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Nova Cofins e novo Pis: o princípio da igualdade

04/06/2004 às 00:00
Leia nesta página:

1. Breve Introdução.

É de conhecimento geral que as Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003 instituíram a nova sistemática do PIS e da Cofins, criando a chamada "não-cumulatividade" das contribuições e majorando suas alíquotas para 1,65% e para 7,6%, respectivamente.

Porém, nem todas as Pessoas Jurídicas estão sujeitas à nova Legislação, posto que, as referidas leis estabeleceram que aquelas sociedades que adotam o Regime do IRPJ do "Lucro Presumido" ou do "Lucro Arbitrado" deverão continuar a recolher tais contribuições de acordo com a Lei 9.718/99.

Tais leis também determinaram que estas empresas, por estarem sujeitas à Lei de 1999, não teriam direito aos créditos de ambas contribuições, ou seja, tais pessoas jurídicas continuarão a recolher as alíquotas de 0,65% do PIS e de 3% da COFINS, sendo vedada a apuração e aproveitamento dos valores destes tributos que incidiram na aquisição de seus insumos (art. 10, II da Lei 10.833/2003 e art. 8º, II da Lei 10.637/2002).

Em suma, a legislação federal que trata das contribuições supra mencionadas trouxe, como um dos aspectos do critério material do antecedente normativo, o Regime de Tributação do Imposto de Renda adotado pela Pessoa Jurídica, ou seja, para preencher a Hipótese de Incidência da nova Cofins e do novo PIS, não basta auferir receitas, deve estar enquadrada no Regime de Lucro Real.

Portanto, o regime de tributação do Imposto de Renda constitui um "critério de discrímen" disposto na norma visando a adoção de um tratamento jurídico diversificado. Neste sentido, mister verificar se tal critério afronta o "princípio da igualdade" da Constituição Federal.


2. Breve Explicação sobre o "Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade"

O ilustre professor e doutrinador Celso Antônio Bandeira de Mello nos ensina, na brilhante obra "Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade" (Ed. Malheiros), quais os critérios para a identificação do desrespeito à Isonomia, então vejamos quais as suas principais considerações.

Devemos entender que o Princípio da Igualdade, previsto no artigo 5º caput da nossa Carta Magna, nas palavras do filosofo Aristóteles, prescreve que "a igualdade consiste em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais". Porém diante desta afirmação, surge a principal indagação "quem são os iguais e quem são os desiguais?", ou melhor, "qual o critério legitimamente manipulável que autoriza distinguir pessoas e situações para fins de tratamentos jurídicos desiguais?".

Assim, somente após obtermos respostas às tais indagações é que conseguiremos lograr adensamento do citado primado constitucional para que consigamos a sua aplicação segura.

Para que as diferenciações possam ser adotadas sem a quebra da Isonomia, devemos analisar três aspectos:

i) O Fator de Desigualação.

Neste ponto, há dois requisitos a serem observados: (a) A lei não pode adotar um critério tão específico que singularize um sujeito específico que é acolhido pelo regime peculiar da norma. (b) as pessoas e situações desequiparadas pela regra devem ser efetivamente distintas entre si, ou seja, possuam características, traços, nelas residentes, diferenciados.

ii) Correlação Lógica entre o Fator de Discrímen e a Desequiparação procedida.

Este segundo requisito reporta-se à correlação lógica abstrata existente entre o fator de desequiparação e a disparidade estabelecida no tratamento jurídico diversificado, ou seja, deve-se verificar se há justificativa racional, ou seja, fundamento lógico para, à vista do aspecto diferencial adotado, atribuir o tratamento específico em razão da desigualdade.

iii) Consonância da Discriminação com os Interesses Protegidos na Constituição.

Em outras palavras, não basta que a diferença possua suficiência para discriminações legais, e que possa-se estabelecer racionalmente um nexo entre a diferença e um conseqüente tratamento diferenciado. Requer-se, ainda, que o vínculo demonstrável seja constitucionalmente pertinente, ou seja, que tal tratamento diferenciado seja compatível com o sistema constitucional.

