Capa da publicação Desapropriações na Copa do Mundo: distorção do interesse público
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As desapropriações de urgência para obras da Copa do Mundo sem justa remuneração.

O desvalor dos direitos individuais pela distorção da supremacia do interesse público

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11/11/2016 às 19:42
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Conclusão

Diante das questões apresentadas conclui-se que, em que pese reconheça-se que a atividade da administração pública está calcada axiologicamente na regra abstrata da supremacia do interesse público sobre o particular, não se pode olvidar que o atual quadro do direito administrativo, com base constitucionalizada, exige a observância, no caso concreto, dos interesses públicos à luz do respeito aos direitos individuais, a fim de evitar condutas inconstitucionais e lesivas da administração pública.

As desapropriações feitas em caráter de urgência para a Copa do Mundo de 2014, com base unicamente no rito previsto pelo art. 15, §1º, do Decreto Lei 3365/41, demonstram a acepção ultrapassada e não mais cabível de que a supremacia do interesse público é absoluta e independe dos interesses efetivamente envolvidos no caso concreto. Esta acepção ultrapassada, conforme demonstrado, resultou na desapropriação desastrada de muitos imóveis, sem que fosse garantido efetivamente direito à indenização justa.

Por outro lado, o entendimento doutrinário e jurisprudencial de que tais desapropriações apenas podem ocorrer quando precedidas de prova produzida por perito oficial, evidencia a repaginação conceitual da supremacia do interesse público sobre o particular: deixando clara a prevalência do interesse coletivo sobre o individual, mas preocupando-se em resguardar os direitos do proprietário, como a justa e prévia indenização no caso de desapropriações.


Referências

[https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2014/05/140514_desapropriacoes_copa_recife_rm]. Acessado em: 02 de dezembro de 2015.

ÁVILA, Humberto. Repensando o “princípio da supremacia do interesse público sobre o particular”. In: Revista Diálogo Jurídico, Salvador. Vol. 1, n. 7, outubro, 2001.

CAMARA, Maria Helena Ferreira da. Aspectos do direito de propriedade no capitalismo e no sovietismo. Rio de Janeiro: Forense, 1981.

Disponível em: [https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/06/1638634-1-ano-apos-copa-35-obras-nao-estao-prontas.shtml]. Acessado em: 02 de dezembro de 2015.

FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo. 27.ed. São Paulo: Atlas, 2014.

JÚNIOR, José Cretella. Comentários à Lei de Desapropriação: Constituição de 1998 e Leis Ordinárias. Rio de Janeiro: Forense, 1992.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 1998.

WHITAKER, Firmino. Desapropriação. São Paulo: Saraiva, 1927.


Notas

1 "Eu tinha construído o meu futuro, que era a minha casa, com muito esforço. E, de repente, eles vêm e fazem uma derrota dessas com a gente. Derrubaram o que era nosso sem dar nosso direito”. Jerônimo Sebastião de Oliveira, de 72 anos, é um dos afetados pelas desapropriações para a Copa do Mundo realizadas em Camaragibe, na região metropolitana de Recife. A área será usada para a construção de duas obras de mobilidade urbana do governo de Pernambuco: o Terminal Integrado de Camaragibe e o Ramal da Copa - ambos serviriam para facilitar o acesso à Arena Pernambuco, palco de cinco jogos do Mundial. Os moradores foram removidos, mas nenhuma das duas obras foi concluída. A reclamação de seu Jerônimo é a mesma de muitas outras famílias que também tiveram que deixar suas casas na região por conta das obras da Copa. Eles dizem ter recebido do governo pernambucano uma indenização muito abaixo do valor de mercado dos seus imóveis e, com isso, estão tendo que morar de aluguel ou de favor. ‘Não deu nem a metade do valor [do imóvel]. Então não dá para comprar uma casa. Estou morando de favor com uma sobrinha, e ela está cobrando 400 reais de aluguel. E mesmo assim, ela já está pedindo a casa. Não tenho para onde ir’, disse Jerônimo à BBC Brasil”.

2 Quase um ano após o início da Copa, uma derrota diferente daquelas sofridas pelo Brasil em campo é visível nas 12 cidades-sede do evento: ao menos 35 obras de transporte coletivo e de aeroportos ainda não estão concluídas.Orçadas em R$ 11 bilhões quando lançadas, em 2010, elas estão atrasadas, paradas ou nem foram iniciadas. Em alguns casos, investigações estão sendo feitas por suspeita de corrupção.E não são só problemas com estádios, que além de tudo caminham em parte para virar "elefantes brancos", como em Brasília e em Cuiabá.“O setor de transporte urbano, vendido pelo governo como o principal legado do torneio, só tem 21,4% das obras de grande porte previstas em 2010 concluídas, segundo levantamento da Folha e checado in loco em Fortaleza (CE) e em Cuiabá (MT), onde estão as obras com mais problemas. Essas obras foram definidas para a instalação de três tipos de meios de transporte: BRTs (ônibus especiais em corredores), VLTs (trens leves sobre trilhos) e monotrilhos.O pacote inicial, de 2010, previa 48 obras de mobilidade urbana e 25 em aeroportos. A composição foi alterada. Em 2013, na última lista oficial, havia 51 projetos de mobilidade e 23 em aeroportos.Os atrasos encareceram as obras. O preço de projeto (que não considera a inflação) com que elas foram contratadas depois de 2010 já era, em média, 33% superior ao previsto no lançamento do pacote.Mais o valor vai subir mais. No caso de um VLT em Cuiabá, o projeto começou em R$ 700 milhões, passou na licitação para R$ 1,5 bilhão e deve alcançar os R$ 2,5 bilhões.Quarenta trens foram encomendados e pagos, ao custo de R$ 500 milhões. Como não há trecho pronto do VLT de mais de 22 km, os veículos estão parados num pátio.Quase 90% do financiamento de R$ 1,1 bilhão já foi liberado. Uma CPI foi aberta para descobrir para onde foi o dinheiro, já que a obra tem menos de 50% de avanço.O monotrilho da Linha 17-Ouro, em São Paulo, quando lançado para a Copa, custaria R$ 2,9 bilhões. O valor está em R$ 4,7 bilhões, e a conclusão, prevista para março de 2013, pulou para 2017.Dificuldades com desapropriações, alta de custos, projetos mal concebidos e falta de recursos são motivos apontados pelos especialistas para o fracasso da empreitada.O aeroporto de Fortaleza tinha previsão de um novo terminal, para junho de 2013. A obra começou e foi abandonada com 16% realizados.Nos estádios, a vocação para "elefante branco" não é mais o único problema. Os custos a mais pelos erros e atrasos começam a aparecer.

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Sobre o autor
Alex Santiago

Graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Mestre em Direito Constitucional pela Universidade Fortaleza. Doutorando em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza. Professor de Direito Penal e Processo Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

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