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O Ministério Público e a tutela da probidade administrativa

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11. Tutela da Probidade Administrativa pelo Ministério Público

Feitas breves considerações acerca do Ministério Público e da probidade administrativa, passemos à parte conclusiva do trabalho.

No presente momento, analisaremos aspectos procedimentais, notadamente o inquérito civil, e processuais, através dos quais o Ministério Público consegue perseguir e punir aqueles que degradam o patrimônio de toda a sociedade.

Para tanto, ressaltamos que não serão abordados aspectos criminais, nem outras hipóteses que não aquelas previstas na lei de improbidade administrativa, notadamente os casos de crimes de responsabilidade dentre outros.


12. Legitimidade

Consoante a lei 8.429/92 não só o Ministério Público tem legitimidade para a propositura de ação para a persecução de improbidade administrativa.

Ocorre, todavia, que o presente trabalho tem por escopo a atuação ministerial na persecução da conduta em tela, pelo que será analisada somente a legitimidade do Parquet.

12.1. Natureza constitucional

A legitimidade do Ministério Público para a persecução do agente ímprobo decorre da própria Constituição Federal que determina em seu art. 129, III, que o Ministério Público deverá zelar pelo patrimônio público.

Nesse sentido, ainda que não houvesse determinação expressa na lei, em existindo a mesma, poderia o Parquet utilizar-se da via processual.

Paulo Henrique Blasi entende que "o Ministério Público, como guardião constitucional da probidade, deve agir com severidade, porém com prudência e ponderação, a fim de que se preserve sua autoridade e independência".

No mesmo sentido Pontes de Miranda: "Se há interesse público que baste a intervenção fiscalizante, cabe ao Ministério Público exercer a função que a lei explícita ou implicitamente lhe cometeu".

12.2. Legitimidade infraconstitucional

Mesmo em sede infraconstitucional não entendemos que não seria necessário previsão expressa para que o Ministério Público tutelasse a probidade administrativa.

Prevê o art. 129, III, da Constituição Federal que o Ministério Público tem por função institucional a proteção de "outros interesses difusos...".

Assim sendo, tem-se que o patrimônio público, colocado no mesmo inciso, é um interesse difuso.

Dessa maneira como se não bastasse a determinação expressa, poderia o Ministério Público, perseguir os agentes de improbidade administrativa na medida em que a defesa do patrimônio público é interesse difuso.

Para a doutrina: "Na conceituação dos interesses ou direitos ‘difusos’, optou-se pelo critério da indeterminação dos titulares e da inexistência entre eles de relação jurídica-base, no aspecto subjetivo, e pela indivisibilidade do bem jurídico, no aspecto objetivo".

Para Eduardo Arruda Alvim os direitos difusos "não dizem respeito a uma só pessoa, senão que atinam mais de uma (número indeterminado), daí porque dizem-se transindividuais, pertencendo a uma comunidade composta por pessoas indeterminadas e indetermináveis".

No mesmo sentido ensina Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, que entende "ser dever do MP promover ação civil pública na defesa de todo e qualquer direito difuso ou coletivo (...) independentemente da existência de lei específica sobre este ou aquele direito difuso".

No mesmo sentido Hugo Nigro Mazzilli, que entende ser dever do Ministério Público intentar a ação civil pública quando verificados motivos ensejadores.

Entendendo da mesma maneira, Rogério Pacheco Alves ressalta as vantagens de se reconhecer o patrimônio público como um direito difuso, verbis:

"A caracterização da tutela do patrimônio público como um direito difuso nos permite aplicar não só toda a sólida base teórica já produzida, no Brasil e fora dele, sobre o tema mas também, e sobretudo, os instrumentos legais já existentes em nosso ordenamento. Nessa linha, a par da aplicabilidade das normas previstas na Lei de Improbidade Administrativa (Lei n.º 8.429/92), tem-se como possível a incidência da Lei da Ação Civil Pública (Lei n.º 7.347/85), da Lei da Ação Popular (Lei n.º 4.717/65) e do próprio CDC (Lei n.º 8.078/90), isto, evidentemente, sem contar com a subsidiária possibilidade de aplicação do CPC e do próprio CPP, este último principalmente no capítulo referente te ao inquérito civil".

Ainda que não fosse necessário, a lei de improbidade administrativa previu expressamente a possibilidade de o Ministério Público ingressar com a ação.

Ainda que se fale em possibilidade entendemos tratar-se de um dever, dada a incidência do princípio da obrigatoriedade, pelo que entendemos tratar-se de dever do membro do Ministério Público fazer uso de todos os instrumentos jurídicos ao seu alcance para a plena eficácia das sanções de uma eventual ação de improbidade administrativa.

Nesse sentido são os ensinamentos de Piero Calamandrei:

"no processo civil a participação do Ministério Público tem a finalidade de suprir a não iniciativa das partes privadas ou de controlar sua eficiência, sempre que, pela especial natureza das relações controvertidas, possa temer o Estado, que o estímulo do interesse individual, ao qual está normalmente encontrado o ofício de dar impulso à justiça civil, possa ou faltar totalmente ou se dirigir a fins distintos da observância da lei".

