Sumário: 1. Introdução. 2. Estudo da legislação em testilha. 3. Doutrina e conceitos. 4. Análise de jurisprudência. 5. Considerações Finais. Referências bibliográficas
Resumo
O presente artigo científico se destina a estudar a legislação que instituiu o Serviço Auxiliar Voluntário (SAV) na Polícia Militar do Estado de São Paulo (PMESP).
Desde seu advento, em 2002, diversas lides trabalhistas surgiram em desfavor da Fazenda Pública do Estado de São Paulo (FPESP), atingindo o judiciário estadual e mesmo o âmbito federal.
Questionamentos diversos, circundantes dos direitos trabalhistas consolidados na Constituição Federal (CF) e na lei especial, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) foram abarcados, criando cisões de entendimentos, o que culminou no término dessa atividade no Estado de São Paulo.
Buscar-se-á dirimir algumas dúvidas e apresentar pareceres das cortes, de forma a se verificar a constitucionalidade da lei em testilha.
Palavras-chave: Direito Constitucional. Lei Estadual n° 11.064, de 8 de março de 2002. Serviço Auxiliar Voluntário. Considerações.
1. Introdução
No escopo de contextualizar o início dessa atividade, cabe recordar que uma cobrança governamental e da própria sociedade, já há muito tempo, é o aumento do efetivo de policiais no serviço operacional.
A fonte oficial mais segura com os dados comparativos de contingente das polícias brasileiras que foi, de fato, publicada e divulgada, tem origem no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2015, sendo trabalho inovador daquele órgão neste sentido.
Conforme o relatório, intitulado Perfil dos estados e dos municípios brasileiros: 2014, a PMESP possuía, à época, contingente de 89.478 homens e mulheres, sendo o maior efetivo das polícias do Brasil. O trabalho ainda permitiu posicionar a relação entre número de habitantes para cada policial militar, sendo certo que este Estado teve o índice de policiais por habitante de 1:1353, sendo este calculado com base nas estimativas de população de 1º de julho de 2013, enviadas para o Tribunal de Contas da União (TCU) em 31 de outubro de 2013. (IBGE, 2015, p. 73).
Sem aprofundamentos absurdos, pode-se considerar que, em regra, a proporção percentual de policiais operacionais e administrativos está na ordem de 70 para 30.
Destes 70% que realmente operam na atividade-fim, no atendimento direto ao cidadão, há uma divisão de turnos, que consiste basicamente no regime de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso, denominado coloquialmente 12X36. Assim, do “todo” operacional, supõe-se que 16 mil homens trabalham por turno de serviço no Estado de São Paulo. É claro que há regramentos diversos para a divisão deste efetivo, em face dos índices criminais, população residente e pendular e demais peculiaridades de cada município, região e bairro, mas admite-se como verossímil a média ora apresentada.
Por conta da necessidade premente de mais policiais nas ruas, a solução apresentada pelo Governo do Estado de São Paulo, também levada a efeito por outros Estados da Federação, foi a adoção do SAV – cujos concursados foram denominados Soldados PM Temporários – serviço este que teve a missão precípua de atuar no campo administrativo das unidades policiais, liberando, assim, policiais para operar no serviço de patrulhamento.
Ocorre que a iniciativa, num primeiro momento de bom alvitre para o fim almejado – aumento de policiais nas ruas e, por conseguinte, aumento da sensação de segurança –, resultou numa série de ações judiciais ingressadas por ex-Soldados PM Temporários após o contrato previsto de um ano (prorrogável por mais um), os quais, sentindo-se injustiçados pela prestação de serviço, considerada desproporcional em relação aos benefícios recebidos, buscaram a Justiça para o reclamo de seus anseios.
2. Estudo da legislação em testilha
A lei em comento originou-se numa lei federal que propiciou a atividade voluntária nas polícias dos Estados brasileiros. Assim, cabe breve pontuação das duas legislações, inicialmente a federal, e em seguida, a estadual.
