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Breves considerações acerca do regime de bens da participação final nos aquestos

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13/12/2016 às 11:45

Resumo:


  • O regime da participação final nos aquestos é disciplinado pelos artigos 1.672 a 1.686 do Código Civil brasileiro e substituiu o antigo regime dotal, permitindo que cada cônjuge possua um patrimônio próprio e administre seus bens de forma independente, com partilha de bens adquiridos conjuntamente apenas na dissolução da sociedade conjugal.

  • Esse regime tem raízes históricas na legislação sueca e foi adotado com variações em países como França, Alemanha e Espanha, mas sofreu críticas por desfigurações teóricas e práticas em sua aplicação no direito brasileiro.

  • Na prática, a divisão dos aquestos ocorre no momento da dissolução da sociedade conjugal, com a apuração contábil dos bens adquiridos onerosamente durante o casamento, excluindo-se os bens particulares de cada cônjuge, como aqueles possuídos antes do casamento ou recebidos por herança ou doação.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A Administração dos Bens do Casal

Os cônjuges, marido ou mulher, podem livremente praticar os atos de disposição em administração dos bens do casal necessários ao desempenho de sua profissão.

Não há, portanto, qualquer limitação a qualquer dos cônjuges, em conjunto ou isoladamente, se imbuídos de boa-fé, para alienar os bens do casal ou os administrar, conforme disciplina o caput do artigo 1.663 do Código Civil:

Art. 1.663 – A administração do patrimônio comum compete a qualquer dos cônjuges.

O princípio constitucional da igualdade entre homem e mulher, preconizado no artigo 226, parágrafo 5º da Constituição Federal, não deixa dúvida: podem os cônjuges, em conjunto ou isoladamente, munidos de boa-fé, alienar os bens do casal ou os administrar, conforme já dito, exceção se faz a alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis, conforme disposto no artigo 1.642, I e VI do Código Civil:

Art. 1.642 – Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quanto a mulher podem livremente:

I – praticar todos os atos de disposição e de administração necessários ao desempenho de sua profissão, com as limitações estabelecidas no inciso I do art. 1.647;

VI – praticar todos os atos que não lhes forem vedados expressamente.

É lícito a qualquer dos cônjuges, independentemente de autorização prévia do outro, comprar bens domésticos. Se através de financiamento ou crediário, obrigam-se solidariamente ambos os cônjuges. Artigos 1.643 e 1.644 do Código Civil.

Art. 1.643 – Podem os cônjuges, independentemente de autorização um do outro:

I – comprar, ainda a crédito, as coisas necessárias à economia doméstica;

II – Obter, por empréstimo, as quantias que a aquisição dessas coisas possa exigir.

Art. 1.644 – As dívidas contraídas para os fins do artigo antecedente obrigam solidariamente ambos os cônjuges.

Em havendo a impossibilidade de um dos cônjuges em exercer a administração dos bens, poderá o outro cônjuge fazê-lo. Poderá, inclusive, alienar bens imóveis comuns e do consorte, também os móveis, desde que com autorização judicial, conforme disciplina o artigo 1.651 do Código Civil:

Art. 1.651 – Quando um dos cônjuges não puder exercer a administração dos bens que lhe incumbe, segundo o regime de bens, caberá ao outro:

I – gerir os bens comuns e os do consorte;

II – alienar os bens móveis comuns;

III – alienar os imóveis comuns e os móveis ou imóveis do consorte, mediante autorização judicial.

Aquele cônjuge que estiver na posse de bens particulares comuns ou do outro cônjuge será o responsável pelos frutos, se o rendimento for comum, como procurador, se munido de mandato expresso ou tácito para administrá-los, e como depositário. Deverá prestar contas se convocado.

Terá legitimidade para exigir a responsabilidade o outro cônjuge ou os seus herdeiros, conforme disciplina o artigo 1.652 do Código Civil:

Art. 1.652 – O cônjuge, que estiver na posse dos bens particulares o outro, será para com este e seus herdeiros responsável:

I – como usufrutuário, se o rendimento for comum;

II – como procurador, se tiver mandato expresso ou tácito para os administrar;

III – como depositário, se não for usufrutuário, nem administrador.

Além da possibilidade de qualquer dos cônjuges administrarem os bens, a legislação permite que um dos cônjuges possa ingressar em juízo para buscar a proteção do bem comum nas hipóteses de pedir a desobrigação ou reivindicar o livre domínio dos imóveis do casal que tenham sido gravados ou alienados sem o consentimento ou sem o suprimento judicial (artigo 1.642, III do Código Civil) ou se não casados sob o regime da separação absoluta, de pedir a rescisão dos contratos de fiança e doação ou a invalidação do aval realizado pelo outro cônjuge com infração ao disposto nos incisos III e IV do artigo 1.647 do Código Civil e para pedir a posse, propriedade e domínio dos bens móveis ou imóveis adquiridos na constância do casamento que foram doados ou transferidos pelo outro cônjuge ao concubino, desde que provado que os bens não foram adquiridos pelo esforço comum destes, se o casal estiver separado de fato por mais de cinco anos (artigo 1.642, V do Código Civil).