O dever do Ministério Público atuar sempre que estiver em jogo o interesse público não é particularidade do ordenamento jurídico pátrio. No México, como observa Carlos Arelliano García "Se oirá precisamente al Ministerio Público: I. Cuando la solicitud promovida afecte los intereses públicos".

Assevera ainda Guiseppe Chiovenda: "o Ministério Público vela pela observância das leis, pela pronta e regular administração da justiça (...)".

Como se pode observar, é unânime o mister do Parquet em zelar pela res publica.


13. COMPETÊNCIA

Estudar a competência é de salutar importância para a ação de improbidade administrativa, na medida em que, dependendo de quem vá figurar no pólo passivo da ação, há a necessidade de que o processamento seja em determinados órgãos jurisdicionais, sob pena de nulidade do processo.

Até 24 de dezembro de 2002 o chamado foro por prerrogativa de função não se aplicava aos casos de improbidade administrativa. É certo que haviam posições em sentido contrário, o que acabava por não preponderar.

O foro por prerrogativa de função não incidia no que respeitava as questões de improbidade administrativa, na medida em que tal regra se aplicava somente em casos de crimes.

Anteriormente à lei 10.628 de 24 de dezembro de 2002, havia discussão acerca do foro por prerrogativa de função. Neste aspecto, ainda que a lei tenha terminado com a celeuma cabe uma menção à particularidade que se impunha aos prefeitos.

Para os prefeitos municipais a Constituição não estabelece o foro por prerrogativa de função somente para os casos de crimes, o que poderia levar à interpretação segundo a qual os atos de improbidade administrativa praticados por eles seriam julgados pelo Tribunal de Justiça.

Era uma questão de alta indagação que gerava grandes discussões doutrinárias.

Em trabalho primoroso, Raul de Mello Franco Junior analisava a questão para ao final estabelecer sua opinião no sentido de não se aplicar a regra constitucional aos casos de improbidade administrativa por ser tal processo eminentemente cível.

De fato, a Constituição somente realça a questão dos crimes para a instituição do foro por prerrogativa de função nos casos do art. 102, I, "b"; 105, I "a"; e 96, III; deixando em aberto a hipótese dos prefeitos municipais elencada no art. 29, X.

Mas tal questão não mais se coloca, na medida em que a lei 10.628 de 24 de dezembro de 2002 inseriu dois parágrafos no art. 84. do Código de Processo Penal, dispondo o segundo deles: "A ação de improbidade, de que trata a Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992, será proposta perante o tribunal competente para processar e julgar criminalmente o funcionário ou autoridade na hipótese de prerrogativa de foro em razão do exercício de função pública".

Assim não cabe mais qualquer discussão acerca da aplicabilidade do foro por prerrogativa de função, aplicando-se a regra a todas as autoridades, vez que doravante o CPP é expresso ao estabelecer o foro por prerrogativa de função aos casos de improbidade administrativa.

Vencida a questão da competência por prerrogativa de função vejamos os demais casos de competência para o trâmite de processos de improbidade administrativa. Nestes casos a regra geral de competência que estatui o CPC é o domicílio do réu, mas este não é o entendimento da doutrina.

Wallace Paiva Martins Júnior entende dever ser ajuizada a ação no local do dano, como determinação da lei da ação civil pública.

No mesmo sentido entende Marino Pazzaglini Filho, para quem "o juízo competente para a proposição da ação civil de improbidade administrativa é o do local onde ocorrer o dano, excepcionando o foro comum, que é do domicilio do réu".

É cediço que em se tratando de improbidade administrativa perpetrada contra patrimônio público da união competente será a Justiça Federal da Seção Judiciária do local dos fatos.

Já em se tratando de improbidade administrativa contra patrimônio das Fazendas estadual e municipal caberá ao magistrado estadual a cognição dos fatos.

13.1. Prevenção da competência

No tocante à prevenção de competência do juízo temos que estar atentos a qual o motivo ensejador da aferição da prevenção, explicamos.

Quando estivermos diante de uma situação de litispendência, o juízo que continuará a conhecer o processo é aquele em que o réu foi validamente citado, pois a citação válida torna o juízo prevento.

Por outro lado, quando estivermos falando de conexão ou continência, a prevenção do juízo se dá para o juízo que despachou em primeiro lugar.

Ocorre, todavia, que em se tratando de ação de improbidade administrativa a própria lei estabelece uma causa de prevenção própria, em seu § 5º do art. 17. que determina "A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir o mesmo objeto".

A primeira observação é no sentido de que continua válida a determinação do CPC para os casos de litispendência, na medida em que lei somente fala em causa de pedir e objeto.

Ademais, não será a regra do art. 106. do CPC a ser utilizada, mas sim a da lei, utilizando-se o CPC para sabermos o que se considera a dita propositura da ação.


14. Inquérito civil

Ainda que a lei de improbidade administrativa não fale expressamente em inquérito civil para a propositura da ação de improbidade administrativa, entendemos salutar que o mesmo se faça presente.

