Notas sobre intervenção e liquidação extrajudicial em entidades fechadas de previdência complementar (EFPC)

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30/11/2016 às 10:23
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5. PROCESSO E PRAZOS NA LIQUIDAÇÃO DE EFPC

Como já afirmado, a liquidação extrajudicial é, em tese, um procedimento legal enxuto, célere, no qual o devido processo legal, é mitigado em nome do resguardo do interesse maior da coletividade. Tal posicionamento tem respaldo na doutrina e na jurisprudência e está de acordo com o princípio constitucional da proporcionalidade.

A liquidação extrajudicial de plano de benefícios de EFPC não tem prazo para terminar. A liquidação de entidades do sistema financeiro tem. Pelo art. 15, § 2.º, o prazo para o término da liquidação é de, no máximo, 60 dias “contados do primeiro protesto por falta de pagamento ou, na falta deste, do ato que haja decretado a intervenção ou a liquidação”.

Entretanto, a jurisprudência tem entendido que o prazo legal para liquidação é inexeqüível e “comporta elastecimento não apenas pela natural complexidade do processo administrativo dessa natureza, como porque dependentes as providências de atos e fatos de terceiro, externos àquele âmbito”.13

Embora a liquidação de EFPC não tenha prazo para término, obedece a um trâmite formal, que precisa ser observado da maneira mais rigorosa possível, sob pena de nulidade.

As fases da liquidação são as seguintes, conforme disposto na LC 109/01 e, suplementarmente, na Lei 6.024/74:

  1. decretação da liquidação pelo órgão regulador e fiscalizador (atualmente a PREVIC) – LC 109/01, art. 55;

  2. posse do liquidante (Lei 6.024/74, art. 8.º);

  3. arrecadação dos livros e documentos da instituição (Lei 6.024/74, art. 9. º, “a”);

  4. levantamento do balanço geral da liquidação e das demonstrações contábeis e atuariais necessárias à determinação do valor das reservas individuais (LC 109/01, art. 51; Lei 6.024/74, art. 9.º, “b”) – esta determinação não constava da Lei 6.435/77;

  5. em cinco dias da posse do liquidante, os administradores e ex-administradores da entidade devem encaminhar declaração com seus dados pessoais e patrimoniais ao liquidante (Lei 6.024/74, art. 10);

  6. instauração de inquérito administrativo pelo órgão regulador e fiscalizador para apuração de responsabilidades dos administradores da entidade liquidanda (LC 109/01, art. 61) – esta determinação não constava da Lei 6.435/77;

  7. publicação de edital de comunicação da indisponibilidade de bens de ex-administradores (LC 109/01, art. 60, caput);

  8. comunicação formal da indisponibilidade às autoridades competentes (LC 109/01, art. 60, caput);

  9. publicação de aviso aos credores, no Diário Oficial e em jornal de grande circulação no local da sede da entidade, para que, num prazo entre 20 e 40 dias, declarem seus respectivos créditos perante a entidade em liquidação (Lei 6.024/74, art. 22);

  10. análise e decisão sobre os créditos habilitados (Lei 6.024/74, arts. 23. e 24);

  11. notificação por escrito aos credores acerca da decisão adotada, abrindo-se dez dias de prazo para recurso dos mesmos ao órgão fiscalizador (Lei 6.024/74, art. 24);

  12. julgamento dos recursos pelo órgão fiscalizador (Lei 6.024/74, art. 25);

  13. organização do quadro geral de credores (Lei 6.024/74, art. 25; LC 109/01, art. 50);

  14. publicação de aviso de que o quadro geral de credores e o balanço geral estão afixados na sede e demais dependências da entidade (Lei 6.024/74, art. 25);

  15. abertura de prazo de dez dias para impugnação sobre legitimidade, valor ou classificação dos créditos (Lei 6.024/74, arts. 25, § único, e 26);

  16. notificação ao eventual impugnante para que ofereça as razões de recurso em cinco dias (Lei 6.024/74, art. 26, § 2.º);

  17. elaboração de parecer sobre os recursos oferecidos (Lei 6.024/74, art. 26, § 3.º);

  18. encaminhamento dos recursos ao órgão fiscalizador (Lei 6.024/74, art. 26, § 3.º);

  19. julgamento das impugnações pelo órgão fiscalizador (Lei 6.024/74, art. 26, § 4.º);

  20. publicação de avisos sobre eventuais modificações no quadro geral de credores (Lei 6.024/74, art. 26, § 4.º);

  21. continuidade de ações ou proposituras de outras em 30 dias (Lei 6.024/74, art. 27);

  22. realização do ativo e liquidação do passivo (LC 109/01, art. 50);

  23. aprovação, pelo órgão regulador e fiscalizador, das contas finais do liquidante, com a baixa nos devidos registros (LC 109/01, art. 53).

