A teoria da desconsideração da personalidade jurídica no Código de Defesa do Consumidor

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3. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica era aplicada no Brasil até mesmo quando não havia disposição de lei que autorizasse sua imposição. Os tribunais aplicavam tal instituto analogicamente, utilizando, deste modo, o dispositivo 135 do Código Tributário Nacional, que tem o seguinte teor:

Art. 135. Caput. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes e infração de lei, contrato social ou estatutos

I – as pessoas referidas no artigo anterior;

II – os mandatários, prepostos e empregados;

III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.

Gagliano40 e Pamplona Filho enfatizam que “coube à jurisprudência, acompanhada eventualmente por leis setoriais, o desenvolvimento da teoria no Direito Civil brasileiro”.

O primeiro artigo de lei a tratar sobre a teoria da desconsideração no Brasil foi o 28 do Código de defesa do consumidor, que em seus parágrafos autoriza o magistrado a desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade no momento em que houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social, tudo isso em face do consumidor. E mais, nos casos de falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica produzido por má administração, e sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.

De acordo com Venosa41 “ainda que não se trate de típica relação de consumo, impõe-se que o princípio seja aplicado por nossos tribunais, sempre que o abuso e a fraude servirem-se da pessoa jurídica como escudo protetor”.

Venosa42 disserta que, ainda quando não havia norma específica sobre o assunto, a Consolidação das Leis do Trabalho já dispunha em seu art. 2º, §2º:

Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinado.

A teoria da desconsideração resume-se em restringir a utilização imprópria da personalidade jurídica. Assim, Gonçalves43 afirma que as “pessoas inescrupulosas têm-se aproveitado desse princípio, com a intenção de se locupletarem em detrimento de terceiros, utilizando a pessoa jurídica com uma espécie de ‘capa’ ou ‘véu’ para proteger os seus negócios escusos”.

Na lição de Diniz44, “a doutrina da desconsideração da pessoa jurídica visa impedir a fraude contra credores, levantando o véu corporativo, desconsiderando a personalidade jurídica num dado caso concreto [...]”.

No mesmo sentido, Diniz45 suscita que:

A teoria da desconsideração da personalidade jurídica foi desenvolvida pelos tribunais [...] tendo em vista aqueles casos concretos, em que o controlador da sociedade a desviava de suas finalidades, para impedir fraudes mediante o uso da personalidade jurídica, responsabilizando seus membros.

Compartilhando dos mesmos ensinamentos, Gonçalves46 sustenta que:

Permite tal teoria que o juiz, em casos de fraude e de má-fé, desconsidere o princípio de que as pessoas jurídicas têm existência distinta da dos seus membros e os efeitos dessa autonomia, para atingir e vincular os bens particulares dos sócios à satisfação das dívidas da sociedade ([...] erguendo-se o véu da personalidade jurídica).

Assim, visando coibir fraudes mediante o uso da personalidade jurídica, é que se deu o nascimento da teoria da desconsideração da personalidade jurídica.


4. A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Poucos doutrinadores se dedicaram ao estudo das formas processuais da desconsideração da personalidade jurídica no Código de Defesa do Consumidor. Ademais, nas palavras de Freitas47 pode-se concluir que, pouco material jurisprudencial nos traz qual o tratamento que tem sido dispensado pelo Judiciário no tocante à teoria da desconsideração da personalidade jurídica no Código de Defesa do Consumidor.

E Freitas48 assevera que:

[...] não obstante quase não encontrarmos julgados a respeito da aplicação específica do art. 28 do Código e Defesa do Consumidor, isso não significa que sua aplicação tenha sido tranquila. Pelo contrário, já pela leitura do dispositivo, encontramos sérios problemas para a compreensão da mens legis, do alcance do dispositivo.

A mesma autora salienta que o art. 28 do Código de Defesa do Consumidor, o qual trata sobre a teoria da desconsideração da personalidade jurídica nas relações de consumo, não é nada transparente, tendo em vista que existem interrogações sobre determinados pontos que precisam ser esclarecidas diz Freitas49.

