PENAL – CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO – CRIME DE "LAVAGEM" – INÉPCIA DA DENÚNCIA – CERCEAMENTO DE DEFESA – IMPEDIMENTO DE PROCURADORES PARA O OFERECIMENTO DA DENÚNCIA – PROVAS ILÍCITAS – INOCORRÊNCIA.

- Conforme descrito na peça acusatória, durante o período compreendido entre maio de 1996 e maio de 1999, o paciente teria enviado ao exterior, clandestinamente, valores objeto de operações de câmbio não autorizadas pelo Banco Central e, ainda, teria procedido à "lavagem" de dinheiro. Tal conduta consistia na importação de bens, especialmente veículos, perfazendo um total de US$ 17.930.760,00 (dezessete milhões, novecentos e trinta mil setecentos e sessenta dólares americanos), constando no SISBACEN, tão-somente, o valor declarado de US$ 1.487.411,63 (um milhão, quatrocentos e oitenta e sete mil, quatrocentos e onze dólares americanos e sessenta e três centavos). Segundo o parquet, o acusado utilizava dinheiro oriundo de sua atividade delituosa, dentre outras finalidades, para pagamento de cartões de crédito internacionais, dos quais era titular, cujos gastos totalizaram R$ 257.708,89 (duzentos e cinqüenta e sete mil setecentos e oito reais e oitenta e nove centavos) entre janeiro de 1995 e setembro de 1998. Consta, ainda, que suas despesas com condomínio, passagens aéreas nacionais e internacionais, advogados e médicos, eram incompatíveis com a renda por ele declarada, demonstrando, ainda, outros sinais exteriores de riqueza, tais como a propriedade de vários veículos importados.

- A exordial acusatória, acostada às fls. 46/59 dos presentes autos, descreve fato delituoso, com todas as suas circunstâncias. A materialidade encontra-se comprovada pelo fato do volume de importações efetuadas pelas empresas do Paciente haver sido muito maior do que as operações de câmbio registradas no Banco Central. De outro lado, todas as alegações com referência à inocorrência do delito em questão (como, por exemplo, a de que tais operações poderiam ter sido feitas em nome dos clientes da empresa, já que esta serviria apenas como meio para a obtenção dos veículos importados), entendo que para a sua precisa averiguação é necessário o exame de todo o material cognitivo, como ressaltado pelo v. acórdão. Em sede mandamental, tal desiderato é inviável.

- Por outro lado, não há que se falar em cerceamento de defesa. Pelas informações prestadas, destaca-se que a oitiva de testemunhas por carta rogatória não foi deferida, num primeiro instante, em face da possibilidade da comprovação do alegado pela via documental. Ainda assim, logo em seguida, o magistrado, em homenagem à ampla defesa, propiciou a expedição de rogatória.

- Com relação à ocorrência de litispendência, o pedido, também, não comporta deferimento. Os impetrantes sustentam que a ação penal em questão lastreia-se nos mesmos fatos da ação penal nº 98.24214-7.

Pelo que se depreende dos autos, os fatos narrados na peça acusatória objeto da Ação nº 98.24214-7 apontam que o paciente teria mantido, nos anos de 1992 a 1994, depósitos em sua titularidade em contas no Banco Citibank, em Miami-EUA e no Banco do Brasil, também em Miami-EUA, sem comunicar o fato à Receita Federal (fls. 68).

- No caso sub judice, a denúncia volta-se contra fatos ocorridos a partir de maio de 1996 até maio de 1999. Portanto, verifica-se que os fatos criminosos descritos na denúncia referem-se a períodos totalmente distintos. Na realidade, o que se infere é que a Ação Penal nº 98.0024214-7 é citada na peça vestibular apenas como exemplo de que o acusado realmente mantinha contas no exterior. Não há, por conseguinte, que cogitar-se na identidade de fatos e, conseqüentemente, de litispendência entre ambas as ações.