A respeito das fases acima dispostas, de maneira sintética, é necessário mencionar que entendemos que não se aplica às liquidações de planos de benefícios o disposto no art. 11. da Lei 6.024/74, que determina a elaboração e o envio de relatório preliminar ao órgão fiscalizador, em sessenta dias após a posse, com o exame da escrituração, da aplicação dos fundos e disponibilidades da situação econômico-financeira da instituição, contendo a indicação dos eventuais atos e omissões danosos que tenham sido verificados e proposta de providências (Lei 6.024/74,). Tal providência somente seria necessária se, às liquidações de planos de benefícios se aplicasse também o que determina o art. 21. da citada Lei 6.024/74, ou seja, que, em vista do relatório acima, o órgão fiscalizador decidirá sobre continuidade da liquidação ou decretação da falência da entidade (Lei 6.024/74, art. 21).

Como é assente, as EFPCs não se sujeitam à falência (LC 109/01, art. 47) e a decretação só se dá “quando reconhecida a inviabilidade de recuperação da entidade” (LC 109/01, art. 48). Evidentemente, como já mencionado, o plano de benefício administrado por EFPC pode ter sua liquidação levantada, desde que “constatados fatos supervenientes que viabilizem a recuperação da entidade” (LC 109/01, art. 52). A superveniência de que trata a lei, portanto, indica que é durante o processo de liquidação que se dará a análise sobre eventual levantamento da mesma, e não em caráter preliminar e inicial, consubstanciado no relatório de que trata a Lei 6.024/74 relativamente às instituições financeiras.

Além disso, os créditos dispensados de habilitação devem possuir relação nominal (Lei 6.024/74, art. 22, § 2.º), e os credores obrigados à habilitação têm direito de obterem todas as informações, extratos, saldos e outros elementos necessários à defesa de seus interesses e à prova de seus créditos (Lei 6.024/74, art. 22, § 3.º).

A teor do que dispunha o art. 205. da revogada Lei de Falências (Dec.-Lei 7.661/45), e embora não especificado na Lei 6.024/74, havia necessidade de publicação no Diário Oficial do aviso aos credores, por duas vezes consecutivas. Entretanto, tal dispositivo foi revogado pela atual Lei de Falências, que não menciona mais a quantidade de vezes para publicação de editais, falando-se apenas que se deve publicá-lo (arts. 7.º, § § 1.º e 2.º; 52, § 1.º; e 99, parágrafo único). Não se pode esquecer que a publicação do Diário Oficial não prescinde a realizada em jornal de grande circulação, obrigação constante do art. 22. da Lei 6.024/74.

Por derradeiro, a lei 6.024/74, em seu art. 30, fixa um prazo geral de dez dias para recurso contra qualquer decisão do liquidante e um prazo de cinco dias para que este encaminhe o recurso ao órgão fiscalizador para decisão. Tal recurso genérico não tem efeito suspensivo. Já os recursos específicos, mencionados nos arts. 24. (contra declaração de créditos) e 25 (contra o quadro geral de credores), possuem efeito suspensivo, seja porque a lei não declara expressamente seu efeito, seja porque a sistemática da liquidação necessita que se paralisem os procedimentos liquidatórios até o julgamento dos referidos recursos.


6. INDISPONIBILIDADE DOS BENS DOS ADMINISTRADORES

Como já referido, os bens dos administradores de EFPC que venha a ter plano de benefício sob liquidação extrajudicial, bem como os dos administradores que tenham exercido tal função nos 12 meses à decretação, ficam indisponíveis (LC 109/01, art. 59).

Tal indisponibilidade, entretanto, não atinge bens inalienáveis ou impenhoráveis (LC 109/01, art. 59,§ 3.º), nem aqueles que tenham sido objeto de alienação devidamente registrado em cartório até doze meses antes da data da decretação (LC 109/01, art. 59, § 4.º).

Também a LC 109/01 tomou o cuidado de não pôr em disponibilidade bens de administradores quando o motivo da liquidação extrajudicial do plano não tiver nenhuma relação com atos dos mesmos, ressalvando que tal situação pode ser revista a qualquer momento quando constatadas irregularidades ou indícios de crimes por ela praticados (art. 59, § 5.º).

O STJ já determinou a suspensão de processo de execução cuja penhora recaiu sobre bem de administrador de entidade cuja liquidação foi decretada14 e, principalmente, decidiu que, embora constritos, os bens não deixam de ser administrados pelos seus donos, e que os frutos do patrimônio retido não são atingidos pela indisponibilidade:

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“1. A intervenção e a liquidação extrajudicial da sociedade por ações produzem o efeito imediato da indisponibilidade dos bens dos administradores (art. 36. da Lei 6.024, de 13 de março de 1974), sendo vedado, consoante a lei, por qualquer forma, direta ou indireta, aliená-los ou onerá-los, ‘até a apuração final de suas responsabilidades’.

2. Esta imposição legal, no entanto, não impede ou subtrai dos dirigentes da sociedade a sua administração. Cria-se uma restrição ao direito de propriedade, visando sua conservação, não podendo – todavia – a liquidação extrajudicial ‘afetar o processo produtivo ou as operações comerciais’.

