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A guerra civil da Síria e a sua relação com o Direito Internacional Público

20/05/2017 às 15:15
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As negociações do cessar-fogo na Síria evidenciam a internacionalização do conflito, que passou a envolver diversos atores e tem consequências que extrapolam as fronteiras.

INTRODUÇÃO

O presente artigo aborda a relação da maior crise humanitária atual, a guerra civil na Síria e sua relação com direito internacional público. Temos a intenção de analisar os institutos do direito internacional que se relacionam diretamente com os problemas enfrentados pela Síria. Esse conflito já se estende por anos e o número de vítimas de guerra aumenta, chamando a atenção da comunidade internacional.

Primeiramente, será abordado o direito internacional dos conflitos armados aplicados à guerra da Síria. Após tal abordagem, as consequências da guerra da Síria, dentre elas a violação ao Direito Internacional Humanitário e ao Direito Internacional dos Direitos Humanos.


1. O DIREITO INTERNACIONAL DOS CONFLITOS ARMADOS APLICADOS A GUERRA DA SÍRIA.

Desde os primórdios da civilização, os conflitos armados estão presentes na história. Sejam eles por questões territoriais, étnicas, crenças ou interesses em comum. O uso da força, em muitas vezes, é o meio em que os Estados encontram para resolver e alcançar seus determinados fins. A questão é que tais ações, com o desenvolver da sociedade, da globalização e da tecnologia, foram ganhando força e causando drásticas consequências à população mundial e aos relacionamentos entre os Estados. Desta forma, a fim de regulamentar as guerras e conflitos armados, surge o Direito Internacional, o qual, tendo como fonte primária o consentimento dos Estados, objetiva normatizar as relações entre os Estados, para que possam atingir seus objetivos por meios pacíficos, sem o uso da força.

A guerra da Síria teve seu início no começo do ano de 2011, com protestos contra o governo do presidente Bashar al-Assad, visando uma renovação na política do país para um sistema político mais democrático. A resposta do governo diante das manifestações foi uma intensa represália aos grupos de oposição do presidente. O início do conflito começou, portanto, como uma luta pelo poder sírio em que a oposição exigia a saída do presidente e este lutava contra grupos que objetivavam, de acordo com o governo, apenas a desestabilização e crise do país.

Contudo, o conflito ganhou um âmbito diferente, ou seja, não se trata mais do uso de armas e violência como oposição ao governo ou para defendê-lo. Surgiram outros autores, dentre eles, o próprio Estado Islâmico (EI), extremistas mulçumanos, além da participação de outros Estados. O que começou como uma oposição a um governo ditatorial, hoje é uma guerra devastadora em que vários agentes são acusados de crimes de guerra e atentados contra civis.

O cenário atual do conflito é a luta do Estado Islâmico em território sírio contra o governo de Bashar al-Assad e contra os rebeldes, e já ocupa parte do território da Síria. Enquanto vários sírios vivem nos territórios dominados pelo EI e são submetidos, muitas vezes, a um tratamento cruel e radical, outro aspecto relevante durante o conflito são as constantes acusações de violência e crimes por parte do próprio governo sírio. Uma grave acusação ao governo, durante a guerra, é o uso de armas químicas. Sabe-se que a Síria possui um grande arsenal dessas armas, mas o governo, ainda no início do conflito, afirmou que esse arsenal não seria usado, visando à proteção dos civis. Fato é que vários ataques envolvendo gases tóxicos foram registrados em território sírio, ocasionando elevado número de mortes.

Vários são os esforços para o fim da guerra pela comunidade internacional, através de negociações sucessivas, entretanto, nenhuma delas ainda foi plenamente eficaz. Diversos sujeitos estão envolvidos nos conflitos, dentre eles, potências regionais e globais, tais quais os Estados Unidos, em oposição ao governo sírio e à Rússia, um dos países responsáveis pelo suporte à Bashar al-Assad.


