Dever de motivação das decisões judiciais no novo CPC

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15/12/2016 às 12:58
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A pesquisa buscou discorrer sobre o dever de motivação das decisões judiciais, especificamente o artigo 489, e seus parágrafos primeiro e segundo.

RESUMO: Este trabalho teve por objetivo discorrer sobre o dever de motivação das decisões judiciais, como concretização da garantia de um processo justo. Visou demostrar a sua relevância no Estado de Direito, a fim de se construir uma decisão justa, participada, democrática, sem subjetivismos e arbítrios por parte dos julgadores. A pesquisa trouxe uma análise sobre às inovações advindas com a entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil no que concerne à matéria, tendo em vista que o novo diploma processual implementou dispositivos que norteiam a exata forma de fundamentar as decisões (artigo 489, §1º e 2º), expondo situações em que a decisão não será considerada fundamentada. Buscou demostrar a evolução do direito processual civil, e sua conexão com a Constituição Federal de 1988, notadamente o novo diploma processual que foi promulgado no atual Estado Constitucional, o qual preconiza que o direito processual civil será ordenado, disciplinado e interpretado à luz da Constituição Federal. E por fim, buscou compreender se as alterações trazidas pelo Novo Código de Processo Civil, especificamente seus artigos 11, 489 e seus parágrafos 1º e 2º, contribui para o provimento de um justo processo. Foi questionado se o dever de motivação das decisões judiciais previsto na CF/88 (artigo 93, inciso IX) ratificado pelas premissas no Novo Código de Processo Civil, condizia com a as perspectivas de consolidação de um processo justo. Conclui-se que o Novo Código de Processo Civil busca assegurar aos jurisdicionado a aplicação dos princípios processuais constitucionais, e que o dever de motivação, consubstanciado com o artigo 489, §1º e §2º, consolida a perspectiva de um processo justo, fortalecendo o modelo constitucional de processo. O dever de motivação foi tratado neste trabalho sempre com o ponto de vista jurídico.

PALAVRAS-CHAVES: Dever de motivação; Decisões judiciais; Constituição Federal; Novo Código de Processo Civil; Processo justo; Garantia constitucional; Regra; Princípio.


INTRODUÇÃO

A Constituição Federal de 1988 prevê, em seu artigo 93, inciso IX, que toda decisão judicial deverá ser fundamentada, sob pena de nulidade. O dever de motivação das decisões judiciais é uma garantia que representa componente basilar de um processo justo, vez que a jurisdição deve atuar mediante o devido processo constitucional, o que implica na exigência de que seja proferida uma decisão que justifique, de forma clara e precisa as razões de fato e de direito que nortearam a conclusão adotada pelo julgador.

No entanto, no decorrer do tempo, verificou-se a existência de decisões judiciais deveras concisas, que nem sempre cumpriam com a necessária aplicação da norma supramencionada.

Tem-se que o dever de motivação é pressuposto do Estado de Direito, constituindo um necessário instrumento do controle da atividade jurisdicional, pois é pela motivação que o juiz presta contas do exercício do poder jurisdicional, demostrando às partes, aos tribunais que lhe são hierarquicamente superiores e à sociedade de modo geral que aquela era a decisão correta a ser tomada.

Outrossim, o dever de motivação é fundamental para a ascensão da segurança jurídica. A jurisdição desempenha relevante função de esclarecimento, integração e homogeneização do Direito, dissolvendo antinomias, buscando soluções sistemáticas para eventuais omissões legislativas e definindo a forma pela qual o Direito deve ser interpretado e compreendido.

Ademais, indubitavelmente, o dever de motivação é, possivelmente uma das mais importantes garantias do devido processo legal, posto que é indispensável ao controle e a legitimação da atividade jurisdicional.

Com isso, verificou-se que, na vigência do Código de Processo Civil de 73, proliferavam-se decisões judiciais imotivadas ou mal motivas, sempre amparadas no equivoco entendimento jurisprudencial de que o juiz não precisa dar resposta a todas as alegações das partes, bastando que apresente as razões de sua decisão.

Facilmente se deparava com decisões padronizadas, que nem sempre serviam para dar uma resposta adequada às pretensões formuladas pelas partes e, com espantosa frequência, nem mesmo tinha relação com o caso concreto.

Diante disso, com a promulgação da Lei 13.256, de 04/02/2016 (Novo Código de Processo Civil), tem-se a expectativa de dar nova dignidade ao dever de motivação das decisões judiciais, a qual estabelece, de forma bastante detalhada, o que é motivar adequadamente uma decisão judicial (artigo 489, §1º e §2º).