3. Nesta linha, importa realçar que a liquidação extrajudicial recai sobre o Banco Hércules S/A, a Hércules Corretora de Valores Mobiliários Ltda e o Consórcio Mercantil S/C Ltda e os dividendos que o recurso visa liberar são referentes às ações de propriedade da recorrente nas empresas Banco Mercantil do Brasil S/A (Banco de Investimento) e Companhia de Seguros Minas Brasil.

4. A Lei 6.024/74 não prevê a indisponibilidade dos frutos civis do capital, quando nada para a justa conservação dos bens. Liberação permitida em relação aos dividendos das ações das empresas não sujeitas ao regime especial.

5. Recurso especial provido. 15


7. INTERRUPÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES

A interrupção dos aportes dos participantes e da patrocinadora para o plano de benefícios, a partir da decretação da liquidação extrajudicial de plano de benefícios administrado por EFPC, previsto no inciso VIII do art. 49. da LC 109/01 (e que constava do inciso IX do art. 66. da Lei 6.435/77) é medida que mais caracteriza o término das atividades da entidade.16

A interrupção prevista em lei se justifica porque, sendo inviável a recuperação da entidade – e se não fosse assim a liquidação não seria decretada – não há mais sentido em custear o plano de benefícios. Não obstante, a patrocinadora e os participantes são obrigados a efetuar as contribuições anteriores à decretação da liquidação, pois se está diante, como já visto, de relação contratual consubstanciada pelo Regulamento do plano, pelo Estatuto da entidade, pelo convênio de adesão e pelo Plano de Custeio, que traça o nível de contribuição necessário para o equilíbrio do mesmo.

É esse o sentido do posicionamento expresso pelo STJ:

“.................................................

A interrupção a que se refere o art. 66, IX, da Lei 6.435/77, justifica-se pelo fato da decretação da liquidação extrajudicial da entidade de previdência privada decorrer do reconhecimento da inviabilidade da sua recuperação, de forma que não se justifica exigir que a patrocinadora continue contribuindo para o custeio de uma entidade que se encontra em liquidação extrajudicial. Tal interrupção, no entanto, não impede a cobrança de créditos da massa que se entende devidos por força de obrigação contratual, cabendo ao síndico adotar as medidas judiciais e extrajudiciais que considere necessárias à satisfação de tais créditos”. 17


8. ORDEM DE PREFERÊNCIA NO RATEIO

A ordem de preferência no rateio deve seguir o disposto no art. 83. da Lei de Falências (Lei 11.101/2005), a saber:

Art. 83. A classificação dos créditos na falência obedece à seguinte ordem:

I – os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a 150 (cento e cinqüenta) salários-mínimos por credor, e os decorrentes de acidentes de trabalho;

II - créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado;

III – créditos tributários, independentemente da sua natureza e tempo de constituição, excetuadas as multas tributárias;

IV – créditos com privilégio especial, a saber:

a) os previstos no art. 964. da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002;

b) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta Lei;

c) aqueles a cujos titulares a lei confira o direito de retenção sobre a coisa dada em garantia;

V – créditos com privilégio geral, a saber:

a) os previstos no art. 965. da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002;

b) os previstos no parágrafo único do art. 67. desta Lei;

c) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta Lei;

VI – créditos quirografários, a saber:

a) aqueles não previstos nos demais incisos deste artigo;

b) os saldos dos créditos não cobertos pelo produto da alienação dos bens vinculados ao seu pagamento;

c) os saldos dos créditos derivados da legislação do trabalho que excederem o limite estabelecido no inciso I do caput deste artigo;

VII – as multas contratuais e as penas pecuniárias por infração das leis penais ou administrativas, inclusive as multas tributárias;

VIII – créditos subordinados, a saber:

a) os assim previstos em lei ou em contrato;

b) os créditos dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatício.

§ 1º Para os fins do inciso II do caput deste artigo, será considerado como valor do bem objeto de garantia real a importância efetivamente arrecadada com sua venda, ou, no caso de alienação em bloco, o valor de avaliação do bem individualmente considerado.

§ 2º Não são oponíveis à massa os valores decorrentes de direito de sócio ao recebimento de sua parcela do capital social na liquidação da sociedade.

§ 3º As cláusulas penais dos contratos unilaterais não serão atendidas se as obrigações neles estipuladas se vencerem em virtude da falência.

§ 4º Os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão considerados quirografários.

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Sobre o autor
Alexandre Maimoni

Alexandre Brandão Henriques Maimoni, Advogado especializado em Direito Administrativo e previdência complementar fechada, Membro titular da Câmara de Recursos da Previdência Complementar, Possui graduação em Direito pela Universidade de São Paulo(1993), graduação em Comunicação Social - Jornalismo pelo Centro Universitário de Brasília(1999), especialização em Direito da Medicina pela Universidade de Coimbra(2014), especialização em Health Strategic Management for the Executive Manager (HESTRAM) pela University of Miami(2015) e aperfeicoamento em Curso Avançado de Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público(2001). Atualmente é Sócio em escritório de advocacia da Maimoni Advogados Associados. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Público.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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