2. DAS CONSEQUÊNCIAS DA GUERRA DA SÍRIA: A VIOLAÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS E AO DIREITO HUMANITÁRIO NA SÍRIA.

2.1 CONSEQUÊNCIAS E VÍTIMAS DA GUERRA.

Segundo afirmou Filippo Grandi, Alto Comissário das Nações Unidas para Refugiados, a Síria é a maior crise humanitária e de refugiados do nosso tempo, que continua causando sofrimento para milhões de pessoas, e que deveria atrair o apoio de todo o mundo.

A guerra na Síria, a qual completou cinco anos, já contabiliza o número de mais de 250 mil mortos em decorrência do conflito. As forças do governo realizaram ataques indiscriminados ou que visaram diretamente os civis, como o bombardeio de áreas residenciais civis e de centros médicos, com artilharia, morteiros, bombas de barril e, supostamente, agentes químicos, matando civis de forma ilegal. As forças governamentais também impuseram cercos prolongados, encurralando os civis e privando-os de comida, cuidados médicos e outras necessidades.

Outro problema enfrentado pelos civis na Síria é o fato deles constituírem, frequentemente, os alvos do governo sírio e do Estado Islâmico, ferindo assim, um princípio basilar do Direito de Guerra. Os civis são vítimas do uso de bombas de fragmentação pelo governo e este uso resulta em mortes, lesões e em um legado de remanescentes explosivos de guerra.

A soberania territorial da Síria também foi violada durante a guerra civil. Hoje diversos grupos armados não estatais, como o Estado Islâmico, ocupam grande parte do território sírio, intensificando ainda mais a violência e os ataques terroristas no país.

2.2 A violação aos Direitos Humanos e ao Direito Humanitário na Síria.

Há grave violação aos direitos humanos em decorrência da oposição interna ao governo de Bashar al-Assad, como já dito anteriormente. Hoje o conflito já ultrapassa os limites impostos pelo Direito Humanitário, uma vez que um dos principais agentes da guerra na Síria é o Estado Islâmico, responsável por grande parte dos ataques no país. Apesar de ser independente do governo sírio, este acaba sendo responsabilizado pelos atos do grupo terrorista devido à omissão estatal frequente.

Diante dessas afirmações, é necessário entender o que é o Direito Internacional dos Direitos Humanos e o Direito Internacional Humanitário, para, depois das explicações correspondentes, explicitar as violências a esses direitos no cenário sírio de guerra, e evidenciar, assim, a clara violação de tais direitos.

O Direito Internacional Público é um campo muito amplo, que possui vários ramos como, por exemplo, os Direitos Humanos (DH) e o Direito Internacional Humanitário (DIH). Ambos os sistemas têm como prioridade a proteção da dignidade do indivíduo tendo como base os seguintes princípios: (a) não-discriminação – cada ser humano deve ter sua dignidade resguardada independente de sua raça, sexo, cor, nacionalidade ou religião; (b) segurança – não deve aplicar aos indivíduos retaliações, penas coletivas ou fazê-los reféns; (c) inviolabilidade – toda pessoa tem o direito de ter sua integridade moral e física respeitada, não importando se o cenário é de paz ou de conflito1.

Apesar de terem nomenclaturas bem parecidas e diversas semelhanças o DIH e os DH são ordens jurídicas distintas. Estes sistemas atuam em situações e âmbitos diferentes. Enquanto os Direitos Humanos são aplicáveis em qualquer tempo ou espaço, o Direito Internacional Humanitário opera em tempo de conflitos armados e nas áreas onde acontecem as hostilidades.