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O professor Luiz Guilherme da Costa Wagner Junior nos dá um conceito do que seria inquérito civil ao citar Hugo Nigro Mazzilli:

"Poderia o inquérito civil ser entendido como ‘uma investigação administrativa prévia, presidida pelo Ministério Público, que se destina basicamente a colher elementos de convicção para que o próprio órgão ministerial possa identificar se ocorre circunstância que enseje eventual propositura de ação civil pública".

A finalidade do inquérito civil é, como ensina Rogério Pacheco Alves, o instrumento para a "coleta de elementos demonstradores da ocorrência do ilícito e de sua autoria".

Podemos encontrar previsão legal do inquérito civil na lei da ação civil pública (Lei n.º 7.347/85).

Na lei de improbidade administrativa não se falou em inquérito civil, mas em inquérito policial e procedimento administrativo (art. 22). Tal previsão poderia levar ao entendimento de que não seria possível a instauração de inquérito civil para a apuração de atos de improbidade administrativa.

Tal não deve ser o entendimento a ser seguido. Deve ser admitido o inquérito civil com seus mais amplos poderes assim como no caso da ação civil pública. Nesse sentido é o entendimento do professor Wallace Paiva Martins Júnior que tece os seguintes comentários:

"(...) nada impede ao Ministério Público a promoção de inquérito civil com uso dos poderes requisitórios correspondentes (perícias, estudos, dados técnicos, informações, depoimentos, notificações etc.) para a apuração de ato de improbidade administrativa, tendo em vista que a Constituição Federal (art. 129, III e VI), a Lei Federal n. 7.347/85 (arts. 1º, IV, e 8º e parágrafo único) e, posteriormente, a Lei Federal n. 8.625/93 (arts. 25, IV, e 26, I a III) inscrevem essas prerrogativas na instituição da proteção do patrimônio público, da moralidade administrativa e de qualquer outro interesse difuso ou coletivo".

O inquérito civil deve conferir ao Ministério Público a mais ampla gama de elementos, pois é através dele que se formará a convicção do Parquet para a propositura ou não da ação de improbidade administrativa.

14.1. Obrigatoriedade de realização do inquérito civil

Questão que se coloca é a obrigatoriedade ou não de instauração de inquérito civil para a posterior propositura da ação de improbidade administrativa.

A lei 8.429/92 não fala em inquérito civil, mas no já comentado inquérito policial ou procedimento administrativo, o que poderia levar ao entendimento segundo o qual não estaríamos diante da necessidade ou obrigatoriedade de inquérito civil. Esse não é o entendimento que deve prevalecer.

Os entendimentos acerca da obrigatoriedade de instauração de inquérito civil ou até mesmo o inquérito policial ou procedimento administrativo de que fala a lei caminham em sentidos diversos, senão vejamos.

Wallace Paiva Martins Júnior entende não se tratar de obrigação, mas sim de mera faculdade:

"A prerrogativa instituída é mera faculdade conferida ao Ministério Público, pois a lei saliente que o órgão ‘poderá requisitar’. Assim, o Ministério Público recebendo ou conhecendo notícia de improbidade administrativa poderá optar pela solução que lhe for mais conveniente para a apuração do ato de improbidade administrativa e promoção de futura ação civil pública".

Em seu livro o professor Wallace mantém o entendimento:

"Entretanto, frise-se que o inquérito civil, o inquérito policial e o procedimento administrativo são meras faculdades, dispensáveis e prescindíveis, se o Ministério Público possuir elementos probatórios da convicção da prática de improbidade administrativa, como depoimentos, documentos, laudos, enfim, provas lícitas. A ação civil pública de improbidade administrativa de modo algum subordina-se à prévia conclusão ou instauração de inquérito civil, policial ou procedimento administrativo".

No mesmo sentido preleciona Marino Pazzaglini Filho:

"Importante, inicialmente, enfatizar que a instauração de inquérito civil é facultativa, pois, além de não se constituir em pressuposto ao aforamento de ação civil pública ou de improbidade administrativa, pode ser desnecessária quando o Ministério Público já dispuser de elementos de convicção suficientes para instruir a petição inicial da ação civil, em especial quanto a autoria, ao fato, aos fundamentos jurídicos do pedido, com suas especificações (art. 282, II, III e IV do CPC), tais como pecas de informações remetidas por autoridades judiciárias, administrativas e legislativas extraídas de processos civis e criminais".

Ainda na mesma esteira Rogério Pacheco Alves:

"Por derradeiro, é preciso esclarecer que não se deve extrair do princípio da obrigatoriedade a conclusão, equivocada, de que a instauração do inquérito civil é indispensável à propositura da ação civil pública. Obrigatória será para o Ministério Público a apuração dos supostos atos de improbidade, servindo-se para tanto, ordinariamente, do instrumento aqui analisado, pois, como acentuado por Mazzilli, existe para a Instituição antes o dever que o direito de agir. No entanto, já dispondo de elementos suficientes à formatação de sua opinio, evidentemente não há que se exigir, sob pena de exacerbado formalismo, que instaure o inquérito civil no qual, afinal, somente seriam reproduzidos os elementos já existentes. Tem-se, desse modo, que meras peças de informação (representações, relatórios do Tribunal de Contas e de CPI’s etc.) já se mostrarão aptas a embasar a ação civil pública ou qualquer outro tipo de ação no campo da improbidade, não se podendo conceber a instauração do inquérito civil, assim, dada a sua prescindibilidade, como uma condição de procedibilidade".

