4 - POSIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL EM MINAS GERAIS PERANTE O CONSELHO PENITENCIÁRIO
Ilustre Procuradora da República ZANI SOUZA, em bem elaborado parecer emitido no exercício de suas atribuições de Conselheira do Conselho Penitenciário em Minas Gerais, sustenta o entendimento que passamos a transcrever:
"Entrou em vigor no dia 02 de dezembro de 2003, por força do disposto no seu artigo 9º, a Lei 10.792, de 1º de dezembro de 2003, alterando a Lei nº 7.210, de 11 de junho de 1984 - Lei de Execução Penal e o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal.
"Algumas críticas reverberam na doutrina no sentido de não se ter adotado a melhor técnica legislativa devido ao fato desta Lei alterar dispositivos do Código de Processo Penal e da Lei de Execuções Penais em um único corpo.
"A sucessão de leis no tempo, mormente aquelas que procedem a alterações pontuais no sistema jurídico, ocasiona, freqüentemente, dificuldades de interpretação, e até mesmo o aparecimento de antinomias que segundo Tércio Sampaio Ferraz Jr. consistem na "oposição que ocorre entre duas normas contraditórias (total ou parcialmente), emanadas de autoridades competentes num mesmo âmbito normativo que colocam o sujeito numa posição insustentável pela ausência ou inconsistência de critérios aptos a permitir-lhes uma saída nos quadros de ordenamento dados."
"Contudo, o sistema jurídico deverá, teoricamente, formar um todo coerente, devendo, por isso, excluir qualquer contradição lógica nas asserções, feitas pelo jurista, elaborador do sistema sobre as normas, para assegurar sua homogeneidade e garantir sua segurança na aplicação do direito. Para tanto, o jurista lançará mão de uma interpretação corretiva, guiado pela interpretação sistemática, que o auxiliará na pesquisa dos critérios para solucionar a antinomia a serem utilizados pelo aplicador do direito."2
"A lei em comento procedeu à alteração de diversos dispositivos do CPP e da LEP, entretanto, realizaremos um corte metodológico no intuito de analisar especificamente a mudança na redação do art. 70 da Lei de Execuções Penais. (...).
"Com o advento da Lei n° 10.792/03, a redação do inciso I alterada, litteris:
"I – emitir parecer sobre indulto e comutação de pena, excetuada a hipótese de pedido de indulto com base no estado de saúde do preso (Redação dada pela Lei n° 10.792, de 1°.12.2003)".
"Poder-se-ia pensar em um primeiro momento, baseado em uma interpretação literal, que o Conselho Penitenciário teria perdido a atribuição de emitir parecer acerca do livramento condicional, haja vista sua omissão na nova redação, provocando uma derrogação em tal competência.
"Entretanto, a tarefa do aplicador do direito é solucionar o conflito aparente de normas através de uma interpretação sistemática, pois ‘sempre que descobre uma contradição, deve o hermeneuta desconfiar de si; presumir que não compreendeu bem o sentido de cada um dos trechos ao parecer inconciliáveis, sobretudo se ambos se acham no mesmo repositório."3
"O livro IV do Código de Processo Penal, intitulado "DA EXECUÇÃO", restou revogado pela Lei de Execuções Penais visto que essa regulou toda a matéria. No intuito de elucidar a questão trazida à lume, convém relembrar o que dispunha a legislação pretérita no tocante ao livramento condicional:
"Art. 713. As condições de admissibilidade, conveniência e oportunidade da concessão do livramento serão verificadas pelo Conselho Penitenciário, a cujo parecer não ficará, entretanto, adstrito o Juiz."
"Atualmente, a Lei de Execuções Penais em seu art. 131, em seção que trata especialmente do Livramento Condicional, dispõe o seguinte:
"Art. 131. O livramento condicional poderá ser concedido pelo Juiz da execução, presentes os requisitos do artigo 83, incisos e parágrafo único, do Código Penal, ouvidos o Ministério Público e o Conselho Penitenciário."