A lei federal n° 10.029, de 20 de outubro de 2000, estabeleceu normas gerais para a prestação voluntária de serviços administrativos e de serviços auxiliares de saúde e de defesa civil nas Polícias Militares e nos Corpos de Bombeiros Militares.
Constituída de apenas seis artigos, basicamente preconizou a possibilidade dos Estados contratarem voluntários para serviços exclusivamente internos, com requisitos de maioridade (até 23 anos), com prazo de prestação de serviços de um ano, remuneração de natureza jurídica indenizatória não superior a dois salários mínimos e a não geração de vínculo empregatício, obrigações de natureza trabalhista, previdenciária ou afins.
Supedaneado na lei federal, o Estado de São Paulo promulgou, assim, a Lei n° 11.064, de 8 de março de 2002, que instituiu o Serviço Auxiliar Voluntário na Polícia Militar do Estado.
Conforme asseverado anteriormente, um dos objetivos foi o aumento do contingente policial do serviço operacional, senão veja-se:
Artigo 2.º - O Serviço Auxiliar Voluntário objetiva:
I - proporcionar a ocupação, qualificação profissional e renda aos jovens que especifica, contribuindo para evitar o seu envolvimento em atividades anti-sociais;
II - aumentar o contingente de policiais nas atividades diretamente ligadas à segurança da população. (SÃO PAULO (Estado), 2002, grifos nossos)
Em seus dispositivos seguintes a norma seguiu a vereda indicada pela lei n° 10.029/00, no que se refere à faixa etária para ingresso, a necessidade de concurso, o prazo de atividade (prorrogável, todavia, por um ano), e, também, a não geração do vínculo trabalhista.
Até aqui não há contestação quanto à legalidade da aplicação destas normas, sua eficácia e as benesses decorrentes ao serviço de atendimento aos cidadãos. Prova disso, repita-se, foi a adoção de serviço similar em outros Estados, com os mesmos propósitos.
3. Doutrina e conceitos
O dicionário Houaiss (2009) descreve o verbete voluntário nas acepções de adjetivo e substantivo:
adjetivo
1 que não é forçado, que só depende da vontade;
espontâneo
Ex.: movimento v.
2 que se pode optar por fazer ou não
Ex.: demissão v.
3 Regionalismo: Rio Grande do Sul.
que não precisa ser fustigado (diz-se de cavalo)
substantivo masculino
4 aquele que ingressa no serviço militar espontaneamente
5 estudante que é admitido num curso em condições diferentes das que se aplicam aos estudantes regulares
6 aquele que se dedica a um trabalho sem remuneração, prestando ajuda quando necessário.
A pesquisa em busca de doutrina específica acerca do tema não foi frutífera, e, caso exista, realmente é insuficiente e não divulgada. A tentativa, no presente artigo científico, é demonstrar as posições favoráveis e contrárias no tocante à constitucionalidade da lei.
Ocorre que, palmilhando a dita “constitucionalidade” da lei em apreço, logrou-se localizar texto concernente, precipuamente em face do Protocolado 54.958/2008, firmado pelo promotor de justiça Ricardo de Barros Leonel em 19 de junho de 2008, tendo como interessada a Promotoria de Justiça da cidade de Diamantina, que teve como parecer não vislumbrar-se que a Lei Estadual n° 11.064/02 ferisse dispositivos da Carta Magna.
O processo na Vara do Trabalho daquela foi instaurado em razão de reclamação trabalhista proposta em face da Fazenda Pública do Estado de São Paulo, pretendendo o autor, que havia anteriormente atuado como policial militar temporário, o reconhecimento de vínculo empregatício com relação ao Estado e o pagamento de verbas trabalhistas que afiançou serem devidas.
