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A hermenêutica jurídica na pós-modernidade: novos olhares hermenêuticos

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24/04/2017 às 16:00
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4. Considerações críticas sobre a teoria de uma hermenêutica ambiental: O problema da discricionariedade e a única resposta em direito.

Diante dessas postulações, a princípio, consideramos que uma hermenêutica particular ambiental é possível. Entretanto, não se pode ignorar as dificuldades teóricas inerentes a teoria de Belchior e Leite, razão pela qual o registro se faz necessário . A primeira delas situa-se no campo da dogmática hermenêutica, e trata da superação do paradigma sujeito-objeto, tendo em vista a expressão das lições heideggerianas e gadamerianas, e a segunda se refere ao campo da teoria do Direito, a saber, a fundamentação de Belchior e Leite a partir da Teoria da Argumentação e da Ponderação de Princípios, de Alexy, é deveras criticada por sua leniência com a subjetividade do intérprete.

Ora, o trecho transcrito a seguir, retirado da obra de Belchior, demonstra como a teoria de Belchior e Leite encontra fundamento na teoria do conhecimento, cuja principal característica é a separação entre sujeito-cognoscente e objeto-congnoscível:

Consoante outrora vista, na formação do conhecimento existem três elementos: o sujeito cognoscente, o objeto congnoscível e a atividade. Sujeito este que só pode ser o homem, único ser dotado de racionalidade, que realiza a conduta tendo como fator determinante o valor, a fim de atingir determinado objeto (BELCHIOR, 2014, p. 106).

Como resultado, Belchior conclui que não se pode esperar uma única resposta correta para o direito e que diante da multiplicidade de sentidos da norma o intérprete, para escolher a melhor interpretação, deve utilizar-se da pré-compreensão ambiental, mas ainda assim haverá espaços para subjetividade, conforme se verifica a seguir:

De todo modo, já fica claro que os princípios não têm como oferecer respostas únicas e exclusivas, haja vista que, como visto na hermenêutica filosófica, o sentido a ser captado da norma é inesgotável. Mesmo que o jurista utilize todos os princípios interpretativos, ainda assim haverá margem para subjetividade e arbitrariedade.

Não obstante, os prejuízos que podem advir do exercício subjetivo do direito, ainda há, na teoria de Belchior e Leite, evidentes dificuldade teóricas relacionadas a utilização do paradigma do conhecimento. Isto porque, considera-se superado o esquema sujeito-objeto, conforme Souza (2007, p. 29):

Na atualidade, não se pode aceitar passivamente as antinomia kantianas, que separam o ser dos fenômenos. O ser é englobante e se realiza através da história, portanto está nos fenômenos e apresenta uma característica dinâmica e não estática. O direito não pode, pois, ser examinado através de dogmas. O dogma deve se transformar em problema e, por isso, é necessário superar a mera utilização da lógica formal, examinando as normas e os conflitos à luz da dialética social. Somente através de um processo dialético é que o ser se expõe. Assim, o objetivo do direito é a libertação de todos os indivíduos, encerrando uma aposta no homem, com a busca de um bem-estar social.

Dessa forma, é necessário esclarecer se tal abordagem hermenêutica seria realizável diante das críticas pertinentes à discricionariedade das decisões obtidas por meio do paradigma da teoria do conhecimento, uma vez que se considera que a discricionariedade permitida em lei pode gerar desvio de motivação do ato jurídico mediante a subjetividade do julgador, a partir da multiplicação de princípios e teorias interpretativas, o que pode gerar verdadeira arbitrariedade.

Quanto a este particular consideramos correto o posicionamento Streck, diametralmente oposto à ideia de uma hermenêutica particular, e que combate amplamente os dois pressupostos utilizados por Belchior e Leite no desenvolvimento da teoria sobre uma hermenêutica particular, a saber: o paradigma epistemológico da teoria do conhecimento e a doutrina das várias respostas possíveis em direito, característica da Teoria da Argumentação e da Ponderação de Princípios de Alexy.

Isto porque a utilização do paradigma da teoria do conhecimento e da Teoria da Argumentação e da Ponderação de Princípios, de Alexy, revela compassívidade com o relativismo e a discricionariedade, conforme se verifica em Belchior (2014, p. 164).

Diante de uma colisão do direito ao meio ambiente com outro direito fundamental, em um primeiro momento, o intérprete deverá utilizar o princípio do sopesamento e da ponderação para tentar harmonizar os bens, os lavores e interesses envolvidos no caso concreto. Utilizar-se-á, por seguinte, a otimização sugerida por Alexy, no intuito de que referidos princípios sejam realizados na maior medida do possível, diante das possibilidades fáticas e jurídicas existente.

