Dispõe o artigo 1723 do Código Civil: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.”
Mesmo depois de catorze anos da sua publicação, ainda há uma grande dificuldade no entendimento e na caracterização da União Estável dentro da comunidade jurídica e da própria sociedade. É comum se ver e ler tentativas de caracterizá-la em abstrato (assim como muitos outros institutos jurídicos por nossas bandas). Vale lembrar que o dispositivo é texto de norma e não a norma em si, que só é construída no caso (Muller).
Muito embora seja possível extrair da dicção do mencionado artigo elementos subjetivos e objetivos acerca da caracterização da União estável, não é possível reconhecê-la peremptoriamente em abstrato. É a faticidade (mais até do que a vontade das partes) que irá caracterizá-la, já que sua natureza jurídica é de ato-fato jurídico. Assim, só existe união estável em concreto.
É possível, dessa forma, que mesmo que um casal se imagine não vivendo em união estável, possa efetivamente estar sob essa condição, dada a possível realidade daquela união entre eles demonstrar o contrário. Ou ainda um casal que se imagine vivendo sob o fenômeno e não esteja, pela falta de algum elemento ou a incidência de impedimento matrimonial, por exemplo.
A análise, além de ser feita exclusivamente em casos concretos, deve ser bastante acurada e a conjugação dos elementos inequívoca, mesmo que subjetivos. A união estável é entidade familiar reconhecida constitucionalmente e cada vez mais equiparada ao casamento, mormente pelo STF.
Dentre os elementos caracterizadores da união estável, estipulados pelo legislador civil, destaca-se como o mais importante, indispensável a rigor, o “objetivo de constituir família”. Como dito, união estável é família. E é bom ressaltar para estancar eventuais dúvidas que isso não deve ser vislumbrado como algo futuro ou desejoso, mas sim atual e efetivo. É dizer: se o casal em análise vive atualmente como família.
Tal redação do elemento subjetivo da espécie pode gerar divergências, uma vez que se for perguntado a um casal de namorados se ele tem objetivo de constituir família, na maioria dos casos, certamente, a resposta será positiva, traçando-se, no entanto, um intuito futuro. Daí a necessidade da atualidade familiar do casal.
Mesmo que haja uma aparência de preenchimento dos elementos (objetivos e subjetivos), é necessária a concretude para uma definição. A simples narração de informações abstratas (como comumente acontece em sala de aula ou até mesmo na prática jurídica) não permite afirmar se estamos ou não diante de uma união estável.