"Segundo o brocado latino verba cum effectu sunt accipienda, não se presume na lei, palavras inúteis. Segundo Carlos Maximiliano deve-se dar "valor a todos os vocábulos e, principalmente, a todas as frases, para achar o verdadeiro sentido de um texto; porque este deve ser entendido de modo que tenham efeito todas as suas provisões, nenhuma parte resulte inoperativa ou supérflua, nula ou sem significação alguma."4
"A retirada do livramento condicional da enumeração do art. 70 não retira do âmbito de atribuições do Conselho Penitenciário a necessidade do seu parecer visto que tal enumeração não é exaustiva. Neste sentido MIRABETE assevera:
"A enumeração das atribuições do art. 70 não é exaustiva. Ao contrário, prevê a Lei de Execução Penal outras atividades do Conselho Penitenciário.
Incumbe-lhe também representar para a revogação do livramento condicional (art. 143); representar para que sejam modificadas as condições estabelecidas nesse benefício (art. 144); emitir parecer sobre a suspensão do curso do livramento condicional (art.145); representar para a declaração de extinção da pena privativa de liberdade ao expirar o prazo do livramento sem causa de revogação (art. 146) (...)".5
"Já em comentário ao livramento condicional, especificamente ao art. 131 da LEP, MIRABETE afirma:
"Preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos o livramento condicional será concedido pelo Juiz da execução (arts. 66, III, e; e 131 da LEP). Exigi-se, porém, obrigatoriamente um parecer a respeito da admissibilidade, conveniência e oportunidade do benefício pelo Conselho Penitenciário (arts. 70, inciso I, e 131 da LEP), bem como a audiência pública do Ministério Público (art. 132 da LEP). Trata-se de judicialização do procedimento executório, ao reverso do caráter administrativo que vem dominando essa matéria, em prejuízo da verdadeira natureza jurídica da execução penal. Embora não esteja o Juiz da execução adstrito às conclusões e pareceres, são eles de elevado valor na aferição dos requisitos necessários para a concessão do benefício e sua falta torna nula a decisão proferida."6
‘FEU ROSA também pugna pela necessidade do parecer do CONPEN:
"Realmente o Juiz não está vinculado a esse parecer, ou seja, não é obrigado a segui-lo. Mas não pode decidir sem sua prévia apresentação".7
"Por fim, demonstrado o entendimento uníssono da doutrina, entende Paulo Lúcio Nogueira (em comentário ao art. 131, LEP):
"O livramento é um direito do condenado ligado à sua liberdade, desde que preenchidos os requisitos legais para sua obtenção. É um incidente da execução da pena, e, por isso, concedido pelo Juiz das execuções penais, ouvido o Conselho Penitenciário e o Ministério Público."8
"Conclusão
"Vemos, portanto, que não ocorrem in casu as hipóteses elencadas no art. 2°, & 1°, da LICC, substituindo a eficácia do art. 131 da LEP, remanescendo a necessidade de parecer do CONPEN para a concessão de livramento condicional."
Em sua próxima reunião, a ter lugar em 14 de fevereiro, o Conselho Penitenciário de Minas Gerais irá deliberar sobre o assunto. A tendência atual é manter as atribuições do Conselho.
E, a julgar pelo entendimento expressado pelo Juiz da Vara de Execuções Criminais em Belo Horizonte, em Seminário que teve por finalidade precisamente discutir a nova lei, a atitude é de reservas e até de censura pelas frustrações por ela causadas.
O Juiz Herbert Carneiro, por exemplo, em sua intervenção, no Seminário, foi incisivo:
"Lamentavelmente, a proposta da legislação começou de uma forma e terminou de outra. Para mim, a lei 10.792 trouxe grandes frustrações, pois trata de forma ineficaz de muitos dispositivos, principalmente, por não levar em conta a estrutura falida do sistema prisional brasileiro". O magistrado fez um comparativo entre a lei antiga de Execuções Penais, a 7.210/84, e a 10.792/03. "Não tenho dúvida que o próximo passo do legislador, para atender o clamor público, será a admissão da prisão perpétua e da pena de morte no Brasil", analisou.
