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Algumas restrições ao princípio da força obrigatória dos contratos no compromisso de compra e venda de imóvel

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01/12/2000 às 00:00
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4 A POSIÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA.

Para cotejo e análise, anotamos posicionamentos jurisprudenciais atualmente considerados, que ainda permitem a perda das quantias pagas, antes da vigência do CDC:

"COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - Inadimplemento do promitente comprador da última parcela - Rescisão - Contrato com cláusula que prevê perda das prestações pagas - Inaplicabilidade das normas do CDC por ser posterior ao negócio - Entendimento jurisprudencial de redução proporcional da pena convencional.

Ementa da Redação: No compromisso de compra e venda de imóvel, o não-pagamento da última parcela pelo promitente comprador enseja a rescisão do contrato, nos termos do art. 1092, par.ún., do CC. Como o negócio foi realizado antes do advento do CDC, não se pode aplicar a norma estampada em seu art. 53, ou seja, a proibição do perdimento das prestações pagas, mas a jurisprudência tem adotado a possibilidade de redução proporcional da pena convencional; assim, deverá a promitente vendedora devolver 90% das prestações pagas, percentual que tem o dom de equanimidade contratual, na medida em que repassa a importância necessária para cobertura dos prejuízos da rescisão".

in RT 739/270, Ap.271.349-2/2 - TJSP, 3.ª Câm. - j. 03.12.1996 - rel. Des. Ênio Zuliani. Juntamos cópia do acórdão nos anexos.

"COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - Contrato firmado antes da vigência do Código de Defesa do Consumidor - Estipulação da perda das prestações pagas no caso de resolução contratual em virtude do inadimplemento do compromissário-comprador - Admissibilidade - Valor, porém, que poderá ser reduzido, a critério do Juiz - Inteligência do art. 924 do CC.

Ementa da Redação: No compromisso de compra e venda, firmado antes da vigência do Código de Defesa do Consumidor, é válida a estipulação da perda das prestações pagas em virtude de resolução contratual decorrente do inadimplemento do compromissário-comprador, em face da natureza de cláusula penal compensatória, podendo o Juiz, a seu critério, reduzir o valor da perda das prestações adimplidas, conforme disposto no art. 924 do CC".

in RT 750/227, Resp 115.787-RS - STJ, 3.ª T. - j. 10.06.1997 - rel. Min. Waldemar Zveiter - DJU 20.10.1997. Juntamos cópia do acórdão nos anexos.

Diverso não é o entendimento dos Tribunais superiores quando à aplicação da teoria da imprevisão nos casos em que há o enriquecimento ilícito ao credor e a onerosidade excessiva ao devedor, podendo este último, com fulcro nesta teoria, ajuizar ação postulando a extinção do compromisso e a devolução da quantia paga ao promitente vendedor, sendo devido as perdas e danos à parte prejudicada inobstante haja previsão no contrato.

"COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - Indenização - Descumprimento de obrigação - Verba devida à parte prejudicada independentemente de previsão contratual.

Ementa Oficial: O descumprimento de obrigação decorrente de compromisso de compra e venda dá direito à parte prejudicada de pleitear indenização, independentemente de previsão contratual".

"COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - Inadimplemento - Pretendida aplicação pelo devedor da teoria da imprevisão fundada em dificuldades decorrentes da economia - Inadmissibilidade, se não houver enriquecimento indevido do credor.

Ementa da Redação: É inadmissível a incidência da teoria da imprevisão, nas hipóteses de inadimplemento de compromisso de compra e venda, fundada nas dificuldades decorrentes dos constantes choques aplicados à economia, pois para aplicação dessa teoria não basta a onerosidade excessiva para o devedor, é necessário, também, um indevido enriquecimento para o credor".

in RT 751/360, Ap 53.852-1 - TJMS, 2.ª T. - j. 09.09.1997 - rel. Des. José Augusto de Souza. Juntamos cópia do acórdão nos anexos.

