Capa da publicação Pensão avoenga (pelos avós aos netos)

Alimentos avoengos

Leia nesta página:

Na impossibilidade dos pais arcarem total ou parcialmente com a verba alimentar aos filhos, é possível e permitido aos alimentados pedirem a pensão aos avós, desde que dentro das possibilidades financeiras destes.

O Poder Judiciário é chamado diariamente a resolver inúmeras questões atinentes ao direito de família. Dentre as demandas familiares, as pensões alimentícias ganham destaque pelo elevado número de ações e ainda pelas várias situações fáticas a merecer uma intervenção judicial.

O direito aos alimentos possui regras e princípios a serem observados, dispostos na Lei 5.478/68, no Estatuto da Criança e do Adolescente, além do Código Civil e da própria Constituição da República. Para conceder os alimentos é preciso, portanto, observar os requisitos legais incidentes em cada caso concreto.

Em todas as concessões de pensões alimentícias, há a presença do binômio necessidade/possibilidade, ou seja, comprova-se a necessidade dos alimentos, cujo valor deve ser financeiramente possível ao devedor.

No que tange às partes envolvidas (credor e devedor), é preciso destacar que as pensões alimentícias são concedidas geralmente aos menores de idade, sendo que para os maiores é também possível quando preenchidos os requisitos legais. Doutro lado, os devedores dos alimentos nem sempre são os pais. Outros podem figurar como devedores da obrigação alimentar.

O presente artigo tem por objetivo analisar as situações em que a obrigação pelo pagamento da pensão alimentícia recai sobre os avós, chamado “alimentos avoengos”.

A relação avoenga é o relacionamento existente entre avós e netos, cujo intuito é preservar o convívio sadio, digno e respeitoso entre ascendentes e descendentes no melhor interesse das crianças e adolescentes, através de uma convivência familiar saudável, além do que o relacionamento avoengo conserva também direitos relacionados às partes envolvidas.

A Constituição da República prevê o convívio familiar harmonioso ao dispor no artigo 227, caput, o seguinte:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

O Estatuto da Criança e do Adolescente contempla a proteção aos direitos dos menores, assegurando o respeito e a dignidade de participar da vida familiar, incluindo obviamente o relacionamento entre avós e netos.

Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.

Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos:

(...)

V - participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação;

Art. 25. Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes.

Parágrafo único. Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade.

O respeito à convivência familiar vem descrito, também, no parágrafo único do artigo 1.589 do Código Civil, quando trata do direito de visita dos avós aos netos. Vejamos:

Artigo 1.589. (...)

Parágrafo único. O direito de visita estende-se a qualquer dos avós, a critério do juiz, observados os interesses da criança ou do adolescente.

Sobre a preservação de direitos, é permitido aos netos buscarem no Poder Judiciário a declaração da relação avoenga, cuja ação declaratória é direito próprio e personalíssimo dos que intentam firmar seu direito ao nome, identidade e às suas origens, prestigiando, inclusive, o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.

Precipuamente sobre a pensão alimentícia, o Código Civil contempla que:

Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.

§ 1º Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.

§ 2º Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.

O relacionamento avoengo tem por base a relação de parentesco entre avós e netos (linha reta), trazendo consigo, intrinsicamente, o dever de solidariedade.

A par disso, poderão os avós serem demandados a prestar alimentos aos netos, posto que o dever solidário daqueles em assistir materialmente estes, que necessitam da pensão alimentícia para sobreviver, decorre dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da afetividade, da solidariedade, da proteção familiar e convívio harmonioso, dentre outros.

Dispõe o artigo 1.696 do Código Civil:

Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.

Aliás, ser solidário no âmbito familiar não impõe apenas a assistência material, mas também mútuo dever de afeto, respeito, cooperação e ativa participação na condução da vida dos netos.

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Assim, a pensão avoenga, ou seja, aquela prestada pelos avós aos netos, é perfeitamente possível quando os genitores não puderem prover o sustento da prole.

Os alimentos avoengos, vale dizer, são subsidiários e somente poderão ser arbitrados quando esgotados todos os meios de buscar a verba alimentar primeiramente dos genitores do alimentado.

Inúmeras são as situações em que os genitores não possuem a capacidade de arcar com o pagamento de pensão ao filho, seja por ausência total ou parcial de condições financeiras, seja por estarem em lugar incerto e não sabido, dentre outras.