Existem questionamentos sobre a legitimidade passiva, fala Freitas50 também sobre a “[...] necessidade ou não de ação própria para o reconhecimento da fraude e decorrente da desconsideração da personalidade jurídica, bem como o momento adequado para decretar a desconsideração, também geram sérias dúvidas”.

Tais questionamentos elencados acima serão tratados adiante, onde faremos um exame esmiuçado do art. 28, caput e parágrafos, do Código de Defesa do Consumidor.

Porém, para que seja analisado o referido dispositivo é necessário abordar, primeiramente, acerca dos institutos jurídicos Consumidor e Relação de consumo, o que será visto nos tópicos subsequentes.

4.1 Consumidor

O legislador trouxe a definição de consumidor no diploma jurídico que trata das relações de consumo, o Código de Defesa do Consumidor no seu art. 2º, caput e parágrafo único, foi extraída a seguinte definição:

Art. 2º. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.

O consumidor é associado à figura de trabalhador ensina Freitas51, aquele que trabalha para sobreviver e sustentar sua família. Por esta razão que o consumidor é a pessoa mais importante nas relações de consumo.

O conceito de consumidor se torna completo quando se analisa o art. 2º conjuntamente com os arts. 17 e 29 também do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:

Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.

Art. 29. Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas.

Neste sentido, Nunes52 dispõe que:

[...] a definição de consumidor do CDC começa no individual, mais concreto (art. 2º, caput), e termina no geral, mais abstrato (art. 29). Isto porque, logicamente falando, o caput do art. 2º aponta para aquele consumidor real que adquire concretamente um produto ou um serviço, e o art. 29 indica o consumidor do tipo ideal, um ente abstrato, uma espécie de conceito difuso, na medida em que a norma fala da potencialidade, do consumidor que presumivelmente exista, ainda que possa não ser determinado.

Logo, Nunes Junior53 escreve que consumidor “[...] é aquele que retira da cadeia de produção um bem ou produto; em outras palavras, não o adquire, por exemplo, com o intuito de revenda”.

Sobre a conceituação de consumidor trazida pela lei consumerista, constituiu-se duas correntes doutrinárias, a finalista e a maximalista. Para isso, Nunes Junior54 aponta que a corrente finalista, deve interpretar a figura do consumidor de uma forma restrita, atenuando a incidência do Código, aplicando, apenas, nos casos de real existência de um ente inferior, hipossuficiente. Já corrente maximalista preceitua que a Lei 8.078/90 trouxe normas para reger tudo que se refere ao consumo, atingindo a todos os entes que participam do mercado econômico, interpretando, assim, literalmente o preceito legal em comento.

Destarte, de Nunes Junior55 extrai-se que a lei consumerista veio para dar assistência aos economicamente débeis, e não para resolver lides referentes às relações comerciais.

Destaque-se, contudo, que nada obsta que uma pessoa jurídica figure – com justiça – em uma relação de consumo no pólo hipossuficiente. Por exemplo, uma empresa adquire equipamento de proteção para seus empregados, ou ainda cortadores de grama para manter higienizados seus campos. Em ambos os casos, produtos totalmente desvinculados de sua atividade produtiva, não consistindo os bens como aqueles de capital. Obviamente, a empresa não ficará à míngua de proteção, pode não ter a malfadada inferioridade econômica, mas certamente não tem o domínio situacional e da informação técnica.

Portanto, não obstante o Código de Defesa do Consumidor fosse criado para proteger o consumidor – pessoa física –, o vulnerável, o fraco; o Código também dá guarida às pessoas jurídicas que se encontram na situação de consumidoras, consoante se extrai do exemplo supramencionado.

Sobre o aspecto do consumidor por equiparação, o qual está inserido no parágrafo único do art. 2º do Código de defesa do consumidor, em que o legislador considerou também consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, traz-se à baila o seguinte exemplo de Nunes Junior56:

[...] vislumbrando que uma partida de caixas de leite esteja contaminada, não é necessário que se aguarde a aquisição ou o consumo de uma destas caixas para que se mobilize a aplicação do Código. Havendo uma coletividade de pessoas exposta a eventual consumo de produto inadequado, já se forja o pressuposto de incidência das normas protetivas do consumidor.