Herbert Carneiro lembrou que o propósito das leis deve ser o de devolver o cidadão para a sociedade, mas as modificações da nova proposta são, no mínimo, discutíveis e não vão atingir esse objetivo. O magistrado ainda fez duras críticas aos artigos que dão poder aos diretores dos estabelecimentos prisionais, que abordam a construção de penitenciárias e que falam sobre o interrogatório dos apenados que podem ser realizados pelos juízes diretamente nos presídios. "Se o Estado não tem condições de transportar o preso para o Fórum com segurança, como é que ele vai dar segurança aos magistrados dentro dos estabelecimentos prisionais"? Questionou. Ele finalizou, afirmando que a nova legislação trouxe mais retrocessos do que progressos.
Trata-se do seminário incluído nas comemorações da Semana da Justiça, dedicado à recente reforma processual penal, na qual, em 10 de dezembro de 2003, teceu diversas críticas à nova lei processual penal a Desembargadora JANE RIBEIRO SILVA, da 3ª Câmara Criminal do TJMG, cujo tom foi de crítica à nova lei, participaram dos trabalhos, além do Desembargador ANTONIO AUGUSTO MACEDO MOREIRA, o Professor JAIR LEONARDO LOPES, da Universidade Federal de Minas. (Fonte: TJ-MG, pesquisa via Internet).
5 - POSIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NO CONSELHO PENITENCIÁRIO NO RIO GRANDE DO NORTE
O Procurador Regional da República, Presidente do Conselho Penitenciário em Natal – RN, FRANCISCO CHAVES DOS ANJOS NETO, emitiu Parecer, em 2 de janeiro fluente, acolhido pela 5ª Vara da Justiça Federal naquele Estado, no Processo n° 2002.84.00.007636-2, em pedido de livramento condicional, nestes termos:
"À parte o advento da Lei n° 10.792, de 1º de dezembro de 2003, quando descuidadamente pretendeu excluir o Conselho Penitenciário de emitir parecer consultivo quando de pedidos de livramento condicional, o certo é que inadvertidamente restou incólume todo o capítulo dedicado à matéria na Lei de Execução Penal, cujo sentido, em sua essência, é não afastar tal órgão dessa incumbência histórica no trato da questão, é bem verdade que mitigada, mas nem por isso excluída de tal mister.
"Para começar, é só ter presente a dicção do art. 131 da Lei de Execução Penal, nos seguintes termos:
‘Art. 131. O livramento condicional poderá ser concedido pelo Juiz da execução, presentes os requisitos do art. 83, incisos e parágrafo único, do Código Penal, ouvidos o Ministério Púbico e o Conselho Penitenciário.’ (grifei).
"Trata-se, portanto, de um ato complexo do qual participam vários órgãos, aí incluídos o Ministério Público, o Conselho Penitenciário (havia, antes, um parecer criminológico da Comissão Técnica de Classificação existente em cada estabelecimento prisional), até desembocar na decisão final do magistrado.
"Registre-se, por oportuno, que, ao contrário do que possa aparentar, não me causa maior impacto a nova redação do art. 70, inciso I, da Lei de Execução Penal, a partir da redação patrocinada pela Lei nº 10.792, de 1º de dezembro de 2003, naquilo que aparentemente, repita-se, pretendeu afastar o livramento condicional do rol de atribuições do Conselho Penitenciário.
"A se abraçar tal perspectiva, então, numa interpretação extrema, chegar-se-ia ao absurdo de afastar o próprio Ministério Público de qualquer audiência prévia quando da concessão de livramento condicional, já que, taxativamente falando, não encontra tal atribuição no rol do art. 68 da mesma Lei de Execução Penal.