Vários artigos da Declaração Universal de Direitos Humanos foram violados, tais como os arts. 2, 3, 5, 9 e 25. O relatório mundial de 2015 que aborda acontecimentos de 2014 da Human Rights Watch trouxe alguns dados que comprovam as violações. Segundo o relatório, a Rede Síria de Direitos Humanos destacou a possibilidade de que 85.000 sírios estivessem submetidos a desaparecimento forçado (subtração forçada de alguém de seu âmbito familiar e social de forma ilegal) pelo governo. Tal afirmação fere o direito à paz, à liberdade e à dignidade do homem e também à Declaração sobre a Proteção de Todas as Pessoas contra os Desaparecimentos Forçados de 1992.

Além disso, o relatório já citado e também relatórios da Anistia Internacional destacam a existência de vários casos de maus tratos e tortura, que são violações diretas do art. 5º da Declaração Universal de Direitos Humanos e à Declaração sobre a Proteção de Todas as Pessoas contra a Tortura ou Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes de 1975.

O campo de refugiados de Idlib na Síria foi vítima de bombardeios em maio de 2016. Cerca de 28 pessoas foram mortas e os feridos computavam, no início de maio, o número de 50 pessoas. Dentre as vítimas, grande foi o número de mulheres e crianças. Os bombardeios contra os civis no campo de refugiados constituem crime de guerra, porque violam os princípios e direitos previstos no Protocolo II Adicional às Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1949 relativo à Proteção das Vítimas dos Conflitos Armados Não Internacionais. O art. 4º do citado Protocolo prevê que todos os civis devem ser protegidos e respeitados, além de determinar a proibição “dos atentados contra a vida, saúde ou bem-estar físico ou mental das pessoas, em particular o assassínio, assim como os tratamentos cruéis, tais como a tortura, as mutilações ou qualquer forma de pena corporal... Os atos de terrorismo; Os atentados à dignidade da pessoa, nomeadamente os tratamentos humilhantes e degradantes, a violação, a coação à prostituição e todo o atentado ao pudor.”.

Outro exemplo de violação ao Direito Humanitário é o ataque à população civil na cidade de Aleppo, principal cidade do norte da Síria que está destruída em decorrência da guerra. Mais uma violação foi noticiada em abril deste ano, quando bombardeios aéreos atacaram o hospital Al-Quds, ocasionando a morte de pelo menos 27 pessoas, dentre elas crianças e médicos. Os ataques a hospitais civis constituem violação ao art. 18 da Convenção IV, Convenção de Genebra Relativa à Proteção das Pessoas Civis em Tempo de Guerra, de 12 de Agosto de 1949, que prevê “os hospitais civis organizados para cuidar dos feridos, doentes, enfermos e parturientes não poderão, em qualquer circunstância, ser alvo de ataques; serão sempre respeitados e protegidos pelas Partes no conflito.”.

Diversos crimes de guerra cometidos em território sírio também foram denunciados em relatórios da Anistia Internacional:

O governo e as forças aliadas continuaram a cometer crimes de guerra e outras sérias violações do direito internacional, como ataques diretos contra civis e ataques indiscriminados. Por exemplo, um ataque com bomba de barril em Baideen, no governado de Alepo, em 5 de fevereiro, deixou pelo menos 24 civis mortos e 80 feridos. Um ataque aéreo no mercado de Sahat al- Ghanem em Duma, no dia 16 de agosto, matou aproximadamente 100 civis e deixou centenas de feridos. Segundo o Centro para Documentação de Violações, uma ONG síria, bombardeios aéreos foram responsáveis por metade das mortes de civis. Anistia Internacional informe 2015/2016.

A partir desses relatos, fica clara a violação do Direito Internacional dos Direitos Humanos e o Direito Internacional Humanitário, os quais são institutos basilares do Direito Internacional Público.