Após esgotados todos os meios de buscar o auxílio financeiro do genitor ou da genitora, poderá o alimentado ingressar com ação de alimentos em desfavor dos avós paternos ou maternos, cuja obrigação será imposta na totalidade aos avós ou ainda parcialmente, dividindo-se com o devedor originário (pais) o pagamento da pensão alimentícia.

Por isso, haverá casos em que a verba alimentar dos netos será imposta aos avós como forma de complementação da pensão recebida dos pais ou ainda responsabilizá-los totalmente pelo pagamento dos alimentos quando provada a incapacidade dos pais no auxílio financeiros aos filhos.

A jurisprudência tem se manifestado no seguinte sentido:

Apelação. Alimentos avoengos. Fixação. Mãe que é estudante e que é estagiária, e que por isso comprovadamente não tem possibilidade de, sozinha, suportar as despesas de sustento dos três filhos menores de idade. Pai que comprovadamente é drogadito, que esteve internado para tratamento por diversas vezes, que não trabalha e que é sustentado pela mãe dele (a avó paterna). Avó paterna que vinha pagando alimentos provisórios fixados contra ela, por decisão contra a qual ela não recorreu, por mais de 05 anos, com regularidade, sem inadimplência, e sem qualquer prova ou notícia de dificuldade em atender às próprias despesas depois do pagamento dos alimentos. Hipótese de comprovação cabal de insuficiência da mãe, de comprovação concreta e absoluta da incapacidade do pai, e de demonstração da plena possibilidade da avó, tudo a justificar a fixação de alimentos contra ela, na exata quantia que havia sido fixada provisoriamente, sem insurgências, e que vinha sendo paga há mais de 05 anos. Deram provimento.

(TJRS - AC nº 70059818682, Relator Rui Portanova, Oitava Câmara Cível, J. 26/06/2014).

Apelação cível. Ação de alimentos. Obrigação avoenga. Caráter subsidiário ou complementar da obrigação avoenga, porquanto aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos, decorrente do poder familiar (arts. 1.566, IV e 1.698 do Código Civil). Condenação que só se justifica em face da manifesta impossibilidade dos pais proverem os filhos. Situação dos autos em que não comprovada a impossibilidade dos genitores de sustentar as filhas. Apelação desprovida.

(TJRS - AC nº 70064263361, Relator Jorge Luís Dall'Agnol, Sétima Câmara Cível, J. 27/05/2015).

Apelação cível. Alimentos avoengos. Descabimento. Sentença reformada. A obrigação avoenga é extraordinária, subsidiária e complementar, cabível apenas na hipótese de efetiva impossibilidade dos genitores, aos quais incumbe o sustento da prole. Caso no qual não restou suficientemente demonstrado que o pai não reúne condições para adimplir com a obrigação alimentícia, eis que inclusive encontra-se laborando no ramo da construção civil e efetuando depósitos parciais Da pensão. Da mesma forma, inexiste prova cabal de que a genitora não reúna possibilidades para sustentar a filha, não havendo como se estender a obrigação aos avós paternos. Ademais, os avós são pessoas de modestos rendimentos, que auferem menos de 2 salários mínimos, conjuntamente, sem a menor condição de arcar com o pagamento de alimentos à neta sem prejuízo ao próprio sustento. Deram provimento.

(TJRS - AC nº 70065203333, Relator José Pedro de Oliveira Eckert, Oitava Câmara Cível, J. 06/08/2015).

Inclusive, a pensão alimentícia poderá ser dividida entre os avós paternos e maternos, na proporção das condições financeiras de cada um.

Diante disso, conclui-se que, na impossibilidade dos pais arcarem total ou parcialmente com a verba alimentar aos filhos, é possível e permitido aos alimentados pedirem a pensão aos avós, desde que dentro das possibilidades financeiras destes. Esta obrigação relaciona-se ao dever de solidariedade familiar e relação de parentesco, além de preservar o convívio familiar sadio, cumprindo, assim, o objetivo de união, assistência e amparo que deve permear todo o relacionamento familiar digno.

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Sobre o autor
Marcelo Bacchi Corrêa da Costa

Advogado com 23 anos de experiência. Atua na cidade de Campo Grande/MS e região. Pós graduado em Direito Público e em Ciências Penais.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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