Nesse sentido, Alexy (1998, p.151), em apertada síntese, considera que não é possível chegar a uma única resposta correta em direito, no máximo, um intérprete dedicado poderia, segundo determinados métodos, chegar a uma resposta aproximada da correta, caso contrário necessitaria de tempo, informação e capacidades ilimitadas, além de clareza linguística e ausência de preconceitos.

La cuestión de la única respuesta correcta depende esencialmente de si el discurso práctico lleva a una única respuesta correcta para cada caso. Llevaría a ello si su aplicación garantizara siempre un consenso. Ya un simple esbozo muestra claramente que varias de sus exigencias, bajo condiciones reales, sólo se pueden cumplir de manera aproximada. Esto ya excluye un consenso para cada cuestión. Por tanto, una única respuesta correcta para cada caso sólo podría admitirse recurriendo a cinco idealizaciones, a saber: 1) tiempo ilimitado, 2) información ilimitada, 3) claridad lingüística conceptual ilimitada, 4) capacidad y disposición ilimitada para el cambio de roles y 5) carencia de prejuicios ilimitada.

Por outro lado, consideramos correta a tese da única resposta de Dworkin, que se utiliza do direito como integridade, onde os princípios e a coerência tem papel fundamental no exercício do direito livre de subjetivismo e arbitrariedades.

Isto porque, para Dworkin o direito é mais do que um conjunto de regras de onde é possível eleger uma dentre as várias decisões possíveis. Para Dworkin o direito é uma construção, onde adota-se a integridade como instrumento que visa à coerência de princípio de uma comunidade; que, em pese não exigir a manutenção de decisões do passado, deve considerá-las (GUEST, 2010, p. 61).

Nesse ponto, é de fundamental importância ressaltar como a teoria de Dworkin (2003, p. 274), oferece uma resposta ao problema da discricionariedade de considerar possível várias respostas, a partir do ideal de coerência do sistema com as decisões do passado. Para Dworkin a prática atual do direito deve manter uma coerência organizada e justificada com as decisões do passado para que se possa garantir um “futuro honrado”.

Os direitos e deveres que decorrem de decisões coletivas tomadas no passado e que, por esse motivo, permitem ou exigem a coerção – contêm não apenas o limitado conteúdo explícito dessas decisões, mas também, num sentido mais vasto, o sistema de princípios necessários a sua justificativa. A história é importante porque esse sistema de princípios deve justificar tanto o status quanto o conteúdo dessas decisões anteriores (DWORKIN, 2003, p. 274).

Assim, logo percebemos a importância que o autor dá ao precedente, ou seja, às decisões passadas, quando da interpretação do direito no caso concreto, sempre com fito na coerência ou integridade.

Para ilustrar esse exercício de reflexão em busca da coerência do sistema, Dworkin cria uma metáfora, que chama de “romance em cadeia” (GUEST, 2010, p. 52), em que considera que os juízes são autores e críticos do direito como se este fosse um romance que assumiram no meio da trama e que os mesmos possuem a obrigação de dar continuidade, cientes de que deverão acrescentar um capítulo e que, este capítulo, por sua vez, será acrescido adiante por um próximo juiz e autor.

Para Dworkin, esse exercício não é simples, tendo em vista que cada juiz deve considerar o que recebeu e assim criar o melhor romance possível como se fosse a obra de um só autor. Dworkin cria, então, a figura de Hércules, um juiz com capacidades sobre-humanas que o ajudará a desenvolver seus argumentos.

Ademais, no intento de desenvolver seus argumentos, Dworkin faz a distinção entre os easy cases e os hard cases; entre princípios e regras e entre argumentos de princípio e argumentos de política, sempre criticando o positivismo.

Dworkin crítica o positivismo por considerar que esta maneira de compreender o direito permite que, nos chamados casos difíceis, ou seja, nos casos em que o juiz se encontra diante de uma zona de penumbra sobre a correta interpretação, por não haver uma regra de direito “clara” anteriormente estabelecida, haveria a possibilidade de criar direitos que seriam aplicáveis às demandas vindouras.

Para Dworkin (2002, p. 136), o juiz, diante de casos difíceis, deve basear-se em argumentos de princípio (principle), uma vez que as decisões judiciais tornam efetivos os direitos políticos existentes.