"Ocorre que, tratando-se, como efetivamente se trata, de um rol meramente exemplificativo, tal incumbência do Ministério Público pode ser encontrada, a partir de uma leitura sistemática, no art. 131 da mesma Lei de Execução Penal.
"Igual raciocínio se aplica ao Conselho Penitenciário, já que, a se entender que o rol do art. 70 do aludido diploma legal não encerra um sentido taxativo, é o bastante se apegar a uma interpretação sistemática até chegar ao aludido art. 131, cuja redação, acentua-se, mais uma vez, permaneceu incólume às modificações introduzidas pela nova legislação.
"Tenho defendido tal posição no próprio Conselho Penitenciário, do qual sou o seu Presidente, e, por coerência, não vejo como modificar tal posicionamento na presente quadra de análise."
O entendimento consubstanciado no parecer ora transcrito é o mesmo que tem sido adotado pelo Conselho Penitenciário no Rio Grande do Norte, consoante informou-nos por telefone seu ilustre Presidente.
6 - ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUANTO À INDISPENSABILIDADE DO PARECER DO CONSELHO PENITENCIÁRIO NOS LIVRAMENTOS CONDICIONAIS
Há numerosos precedentes da jurisprudência tanto do Supremo Tribunal Federal como do Superior Tribunal de Justiça, sempre a exigir o parecer do Conselho Penitenciário, além da observância dos demais requisitos objetivos e subjetivos estipulados na legislação e regulamentos, quando da análise dos pedidos de livramento condicional.
Como exemplo lapidar, podemos citar o voto do ilustre Ministro CID FLAQUER SCARTEZZINI no HC 5.423, conforme trechos abaixo transcritos:
"HC – LIVRAMENTO CONDICIONAL – PARECER DO CONSELHO PENITENCIÁRIO – OBRIGATORIEDADE.
"- Se o pedido de livramento condicional está tramitando normalmente perante o juízo da execução, e ali se aguarda a manifestação do Conselho Penitenciário, não há constrangimento ilegal nesta espera, posto que o art. 131 da LEP assim determina.
"- Ordem denegada."
Fundamentando, esclarece:
"Assim, e tendo em vista o art. 131, da Lei de Execuções Penais que determina que o livramento condicional será concedido pelo Juiz da execução, ouvidos o MP e o Conselho Penitenciário, não há qualquer constrangimento ilegal imputado ao paciente, quando seu pedido corre normalmente pelo Juízo próprio e aguarda-se a manifestação imprescindível do Conselho Penitenciário." (HC 5.423-RJ, Relator: Min. CID FLAQUER SCARTEZZINI, j. 11/03/1997, 5ª Turma, DJU 14.04.1997)."
Na mesma linha encontramos o posicionamento do Ministro FERNANDO GONÇALVES também do Superior Tribunal de Justiça, no HC nº 5.769, em voto acolhido pela unanimidade do Plenário da 6ª Turma, ao aduzir:
"PENAL. LIVRAMENTO CONDICIONAL. MAUS ANTECEDENTES. ART. 83, I DO CÓDIGO PENAL.
"1. O parecer favorável do Conselho Penitenciário, aliado à satisfação pelo sentenciado dos requisitos de ordem objetiva e subjetiva, autoriza o deferimento do pedido de livramento condicional que não deve ser simplesmente afastado sob fundamento da ausência de bons antecedentes, circunstância já sopesada na fixação da pena, acima do mínimo legal. Não se pode equiparar o tecnicamente primário ao reincidente, com exigência de cumprimento de mais da metade da pena. (HC 5.769-RJ, Relator: Min. FERNANDO GONÇALVES, j. 17/06/1997, 6ª Turma, DJU 04.08.1997)."