- Quanto à ilegalidade das investigações promovidas pelo Ministério Público, sem a instauração de inquérito policial, o writ, igualmente, improcede. Com efeito, a questão acerca da possibilidade do Ministério Público desenvolver atividade investigatória objetivando colher elementos de prova que subsidiem a instauração de futura ação penal, é tema incontroverso perante esta eg. Turma. Como se sabe, a Constituição Federal, em seu art. 129, I, atribui, privativamente, ao Ministério Público promover a ação penal pública.

Essa atividade depende, para o seu efetivo exercício, da colheita de elementos que demonstrem a certeza da existência do crime e indícios de que o denunciado é o seu autor. Entender-se que a investigação desses fatos é atribuição exclusiva da polícia judiciária, seria incorrer-se em impropriedade, já que o titular da Ação é o Órgão Ministerial. Cabe, portanto, a este, o exame da necessidade ou não de novas colheitas de provas, uma vez que, tratando-se o inquérito de peça meramente informativa, pode o MP entendê-la dispensável na medida em que detenha informações suficientes para a propositura da ação penal.

- Ora, se o inquérito é dispensável, e assim o diz expressamente o art. 39, § 5º, do CPP, e se o Ministério Público pode denunciar com base apenas nos elementos que tem, nada há que imponha a exclusividade às polícias para investigar os fatos criminosos sujeitos à ação penal pública.

- A Lei Complementar nº 75/90, em seu art. 8º, inciso IV, diz competir ao Ministério Público, para o exercício das suas atribuições institucionais, "realizar inspeções e diligências investigatórias". Compete-lhe, ainda, notificar testemunhas (inciso I), requisitar informações, exames, perícias e documentos às autoridades da Administração Pública direta e indireta (inciso II) e requisitar informações e documentos a entidades privadas (inciso IV).

- Por fim, com relação à alegação de que a denúncia lastreou-se em provas ilícitas, oriundas da quebra de sigilo fiscal, bancário e de correspondência, sem autorização judicial, impõem-se algumas considerações preliminares. Especificamente quanto a este fundamento, observo que o v. acórdão guerreado afastou seu exame, em sede de embargos declaratórios, por entender que a via do habeas corpus não era a adequada para discussão acerca desse tema. Diante disso, torna-se inviável a apreciação da questão nesta oportunidade – já que não examinada pelo Tribunal a quo – sob pena de suprimir-se instância.

- Entretanto, impõe que seja feita uma retificação, nesse último ponto, no decisum atacado. Tanto esta Corte (v.g. RHC 11.338/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, DJU 08/10/2001) quanto o Colendo Supremo Tribunal Federal (v.g. HC 81.294/SC, Rel. Ministra ELLEN GRACIE e HC 79.191/SP, Rel. Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, entre outros), têm entendido que o habeas corpus é instrumento idôneo para afastar constrangimento decorrente da quebra de sigilo, uma vez que de tal procedimento pode advir medida restritiva à liberdade de locomoção. Assim, equivocado o entendimento adotado pelo Tribunal a quo, ao afirmar que o writ não se coaduna com o pronunciamento acerca de eventual ilegalidade na quebra de sigilo. Dessa forma, no tocante a este aspecto, entendo que deva ser submetido àquela Corte, para que se pronuncie a respeito.

- Ordem concedida em parte, de ofício, somente quanto a este último tópico, determinando, apenas, que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região proceda à devida apreciação da alegação de quebra de sigilo fiscal, bancário e de correspondência, sem autorização judicial."

O Tribunal Regional Federal da 2ª. Região, em acórdão unânime proferido pela sua 6ª. Turma, assim decidiu ainda mais recentemente:

"(...) No que tange à possibilidade bem como à legalidade da prova recolhida pelo Ministério Público, em seu poder investigatório criminal, fulcrado no art. 129, VI, VII, VIII da CF, que tem como reflexo os arts. 26, V da Lei nº. 8.625/93 e 8º., IV, V, VII e VIII da LC 75/93, independentemente da norma do art. 144, § 1º., IV do Texto Básico, a teor do princípio da unidade, trata-se de questão, outrossim, pacificada nas Cortes Superiores (STF, HC 77.371, DJ 23/10/98; STF, HC 81.303, DJ 23/08/02; STF, HC 18.060, DJ 26/08/02), que conferem ao termo – exclusividade – o sentido de divisão funcional entre as diversas categorias policiais, e não a vedação de que o MP possa proceder em tema investigatório." (HC nº. 2001.02.01.022657-6 – Rel. Des. Fed. Poul Erik Dyrlund, j. 02/04/03, DJU 2 29/04/03, p. 211).