Diante disto, o fato do legislador explanar, no art. 2º do CDC, acerca da categoria dos indetermináveis, torna possível a defesa dos respectivos direitos mediante instrumentos de tutela coletiva.

4.2 A teoria da desconsideração e as relações de consumo

Colhe-se que a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, no que diz respeito às relações de consumo, está fundamentada no art. 28 do Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista que nesse artigo encontram-se as hipóteses permissivas do emprego da teoria.

Na lição de Freitas57, o Estado promove os direitos do consumidor assim:

No Brasil, por força de disposição constitucional, os direitos do consumidor são elevados à categoria de direitos constitucionais (art. 5º - XXXII – “O Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do Consumidor). A lei mencionada no texto da Constituição é a de número 8.078/90, o Código do Consumidor. Pela primeira vez, há em um texto de lei aprovada a referência clara e inequívoca da desconsideração da personalidade jurídica, conforme se extrai da leitura do art. 28 do referido Codex. O art. 28 do Código de Defesa do Consumidor, objeto de estudo deste livro, dispõe sobre as hipóteses em que a desconsideração da personalidade jurídica torna-se possível nas relações de consumo. A desconsideração consistiria em um reflexo, uma decorrência da violação de lei. Deve-se reconhecer a ineficácia da personalidade jurídica apenas em relação ao caso em que houver fraude.

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O art. 28, caput, do Código de Defesa do Consumidor preceitua que:

O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

O que se diz no art. 28 em análise é que, para salvaguardar o direito do consumidor, o juiz fica autorizado a desrespeitar o princípio da autonomia da pessoa jurídica, aplicando a teoria da desconsideração nos casos de abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social, garante Saad58.

Nas mesmas palavras Rocha59 enuncia que:

Como o CDC faz parte de um sistema jurídico protetivo, entende-se que as hipóteses legais para a desconsideração da personalidade jurídica, previstas em seu art. 28, caput, devem ser analisadas objetivamente, sem qualquer indagação de dolo ou culpa do fornecedor. Exigir-se que o consumidor prove as hipóteses do art. 28, do CDC, sob o ângulo subjetivo, seria o mesmo que conceder ao consumidor o direito de ação para desconsiderar a personalidade jurídica do fornecedor e, ao mesmo tempo, inviabilizá-la, devido à sua vulnerabilidade e hipossuficiência.

Ademais, existe uma polêmica doutrinária no que tange ao fato de que o caput do art. 28 dispõe que é uma faculdade do juiz desconsiderar a personalidade jurídica de uma sociedade, o que gera controvérsias.

Neste sentido, Saad60 enuncia que “[...] essa faculdade converte-se em dever depois de feita a prova do prejuízo do consumidor devido a uma das circunstâncias elencadas nesse mesmo art. 28”.

Freitas61 certifica que:

Em uma primeira leitura do caput do art. 28 do Código de Defesa do Consumidor, o leitor desavisado poderia ser induzido a concluir que, em decorrência do verbo poder, mesmo com a devida demonstração dos requisitos explicitados no dispositivo legal, o magistrado pudesse, por livre escolha, deixar de aplicar a desconsideração.

[...] Diante do exposto, só resta concluir que mesmo que a lei envolva certa análise subjetiva por parte do julgador, esse, ao julgar, deverá sempre observar a finalidade da lei. Assim, a desconsideração da personalidade jurídica deve ser aplicada tendo em vista a equidade, os princípios gerais do direito, além dos limites dispostos no caput e nos parágrafos do art. 28 do Código de Defesa do Consumidor.