Assim também entende o Superior Tribunal de Justiça:

"A Turma, por maioria, negou provimento ao recurso, entendendo que, para instaurar ação civil pública por ato de improbidade, não é imprescindível o prévio inquérito civil cautelar, porquanto no curso da ação civil é assegurada ao réu a sua ampla defesa com a observância do contraditório. Outrossim, descabe o deferimento da segurança para trancar a ação civil por inexistir defeito insanável no inquérito, uma vez que este, por se destinar apenas ao recolhimento informal e unilateral de provas, pode ou não anteceder a ação civil pública".

Ainda pela dispensabilidade, João Batista de Almeida:

"O Ministério Público, no entanto, poderá ajuizar ação civil pública mesmo sem a instauração prévia do inquérito civil, desde que possua elementos de convicção necessários a tal desiderato. Poderá ainda ajuizar a aludida no curso do inquérito civil. Em suma, o órgão ministerial não está obrigado a instaurar ou a concluir inquérito civil como condição para a propositura da respectiva ação".

Adilson Abreu Dallari entende não ser tão dispensável assim:

"Aplicando-se tais ensinamentos à competência para a instauração do inquérito civil, fica espantosamente claro que isso não pode ser tomado como uma prerrogativa pura, como mera faculdade, como questão de foro íntimo, com matéria totalmente submetida ao puro arbítrio do membro do Ministério Público.

Felizmente, já existem insuspeitas e respeitáveis opiniões doutrinárias mais lúcidas a esse respeito.

‘O inquérito civil não é em si uma função, e sim um instrumento, que legitima, implicitamente o exercício da função investigatória.

‘Note-se que quando prevê o inquérito civil, para, em seguida, tratar de valores essenciais para a sociedade ligando aquele à proteção desses valores, a Constituição Federal deixa claro que o inquérito civil é um instrumento para aquele fim, mesmo porque quem quer os fins quer, explícita ou implicitamente, os meios.

‘Então, claro está que a Carta Federal confere ao Ministério Público um poder investigatório voltado para a apuração de lesões ou ameaças de lesões àqueles valores.

‘Esse poder investigatório constituiu função exclusiva do Ministério Público, pois a Constituição Federal ressalvou a legitimação concorrente apenas para a ação civil pública (art. 129, § 1º), não o fazendo relativamente ao inquérito civil. Além disso, a própria Lei 7.347/85, estabelece, como visto, inicialmente, a exclusividade do inquérito civil para o Ministério Público, reafirmando a possibilidade de competência concorrente para a função investigatória na matéria, por meio do inquérito civil.

‘Como todo poder, é um poder-dever e assim não pode deixar de ser exercido. Todavia, como é óbvio em nome e na defesa desses mesmos valores, esse poder não deve transformar-se em instrumento de devassa, porém em instrumento para a investigação e apuração de elementos e fatos necessários para a apuração de ação pública, civil ou penal, para a proteção do patrimônio público e social e de interesses difusos e coletivos’ (José Emmanuel Burle Filho, ‘Principais aspetos do inquérito civil, como função institucional do Ministério Público’, in Ação Civil Pública, coord. Edis Milaré, Ed. RT, 1995, pp. 321. e 322).

Hely Lopes Meirelles, ao discorrer sobre a prioritária legitimação do Ministério Público para a propositura da Ação Civil, Faz uma importantíssima ressalva: ‘Mas esses poderes atribuídos ao Ministério Público para, a propositura da ação civil pública não justificam o ajuizamento de lide temerária ou sem base legal, nem autorizam a concessão de liminar suspensiva de obras e serviços públicos ou particulares regularmente aprovados pelos órgãos técnicos e administrativos competentes, sob a simples alegação de dano ao meio ambiente’ (Hely Lopes Meirelles, Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção e ‘Habeas Data’, 16ª ed., Ed. RT, p. 126).

Em abono de sua posição Hely Lopes Meirelles reproduz esta expressiva manifestação do hoje Ministro do Supremo Tribunal Federal, José Celso de Melo Filho emitida quando no exercício do cargo de Assessor do Gabinete Civil da Presidência da República: ‘O inquérito civil, em suma, configura um procedimento preparatório, destinado a viabilizar o exercício responsável da ação civil pública. Com ele, frustra-se a possibilidade, sempre eventual, de instauração de lides temerárias’ (apud, Hely Lopes Meirelles, Mandado de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado de Injunção e ‘Habeas Data’, 16ª ed., Ed. RT, p. 125, nota 3).

Não se pretende sustentar que a realização do inquérito civil seja condição indispensável para a propositura de toda e qualquer ação civil pública. O bom-senso não briga com o direito. Quando houver informações firmes e seguras no sentido da provável ocorrência de determinado dano a interesse supra-individual (coletivo ou difuso), é de admitir-se a direta propositura de ação judicial.