É de Julio Fabbrini Mirabete a lição: "Como titular do jus puniendi, nada impede que o Ministério Público, além de requisitar informações e documentos para instruir procedimentos promova atos de investigação para apuração de ilícitos penais, pois, nos termos da Constituição Federal, ´pode exercer outras funções que lhe sejam conferidas desde que compatíveis com sua finalidade´ (artigo 129, IX)." (14)

Para encerrarmos as argumentações, objetamos ainda o seguinte: mesmo em se admitindo que a Lei Orgânica do Ministério Público Estadual não permitisse as investigações criminais (o que, absolutamente, não é verdade), ainda assim, por força do art. 80 da referida Lei Federal poderíamos utilizar, subsidiariamente, as normas da Lei Orgânica do Ministério Público da União (Lei Complementar Federal nº. 75/93), que "não deixa margem de dúvidas quanto à operacionalização das investigações criminais diretas no âmbito do Ministério Público", como argumenta Polastri, no livro já aludido (p. 91), referindo-se, com certeza (ainda que não o diga expressamente), aos arts. 7º., I e 8º., VII, in verbis:

"Art. 7º. - Incumbe ao Ministério Público da União, sempre que necessário ao exercício de suas funções institucionais:

"I - instaurar inquérito civil e outros procedimentos correlatos."

"(omissis)."

"Art. 8º. - Para o exercício de suas atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência:

"(omissis)."

"VII - expedir notificações e intimações necessárias aos procedimentos e inquéritos que instaurar."

Há vários sistemas jurídicos alienígenas que ao priorizarem em suas reformas processuais penais o fortalecimento do Ministério Público, passaram a permitir de maneira ampla a investigação criminal pelo parquet.

No Direito comparado observamos a existência de dois sistemas principais: o inglês (a Polícia detém o poder de conduzir as investigações preliminares) e o continental (o Ministério Público conduz a investigação criminal).

Neste segundo sistema, encontramos, por exemplo, países como a Itália, Alemanha, França e Portugal, como veremos a seguir:

Na Alemanha, lê-se no Código de Processo Penal:

"StPO § 160: (1) (omissis)

"(2). A Promotoria de Justiça deverá averiguar não só as circunstâncias que sirvam de incriminamento, como também as que sirvam de inocentamento, e cuidar de colher as provas cuja perda seja temível.

"(3). As averiguações da Promotoria deverão estender-se às circunstâncias que sejam de importância para a determinação das conseqüências jurídicas do fato. Para isto poderá valer-se de ajuda do Poder Judicial.

"StPO § 161: Para a finalidade descrita no parágrafo precedente, poderá a Promotoria de Justiça exigir informação de todas as autoridades públicas e realizar averiguações de qualquer classe, por si mesma ou através das autoridades e funcionários da Polícia. As autoridades e funcionários da Polícia estarão obrigados a atender a petição ou solicitação da Promotoria."

Na Itália não é diferente no seu "Codice di Procedura Penale":

"Art. 326 – O Ministério Público e a Polícia Judiciária realizarão, no âmbito de suas respectivas atribuições, a investigação necessária para o termo inerente ao exercício da ação penal."

"Art. 327 – O Ministério Público dirige a investigação e dispõe diretamente da Polícia Judiciária."