Outros julgados esclarecem eventuais dúvidas quanto ao momento do credor pleitear seus direitos:

"COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - Reivindicatória contra promissário-comprador - Inadmissibilidade - Necessidade de prévia ou simultânea rescisão contratual - Voto vencido.

Ementa da Redação: Pressupondo a reivindicatória um proprietário não possuidor que age contra um possuidor não proprietário, o seu sucesso reclama a reunião de dois elementos: o domínio do autor e a posse injusta do réu. Exercida a posse por força de contrato de promessa de compra e venda, inadmissível a reivindicatória contra o promissário-comprador sem prévia ou simultânea rescisão do contrato, haja vista que, enquanto não desfeito o negócio, injusta não pode ser considerada a posse do que se comprometeu a adquirir".

in RT 735/260, EL 229.954-1/9-01 - TJSP, 6.ª Câm. - j. 26.09.1996 - rel. Des. Ernani de Paiva. Juntamos cópia do acórdão nos anexos.

"COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA - Possessória - Inadimplência do promitente comprador - Cláusula expressa que admite a reintegração de posse - Desnecessidade de anterior ação rescisória do contrato - Voto vencido.

Ementa da Redação: Com a falta de pagamento de parcela do preço e potencial prejuízo ao promitente vendedor em razão da permanência do promitente comprador na posse do imóvel, e havendo cláusula resolutória expressa, pode aquele propor ação de reintegração de posse, independentemente da propositura, prévia ou concomitante, da ação de rescisão do contrato".

in RT 735/253, Agln 11.532-4/8 - TJSP, 5.ª Câm. - j. 08.08.1996 - rel. Des. Luís Carlos de Barros. Juntamos cópia do acórdão nos anexos.


CONCLUSÃO

Uma vez celebrado um contrato, preenchendo todos os requisitos exigidos pela lei, as partes vinculam-se ao mesmo devendo cumprí-lo, pois o próprio ordenamento jurídico traz sanções àquele que não cumpre com o que se obrigou de forma livre e espontânea.

Pelo princípio da força obrigatória dos contratos, cumprí-los incondicionalmente é a regra, mas esta tem exceção, em face de circunstâncias supervenientes, irresistíveis e imprevisíveis, e deste modo, alheias à vontade dos contratantes, fazendo com que não consigam suportar o que fora objeto de sua própria vontade - o contrato. Para tanto, permite-se excepcionalmente romper com o princípio, provando que o inadimplemento superveniente foi inevitável e sem culpa, mas, se houver má-fé, serão as partes submetidas às sanções impostas no próprio contrato ou as estabelecidas na lei

Assim, se um indivíduo que é compromissário comprador de determinado bem imóvel, devido a motivos supervenientes alheios à sua vontade não puder mais arcar com o ônus do contrato, se for o caso, poderá pedir revisão judicial das cláusulas contratuais, se não preferir rescindí-lo. De outra parte, embora a cláusula rebus sic stantibus não conste expressamente na regulação legal do contrato de promessa de compra e venda de imóvel, poderá encontrar amparo na nova concepção, voltado para atender sua função social. O Código de Defesa do Consumidor também prevê, no seu art. 6.º, V, a possibilidade de revisão das cláusulas contratuais em virtude de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas para uma das partes e ganho inesperado à outra, podendo assim, ser invocado pelos consumidores para buscar restabelecer o equilíbrio quando a relação for de consumo.

O mesmo diploma legal, em seu art. 53, estabelece a devolução do preço pago pelo compromissário comprador nos contratos de compromisso de compra e venda de imóvel em prestações, quando, em virtude de inadimplemento o compromitente vendedor pleitear resolução do contrato. Porém, tal norma não se aplica aos contratos celebrados antes da vigência, quando ainda era juridicamente possível a estipulação de cláusulas que estabeleciam a perda das prestações pagas em prol do compromitente vendedor. A regra das arras tem incidência na forma do art. 1.095 do Código Civil.