Quando, porém, as informações forem insuficientes para indicar a ocorrência de determinado dano ou de sua autoria, é de rigor a instauração de inquérito civil.

Fazendo-se uma comparação, no campo do direito administrativo, pode-se dizer que o inquérito civil está para a ação civil pública, assim como a sindicância está para o processo administrativo. Não é possível instaurar-se um processo administrativo disciplinar genérico, para que, no seu curso se apure se, eventualmente, alguém cometeu alguma falta funcional.

Não é dado à Administração Pública, nem ao Ministério Público, simplesmente molestar gratuitamente e imotivadamente qualquer cidadão, por alguma suposta eventual infração da qual ele, talvez, tenha participado.

Vale também aqui o princípio da proporcionalidade inerente ao poder de polícia, segundo o qual só é legítimo o constrangimento absolutamente necessário e na medida do necessário.

Repugna a consciência jurídica aceitar que alguém possa ser constrangido a figurar como réu numa ação civil pública perfeitamente evitável. Configurava abuso de poder a propositura de ação civil temerária, despropositada, não precedida de cuidados mínimos quanto à sua viabilidade.

Não há razão alguma para que se deixe de aplicar, em relação ao Ministério Público, o preceito contido no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, que estabelece a responsabilidade patrimonial da Administração Pública por danos causados por seus agentes. Da mesma forma, conforme já tem reconhecido (timidamente) a jurisprudência, o Ministério Público enquanto atuar como parte na relação processual civil, deve suportar os ônus da sucumbência, pois o sistema republicano (conforme a magnífica lição de Geraldo Ataliba) é incompatível com a irresponsabilidade de quem exerce prerrogativas públicas.

A realização ou não do inquérito civil, como providencia preliminar à promoção da ação civil pública, pode ser um importantíssimo indicador do nível de correção da conduta do agente do Ministério Público, da sua maior ou menor diligência no exercício de suas funções.

A experiência prática tem relevado a ocorrência desagradavelmente freqüente de ações civis públicas totalmente despropositadas, que poderiam ter sido perfeitamente evitadas se o promotor público tivesse tido a mais mínima e elementar das cautelas, que é simplesmente ouvir o suposto infrator.

Por outro lado, é fora de qualquer dúvida que um inquérito civil pode fornecer elementos concretos e sólidos, levando à propositura de uma ação civil pública cuidadosamente estruturada e rigorosamente fundamentada, assegurando a efetiva punição dos causadores de danos a interesses difusos e coletivos.

Fundamentos constitucionais

A interpretação constitucional não pode ser avarenta. Não é correto extrair-se, especialmente das garantias constitucionais, apenas aquilo que aflora à superfície.

Por exemplo, quando a Constituição assegura o direito de petição, isso não pode ser entendido apenas como o direito de protocolar um pedido em uma repartição pública. Evidentemente, o direito de petição abrange, também, necessariamente, o direito a uma resposta conclusiva emitida em tempo razoável, devidamente fundamentada e motivada.

Da mesma forma, a garantia do decido processo legal deve ser entendida como protetora da liberdade em seu sentido mais amplo e dos bens não apenas materiais, mas também do patrimônio jurídico e do patrimônio moral das pessoas, que inclui o seu bem estar, sua tranqüilidade. Constranger alguém a afigurar como réu em uma ação civil pública, sem um mínimo de plausibilidade, sem a menor preocupação em verificar se existe ou não motivo para tanto, sem se valer de cautela constitucionalmente prevista para evitar que isso ocorra, ofende, sim, a garantia do devido processo legal.

De maneira alguma se pode entender que qualquer pessoa pode ser acusada sem qualquer motivo ou propósito, desde que se lhe assegure o direito à ampla defesa. Ter que invocar, em juízo, essa garantia, imotivadamente, como resultado de uma acusação gratuita e desprovida de plausibilidade já é um constrangimento ilícito.

São coisas totalmente distintas uma acusação plausível, com relação à qual o acusado se revele, ao final, inocente, e uma acusação despropositada, fruto do puro descuido, da simples negligência no exercício de função pública, para não falar até mesmo de dolo.

O simples fato de figurar como réu em uma ação civil pública já produz efeitos deletérios para o acusado, podendo até mesmo corroer e destruir uma boa reputação, ofendendo seu direito à inviolabilidade da honra e da imagem, prescrita pelo inc. X, do art. 5º da Constituição Federal.

Desgraçadamente, é um dado da realidade o desvirtuamento da Ação Popular, que tem servido, acima de tudo, para alimentar desavenças políticas. O mesmo pode acontecer com a ação civil pública, se não se estabelecer uma diferença entre seu uso e seu abuso.

Não está expresso, mas está implícito no preceito contido no referido art. 129, III, da Constituição Federal, ao mencionar o inquérito civil e ação civil pública, que o Ministério Público deve valer-se do meio menos gravoso para atingir seu objetivo de proteger o patrimônio da coletividade.

Convém não esquecer que o § 2º do art. 5º da Constituição Federal afirma que a enumeração de determinados direitos e garantias não significa a exclusão de outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados.

