Tributação das instituições de assistência social e sem fins lucrativos

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Neste estudo busca-se desenvolver uma linha de pesquisa voltada para o enquadramento das Associações sem fins lucrativos identificando possíveis benefícios tributários.

Das associações
As Associações são constituídas pela união de pessoas que se organizam para fins não econômicos, nos termos do artigo 53 do Código Civil.
Ademais, é considerada de assistência social a Associação que prestar serviços colocados à disposição da população em geral, em caráter complementar às atividades do Estado, conforme autoriza a Constituição Federal.
Importante frisar que o lazer, incluindo todas as atividades esportivas, é um direto social de todos defendido, inclusive, pelo artigo 6º da Constituição Federal.
Assim, podemos concluir que as entidades de assistência social têm como principal objetivo a realização e o desenvolvimento de atividades de interesse público, e sua origem muitas vezes decorre da ineficiência do poder público em atender as necessidades da sociedade.
Por fim, as Associações sem fins lucrativos são caracterizadas pela não distribuição dos lucros auferidos aos seus sócios.
Importante esclarecer que, em que pese a denominação dada pela Constituição, a limitação imposta às entidades sem fins lucrativos não se refere à aferição de lucro, mas sim à sua destinação.
Conseqüentemente, esse tipo societário não está impedido de obter lucro ao final do exercício fiscal, desde que, por imposição da legislação vigente, este lucro seja revertido integralmente na manutenção e no desenvolvimento de seus objetivos assistenciais.
Analisadas todas as características de uma Associação de assistência social e sem fins lucrativos, passaremos a analisar a imunidade tributária.

• Imunidade Tributária
Primeiramente, importante esclarecer que Imunidade Tributária é uma limitação constitucional ao poder de tributar da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Esta limitação poderá ser atinente a determinadas pessoas ou a determinados bens, a qual é determinada de acordo com o dispositivo constitucional que instituir a imunidade.
No presente parecer, tendo em vista as características da Liga de Esportes, abordaremos a Imunidade Tributária destinada às instituições de assistência social e sem fins lucrativos.
Tal imunidade encontra-se disposta nos artigos 150, VI, “c”, e 195, § 7º, ambos da Constituição Federal, os quais estão abaixo transcritos:
“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
VI – instituir impostos sobre:
(...)
c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;
(...)
§ 4º. - As vedações expressas no inciso VI, alíneas b e c, compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nela mencionadas.”
“Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;
b) a receita ou o faturamento;
c) o lucro;
(...)
§ 7º - São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei.”
Da leitura do artigo 150, VI, “c”, da Constituição Federal, verificamos que se trata de uma imunidade tributária destinada exclusivamente aos impostos federais, estaduais e municipais, que incidem sobre o patrimônio, a renda ou os serviços de instituições de assistência social sem fins lucrativos.
Por outro lado, o artigo 195, § 7º, da Constituição Federal, institui imunidade – equivocadamente nomeada de isenção – destinada às contribuições para a seguridade social incidentes sobre o lucro, a receita, o faturamento e a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados à pessoas físicas pela entidade sem fins lucrativos.
Dentre as contribuições para a seguridade social incluídas pela imunidade podemos citar a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), a Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Assim, as presentes imunidades não alcançam os demais tipos de tributos, quais sejam as taxas, as contribuições de melhoria e o empréstimo compulsório.
Por fim, ambos os artigos sob analise determinam que somente gozará de tais imunidades a pessoa jurídica de direito privado que atender aos requisitos da lei.
Trata-se de norma constitucional de eficácia contida, ou seja, a Constituição Federal dispôs acerca das regras gerais da imunidade e determinou que demais requisitos e orientações fossem definidos por lei.
Entretanto, somente a Lei Complementar é competente para regular qualquer tipo de imunidade tributária, conforme determina a própria Constituição Federal em seu artigo 146, inciso II.
Assim, em que pese haverem inúmeras Leis Ordinárias, Decretos e Instruções Normativas regulando as limitações ao poder de tributar em geral, a única Lei competente para regular tal dispositivo, incluindo as imunidades, é Lei Complementar, a qual analisaremos abaixo.
Antes de adentrarmos na análise da Lei Complementar, necessário abrir um parêntese para esclarecer, primeiramente, que nos casos em que houver Imunidade Tributária, em que pese a Constituição Federal dispensar o contribuinte do recolhimento de determinado tributo, este deverá cumprir todas as obrigações acessórias tributárias decorrentes de sua atividade, ou seja, emissão de notas fiscais, manutenção de seus livros contábeis e envio das declarações exigidas pela Receita Federal, podendo ser descritas, dentre outras, a Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF) e a Declaração Anual do Simples Nacional (DASN).
Isto, pois mesmo nestes casos, em que há a ocorrência da imunidade, há a ocorrência do fato gerador, entretanto este, por força de uma disposição constitucional, não é tributado.
Em segundo, para esclarecer que as imunidades acima analisadas somente serão aplicadas sobre o patrimônio, a renda, os serviços, o lucro, a receita, o faturamento e a folha de salários relacionados com as finalidades essenciais das entidades sem fins lucrativos, ou seja, sobre qualquer atividade que extrapole esse limite incidirão os impostos e contribuições abordados nos artigos supra transcritos.
Ante o exposto, realizadas as observações acima, passaremos à análise da Lei Complementar.