Segundo Palombella (2005, p. 330), Dworkin entende que os juízes não devem argumentar com base em considerações de política do direito, ainda que tenham como objetivo o bem-estar coletivo; antes, devem buscar garantir a justiça e a moral das decisões por meio de argumentos de princípios, porque, por sua natureza, o argumento de princípio busca impedir a discricionariedade judicial, e oferecer uma justificativa para a decisão baseada na coerência do sistema. Nesse sentido:

Os argumentos de princípio são argumentos destinados a estabelecer um direito individual; os argumentos de política são argumentos destinados a estabelecer um objetivo coletivo. Os princípios são proposições que descrevem direitos; as políticas são proposições que descrevem objetivos, e qual a diferença? É difícil fornecer alguma definição que não incorra em petição de princípio. Parece natural dizer, por exemplo, que a liberdade de expressão é um direito e não um objetivo, pois os cidadãos têm direito e não um objetivo, pois os cidadãos têm direito a essa liberdade por uma questão de moralidade política, e que o aumento de produção de material bélico é um objetivo e não um direito, pois contribui para o bem estar coletivo, mas nenhum fabricante específico tem uma prerrogativa a um contrato governamental.

Isso, porém, não melhora nossa compreensão, pois o conceito de prerrogativa antes utiliza, do que explica o conceito de direito (DWORKIN, 2002, p. 142).

Por fim, para Dworkin (2002, p. 142-143), um direito político é objetivo político individualizado, como o direito à liberdade. Já uma meta coletiva é um objetivo não individuado, isto é, um estado de coisas cuja especificação não requer a concessão de nenhuma oportunidade particular, mas que estimulam trocas de benefícios no seio da sociedade com vistas à produção de um benefício geral.

Nesse sentido, Costa (2011; p. 98) considera fundamental observar, em Dworkin, essa distinção entre argumentos de princípio e de política, já que ele elege a comunidade de princípios como paradigma ou comunidade ideal, considerando que nela as pessoas estão fortemente ligadas pelo consenso voluntário em serem governadas por princípios comuns e não por regras criadas por um acordo político.

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No trecho a seguir, Dworkin (2003, p. 254-255) expressa as características dessa comunidade ideal.

A política, para essas pessoas, é uma arena de debates sobre quais princípios a comunidade deve adotar como sistema, que concepção deve ter de justiça, equidade e justo processo legal e não a imagem diferente, apropriada a outros modelos, na qual cada pessoa tenta fazer valer suas convicções no mais vasto território de poder ou de regras possível. Os membros de uma sociedade de princípio admitem que seus direitos e deveres políticos não se esgotam nas decisões particulares tomadas por suas instituições políticas, mas dependem, em termos mais gerais, do sistema de princípios que essas decisões pressupõem e endossam.

Assim, cada membro aceita que os outros têm direitos, e que ele tem deveres que decorrem desse sistema, ainda que estes nunca tenham sido formalmente identificados ou declarados.

Também não presume que esses outros direitos e deveres estejam condicionados à sua aprovação integral e sincera de tal sistema; essas obrigações decorrem do fato histórico de sua comunidade ter adotado esse sistema, que é então especial para ela, e não da presunção de que ele o teria escolhido se a opção tivesse sido inteiramente sua. Em resumo, cada um aceita a integridade política como um ideal político distinto, e trata a aceitação geral desse ideal, mesmo entre pessoas que de outra forma estariam em desacordo sobre a moral política, como um dos componentes da comunidade política (DWORKIN, 2003, p. 254-255).

Por esta razão, assim como Costa (2011, p. 98), consideramos possível traçar um paralelo entre a comunidade de princípios e a sociedade democrática de Direito, pluralista e regida pelo direito, na qual cada cidadão respeita os princípios vigentes na sua comunidade.

Outrossim, é fundamental perceber como Dworkin (2002, p. 60) pretender negar toda discricionariedade para o sistema de regras e princípios ao observar que tal sistema deve estabelecer princípios superiores uns aos outros, para que, em determinados casos, estes princípios possam ser obrigatoriamente aplicados, evitando-se, assim, que o juiz possa, de acordo com sua vontade, aplicar o princípio que bem entender, já que, caso esta última hipótese fosse válida, não poderíamos afirmar a obrigatoriedade de regra alguma. 

Existem padrões obrigatórios para os juízes, estruturados por princípios, que, em certas ocasiões, justificam a modificação da decisão judicial: Porém, não é qualquer princípio que pode ser invocado para justificar a mudança; caso contrário, nenhuma regra estaria a salvo. É preciso que existam alguns princípios com importância e outros sem importância e é preciso que existam alguns princípios mais importantes que outros.

