O entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto à retenção de valores pagos na resolução dos contratos de compra e venda de bens imóveis

03/04/2017 às 17:40
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O presente artigo traz o entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca dos limites para retenção de parcelas pagas no âmbito dos contratos de compra e venda de bens imóveis, ante a lacuna legislativa sobre o tema.

Os contratos de compra e venda, via de regra, são regulamentados pela Lei nº. 10.406/2002, que instituiu o Código Civil Brasileiro, e, quando entabulados por pessoas, físicas ou jurídicas, classificadas como “consumidor”e “fornecedor”, pelos ditames da Lei nº. 8.078/90, o Código de Proteção e Defesa do Consumidor.

 

Espécie do gênero contratual acima referido, o contrato de compra e venda de bem imóvel, além de ser regido pelas prefaladas legislações, encontra amparo na Lei nº. 4.591/64, quando feito sob o regime de incorporação, massivamente praticado no Brasil desde a ocorrência do “boom imobiliário”, no ano de 2013, quando a construção civil no país atingiu seu ápice.

 

Contudo, em virtude de uma forte crise econômicae do esfriamento do setor, causado, por exemplo, pela redução do crédito e como consequência da especulação imobiliária, o índice de inadimplemento contratual neste setor, especialmente do consumidor/comprador, cresceu consideravelmente no país, ensejando, consequentemente, um aumento substancial nas demandas judiciais envolvendo litígios dessa natureza.

 

Ocorre que os diplomas legais acima mencionados não estabelecem, de maneira clara e objetiva, os critérios para repartição de valores pagos pelo comprador/consumidor, seja por inadimplemento deste ou do vendedor/fornecedor, ficando sob a égide do Poder Judiciário, quando da apreciação do caso concreto, a fixação dos parâmetros para o correto desfazimento da avença, sopesando princípios como os da obrigatoriedade contratual e da função social do contrato, sempre à luz da legislação consumerista.

 

Nessa senda, vale ressaltar, acerca dos mencionados parâmetros, que o Superior Tribunal de Justiça, ao analisar cláusula contratual acerca de prazo para devolução de valores pagos nos contratos de compra e venda regidos pelo CDC, editou a Súmula nº. 543, in litteris:

 

Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.

 

No entanto, apesar de haver fixado,em sede de enunciado, apenas o critério temporal para a restituição de valores pagos, o STJ, no julgamento do REsp 1300418, analisado em regime de Recurso Repetitivo, estabeleceu que, nos casos de culpa exclusiva do vendedor/fornecedor, a restituição deve ser integral, e que, ocorrendo o desfazimento por culpa apenas do comprador/consumidor, a devolução deve ser parcial.

Como visto, o STJ, em sede de Súmula e de julgamento de Recurso Representativo de Controvérsia, fixou, acerca do tema ventilado, apenas os critérios de tempo e de decaimento do direito das partes, deixando de, naquelas modalidades de estabelecimento de precedente, definir exatamente os parâmetros percentuais para realização da restituição dos valores pagos.

 

Entretanto, quando da apreciação ordinária dos recursos de sua competência, a referida Corte tem sedimentado entendimento no sentido de admitir como razoável, em caso de inadimplemento do consumidor/comprador, a retenção do percentual de até 25% das parcelas pagas pelo consumidor, como asseverado pelo Ministro Luis Felipe Salomão, quando da relatoria do Recurso Especialnº. 1.300.418, no qual consignou, inclusive, que este parâmetro, embora não seja peremptório, tem sido replicado reiteradamente por aquele Tribunal, em, ao nosso sentir, uma nítida aplicação, equitativa e sistêmica, da Súmula 543 do STJ e do artigo 53 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor[1].

 

Em tempo, é de se destacar que o posicionamento mencionado alhures permanece sendo aplicado pela Corte que, em novembro de 2016, assim decidiu:

 

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.CONTRATO DE COMPRA E VENDA. DESFAZIMENTO. 1. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. ART. 273 DO CPC/1973. REQUISITOS PREENCHIMENTO. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 5 E 7 DO STJ. 2. RESOLUÇÃO DO CONTRATO. ABUSIVIDADE. CDC. SÚMULA 543/STJ. 3. DEVOLUÇÃO DE VALORES PAGOS. PERCENTUAL DE RETENÇÃO. REVISÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL E MATÉRIA FÁTICA. SÚMULAS 7 E 83/STJ. 3. AGRAVO IMPROVIDO. (...) 2. A jurisprudência desta Corte se firmou no sentido da possibilidade da devolução de todas as parcelas pagas, desde que a vendedora seja responsável pela rescisão do contrato. Esse entendimento foi consolidado na Súmula 543 do STJ. 3  O percentual de retenção estabelecido pelo acórdão recorrido em 20% dos valores pagos, não destoa da atual jurisprudência desta Corte que, em caso de resolução do compromisso de compra e venda por culpa do promitente comprador, entende ser lícito ao vendedor reter entre 10% e 25% dos valores pagos,  sendo  que a fixação desse percentual  foi  analisada  de  acordo com as peculiaridades do caso concreto,   não   sendo   viável   a  sua  revisão  nesta  instância extraordinária, sob pena de afronta à Súmula 7/STJ. 4. Agravo interno improvido.(AgInt no AREsp 952.241/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/11/2016, DJe 29/11/2016)

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Assim sendo, resta evidenciado que, enquanto persistir o silêncio legislativo no tocante à matéria, deve ser aplicado, nos casos de desfazimento, por culpa do consumidor/comprador, de contratos de compra e venda de imóveis regidos pelo CDC, o posicionamento consolidado do STJ que, no exercício dafunção de integração normativa, entende como admissível a retenção, pelo vendedor/fornecedor, de valores entre os patamares de 10% (dez por cento) e 25% (vinte e cinco por cento) das parcelas pagas, vide os julgamentos dos seguintes recursos: EAg 1138183/PE; AgRg no REsp 927.433/DF; REsp 838.516/RS; AgRg no Ag 1010279/MG.

 

 

 

 

 [1] Art. 53. Nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado.

 

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Sobre o autor
José Pires Rodrigues Filho

Galvão, Cabral e Pires Advocacia e Consultoria Jurídica.

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