3. O DIREITO INTERNACIONAL PENAL APLICADO AO CONFLITO DA SÍRIA

Como vertente integrante do Direito Internacional, apresenta-se, também, o Direito Internacional Penal. Vale antes ressaltar a existência de duas definições, as quais, Direito Internacional Penal e Direito Penal Internacional. A primeira está relacionada ao Direito Internacional Público, sendo denominada por alguns autores como Direito Internacional Público Penal. Já a segunda está relacionada ao Direito Internacional Privado2. O Direito Internacional Penal constitui um conjunto de normas penais que visam à inibição de infrações frente ao Direito Internacional e o Direito. Desta forma, o Direito Internacional Penal apresenta as condutas que infringem o Direito Internacional3. Sem embargo, é válido ressaltar que a o termo Direito Internacional Penal se sobrepôs, ao longo do tempo, ao Direito Penal Internacional em razão de vários autores não considerarem a existência de um sistema penal internacional genuíno, ou seja, afirmava-se que não havia delitos e penas internacionais de fato, desta forma, era ilusório pensar em um Direito Penal Internacional.

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Assim sendo, o Direito Internacional Penal, conforme disposto no Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, aponta como sendo infrações ao Direito Internacional o genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra. Para além, conforme Brant4, também são incorporados às definições de delito internacional: crimes de agressão, terrorismo, lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, corrupção, assim como crimes globais (tráfico de pessoas, órgãos, entre outros). Dentre os delitos aludidos, vale ressaltar certa dificuldade encontrada em relação aos crimes de agressão e de terrorismo, uma vez que as definições de ambos ainda são nebulosas. Em relação aos crimes de agressão, diferente dos demais, a conceituação não é clara. A princípio, crimes de agressão se enquadravam em crimes contra a paz, mas o termo foi considerado muito amplo e de difícil conceituação. Assim sendo, com a resolução 3314 da Assembleia Geral, optou-se pelo termo crimes de agressão, contudo, ainda não há clareza acerca do conceito do tema. Diante das tentativas de conceituar tal delito, a Comissão de Direito Internacional afirma que caracterizaria a violação do artigo 2º, §4, todavia, a definição de crime de agressão continua indefinida. Outra tentativa foi feita na conferência de Roma, em que se definiu a competência do tribunal penal em relação aos crimes de agressão, todavia, não sua conceituação5. Desta forma, permanece a seguinte resolução do Estatuto;

O Tribunal exercerá jurisdição sobre o crime de agressão uma vez que seja aprovado um dispositivo, em conformidade com os artigos 121 e 123, em que se defina o crime e se enunciem as condições nas quais o Tribunal exercerá a sua jurisdição sobre tais crimes. Tal dispositivo será compatível com os dispositivos pertinentes da Carta das Nações Unidas. (ONU, Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. Roma. 1998. artigo 2o§4).

A guerra da Síria, que começou como uma série de grandes protestos populares em 26 de janeiro de 2011 e progrediu para uma violenta revolta armada em 15 de março de 2011, influenciados por outros protestos simultâneos no mundo árabe, com o passar do tempo, deixou de ser uma simples "luta por poder" e passou também a abranger aspectos de natureza sectária e religiosa, com diversas facções que formam a oposição combatendo tanto o governo quanto umas às outras. Assim, o conflito acabou espalhando-se pela região, atingindo também países como Iraque e o Líbano, atiçando, especialmente, a rivalidade entre xiitas e sunitas.

Segundo informações de ativistas de direitos humanos dentro e fora da Síria, o número de mortos no conflito passa das 250 mil pessoas, sendo mais da metade de civis. Outras 130 mil pessoas teriam sido detidas pelas forças de segurança do governo. Mais de quatro milhões de sírios já teriam buscado refúgio no exterior para fugir dos combates, com a maioria destes tomando abrigo no vizinho Líbano. O conflito também gerou uma enorme onda migratória de sírios e árabes em direção a Europa, sem paralelos na história do continente desde a Segunda Guerra Mundial.

E é nesse contexto que o direito internacional público vem atuando, pois é um ramo do Direito destinado a construir um arcabouço jurídico, que regulamenta o sistema internacional, bem como o comportamento e as relações dos Estados mediante uma estrutura internacional anárquica e horizontalizada. Este conjunto normativo, além de ser celebrado a partir do consentimento dos Estados, busca “minimizar os efeitos decorrentes dos conflitos armados, de forma a regulamentar e aprimorar a lei dos usos e costumes da guerra”6.