Esse critério não pode depender das preferências pessoais do juiz, selecionadas em meio a um mar de padrões extrajurídicos respeitáveis, cada um deles podendo ser, em princípio, elegível. Se fosse assim, não poderíamos afirmar a obrigatoriedade de regra alguma. Já que, nesse caso, sempre poderíamos imaginar um juiz cujas preferências, selecionadas entre os padrões extrajurídicos, fossem tais que justificassem uma mudança ou reinterpretarão radical até mesmo da regra mais arraigada (DWORKIN, 2002, p. 60).

Dworkin (2002, p. 114) afirma também que os princípios servem de norte para interpretação do magistrado e que não estão disponíveis à escolha pessoal de cada juiz, mas que devem ser escolhidos após uma avaliação de todos os princípios possíveis de serem aplicados ao caso, determinando-se qual, dentre estes, será capaz de proporcionar, no caso concreto, uma decisão mais coerente com os valores da comunidade.

Ora, por certo este ponto é nevrálgico na teoria de Dworkin, e tem causado graves problemas, conforme aquilo que Streck (2005. p. 396) chama de panprincipiologismo. Entretanto, é papel da hermenêutica contribuir para que hajam mecanismos coerentes na escolha de princípios, haja vista que, a princípio, negar esta possibilidade hermenêutica seria um retorno ao positivismo jurídico e as hipóteses em que se considera que, caso o juiz não possua uma regra clara, estabelecida a priori por uma instituição, ele gozaria de um poder discricionário para decidir o caso de uma maneira ou de outra, o que deve ser rechaçado.

Segundo Costa (2011, p. 97), para Dworkin, pelo positivismo jurídico, o juiz legisla novos direitos e os aplica retroativamente, entretanto ele tem o dever de descobrir os direitos das partes e não de inventá-los, e para atingir esse objetivo, os intérpretes devem ir além da compreensão positivista do direito e da norma positivada, e utilizar-se dos princípios que o sistema dispõe de modo coerente.

Ora, para melhor compreendermos como funciona a interpretação em Dworkin, nos referimos a lição de Matos e Filho (2014 p. 10), segundo quem Dworkin nos ensina que a interpretação do juiz possui dois momentos ou dimensões, um contendo uma dimensão de ajuste e adequação (fit) e outro de justificação (justification).

Para Costa (2011, p. 100), a dimensão da adequação determina que não se pode adotar uma interpretação, ainda que pela sua complexidade, com diferentes leituras de personagem, trama e objetivos que essa interpretação descreve. Desse modo, não significa que cada segmento do texto deve ser compatível ao passado, sendo possível que algumas linhas ou tropos ou mesmo que alguns elementos não coincidam desde que não se deixe sem explicações partes estruturantes do texto.

Costa (2011, p. 100) considera ainda que a segunda dimensão da interpretação exige do intérprete o julgamento das possíveis interpretações e qual delas se ajustam melhor à obra em desenvolvimento, depois de observadas todas as perspectivas da questão. Desse modo, somente quando nenhuma das duas dimensões for desqualificada é que podemos mostrar o texto sob a sua melhor luz, o que permite uma integração mais interessante de estilo e conteúdo.

Por fim, por considerar que essa tarefa não é fácil, Dworkin utiliza a metáfora de um juiz imaginário, denominado de “Hércules”, que possui capacidades sobre-humanas e que aceita aplicar o direito com base na integridade e não em argumentos de política, por isso deverá avaliar as decisões e princípios do passado, a fim de construir o melhor argumento possível a justificar a sua decisão, ao lidar um grande número de casos, conforme se verifica do trecho a seguir:

Assim como, num romance em cadeia, a interpretação representa para cada intérprete um delicado equilíbrio entre diferentes tipos de atitudes literárias e artísticas, em direito é um delicado equilíbrio entre convicções políticas de diversos tipos; tanto no direito quanto na literatura, estas devem ser suficientemente afins, ainda que distintas, para permitirem um juízo geral que troque o sucesso de uma interpretação sobre um tipo de critério por seu fracasso sobre outro. Devo tentar expor essa complexa estrutura da interpretação jurídica, e para tanto utilizarei um juiz imaginário, de capacidade e paciência sobre-humanas, que aceita o direito como integridade (DWORKIN, 2003, p. 287).

[...]

Para esse fim, eu inventei um jurista de capacidade, sabedoria, paciência e sagacidade sobre-humanas, a quem chamarei de Hércules. Eu suponho que Hércules seja juiz de alguma jurisdição norte-americana representativa.

Considero que ele aceita as principais regras não controversas que constituem e regem o direito em sua jurisdição. Em outras palavras, ele aceita que as leis têm o poder geral de criar e extinguir direitos jurídicos, e que os juízes têm o dever geral de seguir as decisões anteriores de seu tribunal ou dos tribunais superiores cujo fundamento racional (rationale), como dizem os juristas, aplica-se ao caso em juízo (DWORKIN, 2002, p. 165).