A justificativa para a pesquisa baseia-se na relevância do tema sob o contexto jurídico e social, especialmente a partir do novo regramento processual civil, o qual tratou de programar significativas modificações normativas quanto ao tratamento dedicado à garantia da fundamentação das decisões (artigo 93, inciso IX, do Novo Código de Processo Civil) no cenário jurídico.

A presente pesquisa traz uma análise sobre às inovações advindas a partir da vigoração do Novo Código de Processo Civil no que concerne à matéria, tendo em vista que o novo diploma processual trouxe dispositivos que norteiam a exata forma de fundamentar as decisões (artigo 489, §1º e 2º), expondo situações em que a decisão não será considerada fundamentada, o que garante um provimento com maior qualidade.

O problema que norteia o presente trabalho compreende no seguinte questionamento: o dever de motivação das decisões judiciais previsto na CF/88 (artigo 93, inciso IX) ratificado pelas premissas no Novo Código de Processo Civil, condiz com a as perspectivas de consolidação de um processo justo?

O Novo Código de Processo Civil, ao definir hipóteses específicas em que a decisão não será considerada motivada busca resguardar a efetiva aplicação da garantia da fundamentação das decisões no contexto processual, prevista pela constituinte de 1988, colaborando significativamente para a expansão da qualidade das decisões e para a efetivação dos direitos fundamentais, através do processo.

É preciso resguardar o devido processo constitucional, permitindo um maior controle dos atos judiciais através do dever de motivar as decisões judiciais, o que representa um forte instrumento contra a arbitrariedade, contra o subjetivismo e o abuso de poder dos julgadores.

O mesmo diploma processual, objetivando concretizar a aplicação do disposto nos parágrafos 1ª e 2º do artigo 489, cria a possibilidade das partes interpor recurso caso a decisão incorra em qualquer das condutas previstas no mencionado dispositivo (vide artigo 1.022, parágrafo único, inciso II, do Novo Código de Processo Civil).

Para fins de delimitação do tema, como já retratado, o presente trabalho tem por objetivo geral estudar a importante e polêmica novidade implantada pelo novo regramento processual, qual seja a imposição do dever de motivação das decisões judiciais, especificamente o artigo 489 do Novo Código Processual, que traz as hipóteses que uma decisão não será considerada motivada.

Igualmente, tem por objetivos específicos, demostrar a evolução processual civil e sua conexão com a Constituição Federal de 1988, notadamente o novo diploma processual que foi promulgado no atual Estado Constitucional.

Compreender se as alterações trazidas pelo Novo Código de Processo Civil, especificamente seus artigos 11, 489 e seus parágrafos 1º e 2º, contribui para o provimento de um justo processo.

No trabalho desenvolvido utilizou-se o método dedutivo, com pesquisa bibliográfica de cunho qualitativo, através de doutrina, jurisprudências e julgados.


1. CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO PROCESSO CIVIL

A conexão entre o processo civil e a Constituição, acentuada após o segundo pós-guerra, com a constitucionalização e a fundamentalização de várias garantias processuais, conduzindo a uma teoria constitucional do processo, seja no tocante ao alento da análise da matriz constitucional do processo civil, ou seja, no que concerne à nova leitura dos institutos processuais fundamentais.

Sendo o direito processual civil um ramo do direito público, pois, voltado ao estudo da atividade-fim do Poder Judiciário, o exercício da função jurisdicional, evidencia a necessidade de seu estudo dar-se a partir da Constituição da República Federativa do Brasil (CF/88).

Tem-se que é a Constituição e não as leis que moldam o “ser” (ou melhor, o dever-ser) do Estado brasileiro.

Com isso, o disposto no artigo 1º da Lei 13.256, de 04/02/2016 (Novo Código de Processo Civil), traz à baila a Constitucionalização do Processo Civil, que é uma das características do direito contemporâneo, o qual tem com base principal o chamado neoconstitucionalismo ou póspositivismo.

O artigo 1º do Novo Código de Processo Civil nos revela que, o direito processual civil será ordenado, disciplinado e interpretado à luz da nossa atual Constituição Federal.

Nesses termos, o NCPC, já em seu primeiro artigo, confirma ser um documento processual, constituído à luz da Constituição e de seu modelo único de processo. Conforme expressa redação do referido dispositivo, a hermenêutica (o dever de interpretar e aplicar as normas processuais) será realizado conforme a Constituição de 1988.

