Assunto que gera muitas discussões, por ocasião de palestras ou seminários, é se os filhos devem ou não começar a trabalhar na empresa pertencente à própria família. A tradição da família brasileira é de colocar toda a família na empresa, sejam eles competentes ou não, pois, perante os pais, os filhos são todos iguais, sabemos nós que na prática não é bem assim.
O perigo é que aconteça como na charge abaixo:
Este é o meu filho, Rob Jr. Quero que ele vá subindo aos poucos na empresa – mesmo que dure o dia inteiro”
Tenho para mim que é a melhor solução é aquela proposta por ANTONIO CARLOS VIDIGAL in “ACONTECE NAS MELHORES FAMÍLIAS – Repensando a empresa familiar’ Editora Saraiva que diz:
“ Pai rico, filho nobre, neto pobre. ” Esse dito popular, que tem se revelado verdadeiro, vale para ao mundo todo. Infelizmente essa parece ser uma verdade universal. Quando se torna um empresário bem-sucedido, tipicamente tenta expurgar sua culpa por não ter dado atenção aos filhos compensando com bens materiais. “Quero que meus filhos tenham tudo que eu não tive quando era moço” é uma frase comum. É mesada alta, muito dinheiro para gastar no “Shopping Center”, tênis e jeans da grife do momento. Aos 18 anos, vem um carro zero, às vezes importado. Colégio chique, clube idem. Esse vai ser o “filho nobre”, o príncipe das baladas e das discotecas. Dificilmente esse (a) jovem vai ser trabalhador(a). Os valores dele são materialistas e ele acha que fazer força para obter alguma coisa não vale a pena – vai passar a vida aproveitando o dinheiro gerado pela empresa que o pai fundou. Seus filhos também serão educados mal e tipicamente quebrarão a empresa: os “netos pobres”. Pag. 234.
Quando, em palestras ou seminários, acompanhando a opinião do autor, afirmamos que os filhos “não devem começar trabalhando na empresa da própria família”, surge uma espécie de revolta, principalmente, se os presentes são todos ou maioria composta por fundadores da empresa de familiar.
E as ponderações são quase sempre as mesmas, ou seja, é muito melhor para os filhos aprender com o próprio pai a arte de administrar a empresa, ou ainda, por que vai aprender lá fora se é aqui que eles serão futuros proprietários e, assim, por diante.
Tento esclarecer meu posicionamento, partindo de algumas premissas que me parecem lógicas:
1ª – O pai já chegou ao teto de conhecimento, tanto que está pensando em se aposentar, isto é, não tem mais onde expandir esse conhecimento adquirido ao longo dos anos. Entretanto, não é isso que a empresa precisa, pois com advento de novas tecnologias, concorrência acirrada no mercado, etc., os filhos precisam estar mais bem preparados para acompanharem o chamado “novo mercado”;
2ª - Os pais sendo bens sucedidos poderão amedrontar aos filhos, pois esses tendem a ser comparados com seus pais;
3ª – Normalmente os pais não tiveram oportunidade de estudar e frequentar cursos especialmente voltados para a atividade da empresa, sendo que seu aprendizado é, quase sempre, fruto de sua força de vontade e persistência em subir na vida. Assim, pouca ou quase nada poderá acrescentar no aprendizado de seus filhos em relação a essas tarefas;
4ª - Os filhos trabalhando fora da empresa da família aprenderão coisas simples, mas de fundamente importância, como, por exemplo, a cumprir horário integral na empresa. Quem já viu um filho ser descontado de sua remuneração por ter faltado ou chegado atrasado ao trabalho? Da mesma forma, no que diz respeito a subordinação, ou seja, receber e cumprir ordens de um superior que não seja exclusivamente dos pais. Outro erro é criar um “cargo” para os filhos serem alocados na empresa, entrando na empresa no cargo de “diretor tal”, ou o que é pior “assessor do presidente” como forma de justificar sua entrada na empresa, pois não se aprende osmose a trabalhar;
5ª – Outro erro, quando os filhos vão trabalhar na empresa, é obriga-los a exercer funções de “chão de fábrica”, ou seja, demonstrar aos demais funcionários que é necessário conhecer todos os departamentos da empresa para poder administrá-la. Deve-se entender que os filhos serão os futuros proprietários da empresa, assim, precisam conhecer um pouco do funcionamento da empresa para administrá-la futuramente, mas esse conhecimento deverá ser mediano, pois eles não irão executar funções próprias dos funcionários;
6ª - A porta de entrada na empresa deve ser bastante estreita, isto é, que sejam criadas regras para que o familiar adentre na empresa, evitando, assim, que a mesma seja usada para “resolver” as necessidades econômicas da família, onde todos ganhão bem, mas terão poucos compromissos com a perenidade da empresa;
7ª – O critério básico é da competência onde o “proponente ao cargo” apresente algumas qualidades que justifiquem o seu aproveitamento na empresa familiar, como, por exemplo, tenha feito uma pós-graduação em matérias de interesse da empresa, etc. Caso contrário se estará apenas formalizando um “cabide emprego” para os familiares sem levar em conta a sua competência;
8ª - Cito vários exemplos, dentre eles, do pai médico que foi para o interior clinicar e ficou rico, possuindo hoje um belo hospital. Se nós formos analisar a conjuntura como esse profissional alcançou o sucesso, muitas das vezes foi por pura sorte, pois, quem sabe, escolheu uma região onde não existia outro hospital ou a especialidade que ele clinicava, etc. Hoje a realidade é outra, pois os clientes desses hospitais são usuários de planos de saúde que enfiam “goela a baixo” o valor dos procedimentos executados. Os grandes hospitais estão sendo adquiridos por redes de medicina corporativa. O que vale para que os filhos médicos venham a acrescentar ao trabalho do pai, é fazer, além do curso de medicina, um ou vários cursos de pós-graduação em áreas especialidades diferentes daquelas das quais o pai já é detentor. Fazer, por exemplo, um curso de pós-graduação em “administração hospitalar” pode ser um bom caminho para melhorar a “gestão” do hospital; conhecerem os mecanismos de associativismo, pois hoje em dia ninguém trabalha isolado.
Aí sim os filhos estarão contribuindo para a perenidade e progresso da empresa. É necessário que haja cooperação mútua entre os herdeiros para o sucesso da Empresa Familiar.
Na opinião de JOÃO BOSCO LODI in “O Fortalecimento da Empresa Familiar” que assim se expressa:
“A cooperação entre irmãos não pode ser um ato obrigatório, resultante de uma ação coercitiva dos pais. A cooperação é um ato de amor, voluntário e gratuito, e pressupõe a liberdade das pessoas de fazê-lo ou não. Não se pode exigir que dois irmãos trabalhem juntos, colaborem na direção da mesma empresa, tenham preferências administrativas iguais”.
E complementa:
“Quando os filhos não se somam, é melhor separá-los em setores, empresas, cidades e até países diferentes. Separa-se o patrimônio da empresa em módulos totalmente independentes, atuando em setores distintos”.