Em Portugal, conforme lição de Germano Marques da Silva, "os órgãos de polícia criminal coadjuvam o Ministério Público no exercício das suas funções processuais, nomeadamente na investigação criminal que é levada a cabo no inquérito, e fazem-no sob a direta orientação do Ministério Público e na sua dependência funcional (arts. 56 e 263)." (15)

Ainda em solo lusitano, a Lei Orgânica do Ministério Público, no seu art. 3º., diz competir ao Ministério Público "dirigir a investigação criminal, ainda quando realizada por outras entidades" e " fiscalizar a actividade processual dos órgãos de polícia criminal."

Em França não é diferente, à vista do art. 41 do respectivo Código de Processo Penal:

"O Procurador da República procede ou faz proceder a todos os atos necessários à investigação e ao processamento das infrações da lei penal. Para esse fim, ele dirige as atividades dos oficiais e agentes da polícia Judiciária dentro das atribuições do seu tribunal."

Diante de tudo quanto foi exposto pode e deve o membro do Ministério Público, quando isto lhe é faticamente possível, investigar diretamente fatos criminosos, principalmente quando se tratar de abuso de autoridade (a título de exemplo); é bom que se diga não ter o Ministério Público, muitas das vezes, condições de, motu proprio, levar adiante uma investigação criminal, até por carência de material, seja humano (investigadores, por exemplo), seja físico (viaturas, espaço físico apropriado, etc); quando houver dificuldades, nada nos impede, ao contrário, tudo indica, que requisitemos a instauração de inquérito policial (ou termo circunstanciado na forma da Lei nº. 9.099/95) à autoridade policial respectiva, atentando-se para o fiel cumprimento da requisição e adotando-se as medidas criminais em caso de não atendimento (pode-se estar configurado, por exemplo, o delito de prevaricação), além da possibilidade de se configurar ato de improbidade administrativa (art. 11, II da Lei nº. 8.429/92).

Apenas ressaltamos o nosso pensamento quanto à impossibilidade de que o mesmo Promotor de Justiça (ou os mesmos profissionais ou a mesma equipe) que investigue possa, depois, valorando a prova por ele próprio colhida, oferecer denúncia. Não cremos ser isso possível.

Vejamos a respeito as observações de Antonio Evaristo de Morais Filho, citando Altavilla:

"Este fenômeno foi muito bem estudado por Altavilla, em sua famosa ‘Psicologia Judiciária’ (Porto, 1960, v. 5, p. 36-39), onde dedicou dois verbetes aos perigos das hipóteses provisórias, que podem ‘seduzir o investigador, de maneira a torná-lo daltônico nas apreciações das conclusões de indagações ulteriores’. Adverte o mestre italiano que, uma vez internalizada na mente do policial, do promotor ou do juiz, a procedência da hipótese provisória, cria-se em seu espírito a necessidade de demonstrar o que considera verdade, ‘à qual ele liga uma especial razão de orgulho’, como se a eventual demonstração da improcedência de sua hipótese ‘constituísse uma razão de demérito’. E assim, intoxicado por sua verdade, sobrevaloriza todos os elementos probatórios que lhe forem favoráveis e diminui ‘o valor dos contrários, até o ponto de não serem tomados em consideração num ato." (16)

Afinal de contas nas veias do Promotor de Justiça também corre o sangue dos pobres mortais...

A jurisprudência, nesse sentido, também é encontrada, inclusive no Superior Tribunal de Justiça:

"O magistrado e o membro do Ministério Público se houverem participado da investigação probatória não podem atuar no processo. Reclama-se a isenção de ânimo de ambos. Restaram comprometidos (sentido jurídico). Daí a possibilidade de argüição de impedimento, ou suspeição." (Superior Tribunal de Justiça. Recurso em habeas corpus 4.769. Relator: Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro. DJU de 06 mai. 1996.)

"Ministério Público. Impedimento de seus órgãos. Nulidade da denúncia. 1) O membro do Ministério Público que atua na fase inquisitorial, apurando pessoalmente os fatos, torna-se impedido para oficiar como promotor da ação penal (inteligência dos arts. 252, I e 258, CPP). Nula, portanto, é a denúncia ofertada, se inobservado esse aspecto." (EJTJAP, v. 1, n. 1, p. 91).

