A velocidade da justiça

25/01/2017 às 07:35
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Ao autorizar o aumento de velocidade nas Marginais, o TJSP inverteu as prioridades estabelecidas pelo legislador constitucional e internacional.

Nenhum jurista sério é capaz de alegar ou demonstrar que o “direito de propriedade” e mais importante que o “direito a vida”. Além de não poder ser desfrutada por pessoas falecidas, a propriedade encontra sua limitação natural no respeito à garantia de vida atribuída a todos os cidadãos. É por isto mesmo que a CF/88 garantiu primeiro a vida e somente depois a propriedade.

 “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:”

A mesma hierarquia de normas pode ser encontrada na Declaração Universal dos Direitos Humanos.

"Artigo 3.

Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

Artigo 17.

1. Todo ser humano tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros.

2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade."

Ao limitar a velocidade nas Marginais o prefeito Fernando Haddad apenas e tão somente respeitou a precedência do “direito à vida” de todos os cidadãos em relação ao “direito de propriedade” dos motoristas que são donos de carros velozes. No período em que esta norma esteve em vigor os acidentes fatais nas Marginais diminuíram muito. Os fatos, portanto, comprovaram a eficácia da política pública adotada pelo petista.

http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2015/09/acidentes-com-mortes-caem-36-com-velocidade-menor-nas-marginais.htm

Hoje o TJSP autorizou o novo prefeito a aumentar a velocidade dos veículos nas Marginais. Não vou transcrever aqui o conteúdo da decisão. Isto é irrelevante. É evidente que, invertendo a lógica da CF/88 e da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o TJSP voltou a dar mais importância ao “direito de propriedade” que ao “direito a vida”.

Qualquer que tenha sido o argumento jurídico empregado pelo TJSP ele esconde um fato importante que pode ter influenciado a decisão. Quase todos senão todos os desembargadores do TJSP ganham várias vezes acima do teto constitucional. Ao contrário da maioria dos paulistas eles tem condições econômicas de comprar carros caros e velozes para os seus filhos e netos. Alguns deles certamente não consideram justo ver seus rebentos obrigados a dirigir em baixa velocidade nas Marginais como se eles fossem iguais aos “outros cidadãos”.

O aumento de velocidade determinado pelo novo prefeito certamente provocará mais vítimas fatais. Portanto, ninguém deve ficar surpreso ou triste quando os filhos e netos dos próprios desembargadores do TJSP começarem a se espatifar nas Marginais. Eles não serão vítimas do trânsito e sim das escolhas jurídicas feitas pelos pais e avós deles.

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Sobre o autor
Fábio de Oliveira Ribeiro

advogado em Osasco (SP)

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