• Código Tributário Nacional – CTN
Em nosso ordenamento jurídico apenas a Lei nº 5.172 de 1966 (Código Tributário Nacional), devidamente recepcionada pela atual Constituição Federal como Lei Complementar, dispõe acerca da imunidade tratada pelos artigos 150, VI, “c”, e 195, § 7º, ambos da Constituição Federal.
Tal matéria é regulada pelos abaixo transcritos artigos do citado diploma legal:
“Art. 9º É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
IV - cobrar imposto sobre:
(...)
c) o patrimônio, a renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, observados os requisitos fixados na Seção II deste Capítulo;
(...)
§ 1º O disposto no inciso IV não exclui a atribuição, por lei, às entidades nele referidas, da condição de responsáveis pelos tributos que lhes caiba reter na fonte, e não as dispensa da prática de atos, previstos em lei, assecuratórios do cumprimento de obrigações tributárias por terceiros.
(...)
Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas:
I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título;
II - aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;
III - manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.
§ 1º Na falta de cumprimento do disposto neste artigo, ou no § 1º do artigo 9º, a autoridade competente pode suspender a aplicação do benefício.
§ 2º Os serviços a que se refere a alínea c do inciso IV do artigo 9º são exclusivamente, os diretamente relacionados com os objetivos institucionais das entidades de que trata este artigo, previstos nos respectivos estatutos ou atos constitutivos.”
Verifica-se que na regulamentação trazida pelos artigos acima, em especial pelo artigo 14, encontram-se alguns requisitos que deverão ser atendidos para o gozo das imunidades sob análise.
Assim, os requisitos que deverão ser atendidos pela pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos são:
 a não distribuição de qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título;
 a aplicação integral, no País, dos seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;
 a manutenção da escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.
Infere-se, pois que a pessoa jurídica de direito privado que atender aos requisitos acima dispostos poderá se beneficiar da imunidade de impostos e contribuições para a seguridade social instituídas pela Constituição Federal.
Importante repisar que as limitações ao poder de tributar instituídas pela Constituição Federal somente poderão ser reguladas por Lei Complementar, não cabendo à Lei Ordinária, Decretos, Instruções Normativas ou, muito menos, qualquer Órgão Público criar limitações ou requisitos para que a pessoa jurídica de direito privado goze das imunidades sob análise.

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• O Entendimento dos Tribunais Pátrios
Embora seja de competência exclusiva da Lei Complementar regular as limitações ao poder de tributar instituídas pela Constituição Federal, não é raro encontrarmos negativas dos órgãos públicos competentes ao gozo de imunidades por pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos, com fundamento em Leis Ordinárias, Decretos ou mesmo Instruções Normativas.
Contudo, em que pese citada arbitrariedade ser comumente praticada, tal situação poderá ser revertida na esfera judicial, conforme entendimento consolidado dos Tribunais Pátrios expresso na ementa abaixo transcrita.
CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. ARTS. 146, INC. II E 195, §7º, DA C.F. LEI N. 8112/91, ART. 55. ENTIDADE DE FINS FILANTRÓPICOS. EFEITO EX TUNC DA DECRETAÇÃO DE QUE DE UTILIDADE PÚBLICA FEDERAL RECONHECIDO.
As limitações constitucionais ao poder de tributar podem ser reguladas apenas por meio de lei complementar, ex vi do art. 146, inc. II, da Lei Maior, que assim dispõe, de forma expressa.
O art. 55 da Lei n. 8212/91, uma lei ordinária, não tem, portanto, poder normativo para operar restrições no tocante à imunidade concedida pela Carta da República, exercitando papel meramente procedimental, quanto ao reconhecimento de um direito preexistente.
A instituição de assistência social, para fins do alcançar do direito oferecido pelo art. 195, §7º, da Constituição Federal, tem de observar os pressupostos elencados no art. 14 da Norma Complementar Tributária. Nada mais. Ou, sob ótica distinta, tem direito à imunidade tributária, no momento em que perfaz o caminho das exigências previstas no Código Tributário Nacional.
Com efeito, o certificar da instituição como de fins filantrópicos e o seu decretar como de utilidade pública federal têm eficácia meramente declaratória e, portanto, operam efeitos ex tunc, haja vista a declaração dizer, sempre, respeito a situações preexistentes ou fatos passados, motivo porque revolve ao momento constitutivo da realidade jurídica ensejadora da imunidade.
Não tendo os pressupostos revelados pelo art. 55 da Lei n. 8212/91 a característica de conferir novo status à entidade de fins filantrópicos, senão de evidenciá-los, em tempo posterior, não há que se falar em existência de crédito tributário oriundo do não pagamento de contribuição patronal, por instituição que lhe é imune, sendo devida, pois, a Certidão Negativa de Débito solicitada. A entidade considerada de fins filantrópicos não está sujeita ao pagamento de imposto não somente a partir do requerimento, mas, uma vez reconhecida como tal, desde a sua criação. Recurso especial não conhecido. Acórdão regional mantido. Acórdão Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Francisco Peçanha Martins, Eliana Calmon, Franciulli Netto e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator. (STJ, REsp 413728 / RS, Relator Ministro PAULO MEDINA, DJ 02/12/2002 p. 283)

• Conclusão
Ante todo o exposto, concluímos que as Associações de assistência social e sem fins lucrativos poderão usufruir das imunidades instituídas pelos artigos 150, VI, “c”, e 195, § 7º, ambos da Constituição Federal, desde que atendidos os requisitos abaixo:
 a não distribuição de qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título;
 a aplicação integral, no País, dos seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;
    a manutenção da escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.
Ademais, importante ressaltar que o Poder Executivo por vezes impõe restrições ao usufruto das citadas imunidades com base em disposições de Lei Ordinária, Decretos ou mesmo Instruções Normativas, sendo certo que tais disposições são inconstitucionais, conforme elucidado acima.

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Sobre os autores
André Pinguer Kalonki

Advogado especialista em Direito Tributário

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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