Destaca-se trecho importante do parecer tecido pelo ilustre representante do Parquet:
Nesse contexto, a interpretação sistemática do perfil constitucional dos servidores públicos militares federais e estaduais, bem como o respectivo regime de recrutamento de pessoal, leva-nos a admitir a viabilidade de que a lei estabeleça, sem qualquer ofensa ao regime do concurso público, a possibilidade de empenho de servidores militares voluntários em caráter temporário. Igualmente, nessa perspectiva, se apresenta legítima a solução no sentido de que não se estabeleça vínculo de emprego ou estatutário com a Administração Militar, apresentando-se como mais apropriada a conclusão de que ostentam condição de certo modo similar à figura dos conscritos, que se encontram em serviço militar obrigatório. (MPSP, 2008)
De outro lado, no sentido da “inconstitucionalidade”, uma obra isolada, de autoria de Nelson Massaki Kobayashi Júnior, então bacharelando em Direito Pela Faculdade de Direito de Presidente Prudente foi, todavia, consultada, e apresentou destacado saber do autor.
Cabe ressaltar que o “momento” foi outro, ocasião em que já se havia iniciado uma série de outros debates judiciais acerca da temática.
Em síntese, o nobre bacharelando cita os princípios constitucionais explícitos em relação à Administração Pública, quais sejam: a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência. Invoca comentários a respeito da natureza jurídica do Soldado PM Temporário, mostrando assente que sua situação é totalmente sui generis, não possuindo características quiçá de assemelhado, quanto mais de militar, não estando sujeito aos regramentos insculpidos no Código Penal Militar (CPM).
Ainda relata, com maestria, quanto à diferença de um trabalho realmente temporário, ao lume da lei n° 6.019, de 3 de janeiro de 1974 (que dispõe sobre o trabalho temporário nas empresas urbanas), o qual:
[...] diverge muito da realidade do SAV, que desde a sua implantação na Polícia Militar de São Paulo, é constante, em aproximadamente dez anos da admissão, ou da contratação da primeira turma de Soldados PM Temporários, já foram homologados quinze concursos, para a prestação do SAV, sendo que em um deles, o SAV-XIV, houve segunda chamada, ou seja, trata-se de uma função permanente na administração da polícia militar, e não de necessidade transitória, o que afasta a relação do SAV com o trabalhador temporário da Lei 6.019. (KOBAYASHI JÚNIOR, 2011, p. 40)
Com razão, a definição dada ao trabalho temporário na lei sobrecitada é “aquele prestado por pessoa física a uma empresa, para atender à necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou a acréscimo extraordinário de serviços” (BRASIL, 1974)
Em derradeiro, o autor aduz que a tendência de inconstitucionalidade é substancial, uma vez que a lei federal se encontra sob os auspícios da decisão final do Supremo Tribunal Federal (STF), nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n° 4173, proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e possui o amparo de entendimento de diversas cortes brasileiras neste sentido.
Em considerações finais, no que diz respeito à lei federal, conclui Kobayashi Júnior (2011, p. 53) que:
[...] carece tal legislação de adequação constitucional, por ser de forma parcial, materialmente inconstitucional, ao inobservar os direitos e garantias fundamentais no que tange à relação de emprego, que é existente, e no que tange aos princípios da administração pública, principalmente a legalidade, a moralidade e a eficiência.
Cabe ressalva que tal ADI deu entrada no STF em 28 de novembro de 2008 e, conforme consulta realizada por este articulista ao sítio eletrônico da Corte, em 25 de março do corrente ano, ainda se encontra aguardando o julgamento final, conclusa desde fevereiro de 2009 ao relator, Ministro Ayres Britto.