Entre esses princípios, figuram, com o qualificativo de fundamentais, o da cidadania e o da dignidade da pessoa humana. Tais princípios não podem ser espezinhados, para sustentar a existência de uma prerrogativa absurda, incompatível com o próprio conceito de direito e com características elementares do exercício da função pública.

Pode-se, portanto, afirmar, com segurança, que, em princípio, é obrigatória a realização de inquérito civil como procedimento preliminar à propositura de ação civil pública de responsabilidade. A instauração do inquérito civil pode ser dispensada se e quando da existência de elementos probatórios que indiquem, com segurança, a efetiva ocorrência de atos deletérios a interesses difusos ou coletivos, assim como de sua autoria, permitindo o exercício responsável do poder/dever de promover a ação civil pública".

Acompanhando o entendimento do professor Dallari, trazemos à colação salutar estudo feito pelo professor Luiz Guilherme da Costa Vagner Junior:

"Tema tormentoso quanto ao inquérito civil refere-se à dispensabilidade ou não da sua instauração pelo Ministério Público antes do ajuizamento de uma ação civil pública.

Os dispositivos legais que regulam a matéria parecem levar a conclusões distintas.

Enquanto que o parágrafo primeiro do artigo 8º. da Lei 7.347/85 fala que ‘o ministério público ‘poderá’ instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, ou requisitar, de qualquer organismos públicos ou particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis’, o artigo 129 da Constituição Federal aponta ser função institucional do Ministério Público ‘‘promover o inquérito civil’ e a ação civil pública, para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos’.

A grande maioria dos doutrinadores curva-se a apontar a facultatividade da instauração do inquérito civil, entendendo não ser o mesmo pressuposto processual para o ingresso de uma ação civil pública.

Hugo Nigro Mazzilli sustenta que ‘o inquérito civil pode e até mesmo deve ser dispensado quando o Promotor de Justiça já tenha em mãos todos os elementos necessários para propor a ação principal ou cautelar. Da mesma forma, em caso de urgência, será possível dispensar o prévio inquérito civil (como no requerimento de medida cautelar)’.

Paulo Márcio da Silva, ao tratar do inquérito civil defende não ser este condição nem pressuposto processual obrigatório e indispensável a legitimar o manejo da ação civil pública, trazendo, nesse sentido, jurisprudências do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Também José Marcelo Menezes Vigliar observa que ‘a exemplo do que ocorre com o inquérito policial, o inquérito civil é dispensável, desde que por outros meios de convicção já se tenha coligido elementos suficientes para a propositura da ação civil pública’.

José Luiz Mônaco da Silva vai buscar fundamento para a facultatividade da instauração do inquérito civil na própria redação do artigo 8º., parágrafo 1º., da Lei 7.347/85, pois segundo o autor, ‘tal dispositivo legal, ao empregar o verbo ‘poderá’, não deixa margem a dúvidas acerca de seu caráter facultativo’.

Por fim, vale citar, ainda, as considerações de Luis Roberto Proença que, ao defender ser o inquérito civil útil, mas não indispensável a propositura da ação civil pública, argumenta que renomados doutrinadores, como Galeno Lacerda, Rodolfo de Camargo Mancuso, Nelson Nery Junior, José Emmanuel Burle Filho e Édis Milaré, conceituam o inquérito civil de forma semelhante, ou seja, apontado como aspectos relevantes do instituto, a exclusividade de sua titularidade, a facultatividade de sua instauração, a formalidade restrita, a inquisitividade, a publicidade mitigada e a auto executoriedade.

Em que pese à respeitabilidade dessas opiniões, nos parece que razão assiste ao Prof. Adilson Dallari que foi absolutamente feliz ao comentar o assunto.

‘São coisas totalmente distintas uma acusação plausível, com relação à qual o acusado se revele, ao final, inocente, e uma acusação despropositada, fruto de puro descuido, da simples negligência no exercício de função pública, para não falar até mesmo de dolo’.

Hugo Nigro Mazzilli, reconhece que ‘sob o aspecto estritamente jurídico, ninguém se presume culpado só pelo fato de estar sendo apurada sua eventual participação em fatos potencialmente ilícitos; entretanto, na esfera prática, uma investigação descabida não raro provoca danos de difíceis mensuração e reparação para quem é investigado, seja uma pessoa física ou até mesmo uma empresa’.

Segundo o Prof. Dallari, a regra geral deveria ser a obrigatoriedade da prévia instauração do inquérito civil.

Para fundamentar sua opinião, invoca os magistérios do Prof. Celso Antônio Bandeira de Mello, para quem ‘as prerrogativas da Administração não devem ser vistas ou denominadas como ‘poderes’ ou ‘poderes-deveres’. Antes se qualificam e melhor se designam como ‘deveres-deveres’, pois nisto se ressalta sua índole própria e se atrai atenção para o aspecto subordinado do poder em relação ao dever, sobressaindo, então, o aspecto finalístico que as informa, do que decorrerão sua inerentes limitações’.