Nesse contexto, analisar o modelo constitucional do direito processual civil, não é uma escolha teórica ou filosófica, tampouco uma corrente de pensamento que dependa da adesão deste ou daquele autor, deste ou daquele entendimento jurisprudencial, tendo em vista que, como toda norma constitucional, sua observância é imperativa, sob pena de inconstitucionalidade.

Está é uma das formas de ver o que Konrad Hesse chama de “força normativa da constituição”.

A ideia de um direito processual civil que aplique a teoria dos direitos fundamentais, bem ainda a força normativa da Constituição, é designada por renomados autores, como o Ministro Barroso, de neoconstitucionalismo ou póspositivismo.

O Ministro e Constitucionalista Barroso, na seara deste pensamento ensina que, o neoconstitucionalismo e o consequente processo de constitucionalização dos direitos possuem três marcos fundamentais, que se dividem em:

a) marco histórico: o constitucionalismo pós-guerra marca o surgimento das constituições garantistas, sendo no Brasil representado pela Constituição Federal de 1988;

 b) marco filosófico: consiste na superação do positivismo pelo pós-positivismo jurídico, destacando-se o reconhecimento da normatividade dos princípios;

c) marco teórico: que se subdividem em outras três grandes transformações: i) reconhecimento da força normativa da Constituição; ii) expansão da jurisdição constitucional; iii) o desenvolvimento de uma nova dogmática de interpretação constitucional.

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Segundo dos Santos, a constitucionalização do direito:

Esta ligada diretamente a expansão normativa constitucional cujo conteúdo material e valorativo se irradia por todo o ordenamento. Por sua vez, os valores, os fins públicos e os comportamentos contemplados pelas normas constitucionais passam a condicionar a validade das normas de todo ordenamento infraconstitucional. (DOS SANTOS, 2016, p. 67)

Já no âmbito processual, seguindo a acepção do neoconstitucionalismo, atualmente se fala em neoprocessualismo.

O neoprocessualismo, considerado como uma quarta evolução histórica do direito processual, consiste no estudo e aplicação do Direito Processual de acordo com o “novo modelo constitucional”.

Também conhecido como “formalismo valorativo”, o neoprocessualismo tem como destaque a relevância dos valores constitucionalmente resguardados na pauta de direitos fundamentais, na construção e na aplicação do formalismo processual.

Com o formalismo processual à luz da constituição, o dever de motivar as decisões judiciais, tema do presente trabalho, visa mostrar a sua real importância no Estado de Direito, com fito de se obter uma decisão justa, participada, democrática, sem subjetivismos e arbítrios por parte dos magistrados.

Tal dever está aliado ao que a doutrina processualista chama de modelo democrático do processo ou de processo democrático, todavia, antes de qualquer análise jurídico-processual do que sejam esses modelos, deve-se discorrer sobre o Estado Democrático de Direito em separado, ainda que brevemente.

1.2. Modelo Democrático de Processo

À luz do Estado (Constitucional) Democrático de Direito, o processo é um instrumento que trata as partes processuais de forma igualitária, equilibrada, sem protagonismos (inibido ser um dos sujeitos melhor, mais importante ou mais sábio que os demais), que compartilha a responsabilidade da resolução do litígio, da demanda judicial, entre outros elementos que demonstram a democratização do processo.

Nesse sentido, ensina o doutrinador Dierle Nunes (2015) que, em uma visão democrática constitucional, podemos asseverar que, não existe entre os sujeitos processuais submissão, mas, sim, interdependência.

Assim, o modelo democrático de processo tem o processo como instrumento comparticipativo, o qual consiste que os sujeitos processuais e juiz devem concorrer, de maneira isonômica, no debate processual, para chegar a uma decisão justa e motivada.

Por outro lado, o modelo democrático de processo tem por objetivo superar a visão de que o processo não é apenas um mero instrumento de jurisdição, mas sim um processo enquanto mecanismo garantístico dos direitos fundamentais das pessoas envolvidas nas demandas judicial.

Objetiva ainda, a preservação da ordem jurídica constitucionalmente estabelecida, vedando desvios e abusos de poder estatal, bem como do poder econômico privado.

O processo democrático fortalece o debate endoprocessual das partes, especialmente garantindo-se a observância dos princípios processuais, com ênfase para o princípio do contraditório, priorizando-se, assim, a cidadania, a democracia, e a soberania popular, bem como assegurando a supremacia da Constituição.