Tal ação, ajuizada, como se disse, pelo Conselho Federal da OAB, teve autoria do então diretor do órgão, Ophir Cavalcante Junior, que alcunhou a legislação federal em comento de “aberração jurídica”. Em suas palavras:
A OAB cumpre mais uma vez o seu papel de defensora da Constituição, isso porque essa lei institui, na verdade, o policial militar de segunda categoria. Trata-se de uma aberração jurídica que tenta burlar o ingresso no serviço público mediante concurso, fragiliza as instituições militares, uma vez que permite o pagamento de remunerações aquém do que é pago hoje aos demais militares, e cria para o cidadão uma enorme sensação de insegurança. A sensação será esta porque esses policiais não estarão adequadamente preparados para lidar com o público. Essa lei faz isso: propicia a colocação nas ruas de policiais despreparados para assumir funções de segurança, gerando ao Estado o dever de indenizar. (OAB, 2008, grifos nossos)
A hachura superior foi proposital no sentido de asseverar que, na PMESP, frise-se bem, os Soldados PM Temporários não podiam executar serviços operacionais, como é descrito pelo então diretor do órgão supramencionado. Se houve casos excepcionalíssimos, foi ao total arrepio da regulamentação interna do Comandante Geral da PMESP, mediante a Portaria n° PM1-001/02/04, de julho de 2004, que trouxe instruções complementares à Lei nº 11.064 no âmbito interna corporis, tendo sido aqueles, certamente, medidas não aprovadas pelos superiores hierárquicos e gestores da polícia deste Estado.
Sobre o assunto, vale a lição de Claudir Roberto Teixeira de Miranda, em artigo publicado na revista A Força Policial:
Por outro lado, as funções do SA V, delineadas nos contornos das leis regentes da matéria, não necessitam de treinamentos específicos e de longa duração, dado o tempo de permanência do SAV na Corporação. São submetidos à uma capacitação (adaptação) mínima para conhecer a estrutura militar, um pouco de suas peculiaridades e adaptação à vida de caserna.
Ainda merece ser acrescido que tais funções desenvolvidas não possuem a amplitude de ação que a denominação faz crer. Está ela restrita aos contornos da Administração, salvo quando colocados para emprego na área de saúde e defesa civil. Aliás, a norma interna que regula o emprego do SAV impõe a proibição de emprego fora do âmbito da Organização Policial-Militar, ainda que embarcado e acompanhado (Portaria do Comandante-Geral nº PMl - 001/02/04). (MIRANDA, 2014, p. 53-54, grifos nossos)
Entenda-se, conforme acima descrito, Organização Policial-Militar, como o quartel, a base, ou seja, o local fixo onde está lotado o Soldado PM Temporário. Entenda-se, ainda, o termo embarcado, como a situação em que o funcionário se encontra no interior de uma viatura policial (vedado em absoluto aos temporários).
Cabe novel aparte, também importante de realce. A petição inicial que sugeriu uma nova ADI à lei federal sobredita, no ano de 2014, firmada pelo Procurador-Geral da República Ricardo Janot Monteiro de Barros teve considerações circundantes à Lei 17.882, de 27 de dezembro de 2012, do Estado de Goiás (que instituiu o SAV naquele Estado, sob a cognominação: Serviço de Interesse Militar Voluntário Estadual-SIMVE). Frise-se que uma das motivações apresentadas (que, logicamente, referiu-se à realidade vivida pela Polícia Militar daquele Estado da Federação), também deu conta de que seus Soldados PM Temporários eram submetidos à execução de serviços externos – infortunadamente não vetados na lei Federal ou do Estado de São Paulo – destacando-se trechos que demonstram faticamente a alegação, in verbis:
O art. 21 da lei goiana veda apenas algumas modalidades de policiamento por parte dos integrantes do SIMVE, os quais, como se viu, possuem atribuições compatíveis com as de soldado de 3ª classe da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militar do Estado de Goiás (art. 2º). Executam, portanto, policiamento ostensivo, que, nos termos do art. 2º, nº 27, do Decreto 88.777, de 30 de setembro de 1983, somente pode ser feito por policiais militares uniformizados ou que possam ser imediatamente identificados por seus equipamentos ou viaturas. (MPF, 2014, p. 28, grifos nossos)
Ora, independentemente das alegações bem justificadas a respeito dos direitos trabalhistas dos Soldados PM Temporários é indiscutível asseverar que a execução de serviços operacionais de polícia por quaisquer destes servidores voluntários é totalmente descabida, muito embora não contraponham diretamente os termos da lei federal, em particular o que dispõe o artigo 5° da norma, que somente lhes proíbe o uso de arma de fogo e o exercício de poder de polícia, senão veja-se:
Art. 5° Os Estados e o Distrito Federal poderão estabelecer outros casos para a prestação de serviços voluntários nas Polícias Militares e nos Corpos de Bombeiros Militares, sendo vedados a esses prestadores, sob qualquer hipótese, nas vias públicas, o porte ou o uso de armas de fogo e o exercício do poder de polícia. (BRASIL, 2000)
Repise-se, in fine, que a ADI n° 1473 ainda não teve decisão cabal proferida pelo Excelso Pretório.