Art. 1.642 – Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quanto a mulher podem livremente:

 III – desobrigar ou reivindicar os imóveis que tenham sido gravado ou alienados sem o seu consentimento ou sem suprimento judicial;

V – reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo outro cônjuge ao concubino, desde que provado que os bens não foram adquiridos pelo esforço comum destes, se o casal estiver separado de fato por mais de 5 (cinco) anos.

Art. 1,647 – Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum cônjuge pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:

III – prestar fiança ou aval;

IV – fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação.

O prazo decadencial para anulação de ato por falta de autorização conjugal ou de suprimento judicial é de dois anos, contados do término da sociedade conjugal, tendo legitimidade ativa o cônjuge a quem caiba conceder a outorga ou por seus herdeiros, conforme disciplinam os artigos 1.649, caput e 1.650 do Código Civil:

Art. 1.649 – A falta de autorização, não suprida pelo juiz, quando necessária (art. 1.647), tornará anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a anulação, até 2 (dois) anos depois de terminada a sociedade conjugal.

Art. 1.650 – A decretação de invalidade dos atos praticados sem outorga, sem consentimento, ou sem suprimento do juiz, só poderá ser demandada pelo cônjuge a quem cabia concedê-la, ou por seus herdeiros.

Nada obsta, contudo, que o cônjuge venha posteriormente convalidar o ato praticado pelo outro cônjuge sem o seu consentimento, o que se fará através de instrumento público, no caso de bem imóvel, ou particular, se bem móvel. Feito isto, desaparece o vício do ato jurídico, nos termos do parágrafo único do artigo 1.649 do código Civil.

A anulação se presta às alienações de bens particulares do cônjuge.

No caso da reivindicação, que se presta às alienações de bens comuns, tem a natureza de ação real, e, à falta de prazo prescricional específico, deve-se observar aquele fixado pelo artigo 205 do Código Civil, qual seja, 10 (dez) anos.


O Cálculo dos Aquestos Finais no Momento da Dissolução da Sociedade Conjugal

Com a dissolução da sociedade conjugal o Código Civil estabelece a forma como se dará a operação contábil.

Art. 1.674 – Sobrevindo a dissolução da sociedade conjugal, apurar-se-á o montante dos aquestos, excluindo-se da soma dos patrimônios próprios:

I – os bens anteriores ao casamento e os que em seu lugar se sub-rogaram;

II – os que sobrevieram a cada cônjuge por sucessão ou liberalidade;

III – as dívidas relativas a esses bens.

Em resumo, apuram-se os bens anteriores ao casamento, os sub-rogados a eles e os que sobrevieram a cada cônjuge por sucessão ou liberalidade e as dívidas relativas aos bens. Estes bens são excluídos dos aquestos.

Seria mais técnico apenas haver informado que não seriam incluídas as dívidas referentes aos bens que também não se comunicam.

O artigo 1.675 disciplina que “ao determinar o montante dos aquestos, computar-se-á o valor das doações feitas por um dos cônjuges, sem a necessária autorização do outro; nesse caso, o bem poderá ser reivindicado pelo cônjuge prejudicado ou por seus herdeiros, ou declarado no monte partilhável, por valor equivalente ao da época da dissolução”.

Desta forma, nos termos do artigo 1.675 do Código Civil, inclui-se nos aquestos o valor das doações feitas por um dos cônjuges sem autorização do outro, facultando-se, inclusive, a reivindicação desses bens e eventuais alienações feitas em detrimento da meação. Importante ressaltar, que trata-se das doações e alienações feitas dos bens adquiridos na constância do casamento.

Art. 1.675 – Ao determinar-se o montante dos aquestos, computar-se-á o valor das doações feitas por um dos cônjuges, sem a necessária autorização do outro; nesse caso, o bem poderá ser reivindicado pelo cônjuge prejudicado ou por seus herdeiros, ou declarado no monte partilhável, por valor equivalente ao da época da dissolução.

Em seguida, dispõe o artigo 1.683 do Código Civil:

Art. 1.683 – Na dissolução do regime de bens por separação judicial ou por divórcio, verificar-se-á o montante dos aquestos à data em que cessou a convivência.

Logo, portanto, assim que dissolvido o casamento pela separação judicial ou pelo divórcio, verifica-se o montante dos aquestos. Se a divisão for possível, faz-se a repartição de cada um. Se não o for, apura-se o respectivo valor para reposição em dinheiro em favor do cônjuge não proprietário, nos termos do artigo 1.684 do Código Civil:

Art. 1.684 – Se não for possível, nem conveniente a divisão de todos os bens em natureza, calcular-se-á o valor de alguns ou de todos para reposição em dinheiro ao cônjuge não proprietário.

Então, se não for possível repor em dinheiro, deve-se aplicar o disposto no parágrafo único do artigo 1.684 do Código Civil:

Art. 1.684, parágrafo único. Não se podendo realizar a reposição em dinheiro, serão avaliados e, mediante autorização judicial, alienados tantos bens quantos bastarem.