Deste modo, o juiz é autorizado a desconsiderar a personalidade jurídica de determinada sociedade e imputar a responsabilidade diretamente aos sócios, desde que haja prejuízo ao consumidor. Neste sentido, leciona Garcia62:

Questão controvertida é se o juiz poderia desconsiderar a personalidade jurídica das empresas de ofício ou se dependeria de requerimento da parte. Sendo as normas consumeristas consideradas de ordem pública e de interesse social, o juiz, verificando qualquer das hipóteses presentes no art. 28, poderá imputar a responsabilidade diretamente aos sócios, inclusive de ofício, de modo a tutelar os consumidores, considerados vulneráveis nas relações contratuais.

Sequencialmente, Nunes63 pontua que o caput do art. 28 do documento Consumerista faz alusão ao fato de que a desconsideração ocorrerá quando “em detrimento do consumidor”. O sentido destas palavras é o da constatação do fato em que o consumidor experimentou certo dano por vício ou defeito do serviço ou produto por quebra de contrato, nulidade ou descumprimento de cláusula, por publicidade abusiva ou enganosa, prática abusiva etc.

Rachel Sztajn, citado por Moraes64, sustenta que:

[...] na primeira parte do caput do artigo em foco, são, na realidade, hipóteses que gerariam a imputação direta dos reais agentes à responsabilidade. E propõe que se crie uma solidariedade de sócios e/ou administradores da sociedade por danos causados aos consumidores e que a sociedade personificada não ressarciu.

Sobre as hipóteses elencadas na primeira parte do caput do art. 28, Saad65 distingue-as:

Exemplificando, configura-se abuso de direito e permite ao juiz desconsiderar a personalidade jurídica se um empresário, para fugir aos efeitos de uma ação coletiva, transfere parte substancial de seu patrimônio para uma outra sociedade.

O “excesso de poder” [...] consiste na prática de ato para o qual não está o administrador autorizado pela lei ou pelo contrato social, os quais impõem limites ao seu poder.

[...]

Isto não se confunde com a “infração da lei” que também autoriza a questionada desconsideração e que se define como ato proibido pela lei ou que viole uma de suas normas.

“Violação dos estatutos ou contrato social” ocorre quando o administrador age de modo contrário às disposições dos atos constitutivos da sociedade.

Freitas66, sobre a primeira parte do art. 28, destaca que a lesão dos interesses do consumidor é elemento que integra a hipótese de desconsideração, ou seja, para que ocorra a desconsideração da personalidade jurídica, o uso abusivo ou ilícito deve incidir em face do consumidor. A desconsideração será sempre a exceção, desse modo, deve ser aplicada somente em casos extremos em que a empresa não tiver patrimônio para ressarcir o dano.

Logo, caso a empresa tenha recursos para reparar os prejuízos que tenha causado ao consumidor, torna-se desnecessário o emprego da teoria da desconsideração da personalidade jurídica.

Na segunda parte do caput do art. 28 trata-se da desconsideração da personalidade jurídica nos casos de falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.

Na primeira hipótese, que é a falência, Rocha67 lembra “sob o enfoque jurídico, é o estado do comerciante que, ilegalmente, com dolo ou culpa, deixa de adimplir obrigação líquida, certa e exigível”.

Na segunda hipótese, insolvência, também Rocha68 escreve que “[...] é o estado do patrimônio de alguém pelo qual se revela incapaz de fazer frente aos débitos que o oneram”.

Na terceira hipótese, encerramento, “é o encerramento da pessoa jurídica por má administração, motivo para aplicar-se o art. 28, que trata sobre a desconsideração da personalidade jurídica”, nas palavras de Rocha69

E, por fim Rocha define70:

A quarta hipótese é a inatividade da pessoa jurídica decorrente de má administração, sendo inegável que se desconsiderada a personalidade jurídica neste caso, o elemento imputável para a dita desconsideração é o objetivo, como objetiva é a responsabilidade adotada no CDC para as relações de consumo.

Freitas71 narra que:

[...] constata-se a presença de um elemento que não se relaciona de forma específica aos interesses do consumidor. Trata-se de “má administração” da pessoa jurídica, que não deve ser confundida com as práticas abusivas explicitadas logo no início do artigo. A má administração da pessoa jurídica refere-se aos atos de gerência incompetente [...]. Não obstante a má administração acabar muitas vezes, de forma indireta, lesando consumidores, não se pode afirmar que alguém vai administrar mal uma empresa visando fraudar direitos do consumidor.