Existem várias perspectivas quanto às origens do direito internacional público, as quais verificam seu surgimento em diferentes contextos históricos. No entanto, existe um entendimento majoritário de que a concretização deste direito ocorre, especialmente, entre os séculos XVI e XVII, com o Tratado de Westfalia, a criação do Estado Moderno e as expansões marítimas. Seria, a partir desse momento, que regras fundamentais passariam a regulamentar as relações entre os Estados Europeus, ocorrendo um reconhecimento mútuo entre as partes, em particular, do princípio da igualdade7. Ainda segundo Varella, o Direito Internacional Público “cresce com maior interdependência global, no século XX, e sofre uma expressão importante, sobretudo, a partir dos anos noventa”8, com o fim da guerra fria e o estabelecimento de tribunais, como o Tribunal Penal Internacional. Visualiza-se, a partir de meados do século XX, uma forte emancipação das regras jurídicas internacionais que visam prioritariamente oferecer aos Estados diversificadas formas de negociação. “As relações políticas entre os Estados são cada vez mais guiadas por normas e cada vez menos pela imposição da força por Estados mais poderosos.”9.

Para o Direito Internacional Público a expressão guerra deve ser definida em termos essencialmente jurídicos. Segundo Mazzuoli “a guerra pode ser conceituada como todo conflito armado entre dois ou mais Estados, durante certo período de tempo e sob a direção dos seus respectivos governos, com a finalidade de forçar um dos adversários a satisfazer a(s) vontade(s) do(s) outro(s)”. Iniciando assim, com uma declaração formal de guerra, e terminando com a conclusão de um Tratado de Paz, ou outra ação capaz de pôr termo às hostilidades e findá-la por completo.

Dentre as definições de guerra para o DIP, podem-se ressaltar os seguintes elementos que caracterizam o conceito de guerra: a) a existência de um conflito armado; b) a desavença entre pelo menos dois Estados; c) a direção das hostilidades; e d) a intenção de impor a sua vontade/desejo sobre o outro. A guerra, para além do caráter estritamente formal, pode ser entendida num sentido material, quando, apesar de não ter se declarado formalmente o início das hostilidades, tem-se início do uso da força armada por um Estado contra outro (ou outros) com a finalidade de impor a este (ou estes) a sua única e exclusiva vontade10.

Atualmente, a guerra é um ato de violência inadmitido no Direito Internacional Público. A partir do século XX, com a proibição da guerra entre os seus componentes, estabelecido no Pacto da Liga das Nações (1919), a guerra se tornou uma questão propriamente jurídica. Em 27 de agosto de 1928 é ratificado o Tratado de Renúncia à Guerra em Paris, conhecida também como o Pacto Briand-Kellog, em referência aos dois estadistas - o Secretário de Estado Americano e o Ministro das Relações Exteriores francês – celebradores da negociação, cuja proibição da guerra tornou-se efetiva. O Tratado Internacional, principal fonte do DIP, estipulou, assim, a renúncia à guerra como meio de solução de conflitos internacionais, a isso renunciando, como instrumento de política nacional, em suas relações recíprocas. Dentro dessa ordenação, com exceção da legítima defesa, qualquer forma de agressão armada é considerada ilegal.

Em confirmação ao Pacto Briand-Kellog, a Carta das Nações Unidas também estabeleceu, no seu art. 2°, § 3°, que: “Todos os membros, a fim de assegurarem para todos em geral os direitos e vantagens resultantes de sua qualidade de membros, deverão cumprir de boa fé as obrigações por eles assumidas de acordo com a presente Carta”. A Carta ainda prescreve, no § 4, a proibição formal e extensiva da guerra, estabelecendo: “todos os membros deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça ou o uso da força contra a integridade territorial ou a dependência política de qualquer Estado, ou qualquer outra ação incompatível com os Propósitos das Nações Unidas”11.