O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, no voto do Ministro ALDIR PASSARINHO, em acórdão colacionado por ALBERTO SILVA FRANCO e outros, in Código Penal e sua interpretação jurisprudencial – 1990 – pág. 437, determinou:
"O livramento condicional é instituto que visa a proporcionar a reintegração do delinqüente na sociedade. Se é certo que o parecer do Conselho Penitenciário foi favorável à concessão do benefício, verificando-se terem sido atendidos os requisitos objetivos necessários, e não havendo nada a demonstrar existirem elementos subjetivos que o desaconselham, e tendo-se em conta, ainda, que o seu deferimento baseou-se em razão que importa para a fixação da pena, mas não para negar-se o livramento, é de dar-se provimento ao recurso para conceder-se o benefício. (HC 5.769-RJ, Relator: Min. FERNANDO GONÇALVES, j. 17/06/1997, 6ª Turma, DJU 04.08.1997)."
Em outro julgamento, o Ministro EDSON VIDIGAL do Superior Tribunal de Justiça também demonstrou a importância da participação do Conselho Penitenciário em sede de processo penal, quando da revogação do Livramento Condicional previsto na Lei 7.210/84, como se transcreve abaixo:
"PROCESSUAL PENAL – RECURSO EM ‘HABEAS CORPUS’ - LIBERDADE CONDICIONAL – REVOGAÇÃO – NULIDADE – NÃO OBSERVÂNCIA DA LEI DE EXECUÇÕES PENAIS – PRÁTICA DE NOVO CRIME – DECRETAÇÃO DE NOVA PRISÃO.
"- Não observado o imprescindível processo legal determinado pela Lei de Execuções Penais, há que decretar a nulidade da revogação da Liberdade Condicional do acusado. (HC 591-MA, Relator: Min. EDSON VIDIGAL, j. 07/05/1990, 5ª Turma, DJU 11.06.1990)."
Segundo ensina, "a revogação prevista na Lei 7.210/84, art. 143, só pode ser decretada a requerimento do Ministério Público, mediante representação do Conselho Penitenciário, ou, de ofício, pelo Juiz, ouvido o libertado".
Verificamos também, recentemente, noutro voto do Ministro JORGE SCARTEZZINI, do Superior Tribunal de Justiça, no HC nº 11.278-SP, da 5ª Turma, conforme transcrito abaixo:
"EXECUÇÃO PENAL – LIVRAMENTO CONDICIONAL – FUGA DP ESTABELECIMENTO PRISIONAL – BENEFÍCIO NÃO FORMALIZADO – ORDEM DENEGADA.
"- Em se tratando de medida que tem como finalidade reintegrar indivíduo segregado à sociedade, a concessão da liberdade condicional subordina-se ao exame prévio de requisitos objetivos e subjetivos.
"- Os primeiros (objetivos) versam sobre a natureza e quantidade da pena, sobre o seu parcial cumprimento e da reincidência específica em crimes hediondos. Já os segundos (subjetivos) compreendem bons antecedentes, comportamento satisfatório durante o cumprimento da pena, além da prova de cessação da periculosidade para os condenados em crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa. Além desses requisitos estão alguns procedimentos específicos, como o descrito no art. 714, do Código de Processo Penal, a prova da reparação do dano, aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto, submissão do condenado a exame criminológico e elaboração de parecer do Conselho Penitenciário e levantamento das folhas de antecedentes e certidões das execuções penais." (HC 11.278-SP, Relator: Min. JORGE SCARTEZZINI, j. 15/06/2000, 5ª Turma, DJU 04.09.2000)."
Como se percebe facilmente, o entendimento acerca da imprescindibilidade do parecer do Conselho Penitenciário nos pedidos de livramento condicional, como já adotado pelo próprio Supremo Tribunal Federal, aliás, quando nem existia o art. 70, inciso I, da Lei nº 7.210, de 11 de junho de 1984, porque está contido no rol de atribuições de órgão consultivo e fiscal da execução da pena, sendo seguido pelo Superior Tribunal de Justiça.
