Crimes tributários: análise crítica da extinção da punibilidade pelo pagamento nos crimes fiscais em contraposição com o jus puniendi estatal

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10/01/2017 às 17:10
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6. EXTINÇÃO DA PUNILIDADE VS. PODER-DEVER DE PUNIR

O bem jurídico tutelado nos delitos tributários, qual seja, a garantia da ordem econômica, com a consequente interferência do Estado com o seu poder-dever de punir, nos casos de descumprimento da norma, não é protegido ou favorecido em qualquer hipótese com a extinção da punibilidade pelo pagamento, ao contrário, pois com a extinção da sanção ao agente delituoso se deturpa o bem jurídico protegido pela norma, criando na sociedade uma sensação de impunidade.

A ausência de coerência em nosso ordenamento jurídico, em relação à extinção da punibilidade, também é fator de reprovação social e ética, isto porque, o meio como está regulamentado beneficia apenas determinados infratores, os criminosos tributários ou econômicos, enquanto que, aos agentes de crimes comuns, o poder-dever é cumprido de forma severa e desproporcional, o que demonstra às claras, a pouca ou nenhuma importância na coerência de valores na confecção das normas em um Estado democrático que prega igualdade a todos.

Daí que, insurge a questão da utilização do Estado de sua prerrogativa de poder-dever de punir apenas como uma finalidade arrecadatória e uma patente injustiça social. A impunidade dos agentes fiscais tem contribuído para o aumento da criminalidade econômico-tributária, pois no Brasil, o “jus puniendi” não está sendo aplicado a exemplo de outros países, como visto anteriormente, incentivando o criminoso do colarinho branco e, de maneira concomitante, minando o bem jurídico tributário. 

Com o malacafento objetivo arrecadatório estatal, razão do esvaziamento do “jus puniendi”, tem-se que, a extinção da punibilidade pelo pagamento não é válido em si e não tem amparo constitucional pra impedir a aplicação do poder-dever estatal, visto não ser essa benesse aplicada indistintamente a qualquer criminoso, mas tão somente determinados sujeitos e a determinados delitos. Ensinam os mestres Günther Jakobs e Manuel Meliá (JAKOBS; MELIÁ, 2007) que: “quando um esquema normativo, por mais justificado que esteja, não dirige conduta de pessoas, carece de realidade social”. 

Assim, atinge a extinção da punibilidade pelo pagamento ou reparação do dano a todos os crimes, indistintamente, ou aplicasse a punição, o “jus puniendi”, a todos os infratores de modo equânime, afastando a manutenção desta contradição, reflexo de uma crise de legitimidade que se instaurou sobre o Direito Penal.


7. CONCLUSÃO

A análise feita a partir da exposição dos conceitos, jurisprudências, Leis e fatos correlacionados ao poder-dever de punir do Estado em confronto com a extinção da punibilidade pelo pagamento dos delitos econômicos, mais especificamente nos crimes tributários, levou-nos a concluir que:

O Direito do Estado, ou seu Poder-Dever de punir, consubstanciado na expressão do “jus puniendi”, deverá atingir a todos os cidadãos deste País que, ao descumprir determinada norma regradora de conduta, sofrerá uma punição equânime ao crime cometido.

Por deter o Estado o monopólio da sanção penal, ao aplicá-la ao indivíduo transgressor, deverá garantir que esta reprimenda, juntamente com os princípios do Direito Penal, impeça ou iniba novas infrações econômicas. A penalidade penal, corretamente aplicada, além de prevenir novos crimes e retribuir ao agente delituoso um comedido sofrimento, legitima o Estado em seu poder-dever perante a sociedade.

Nefasta é a conduta criminosa tributária na sociedade, pois não atinge apenas um indivíduo e, sim, uma gama de pessoas, já que, afeta dentre outras situações, a saúde pública e a educação.

No atual quadro brasileiro, a extinção da punibilidade pelo pagamento não presta para o fim que fora criado. Isto se dá, pois, da maneira como é aplicada aos agentes sonegadores de tributos, só incentiva o crescimento da sonegação, carecendo, portanto, de urgente reforma legislativa deste instituto.

A extinção da punibilidade, aplicada de maneira discriminatória, é reprovável, também, no quesito da individualização da concessão do benefício da extinção, contemplando apenas agentes de considerável poder aquisitivo, o que demonstra uma afronta ao princípio da isonomia, e mais, confirma o verdadeiro caráter do instituto que é a arrecadação aos cofres públicos, relegando o Direito Penal de “ultima ratio” à sarjeta, bem como o “jus puniendi” estatal.


REFERÊNCIAS

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BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RHC 59.324/MS. Relator: Ministro Jorge Mussi. Quinta Turma. Mato Grosso do Sul, 13 out. 2015. DJe 21 out. 2015.

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BORTOWSKI, Leandro Barreto. O preço da liberdade – A extinção da punibilidade nos delitos econômicos à luz do Princípio da proporcionalidade. Rio Grande do Sul: WS Editora, 2009.

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FILHO, Edmar Oliveira Andrade. Suspensão da exigibilidade do crédito tributário. São Paulo: MP Editora, 2007.

GOMES, Luiz Flávio; El TASSE, Adel. Os crimes tributários e a extinção da punibilidade. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2011-mar-17/coluna-lfg-crimes-tributarios-extincao-punibilidade>. Acesso em 29 de novembro de 2016.

JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manuel Cancio. Direito penal do inimigo: noções e críticas. Rio Grande do Sul: Livraria do Advogado, 2007. p.9.

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PRADO, Luiz Regis Prado. Curso de Direito Penal Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 567.

SCHMIDT, Andrei Zenkner. Exclusão da punibilidade em crimes de sonegação fiscal. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 73-74.

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Sobre o autor
Flavio Lisbôa

Advogado especialista e Direito Penal e Processual Penal

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