A desconsideração se produz exclusivamente em função do estado de insolvência ou encerramento das atividades da empresa, motivados por má administração, tendo em vista que não poderá ser desconsiderada a personalidade jurídica da empresa que, mesmo que a insolvência e/ou encerramento das atividades da empresa decorram de uma boa administração.

Assim, se a empresa for próspera, bem administrada, mesmo que esta venha a causar prejuízos ao consumidor e, posteriormente, encerre suas atividades, não caberá a desconsideração de sua personalidade jurídica garante Freitas72.

O §1º do artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor foi vetado pelo Presidente da República, no entanto, é necessário fazer uma análise sobre este parágrafo.

O referido parágrafo era redigido da seguinte forma:

A pedido da parte interessada, o juiz determinará que a efetivação da responsabilidade da pessoa jurídica recai sobre o acionista controlador, o sócio majoritário, os sócios-gerentes, os administradores societários e, no caso de grupo societário, as sociedades que a integram.

As razões do veto, Moraes73 escreve que foram remetidas ao Presidente do Senado Federal portando o seguinte teor:

O caput do art. 28 já contém todos os elementos necessários à aplicação da desconsideração da personalidade jurídica, que constitui, conforme doutrina amplamente dominante no direito pátrio e alienígena, técnica excepcional de repressão a práticas abusivas.

Reside uma polêmica acerca do presente veto. Zelmo Denari, Moraes74 entende que:

[...] Da simples leitura dessas razões se infere que, por um equívoco remissivo, o veto recaiu sobre o §1º, quando, na realidade, deveria versar seu §5º, que, despassando os limites pressupostuais da fraude e do abuso de direito, desconsidera a pessoa jurídica, sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.

Contrapondo o entendimento de Zelmo Denari, Fábio Ulhoa Coelho, citado por Moraes75, enuncia que:

[...] o veto está correto, uma vez que o dispositivo não mencionava as pessoas sobre as quais iria recair a responsabilidade ao se tratar de associações ou fundações utilizadas ilicitamente. Também o mau uso das sociedades comerciais pode se caracterizar através de atitudes praticadas por sócios minoritários, os quais não estão elencados no §1º. E justifica que, em se tratando de uma mera exemplificação, seria mais conveniente deixar o tratamento do tema à doutrina e a jurisprudência.

Já Saad76 coaduna seu entendimento com as razões do veto que foram proferidas pelo Presidente da República, quando diz que “[...] a norma é redundante, pois no caput do artigo já se encontram todos os elementos necessários à proteção do consumidor”.

Para este documento monográfico será adotado o entendimento do jurista Eduardo Gabriel Saad, pelo fato de que está em harmonia com a doutrina majoritária.

Logo, para Freitas77 o caminho mais adequado seria o de compreender que o §1º do art. 28 do CDC, não deve ser completamente afastado, podendo, inclusive, ser evocado pelos interessados e aproveitado pelo magistrado para solucionar controvérsias que envolvam legitimidade passiva.

Diante dos posicionamentos expostos acima, pode-se concluir que eles são um tanto quanto dispares, entretanto, para o presente artigo será adotada a tese de Luciano Amaro, que preceitua que a interpretação que se deve dar é a teoria da desconsideração deve ser empregada para, preliminarmente, afastar obstáculos que impossibilitem o ressarcimento de prejuízos causados ao consumidor e, posteriormente, haver a reparação do dano. Tal tese também é preservada por Márcio André Medeiros Moraes que entende ser esta mais coerente.

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Sobre os autores
Cristiano Poter

Advogado. OAB/PR 68402. Poter Advocacia. Pós-Graduado em Direito Tributário pela UCAM/RJ.

Helena Nickel Poter

Advogada. Advocacia Nickel e Poter. Pós-Graduada em Direito de Família pela UCAM/RJ.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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