No ano de 1997 foi promulgada a Emenda Constitucional nº 16, modificando o §5º do art. 14, da CRFB/88 e criando a denominada reeleição aos cargos do Poder Executivo.
De acordo com o novo texto constitucional, Presidente, Governadores e Prefeitos podem se candidatar aos respectivos cargos para um novo período de mandato, o que até então era inexistente no sistema político brasileiro.
Inovou-se no ordenamento jurídico do país, sob o fundamento da “continuidade administrativa”, como ressaltado pelo Exmo. Dr. Ministro do STF, Exmo. Carlos Veloso, em seu voto na ADI-MC 18-05.
Essa “continuidade administrativa” se destaca e possui relação direta com o verdadeiro exercício da Administração Pública, da execução das políticas públicas, sob o fundamento de que o período de 4 anos não permitiria o governante executar “seu plano de governo”, e em proteção, talvez, ao que, costumeiramente ocorre: o abandono das políticas públicas pelo sucessor.
Não obstante a denominada “continuidade administrativa” reconhecida pelo STF, deve-se observar também, conforme muito bem exposto pelo Exmo. Ministro Gilmar Mendes, em seu voto no REXT 637.485/RJ, que esta deve caminhar ao lado do chamado princípio Republicano, caracterizado este pela alternância do Poder.
“O instituto da reeleição tem fundamento não somente no postulado da continuidade administrativa, mas também no princípio republicano, que impede a perpetuação de uma mesma pessoa ou grupo no poder. O princípio republicano condiciona a interpretação e a aplicação do próprio comando da norma constitucional, de modo que a reeleição é permitida por apenas uma única vez. Esse princípio impede a terceira eleição não apenas no mesmo município, mas em relação a qualquer outro município da federação. Entendimento contrário tornaria possível a figura do denominado “prefeito itinerante” ou do “prefeito profissional”, o que claramente é incompatível com esse princípio, que também traduz um postulado de temporariedade/alternância do exercício do poder. Portanto, ambos os princípios – continuidade administrativa e republicanismo – condicionam a interpretação e a aplicação teleológicas do art. 14, § 5º, da Constituição.”
Ressalte-se que, neste caso, o STF enfrentou a hipótese de se permitir um terceiro mandato em sequência, porém em diferente região, sem contudo, se posicionar acerca da reeleição que denomino “reeleição per saltum”, considerada esta como sendo a reeleição que pressupõe um intervalo de administração do pretenso candidato, para o mesmo cargo e região.
No entanto, os fundamentos de Sua Excelência no v. acórdão devem permanecer incólumes para fundamentar a chamada “reeleição per saltum”.
Poderia se pensar, talvez, em permitir uma apresentação para um novo pleito, apenas com relação á cargos diferentes, como um Prefeito reeleito surgir em uma terceira eleição como candidato a Governador do Estado, ou ainda, o Governador do Estado reeleito para o cargo de Presidente da República.
Porém, ao se tratar do MESMO CARGO, a apresentação para um terceiro mandato, ainda que “per saltum”, repita-se, sacrifica o sistema Republicano.
O Professor português J.J. Canotilho destaca que “a forma republicana de governo recolhe e acentua a ideia de antiprivilégio... . De um modo geral, a forma republicana de governo prefere critérios de electividade, colegialidade, temporariedade e pluralidade. ...”¹
Ressalte-se que o presente artigo não se posiciona contrário á reeleição comum e vigente no sistema brasileiro há mais de 15 anos,² mas sim, com relação á reeleição per saltum.
Sugere-se assim, que um dos legitimados e aptos a tanto busquem na Corte Suprema uma posição acerca da possibilidade da reeleição per saltum, e sua compatibilidade com o sistema Republicano e á alternância de Poder.
Camboinhas-Niterói, RJ, 15 de novembro de 2016.
Bibliografia e decisões citadas:
¹ “Direito Constitucional e Teoria da Constituição”, J.J. Canotilho, 7ª edição, Editora Almedina, pág.229.
² RE 637.485/RJ, STF, Rel. Min. Gilmar F. Mendes: “Com efeito, não se podem desprezar os quatorze anos que se passaram desde o julgamento da medida cautelar, em que a norma do art. 14, § 5º, manteve plena vigência e teve ampla aplicação. Realizadas quatro eleições gerais (1998, 2002, 2006, 2010) e três eleições municipais (2000,2004, 2008) sob a égide da norma introduzida pela EC n. 16/1997, parece impensável uma decisão de mérito desta Corte que venha a interferir nesse estado de coisas já conformado e consolidado.”