Vejamos, através da seguinte simulação, como se procede a divisão dos bens no regime da participação final nos aquestos:

. Patrimônio final do marido.......................................................................R$400.00,00

. ( - ) Bens excluídos................................................................................R$120.000,00

. ( = ) Ganhos ou aquestos......................................................................R$280.000,00

. Patrimônio final da mulher.....................................................................R$200.000,00

. ( - ) Bens excluídos................................................................................R$100.000,00

. ( = ) Ganhos ou aquestos......................................................................R$100.000,00

. Crédito de partição devido pelo marido à mulher:

. ( + ) Ganhos ou aquestos do marido.....................................................R$280.000,00

. ( - ) Ganhos ou aquestos da mulher......................................................R$100.000,00

. ( = ) Sub produto dos ganhos do marido...............................................R$180.000,00

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. ( = ) Sub produto dos ganhos do marido (R$180.000,00 / 2)..................R$90.000,00

Tem-se então, que o crédito da mulher contra o marido é de R$140.000,00 (R$280.000,00 dividido por 2) e que o crédito do marido contra a mulher é de R$50.000,00 (R$100.000,00 dividido por 2).

Esses créditos são compensados e assim se obtém o crédito de participação devido pelo marido à mulher, qual seja, R$90.000,00 (R$140.000,00 - R$50.000,00).

A diferença marcante do regime da participação final nos aquestos frente aos demais regimes está consubstanciada no fato de que a participação se faz sobre os incrementos patrimoniais, mas de forma contábil e modo de apuração de valores, não através da comunhão ou condomínio.

Significa então que, após a compensação de bens, aquele cônjuge em desvantagem passa a ter um crédito que consiste na diferença apurada, e não uma parcela sobre o bem indivisível.

Quanto à parcela que subtrai do patrimônio, o chamado passivo, dispõe o artigo 1.677 do Código Civil:

Art. 1.677 – Pelas dívidas posteriores ao casamento, contraídas por um dos cônjuges, somente este responderá, salvo prova de terem revertido, parcial ou totalmente, em benefício do outro.

Já o artigo 1.678 dispõe:

Art. 1.678 – Se um dos cônjuges solveu uma dívida do outro com bens do seju patrimônio, o valor do pagamento deve ser atualizado e imputado, na data da dissolução, à meação do outro cônjuge.

Em nota de pé de página, o doutrinador José Luiz Gavião de Almeida, em seu livro Direito Civil – Família esclarece:

O valor utilizado, da época da dissolução, vale para todas as hipóteses de extinção da sociedade conjugal. Mas há que se entender o dispositivo em consonância com o art. 1.683 do CC, que fale que, no caso de separação judicial, o montante dos aquestos é verificado pela data em que essa providência for requerida. Mas uma coisa é os bens serem considerados aquestos; outra, o valor que ingressam na comunhão. Ainda que o artigo fale apenas em separação judicial, o mesmo se deve entender relativamente ao divórcio direto, e à anulação ou nulidade de casamento com prévia separação de corpos, pois em todos esses casos, o que não se quer é que um dos cônjuges se beneficie com o esforço isolado do outro. (2008, p. 353)


Bibliografia Consultada

ALMEIDA, José Luiz Gavião de. Direito Civil: Família. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008.

BRASIL. Código Civil, Código de Processo Civil, Código Comercial, Legislação Civil, processual civil e empresarial, Constituição Federal. Organização Yussef Said Cahali. 10ª ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.

CAHALI, Francisco José e HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Curso Avançado de Direito Civil, volume 6: Direito das Sucessões. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.

CATEB, Salomão de Araújo. Direito das Sucessões. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2007.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 19ª ed. São Paulo; Saraiva, 2005.

_______. Dicionário Jurídico, volumes 4 e 6. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

GOMES, Orlando. O Novo Direito de Família. Porto Alegre: Safe, 1984.

GUIMARÃES, Deocleciano Torrieti. Dicionário Técnico Jurídico. 10ª Ed. São Paulo; Rideel, 2008.

LOPES, Rénan Kfuri. Considerações Sobre a Administração e o Regime de Bens Entre os Cônjuges. COAD/ADV, informativo boletim semanal, Belo Horizonte, p. 65, janeiro, 2004.

OLIVEIRA, Euclides Benedito de; AMORIM, Sebastião Luiz. Inventários e Partilhas: Direito das Sucessões: Teoria e Prática. 19ª ed. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 2005.

REALE, Miguel. O Cônjuge no Novo Código Civil. O Estado de São Paulo, 12 Abr. 2003.

_______. O Projeto de Código Civil. Projeto-de-lei nº 634, de 1975.

RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil, volume 6. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 217-218.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito das Sucessões. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2006.

VILLELA, João Baptista. Natureza do Regime de Participação Final nos Aquestos e Fins do Casamento. Disponível em: <http://www.direitodafamilia.net>. Acesso em: 24 Ago. 2009.

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Sobre o autor
José Márcio de Almeida

Advogado. Membro da Academia Brasileira de Direito Civil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, José Márcio. Breves considerações acerca do regime de bens da participação final nos aquestos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4913, 13 dez. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/51361. Acesso em: 24 dez. 2024.

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