Inobstante pouco aplicável, casos há não regulados pela lei n.º 6.766/79 que onde permite-se, excepcionalmente, a rescisão unilateral do compromisso de compra e venda nos moldes do art. 1.088 do Código Civil, desde que ainda não quitado todo o preço.

Quando todas as prestações estiverem quitadas, recusando-se o compromitente vendedor em cumprir com o estipulado, poderá o compromissário comprador valer-se da ação de adjudicação compulsória para obter o contrato definitivo, conforme disposições expressas dos art. 25 da lei n.º 6.766/79 e 16 do Dec.-lei n.º 58/37, estando ou não os instrumentos preliminares registrados.

Com essas conclusões, pensamos estar contribuindo para atualizar a função do Direito, de compor eventuais lides promovendo justiça entre as partes, para fortalecimento do bem comum e estabelecimento da paz social.


NOTAS

1. "Art. 82, CC. A validade do ato jurídico requer agente capaz (art. 145, n. I), objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei (arts. 129, 130 e 145)."

2. "Art. 235, CC. O marido não pode, sem consentimento da mulher, qualquer que seja o regime de bens:

I - Alienar, hipotecar ou gravar de ônus real os bens imóveis, ou direitos reais sobre imóveis alheios (arts. 178, §9.º, n. I, "a", 237, 276 e 293)."

Obs: É indispensável a outorga uxória:

a)nos compromissos de compra e venda de imóvel loteado (art. 11, § 2.º do Dec-lei n.º 58/37);

b) nos contratos relativos a loteamento urbano (art. 18, VII e § 3.º da Lei n.º 6.766/79).

3. "Art. 1.058, CC. (...)

Parágrafo único. O caso fortuito, ou de força maior, verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar, ou impedir."

4. "Art. 5.º, CC. São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:

I - Os menores de dezesseis anos.

II - Os loucos de todo o gênero.

III - Os surdos-mudos, que não puderem exprimir sua vontade.

IV - Os ausentes, declarados tais por ato do juiz."

"Art. 6.º, CC. São incapazes, relativamente a certos atos (art. 147, n. I), ou à maneira de os exercer:

I - Os maiores de dezesseis e os menores de vinte e um anos (arts. 154 a 156).

II - Os pródigos.

III - Os silvícolas."

5. "Art. 145, CC. É nulo o ato jurídico:

I - Quando praticado por pessoa absolutamente incapaz (art. 5.º)."

Art. 147, CC. "É anulável o ato jurídico:

I - Por incapacidade relativa do agente (art. 6.º)."

"Art. 84, CC. As pessoas absolutamente incapazes serão representadas pelos pais, tutores ou curadores em todos os atos jurídicos; as relativamente incapazes pelas pessoas e nos atos que este Código determina."

6. "Art. 97, CC. Se ambas as partes procederam com dolo, nenhuma pode alegá-lo, para anular o ato, ou reclamar indenização."

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"Art. 971, CC. Não terá direito à repetição aquele que deu alguma coisa para obter fim ilícito, imoral ou proibido por lei."

7. "Art. 1.091, CC. A impossibilidade da prestação não invalida o contrato, sendo relativa, ou cessando antes de realizada a condição."

8. "Art. 1.089, CC. Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva."

9. "Art. 145, CC. É nulo o ato jurídico:

(...)

II - Quando for ilícito, ou impossível o seu objeto".

10. "Art. 129, CC. A validade das declarações de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir (art. 82)".

11. "Art. 145, CC. É nulo o ato jurídico:

III - Quando revestir a forma prescrita em lei (arts. 82 e 130)."

12. "Art. 130, CC. Não vale o ato, que deixar de revestir a forma especial, determinada em lei (art. 82), salvo quando esta comine são diferente contra a preterição da forma exigida."

13. "Art. 5.º, LVI, CF/88. São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;"

"Art. 332, CPC. Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa."