Concluindo, mister se faz averiguar, de um lado, aquilo que é adotado como critério de descrímen; de outro lado, deve-se investigar se há fundamento lógico para se atribuir tratamento jurídico diferenciado diante do traço desigualador acolhido, em função da desigualdade proclamada; e finalmente é imprescindível verificar se o fundamento racional é afinado com os preceitos constitucionais.


3. Inconstitucionalidades das Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003.

Após a breve, porém elucidativa explanação dos ensinamentos do eminente prof. Celso Antonio Bandeira de Mello, se faz mister averiguarmos se as normas jurídicas emanadas dos enunciados prescritivos acima guardam consonância com o Princípio da Igualdade.

Conforme visto anteriormente, a legislação federal adotou como critério de descrímen o "Regime de tributação do Imposto de Renda" adotado pela Pessoa Jurídica, e em seu conseqüente normativo prescreve que aquelas sociedades que estiverem regidas pelo regime do Lucro Presumido ou Lucro Arbitrado, não terão suas alíquotas majoradas e não poderão beneficiar-se dos créditos dos seus insumos.

A primeira indagação que se faz é: O Regime de apuração do Imposto de Renda adotado é uma característica inerente aos contribuintes que possa diferenciá-los uns e outros, ou seja, por este critério de discriminação é possível diferenciar uns e outros, a fim de dar à uns tratamento desigual aos outros ?

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Entendemos que não, visto que qualquer Pessoa Jurídica que preencher os requisitos legais pode adotar uns dos Regimes de Apuração do IR, sendo possível ainda, entre um exercício e outro, à conveniência da administração da sociedade, alterar o regime, ou seja, migrar de um regime para outro.

Portanto, o "Regime de Apuração do Imposto de Renda" adotado pela Pessoa Jurídica não é uma característica ou uma situação que possa servir de critério de diferenciação.

É necessário, ainda, averiguar se há correlação lógica entre o critério de diferenciação e o tratamento jurídico diferenciado trazido pelas normas jurídicas em estudo.

Também entendemos que não há tal fundamento racional, ou seja, não se vislumbra fundamento lógico para que a adoção de um determinado Regime de Apuração do IR justifique que uns tenham direito ao crédito calculado sobre os insumos e outros não, ou ainda, que uns vejam sua carga tributária majorada e outros não em virtude da forma contábil de apuração do IR.

Portanto, as enunciações normativas quanto ao critério de descriminação previstos na legislação em estudo não guardam correlação lógica com o respectivo tratamento jurídico diferenciado.

Por fim, mister averiguar se tal diferencial se encontra em consonância com o Sistema Constitucional.

Neste sentido, também entendo que há afronta a Princípios Constitucionais, entre eles afronta ao Princípio da Capacidade Contributiva, visto que em muitos casos (ex. Prestadoras de Serviços) há tamanho aumento da carga tributária que poderá acarretar inviabilidade da continuidade do negócio pelo alto custo fiscal instituído.


4. Conclusão.

A Título conclusivo, diante o estudo a respeito do "conteúdo jurídico do Princípio da Igualdade" trazido ao conhecimento da comunidade jurídica pelo ilustre jurista Celso Antonio Bandeira de Mello, podemos afirmar que os preceitos legais do artigo 8º, inc. II da Lei 10.637/2002 e do artigo 10, inc. II da Lei 10.833/2003 ferem o Princípio Constitucional da Igualdade, previsto no artigo 5º, caput, da nossa Constituição Federal.

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Sobre o autor
Antonio Antunes Junior

Advogado, sócio titular do escritório Antunes Advocacia Empresarial, Professor do curso de especialização em direito tributário, palestrante em treinamentos e cursos "in company", membro do Comitê de Jovens Empreendedores da FIESP, assessor do Tribunal de Ética IV da OAB/SP; pós-graduado em Direito Civil e em Direito Tributário, autor de livros e artigos jurídicos.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANTUNES JUNIOR, Antonio. Nova Cofins e novo Pis: o princípio da igualdade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 332, 4 jun. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5294. Acesso em: 24 nov. 2024.

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