Ainda conforme Bandeira de Mello, ‘o interesse público, fixado por via legal, não está à disposição da vontade do administrador, sujeito à vontade deste; pelo contrário, apresenta-se para ele sob a forma de um comando. Por isso mesmo a prossecução das finalidades assinaladas, longe de ser um ‘problema pessoal’ da Administração, impõe-se como obrigação indiscutível’.

A partir dessas considerações, Prof. Dallari concluiu que, ‘aplicando tais ensinamentos à competência para a instauração de inquérito civil, fica espantosamente claro que isso não pode ser tomado como uma prerrogativa pura, como mera faculdade, como questão de foro íntimo, como matéria totalmente submetida ao puro arbítrio do membro do Ministério Público’.

Por fim, vale observar que, segundo o autor, ‘fazendo-se uma comparação, no campo do direito administrativo, pode-se dizer que o inquérito civil está para a ação civil pública assim como a sindicância está para o processo administrativo’.

Nada a reparar nos comentários acima. Acrescentamos, apenas, nosso posicionamento de que no mínimo deve ser entendido como um relevante elemento para a apuração da responsabilidade funcional do membro do Ministério Público o fato do mesmo ter ou não adotado a cautela de instaurar um inquérito civil antes de ajuizar uma ação civil pública.

Aliás, o próprio Hugo Nigro Mazzilli, que já foi integrante do Conselho Superior do Ministério Público do Estado de S. Paulo e Presidente da Associação Paulista do Ministério Público aponta ser ‘natural, porém, que, quando haja exercício irregular das funções, o membro do Ministério Público poderá ser responsabilizado pessoalmente’.

Nessa esteira de raciocínio, o Prof. Adilson Abreu Dallari que observa que ‘não há razão alguma para que se deixe de aplicar em relação ao Ministério Público o preceito contido no art. 37, parágrafo 6º., da Constituição Federal, que estabelece a responsabilidade patrimonial da Administração Pública por danos causados por seus agentes’.

Não obstante o dispositivo constitucional acima apontado, Paulo Márcio da Silva acrescenta que o órgão do Ministério Público que se portar com desvio quando da presidência do inquérito civil estará sujeito à responsabilidade civil, conforme dicção do art. 85. do Código de Processo Civil, sem prejuízo de eventuais implicações de ordem penal.

Nos parece que beira às raias da negligencia o fato do promotor resolver ingressar com a demanda que, posteriormente, acaba sendo rejeitada pelo judiciário justamente por não conter elementos mínimos que concluíssem pela infração, fato esse que, de certo, poderia ser evitado caso houvesse sido instaurado prévio inquérito civil.

Novamente é Hugo Nigro Mazzilli quem admite que com a instauração do inquérito civil ‘se combate o mau vezo, às vezes encontrado, de um representante do Ministério Público investigar fatos de relevância pública, sem método nem critério, como se fosse um trabalho pessoal, dele próprio, e que não terá nenhuma continuidade quando de seus afastamentos, impedimento, substituição ou sucessão, nem terá controle algum por parte da própria instituição ou da coletividade. Nesses casos, estará clara a burla ao sistema da lei’.

No mesmo sentido, José Celso de Mello Filho observou que ‘o inquérito civil, em suma, configura um procedimento preparatório, destinado a viabilizar o exercício responsável da ação civil pública. Com ele, frustra-se a possibilidade, sempre eventual, de instauração de lides temerárias’.

É bem verdade que, para nos mantermos fiéis ao posicionamento do autor, convém observar que o Min. Celso de Mello defende não ser obrigatória à instauração do inquérito civil. Entende o autor que possuindo o Ministério Público elementos de convicção para o ajuizamento imediato da ação judicial, obtidos por outro meio qualquer (por representação de terceiros, através de outros procedimentos administrativos próprios ou de terceiros, de inquéritos policiais etc), poderá fazê-lo, prescindindo da instauração do inquérito civil".

Nelson Nery e Rosa Maria de Andrade Nery ensinam que "possuindo elementos necessários, poderá desde logo ajuizar a ação, não estando o MP obrigado a instaurá-lo", todavia ressaltam que "trata-se de procedimento administrativo destinado à colheita de elementos para eventual e futura propositura responsável da ACP, evitando-se o ajuizamento de ação temerária".

Como verificado convincentes são os argumentos em ambos os sentidos de modo que ficamos até sem bagagem para opinar a respeito, pelo que nos reservaremos apenas à demonstração dos entendimentos supra.

Apenas ressaltamos que não pode o membro do Parquet agir desenfreadamente sob o manto protetivo das prerrogativas que o ordenamento jurídico lhe confere.

Ao contrário, deve guardar cautela para que não acabe por prejudicar terceiros que ao depois se saiba inocentes.

Ainda que se entenda facultativa a instauração de inquérito civil para o ajuizamento de ação civil de improbidade administrativa, é importante que o membro do Ministério Público aja com cautela, na medida em que poderá ser responsabilizado por isso.

Importante lembrar que Rui Stoco entende que em certas hipóteses é de se admitir a responsabilização do membro do Parquet:

"Segundo ensinamento de José Frederico Marques, ‘ao contrário do que entendem alguns, o Ministério Público não é órgão do Poder Judiciário. E, tampouco, um quarto poder da soberania nacional. Enquadra-se entre os órgãos da Administração Pública, embora em posição especial, resultante de suas magnas funções na tutela do interesse público’ (Manual de direito processual civil, São Paulo, Saraiva, 1974, 1º vol., p. 291-292).