Afinal, trata-se de um conselho formado por sete cidadãos, todos de idoneidade inquestionável, com nível de formação superior, além de integrado, desde sua origem, igualmente por dois membros do Ministério Público, um do Ministério Público Estadual e outro do Ministério Público Federal, e este é mais um dos numerosos motivos por que não pode ser tratado como se fosse uma instituição sem o prestígio que a tradição sempre confirmou de dar seu parecer isento de qualquer injunção de interesses não condizentes com a dignidade de seus integrantes.
A doutrina e a jurisprudência sempre consideraram os Conselhos Penitenciários como uma garantia de isenção e imparcialidade, principalmente no que se refere à possibilidade de
"(...) dar ao condenado a garantia de que, se ele satisfizesse as condições regulamentares, seria liberado, condicionalmente, no tempo mínimo fixado na lei".
Por essa razão é que foi instituído com o escopo de
"(...) estabelecer um processo que, afastando a intervenção meramente administrativa, permita a verificação das condições de admissibilidade por um conselho, composto por juristas, de médicos e de representantes do Ministério Público, examinando-se as possibilidades de colocação futura e de trabalho assegurado, até mesmo em serviços públicos, e finalmente a eficácia do amparo e da vigilância, superintendida por esse conselho auxiliado pelos patronatos". (Relatório do 10º Congresso Penal e Penitenciário Internacional de Praga de 1930, CANDIDO MENDES, apud ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de Processo Penal Brasileiro Anotado, 4ª edição, Editor Borsoi, Rio de Janeiro, 1956, Anotação nº 1485, p. 197).
Dessarte, o elevado grau de confiabilidade das decisões dos Conselhos Penitenciários historicamente se impôs, até mesmo perante o próprio Supremo Tribunal Federal, que, na opinião de alguns de seus Ministros, poderia até mesmo negar habeas corpus, adotando deliberação do Conselho Penitenciário, como ocorreu, por exemplo, em 24 de abril de 1940, no julgamento do HC nº 27.443, em Plenário, em que o Relator, Ministro JOSÉ LINHARES, assim se posicionou. (ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de Processo Penal Brasileiro Anotado, 4ª edição, Editor Borsoi, Rio de Janeiro, 1956, Anotação nº 1485, p. 198).
Bem antes, em Sessão Plenária de 6 de maio de 1935, o Supremo Tribunal Federal, acolhendo o voto da lavra dos Ministros CARVALHO MOURÃO e COSTA MANSO, no HC nº 25.755, em caso em que não havia Conselho Penitenciário, por isso que não houve sua manifestação a respeito do caso, também foi sugerido que se negasse o habeas corpus, porque não poderia ser apreciado pedido de livramento condicional independente da intervenção do Conselho Penitenciário, haja vista que:
"Se a lei exige que o Juiz decida em face do parecer desse Conselho, não vejo como se possa conceder a liberdade condicional independentemente do parecer". E, acrescentando que seria argumentar com abusos supor a recusa de parecer pelo Conselho, sustentou a inaplicabilidade do instituto do livramento condicional, onde não exista Conselho Penitenciário. (...) O Conselho Penitenciário é formado por técnicos, que acompanham o tratamento penal do recluso, e, assim, dispõem de elementos que nos faltam. Não é possível substituí-lo pelo parecer de um carcereiro ou diretor de cadeia comum, geralmente destituído de aptidão para apreciar o problema da regeneração do criminoso, e que procede impelido inevitavelmente pelas simpatias ou antipatias que inspirem os presos". (ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de Processo Penal Brasileiro Anotado, 4ª edição, Editor Borsoi, Rio de Janeiro, 1956, Anotação nº 1485, p. 198, apud Revista de Direito Penal, vol. 16, pp. 87-94).