14. Percebe-se deste modo que o Princípio da Força Obrigatória dos contratos ainda não era tido como regra.

15. "Art. 1.059, CC.

16. "Art. 134. CC. É, outrossim, da substância do ato a escritura pública:

(...)

II – Nos contratos constitutivos ou translativos de direitos reais sobre imóveis de valor superior a Cr$ 50.000 (cinqüenta mil cruzeiros), excetuado o penhor agrícola."

17. Observa-se que o Dec-lei n.º 58/37, veio para fortalecer o Princípio da Força Obrigatória dos Contratos, não permitindo o direito de arrependimento das partes contratantes de compromisso de compra e venda de imóvel, haja vista que até mesmo se estas contratarem de forma contrária o que dispõe este decreto-lei, não valerá o que estiverem estipulado.

18. Conforme Nota 1 ao art. 4.º , do Dec.-lei n.º 58/37. Theotonio Negrão. Código Civil. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 338, atualmente no Cartório do Registro Imobiliário não há mais a inscrição do memorial e sim o registro, conforme o art. 167, I, 19 da Lei 6.015, de 31.12.73 (Lei dos Registros Públicos, em vigor a partir de 01.01.76), "in verbis":

"Art. 167. No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos:

I – o registro:

(...)

19) dos loteamentos urbanos e rurais;

(...)"

19. Conforme Nota 2 ao art. 4.º, do referido Dec-lei, op. cit. p. 338, "a averbação é só para os contratos antigos" (grifo nosso), de acordo com o art. 167, II, 3, da Lei 6.015, de 31.12.73 (Lei dos Registros Públicos, em vigor a partir de 01.01.76), "in verbis":

"Art. 167. No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos:

(...)

II – a averbação:

3) dos contratos de promessa de compra e venda, (...), a que alude o Decreto-lei n. 58, de 10 de dezembro de 1937, quando o loteamento se tiver formalizado anteriormente à vigência desta lei;

(...)"

A mesma Nota, diz que os contratos "atuais estão sujeitos a registro" (grifo nosso), segundo fundamentação do art. 167, I, 20, da Lei 6.015, de 31.12.73 (Lei dos Registros Públicos, em vigor a partir de 01.01.76), "in verbis":

"Art. 167. No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos:

I – o registro:

20) dos contratos de terrenos loteados em conformidade com o Decreto-lei n. 58, de 10 de dezembro de 1937, e respectiva cessão e promessa de cessão, quando o loteamento se formalizar na vigência desta lei;"

20. "Art. 1.088, CC. Quando o instrumento público for exigido como prova do contrato, qualquer das partes pode arrepender-se, antes de o assinar, ressarcindo à outra as perdas e danos resultantes do arrependimento, sem prejuízo do estatuído nos arts. 1.095 a 1.097."

21. "Art. 182. Lei n.º 6.015/73. Todos os títulos tomarão, no Protocolo, o número de ordem que lhes competir em razão da seqüência rigorosa de sua apresentação."

22. Conforme Nota 2, ao art. 22, do Dec. –lei 58/37, Theotonio Negrão, C. Civil, 15. ed, atualmente são registrados (arts. 167-I-9 e 168 da Lei n.º 6.015/73) e não inscritos.


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Sobre o autor
Sidney Campos Gomes

advogado em Santarém (PA)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOMES, Sidney Campos. Algumas restrições ao princípio da força obrigatória dos contratos no compromisso de compra e venda de imóvel. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 48, 1 dez. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/566. Acesso em: 23 dez. 2024.

Mais informações

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Coordenação de Monografia do Departamento de Ciências Jurídicas do Instituto Luterano de Ensino Superior de Santarém - ILESS - ULBRA como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Direito, elaborado entre os meses de Agosto e Novembro de 1999, com defesa oral aprovada perante Banca Examinadora constituída por três advogados militantes na área cível, sob orientação do professor e advogado Dr. Mighel Borghezan.

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