Nesse sentido, Cretella Júnior diz que ‘os agentes do Ministério Público não são considerados órgãos judiciários, não exercem jurisdição, nem são auxiliares do Poder Judiciário, acrescentando que a corporação é histórica e constitucionalmente formada de agentes do Poder Executivo, reconhecendo que os atos danosos que porventura pratiquem, emprenham a responsabilidade civil do estado, que arcará com a reparação’ (O Estado e a obrigação de indenizar, n. 209, p. 303).

Na área penal o Ministério Público é o dominus litis, com prerrogativa exclusiva para dar inicio à ação penal.

No plano do processo civil, como evidencia Yussef Said Cahali, o Ministério Público desempenha uma tarefa híbrida, de agente equiparado às partes, ou de interveniente necessário nas causas, nos casos previstos em lei.

O legislador irroga-lhe assim inumeráveis atividades que se vinculam à prestação do serviço judiciário pelo Estado, fazendo dele um instrumento de intermediação do interesse público na administração da Justiça (ob. cit., p. 220).

Sua responsabilidade funcional, sob o aspecto civil, está prevista no art. 85. do Código de Processo Civil, dispondo que ‘o órgão do Ministério Público será civilmente responsável quando, no exercício das funções, proceder com dolo ou fraude’, sustentando o autor por ultimo citado que, ‘no desempenho dessa atividade junto ao Poder Judiciário, os membros do Ministério Público atuam, dentro de sua especialização, como funcionários públicos, ainda que como agentes da Justiça’ (idem, p. 221).

Nessa linha de raciocínio tem-se que os membros do Ministério Público podem ser responsabilizados pessoalmente pelos atos que pratiquem no exercício de seu munus ou funções típicas, quando procedam com dolo ou fraude, sendo certo que a fraude constitui uma conduta dolosa, e também por culpa em sentido estrito, embora Pontes de Miranda tenha obtemperado que, inobstante o art. 85. do CPC não tenha falado, como o fez o art. 133, I, com relação aos juízes, da ‘recusa, omissão ou retardamento’, sem justo motivo, de providencia que deva ordenar de ofício, ou a requerimento da parte (art. 133, II), a interpretação desse art. 85. não deve dar oportunidade a que se reduza a pouquíssimos casos os de responsabilidade civil dos órgãos dessa instituição (Comentários ao código de Processo Civil, vol. II, p. 147-148).

Nada impede, contudo, que a ação seja dirigida contra a Fazenda Pública, posto que esses membros do Ministério Público são agentes públicos, incidindo a regra do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, cuja responsabilidade é objetiva.

Aliás, como o responsável imediato por ato de seus agentes é o Estado, representado pela Fazenda Pública, com direito de regresso contra estes, nos termos do dispositivo mencionado da Carta Magna, a ação deve primeiramente ser dirigida ao ente público, que, se condenado, deverá, obrigatoriamente, voltar, em ação regressiva, contra o agente causador do dano, impondo-lhe provar a culpa deste.

Não se nega que o interessado que tenha sofrido dano ingresse contra um ou outro, ou mesmo contra ambos, sendo certo, contudo, que a responsabilidade objetiva somente atinge o Estado.

Reformulando nosso entendimento anterior, evoluímos no sentido de admitir a responsabilidade pessoal do membro do Ministério Público por dolo ou culpa, em qualquer das suas modalidade e graus, na consideração de que sua obrigação decorrente dos princípios que informam o dever de reparar e do preceito constitucional que emprenha obrigação ressarcitória dos agentes públicos, nos casos de dolo ou culpa, quando nessa condição causem danos a terceiros.

Assim, mostra-se despiciendo que o art. 85. do Código de processo Civil ou as Leis Orgânicas do Ministério Público, no âmbito federal ou estadual, tenham eventualmente se omitido acerca desse aspecto".

No mesmo diapasão Carlos Roberto Gonçalves ao mencionar Lição de Maria Sylvia Zanella Di Pietro segundo a qual até seria admitida a responsabilidade do magistrado em caso de culpa, pondera que os membros do Ministério Público receberam o mesmo tratamento destes pelo CPC.

Em sentido oposto, Mauro Roberto Gomes de Mattos ressalta que "(...) o magistrado, quando exara opiniões ou profere decisões judiciais, está imune à improbidade administrativa".

Contudo, ao exercer atribuições administrativas poderá cometer improbidade administrativa, devendo destarte, ser julgado pelo Tribunal, por incidência do foro por prerrogativa de função ex vi da lei 10.628/02.

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Sobre o autor
Antonio Roberto Sanches Junior

Advogado, pós-graduando em Direito Civil pela Universidade Paulista (MBA) professor universitário e de cursos preparatórios para concurso público

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANCHES JUNIOR, Antonio Roberto. O Ministério Público e a tutela da probidade administrativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 367, 3 jul. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5390. Acesso em: 25 dez. 2024.

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