No último dia 27 de outubro o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do Recurso Extraordinário n. RE693456, que teve repercussão geral reconhecida e tratou da constitucionalidade do desconto dos dias de greve do servidor público. Por 6 votos a 4, o STF decidiu que "A administração Pública deve proceder ao desconto dos dias de paralisação decorrentes do exercício do direito de greve pelos servidores públicos, em virtude da suspensão do vínculo funcional que dela decorre, permitida a compensação em caso de acordo. O desconto será, contudo, incabível se ficar demonstrado que a greve foi provocada por conduta ilícita do Poder Público".
Pela decisão, fixou-se precedente no sentido de que a entidade estatal deve fazer o corte imediato do ponto do servidor que aderir a greve. Esse entendimento contraria o que tem se verificado na prática da maioria das greves de servidores públicos no Brasil nos últimos anos, em que os servidores que aderem ao movimento continuam recebendo o salário durante a paralisação e só são obrigados a devolver os salários dos dias parados por força de decisão judicial posterior.
A suspensão imediata do pagamento dos salários dos grevistas, como entendeu o STF, poderá inibir a adesão à greve de grande parte da categoria de servidores, tenderá a enfraquecer significativamente os movimentos paredistas ou mesmo impossibilitar que eles se instaurem.
É preciso deixar claro que, seja qual for a decisão do Poder Judiciário acerca da legalidade da greve, os servidores são obrigados a devolver o salário dos dias em que não trabalharam ou a cumprir outra forma de compensação pela suspensão ilegal da atividade, como reposição de horas de trabalho ou do serviço atrasado.
Em quase todas as greves, o principal ponto de pauta questionado diz respeito às recomposições salariais, cuja finalidade é manter o mesmo poder de compra e padrão de vida do servidor. Com isso, restou uma pergunta importante a ser respondida: Como é que a busca por um direito (manutenção da qualidade de vida) pode implicar simultaneamente na perda imediata desse mesmo direito (salários relativos aos dias da suspensão das atividades), como decidiu recentemente o STF?
Deve-se contextualizar a referida decisão com o momento político e econômico que se apresenta para o ano de 2017, a fim de buscar uma resposta possível à citada pergunta. A grande maioria das reformas legislativas propostas pelo governo federal, sobretudo a previdenciária, se forem aprovadas como foram apresentadas, causarão impactos significativamente prejudiciais à população menos favorecida. Os servidores públicos, sobretudo os de carreiras mais simples, também serão diretamente afetados.
Em um cenário como o atual, é imperioso permitir que as categorias de trabalhadores do serviço público mantenham seu poder de resposta para que, em casos extremos de desrespeito aos seus direitos, possam se utilizar do mecanismo da greve sem inibidores agressivos como o imediato corte de seu vencimento.É certo que a população usuária dos serviços públicos não pode arcar sozinha com os prejuízos de uma greve, que são muito danosos. Sempre é melhor que não haja greve, que o Estado cumpra as obrigações assumidas legalmente junto aos servidores e, com isso, possa cobrar-lhes com veemência a obrigação de prestar serviços com qualidade e eficiência. Se esse estado de conciliação se estabelece, a população sai sempre beneficiada.