Na mesma assentada, sustentou o Ministro Relator que, "embora o Juiz possa decidir contra o parecer, não pode julgar sem ele" e que, faltando o parecer, o Juiz ou o tribunal teria meios para obtê-lo,
"porque poderia ser feita uma diligência no sentido de o Conselho Penitenciário emitir o parecer que se reclamasse e, se recusasse, era o caso de demissão e imediata substituição dos conselheiros recalcitrantes e desobedientes. Este Tribunal tem autoridade para exigir, imperativamente, a elaboração do parecer. Não voto com essa diretriz porque acho que o Conselho, materialmente, estava impossibilitado de dar parecer, de vez que não funciona na cadeira onde se encontrava o preso." (ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de Processo Penal Brasileiro Anotado, 4ª edição, Editor Borsoi, Rio de Janeiro, 1956, Anotação nº 1485, p. 198, apud Revista de Direito Penal, vol. 16, pp. 87-94).
O habeas corpus foi concedido por maioria, tendo prevalecido o voto do Ministro BENTO DE FARIA, sustentando que obrigatória é a vista do pedido ao Conselho Penitenciário, para emitir parecer. Desde que este se recusara a dar parecer, o Tribunal deveria conceder o habeas corpus. Não foi adotada a solução radical, defendida por alguns Ministros do Supremo Tribunal Federal, de que inexistindo Conselho Penitenciário, inexistiria o livramento condicional.
A jurisprudência recente do Supremo Tribunal Federal também vinha prestigiando o parecer do Conselho Penitenciário, tendo-o considerado indispensável, inclusive nos casos de revogação do benefício, consoante se percebe do v. acórdão resumido na seguinte ementa:
"LIVRAMENTO CONDICIONAL. SUSPENSÃO (CPC, ART.732). É indispensável que o Juiz ouça o Conselho Penitenciário, embora lícito que mande desde logo recolher o condenado à prisão, quando o imponham as circunstâncias. Recurso provido em parte." (RHC 61.568-SP, RTJ 109/146).
No RHC 61.568-SP, prestigiando parecer do atual Procurador-Geral da República, Doutor CLÁUDIO FONTELES, assim votou o Ministro FRANCISCO REZEK, Jurista que representa, no momento, o Brasil na Corte de Haia:
"(...) pelo art. 727, verifica-se que "o livramento condicional poderá ser também revogado (isto é, além dos casos previstos no art. 726), se o liberado deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes da sentença, ou for irrecorrivelmente condenado", etc. Acrescenta o artigo 730 que "a revogação será decretada a requerimento do Ministério Público, mediante representação do Conselho Penitenciário ou dos patronos oficiais, ou da autoridade policial a quem incumbir a vigilância ou, de ofício, pelo Juiz,...". Ora, se o juiz, no caso de descumprimento, pelo liberado, de qualquer das obrigações constantes da sentença, pode revogar, ex officio, e não simplesmente suspender o livramento condicional, parece-me que, no caso do art. 732, pode suspender o benefício antes do parecer do Conselho Penitenciário. Manda a lei ouvir este órgão da administração da Justiça Penal, e assim, foi feito no caso dos autos, estando o Juiz à espera do parecer. Não manda, porém, a lei, que tal audiência seja prévia. Não se compreenderia, que, praticando o liberado uma infração penal grave, devesse o juiz da execução aguardar o parecer do Conselho Penitenciário, por vezes demorado, para somente depois recolher o condenado à prisão; mesmo porque essa medida é de natureza provisória, pois definitiva é a revogação do livramento, e esta, em caso de comissão de novo crime, só terá lugar depois do julgamento, e se resultar a condenação do acusado. (HC nº 38331-PR).
"(...) É certo que o juiz pode decretar, de ofício, a revogação do livramento quando descumpridas as obrigações impostas ao réu (arts. 727 e 730 do CPP), condicionada sua decisão pela oitiva prévia do próprio réu, e por nada mais. Se nesse caso, mais gravoso para o condenado, prescinde a lei da audiência do Conselho Penitenciário, não se há de desautorizar a suspensão do livramento condicional porque não precedida de parecer do Conselho. Esse entendimento se reforça na consideração de que a medida em exame é provisória; e, no caso concreto, foi requerida pelo Ministério Público.