Para Eduardo Rodrigues dos Santos, o modelo constitucional de processo consiste em:

Um modelo processual democrático construído à luz do paradigma do Estado Constitucional Democrático de Direito, estruturando-se a partir de princípios processuais previstos na Carta Magna. Isso decorre da própria essência da Constituição, enquanto documento político-jurídico fundamental, que, dentre outras coisas, estabelece as normas que devem fundamentar e delinear o sistema jurídico infraconstitucional. (DOS SANTOS, 2016, p. 125).

Assim, concluímos que, se os princípios constitucionais processuais previsto no modelo democrático de processo forem todos observados, certamente teremos um processo justo, o qual se chegara uma decisão justa.

1.3. Direito Fundamental ao Processo Justo

A Constituição Federal de 88 no inciso LIV, do artigo 5º indica que “ninguém será privado da sua liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Com isso, institui-se o direito fundamental ao processo justo, com destaque no plano internacional como na Declaração Universal dos Direitos dos Homens, Pacto Internacional relativo aos direitos Civis e Políticos e na Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

O justo processo constitui princípio fundamental para organização processual no Estado Constitucional, sendo o modelo exigido para prestação jurisdicional e atuação do Estado-Juiz.

A observância do processo justo é necessária para que os sujeitos processuais obtenha uma decisão justa, e se falando na parte extraprocessual é de suma importância a sua aplicação para a formação dos precedentes.

Dessa forma, o magistrado tem o dever de interpretar e aplicar a legislação processual em conformidade com direito fundamental ao processo justo.

Sobre o tema direito fundamental ao processo justo, os doutrinadores Marinoni, Arenhart e Mitidiero lecionam que:

O Estado Constitucional tem o dever de tutelar de forma efetiva os direitos. Se essa proteção depende do processo, ela só pode ocorrer mediante processo justo. No Estado Constitucional, o processo só pode ser compreendido como o meio pelo qual se tutela os direitos na dimensão da Constituição. O direito ao processo justo visa a assegurar a obtenção de uma decisão justa para as partes e a unidade do Direito para a sociedade civil. Ele é o meio pelo qual se exerce pretensão à justiça (Justizanspruch) e pretensão à tutela jurídica (Rechtsschutzanspruch). Esse é o seu objetivo central dentro do Estado Constitucional. (MARINONI, ARENHART, MITIDIERO, 2015, p. 542).

Sendo o processo justo um direito fundamental, conclui-se que, a partir do exercício do direito de ação e da provocação da jurisdição em busca do acesso à justiça, o Estado está obrigado a resguardar, durante todo o trâmite da ação, o respeito aos preceitos constitucionais.

Ademais, outro princípio constitucional processual decorrente do devido processo legal, é o do contraditório, também identificado como princípio da bilateralidade da audiência, o qual se encontra positivado na Constituição brasileira, aliado ao princípio da ampla defesa.

O artigo 5º, inciso LV, dispõe que: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são garantidos o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

Ainda sobre o assunto, ensina José Afonso da Silva que o princípio do contraditório é pressuposto indeclinável para a condução de um processo justo, sem o qual a apreciação judicial é ausente de valor.

Completando a linha de raciocínio sobre tal questão, nos ensinamentos de Edílson Mougenot Bonfim, o contraditório é “uma garantia conferida às partes de que elas efetivamente participarão da formação da convicção do juiz”.

Tem-se, ainda, o princípio da ampla defesa, o que, conforme já mencionado está coadunado com o princípio do contraditório e positivado na Carta Magna de 1998.

Partindo da análise do próprio nome “ampla defesa”, pode-se afirmar que a ampla defesa compreende ser um princípio complexo, o qual estabelece um estado ideal de defesa, garantindo aquele que esteja sendo acusado de algum fato, tem o direito de argumentar e produzir todos os meios de provas admitidos em seu favor.

Por fim, a obrigatoriedade da fundamentação das decisões representa mais uma das garantias de um processo justo. Nesse contexto, uma decisão bem fundamentada e motivada, atendendo os requisitos estipulados no Novo Código de Processo Civil, traz às partes a possibilidade de demonstrar o seu inconformismo com o entendimento do magistrado, utilizando-se dos meios processuais para impugná-la, concretizando assim o justo processo, invocando o princípio do duplo grau de jurisdição.

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Sobre o autor
Paulo Henrique Medeiros

Cursando o décimo período do curso de Direito pela Faculdade Santa Rita de Cássia; Aprovado no XIX Exame de Ordem dos Advogados;

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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