4. Análise de jurisprudência
Citam-se, em sequência, alguns acórdãos que demonstram o atual tratamento da lide.
Veja-se ementa do aresto do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), onde os autores têm decisão favorável, sendo certo que a lei do SAV foi declarada inconstitucional, muito embora a lide federal na ADI que tramita no Supremo ainda não tenha tido sua decisão final:
SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. APELAÇÃO CÍVEL. Ex-soldados temporários contratados sob a égide da Lei Estadual nº 11.064/2002. Pretensão ao recebimento de décimo terceiro salário e férias, não pagas em razão do quanto disposto no artigo 11 da LE nº 11.064/2002. Admissibilidade da pretensão. Lei Estadual nº 11.064/2002 declarada inconstitucional pelo Colendo Órgão Especial em incidente de inconstitucionalidade. Soldados temporários que fazem jus à percepção de algumas das verbas pagas policiais militares efetivos. Sentença de improcedência reformada. Recurso provido. Apelação cível nº 9158701-91.2009. Apelante: Carla Cristina de Souza e outros. Apelado: Fazenda do Estado de São Paulo. Relator: Oswaldo Luiz Palu. São Paulo: 14 de setembro de 2011. (TJSP, 2011)
Nos anos seguintes, as decisões foram pacíficas dentro desta linha, como mostra o acórdão a seguir, um julgado do ano de 2015:
Ementa: SERVIÇO AUXILIAR VOLUNTÁRIO. Soldado Policial Militar Voluntário. LF nº 11.029/00. LE nº 11.064/02. Inconstitucionalidade. Vínculo empregatício. Pagamento dos direitos sociais. Juros e correção monetária. – 1. Declaração de Inconstitucionalidade. O Órgão Especial do TJSP, por unanimidade, declarou a inconstitucionalidade das LF nº 10.029/00 e LE nº 11.064/02 no julgamento do Incidente de Inconstitucionalidade nº 9221852-31.2009, 5-8-2009, Rel. Mathias Coltro. – 2. Vínculo empregatício. A autora foi admitida por meio de contrato de prazo determinado para a prestação de serviço auxiliar voluntário e a ilegalidade na contratação não altera a sua condição de servidora temporária. No entanto, faz jus às férias acrescidas do terço constitucional e do décimo terceiro salário, por força do § 3º do art. 39 da CF, afastado o pagamento do adicional de insalubridade e o adicional de local de exercício, que não fazem parte do rol de direitos trabalhistas constitucionalmente assegurados a todos os servidores públicos. – 3. Tempo de serviço. A inconstitucionalidade retroage para invalidar o próprio exercício, não havendo como computar o tempo de serviço para fins de quinquênio, adicionais e previdência social. No entanto, a maioria entende que o serviço foi prestado e o tempo de serviço deve ser contado para fins previdenciários (aposentadoria e disponibilidade), desde que haja o recolhimento da contribuição respectiva. – 4. Correção monetária e juros de mora. O Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucional a expressão "índice oficial de remuneração da caderneta de poupança" do § 12 do art. 100 da Constituição Federal introduzido pela EC nº 62/09 e, em consequência e por arrasto, a disposição semelhante da LF nº 11.960/09; mas manteve hígidos os juros nela indicados (ADI nº 4.357-DF e 4.425-DF, Pleno, 6-3-2013). – Procedência parcial. Recurso da autora parcialmente provido. (TJSP, 2015)