"Sucede que, mesmo à luz do precedente mencionado, aquilo de que se pode abrir mão, em nome de uma interpretação sistemática de quanto circunda o art. 732 do CPP, é a antecedência do pronunciamento do Conselho. Deixar, simplesmente, de ouvi-lo é desprezar de modo ostensivo e intolerável o comando da lei." (RTJ, v. 109, pág. 146-148).
"Sucede que, mesmo à luz do precedente mencionado, aquilo de que se pode abrir mão, em nome de uma interpretação sistemática de quanto circunda o art. 732 do CPP, é a antecedência do pronunciamento do Conselho. Deixar, simplesmente, de ouvi-lo é desprezar de modo ostensivo e intolerável o comando da lei." (RTJ, v. 109, pág. 146-148).
"Na espécie, o juízo informante não dá notícia de que, mesmo após a decisão impugnada, tenha encaminhado o caso à consideração do Conselho Penitenciário.
"Para o estrito fim de que se promova a audiência prescrita pelo art. 732 do Código de Processo, e sem prejuízo da continuidade da custódia do paciente, concedo a ordem de habeas corpus, provendo assim, em parte, o recurso ordinário."
Este outro precedente não deixa qualquer dúvida quanto à imprescindibilidade da oitiva do Conselho Penitenciário:
"LIVRAMENTO CONDICIONAL. SUSTAÇÃO (CÓDIGO PROCESSO PENAL, ART. 732). NECESSIDADE DE AUDIÊNCIA DO CONSELHO PENITENCIÁRIO. ORDEM DE HABEAS CORPUS CONCEDIDA PARA ANULAR O DESPACHO QUE DETERMINOU A SUSTAÇÃO." (HC 52754-SP – DJU 25/10/1974).
Em seu voto, no HC 52754-SP, o Senhor Ministro RODRIGUES ALCKMIN decretou a nulidade do julgamento que suspendeu o gozo do livramento condicional sem oitiva do Conselho Penitenciário:
"Mas o art. 732 do C.P.Penal diz que "praticada pelo liberado nova infração, o juiz... poderá ordenar a prisão, ouvido o Conselho Penitenciário, suspendendo o curso do livramento condicional..."
"Na espécie, isso não se fez.
"Nem cabe alegar que o livramento podia ser revogado pela má conduta ou por transgressão de uma só das obrigações nele impostas.
"No caso, a sustação (não, revogação) somente se legitima nos termos do art. 732 do C.P. Penal que reclama a opinião do Conselho.
"Concedo a ordem em parte, para anular o despacho que determinou, sem obediência à exigência processual, a sustação do livramento." (STF – HC – 52.754-SP – DJU 20/10/1974).
Bem sabemos que os retrocessos constantes da nova e mal elaborada lei têm certa razão de ser relativamente a algum lugar em que as atribuições do Conselho talvez não sejam levadas tão a sério, com atrasos rotineiros, em prejuízo do direito de liberdade dos presos, ou mesmo em prejuízo da necessidade da pronta definição da existência ou não de certos direitos, tudo conforme registram os discursos e pareceres com certos desabafos contra a má qualidade dos serviços ou da própria escolha de conselheiros que possivelmente não tenham vocação para tão honroso e dignificante o cargo.
Mas isto, com certeza, constitui exceção excepcionalíssima e jamais a regra. E se em algum lugar o Conselho não está funcionando com a necessária eficiência, certamente o melhor caminho não será simplesmente partir para sua extinção. Talvez, o mais aconselhável seria o seu aperfeiçoamento, tornando, por exemplo, mais rigorosa a escolha de seus conselheiros, exigindo certos títulos indispensáveis ao exercício de suas atribuições, além de não deixar a escolha de cinco Conselheiros a livre critério apenas do Governador.
De qualquer forma, pensamos que seria melhor aperfeiçoar as instituições em vez de simplesmente tentar subtrair-lhe as atribuições, tentando destruí-las, por causa de casos, às vezes até mesmo de interesses pessoais contrariados.