Para Dworkin (2014, p. 287), podemos até discordar de um ponto de vista de Hércules, pois se você rejeitar esses pontos de vista distintos por considerá-los pobres enquanto interpretações construtivas da prática jurídica, não terá rejeitado o direito como integridade: pelo contrário, ter-se-á unido a sua causa.

Segundo Costa (2011, p. 101) e Guest (2010, p. 61), para Dworkin o precedente só influirá decisivamente na decisão de Hércules quando estiver embasada em argumentos de princípios que sejam capazes de lhes sustentar no sistema de princípios, sendo necessário considerar não apenas as normas exaradas nas decisões tomadas anteriormente, mas a forma com que elas foram tomadas, por quais autoridades e em quais circunstâncias

Outrossim, para Dworkin, as decisões do juízes devem se diferenciar de decisões políticas tendo em vista que não lhes é dado legislar, já que juízes estão em posição distinta dos legisladores:

O direito como integridade pressupõe, contudo, que os juízes se encontram em situação muito diversa daquela dos legisladores. Não se adapta à natureza de uma comunidade de princípio o fato de que um juiz tenha autoridade para responsabilizar por danos as pessoas que agem de modo que, como ele próprio admite, nenhum dever legal as proíbe de agir. Assim, quando os juízes elaboram regras de responsabilidade não reconhecidas anteriormente, não têm a liberdade que há pouco afirmei ser uma prerrogativa dos legisladores. Os juízes devem tomar suas decisões sobre o “common law” com base em princípios, não em política: devem apresentar argumentos que digam porque as partes realmente teriam direitos e deveres legais “novos” que eles na época em que essas partes agiram, ou em algum outro momento pertinente do passado (DWORKIN, 2003, p. 292-293).

Por fim, Segundo Costa (2011, p. 102) é preciso considerar como o juiz ideal de Dworkin, possui opiniões sobre a adequação que se irradiam a partir do caso que tem diante de si em uma série de círculos concêntricos. Isso revela a influência de Gadamer sobre Dowrkin, conforme se observa do trecho a seguir:

A interpretação é um projeto coletivo em que cada geração deve assumir o texto em uma constante fusão de horizontes de sentido. Dworkin bebe na fonte de Hans-Georg Gadamer (2005) ao falar dos círculos concêntricos de horizontes e o papel da tradição, isto por que: esse deslocar não é nem empatia de uma individualidade na outra, nem submissão do outro sob os próprios padrões, mas significa sempre uma ascensão a uma universalidade superior, que rebaixa tanto a particularidade própria como a do outro. O conceito de horizonte se torna aqui interessante, porque expressa essa visão superior mais ampla, que aquele que compreende deve ter.  Ganhar um horizonte quer dizer sempre aprender a ver mais além do próximo e do muito próximo, não para apartá-lo da vista, senão que precisamente para vê-lo melhor, integrando-o em um todo maior e em padrões mais corretos (COSTA 2011, p. 102).

No mesmo sentido, Matos e Filho (2014, p. 9) consideram que para Dworkin o intérprete não partiria de um vazio jurídico, ao contrário encontraria fundamentos (grounds) que permitiriam um juízo consoante com a responsabilidade política que possui, sendo, também, um entrave para a discricionariedade.

Ora, pelo que, diante do todo que até aqui foi exposto, sobre a teoria hermenêutica no direito e o conflito entre o paradigma da consciência e o paradigma da teoria do conhecimento, sobre a superação do esquema sujeito-objeto, nos apoiamos nas lições gadamerianas e na teoria de Dworkin sobre a única resposta certa em direito para oferecer uma conclusão aos desafios aqui encampados.

Cabe acrescentar que, nesse sentido, Streck considera que, diante da problemática do predomínio do esquema sujeito-objeto e do protagonismo do sujeito-intérprete, a busca pela resposta correta é uma necessidade e uma proposta apresentada por aquele autor diante da simbiose entre a teoria integrativa de Dworkin e a fenomenologia hermenêutica, e a hermenêutica filosófica (leia-se: com base nas lições de Gadamer) deve ser entendida como uma metáfora que deve ser pensada dentro de suas possibilidades.

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Sobre o autor
Neyilton da Costa Oliveira

Advogado. Graduado em Direito pela Universidade Federal do Pará. Mestrando em Direito pelo Programa de Pós Graduação em Direito da Universidade Federal do Pará.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Neyilton Costa. A hermenêutica jurídica na pós-modernidade: novos olhares hermenêuticos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5045, 24 abr. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/55346. Acesso em: 25 abr. 2024.

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