A despeito da ADI em andamento na Suprema Corte, ambas as leis do serviço auxiliar voluntário, federal e estadual de São Paulo, repise-se, foram declaradas inconstitucionais pelo Colendo Órgão Especial do TJSP, na ADI de Lei n° 9221852- 31.2009.8.26.000, pelo fato de criarem nova forma de admissão e remuneração de servidores públicos, não prevista na CF, além de macular direitos sociais constitucionalmente previstos, conforme ementa abaixo transcrita:
INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI FEDERAL 10.029/2000 E LEI ESTADUAL 1 1.064/2002 QUE DISCIPLINAM A CONTRATAÇÃO DE VOLUNTÁRIOS TEMPORÁRIOS PARA AS POLÍCIAS MILITARES E CORPOS DE BOMBEIROS. INCONSTITUCIONALIDADES FLAGRANTES FORMA DE ADMISSÃO E DE REMUNERAÇÃO NÃO PREVISTAS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ENTENDIMENTO. SUPRESSÃO DE DIREITOS SOCIAIS DO TRABALHADOR CONTRATAÇÃO QUE, ADEMAIS, DEVERIA OBSERVAR O PRÉVIO CONCURSO PÚBLICO, JÁ QUE AS FUNÇÕES DESEMPENHADAS POR POLICIAIS MILITARES SÃO PERMANENTES. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA (9221852-31.2009.8.26.0000, Ação Direta de Inconstitucionalidade de Lei, Relator(a): A.C.Mathias Coltro, São Paulo, Órgão Especial, 05/08/2009)
Em sinopse, o SAV foi cancelado no Estado de São Paulo. Não houve mais concursos e o que existe atualmente é a proposta de admissão de Oficiais Administrativos, devidamente regidos pela CLT da qual, inclusive, já houve o certame, cuja seleção, que conta com uma oferta de 5.000 vagas no edital respectivo, foi homologada em 21 de julho de 2015. O objetivo, evidente, é o mesmo: a liberação de policiais para o serviço operacional. Ocorre que ainda não houve a cabal nomeação dos aprovados.
5. Considerações Finais
O poder público deve buscar, de todas as formas legais possíveis, prestar um atendimento de excelência ao cidadão.
No Estado de São Paulo, verificou-se que a lei que instituiu o SAV teve esse intento, almejando uma melhor prestação de serviços de segurança pública, realocando recursos humanos para o serviço operacional da Polícia Militar.
Infelizmente, por conta de uma série de demandas judiciais e necessidade de adequação da norma federal que possibilitou aos Estados o serviço voluntário nas polícias e corpos de bombeiros, o SAV foi abolido.
Isto demonstra que, a despeito de todo vigor envidado pelos governos em proporcionar melhores serviços aos seus contribuintes, tais iniciativas não podem, jamais, ferir direitos trabalhistas devidamente insculpidos na Lei Fundamental.
Referências bibliográficas
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______. Lei n° 10.029, de 20 de outubro de 2000. Estabelece normas gerais para a prestação voluntária de serviços administrativos e de serviços auxiliares de saúde e de defesa civil nas Polícias Militares e nos Corpos de Bombeiros Militares e dá outras providências. Brasília: Diário Oficial da República Federativa do Brasil, 2000.
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______. Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). TJ-SP - ADI de Lei n° 9221852- 31.2009.8.26.000. Relator: A.C.Mathias Coltro, São Paulo, Órgão Especial. Data de Julgamento: 05/08/2009, Órgão Especial. Lex: jurisprudência do TJSP. 2009.
______. Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). TJ-SP - Apelação APL 10173356520148260053 SP 1017335-65.2014.8.26.0053 (TJ-SP). Desembargador Relator: Torres de Carvalho. Lex: Jurisprudência do TJSP. Data do julgamento:16/11/2015. Data da publicação: 20/11/2015.
HOUAISS, Antônio. Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa. v. 3.0. Rio de Janeiro: Objetiva, Junho de 2009.
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