De toda forma, o STJ já sumulou em sentido contrário ao decidir que "a participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia." (Súmula 234).

Interessante, a título de ilustração, a observação feita por Renê Ariel Dotti:

"(...) forçoso é reconhecer que o sistema adotado em nosso país deixa muito a desejar quanto à eficácia e agilidade das investigações. E o maior obstáculo para alcançar estes objetivos decorre da falta de maior integração não somente das categorias funcionais da Polícia Judiciária e do Ministério Público como também de seus integrantes. Observa-se, lamentavelmente e em muitas circunstâncias, a existência de um processo de rejeição que parece ser genético." [17]

Atentos à observação supra (verdadeira e preocupante), esclarecemos que tais considerações, longe de representarem obstáculos à atuação policial, são apenas elucidações que devem ser feitas a respeito das prerrogativas do Ministério Público, nunca se olvidando da importância da polícia judiciária.

Devemos, na lição do maior de todos os Promotores de Justiça, "no trato com as autoridades policiais (...), além do respeito devido às prerrogativas daqueles colaboradores e não subordinados, pugnar pelo prestígio que advém da sua correção." [18]


Notas

1 Ministério Público e Persecução Criminal, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1997, p. 88.

2 Regime Jurídico do Ministério Público, São Paulo: Saraiva, 1996, p. 239.

3 Comentários à Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Obra Jurídica Editora, ps. 204/205.

4 Idem, p. 90.

5 Ob. cit., p. 239.

6 Idem, p. 400.

7 Carlos Maximiliano, Hermenêutica e Aplicação do Direito, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1961, p. 165.

8 Estudos Jurídicos em Homenagem a Manoel Pedro Pimentel, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1992, p. 239.

9 Código de Processo Penal Comentado, Vol. 1, São Paulo: Saraiva, 1996, p. 16.

10 Ob. cit., p. 84.

11 Ob. cit. págs. 85 e 87.

12 Processo Penal, São Paulo: Atlas, 1997, p. 77.

13 Código de Processo Penal Anotado, Borsoi, 1960, p. 248.

14 Código de Processo Penal Interpretado, São Paulo: Atlas, 8ª ed., 2001, p. 560.

15 Curso de Processo Penal, Vol. I, Lisboa: Editorial Verbo, 1996.

16 Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, n.º 19, p. 106.

17 O Ministério Público e a Polícia Judiciária - Relações formais e desencontros materiais, in Ministério Público, Direito e Sociedade, Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1986, p. 135.

18 Roberto Lyra, Teoria e Prática da Promotoria Pública, Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1989, p. 121.

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Sobre o autor
Rômulo de Andrade Moreira

Procurador-Geral de Justiça Adjunto para Assuntos Jurídicos do Ministério Público do Estado da Bahia. Foi Assessor Especial da Procuradoria Geral de Justiça e Coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais. Ex- Procurador da Fazenda Estadual. Professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador - UNIFACS, na graduação e na pós-graduação (Especialização em Direito Processual Penal e Penal e Direito Público). Pós-graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal). Especialista em Processo pela Universidade Salvador - UNIFACS (Curso então coordenado pelo Jurista J. J. Calmon de Passos). Membro da Association Internationale de Droit Penal, da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais, do Instituto Brasileiro de Direito Processual e Membro fundador do Instituto Baiano de Direito Processual Penal (atualmente exercendo a função de Secretário). Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. Integrante, por quatro vezes, de bancas examinadoras de concurso público para ingresso na carreira do Ministério Público do Estado da Bahia. Professor convidado dos cursos de pós-graduação dos Cursos JusPodivm (BA), Praetorium (MG) e IELF (SP). Participante em várias obras coletivas. Palestrante em diversos eventos realizados no Brasil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOREIRA, Rômulo Andrade. A investigação criminal e o Ministério Público. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 277, 10 abr. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5067. Acesso em: 22 dez. 2024.

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