Embora a Carta da ONU não se utilize formalmente da expressão “guerra”, ao fazer referência ao uso da força, que é uma expressão mais abrangente, afirmando assim, que qualquer tipo de agressão é proibido, seja ela física, moral ou de ameaça à integridade territorial ou à independência política de qualquer Estado.

Apesar do Direito Internacional adotar a guerra - ou o conflito armado como um ato ilícito. É fato que, após a criação e desenvolvimento do DIP, juntamente às pressões da ONU e das OIs frente aos Estados, o desenvolvimento e aprofundamento dos processos de integração (blocos regionais) contribuíram em certa medida para a promoção da paz, principalmente quando comparada às guerras mundiais. A questão é que os mecanismos trazidos pelos sujeitos do DIP só são/serão eficazes a medida que os Estados cooperarem, isto é, o bom funcionamento do DIP dependerá dos próprios Estados.

As negociações do cessar-fogo na Síria evidenciam a internacionalização do conflito, que passou a envolver diversos atores e tem consequências que extrapolam as fronteiras, de modo que seu andamento tem impactos na segurança e na política do Oriente Médio e também de outras regiões. É por isso que os futuros desdobramentos do conflito são observados com atenção: populações de localidades isoladas pelos combates agora têm acesso a alimentos e suprimentos e, enquanto fica clara a intenção do governo de expandir e consolidar suas posições, os rebeldes podem promover uma reorganização durante a pausa. Acresce que o fluxo crescente de refugiados, sobretudo em direção à Europa, e o combate a grupos extremistas, são questões associadas ao conflito na Síria que devem permanecer em evidência, pelo menos no curto prazo.

Portanto, o DIP tem uma relação direta com a guerra da Síria, uma vez que os ataques são uma violação flagrante ao direito internacional humanitário e aos direitos humanos, e demonstram uma extrema dificuldade enfrentada pelos civis, que fogem da violência na Síria, na tentativa de encontrar segurança.


Notas

1BRANT, Leonardo Nemer Caldeira (Coord.). Coleção Para Entender: O Direito Internacional Humanitário. Belo Horizonte, Editora Del Rey, 2006.

2MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 7 ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.

3BRANT, Leonardo Nemer Caldeira (Coord.). Coleção Para Entender: A Proteção Internacional dos Direitos Humanos. Belo Horizonte, Editora Del Rey, 2008.

4BRANT, Leonardo Nemer Caldeira (Coord.). Coleção Para Entender: A Proteção Internacional dos Direitos Humanos. Belo Horizonte, Editora Del Rey, 2008.

5BRANT, Leonardo Nemer Caldeira (Coord.). Coleção Para Entender: A Proteção Internacional dos Direitos Humanos. Belo Horizonte, Editora Del Rey, 2008.

6MINISTÉRIO DA DEFESA. Manual de emprego do Direito Internacional dos conflitos armados (DICA) nas forças armadas. 2011.

7MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 7 ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.

8VARELLA, Marcelo D. Direito Internacional Público. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

9VARELLA, Marcelo D. Direito Internacional Público. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

10MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 7 ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.

11ONU. Carta das Nações Unidas. Disponível em: https:<https://nacoesunidas.org/carta/>.

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Sobre a autora
Vivilene Garcia

Acadêmica do curso de Direito da Faculdade Católica Rondônia. Autora de artigo na revista do fórum amazônico de direito processual, mês 08/2016, artigo no primeiro congresso rondoniense de carreiras jurídicas mês 11/2016 e artigo no site jusbrasil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GARCIA, Vivilene. A guerra civil da Síria e a sua relação com o Direito Internacional Público. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5071, 20 mai. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/54609. Acesso em: 22 dez. 2024.

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