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Aspectos de Direito Internacional Privado do Trabalho

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22/09/2004 às 00:00
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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo mostrar o âmbito de aplicação do direito internacional privado na esfera laboral, através de uma análise sistemática do tema proposto.

Inicialmente buscou-se fazer uma apresentação sintetizada do DIPr, explicitando seu conceito, a questão de sua denominação e a relação com a natureza de suas normas, bem como seu objeto e finalidades.

Essa referência introdutória às características específicas do direito internacional privado se deve ao simples fato de que a temática objeto desse estudo se desenvolve nessa esfera jurídica, estando a ela intimamente relacionada. Não há como entender de direito laboral com conexão internacional sem que se tenha pelo menos algumas noções essenciais de DIPr.

Assim, cabíveis as seguintes indagações referentes à temática que será desenvolvida: Qual seria a lei de direito material aplicável diante da incidência de uma lei trabalhista estrangeira? Quais os direitos trabalhistas que devem ser cogitados: os constantes na CLT brasileira ou no Código de Trabalho de certo país? Qual a norma de direito processual que regerá a matéria? Qual país poderá proferir a sentença respectiva?

O ramo jurídico que informa a solução dessas questões é o Direito Internacional Privado, como já se fez menção. Assim, será justamente nele que buscar-se-á as respostas para todas essas indagações, com as necessárias cautelas e adaptações, já que estamos tratando de sua aplicação na esfera trabalhista, cujo princípio maior é a proteção do trabalhador.


2.O DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO EM LINHAS GERAIS

Para melhor compreender-se o tema objeto desse estudo faz-se necessário, primeiramente, fazer uma análise, ainda que breve, de alguns pontos gerais de Direito Internacional Privado, visando estabelecer o âmbito de aplicação dessa área do direito.

De acordo com José Maria Rossani Garcez, o DIPr [1], em síntese, pode ser apresentado como o conjunto de normas ou princípios aplicados ou admitidos por cada Estado, destinadas a regular os direitos, atos ou fatos que tenham conexão internacional e se destinem a ter efeitos entre pessoas naturais ou jurídicas privadas ou a entidades públicas ou privadas no exercício de atividades jusprivatistas [2].

O direito internacional privado, apesar da denominação, é um conjunto de normas de direito público e interno. Interno porque se compõe de normas que cada país adota voluntariamente, como Estado soberano que é. E é direito público porque consiste em uma das espécies de normas de superdireito, ou sobredireito, que não disciplinam diretamente o comportamento dos homens em sociedade, mas a aplicação de outras normas.

Quanto ao objeto do direito internacional privado, entende Jacob Dolinger que a disciplina envolve as seguintes matérias: a nacionalidade, a condição jurídica do estrangeiro, o conflito de leis e o conflito de jurisdições [3].

Já para a corrente liderada por Irineu Strenger, a finalidade principal do direito internacional privado seria a normatividade selecionadora para a aplicação da lei estrangeira em determinado país e da lei nacional deste país a casos que comportem algum elemento de conexão com mais de uma legislação nacional, algum elemento de estraneidade [4].

Enfim, as normas de conflito elaboradas pelos Estados soberanos visam facilitar a aplicação e disciplinar da forma mais adequada o relacionamento internacional, oferecendo aos operadores do direito os princípios regulamentares que permitam a aplicação da legislação estrangeira ou nacional a casos que guardem alguma conexão internacional. Com isso busca-se evitar a possibilidade de julgamentos contraditórios nos diferentes Estados, capazes de disciplinar a mesma relação social [5].

As normas de DIPr indicam o direito aplicável às diversas situações jurídicas conectadas a mais de um sistema legal. Essas norma são constituídas pelos elementos de conexão, que são expressões legais, de conteúdo variável, que têm o efeito de indicar e permitir a determinação do direito ou sistema legal que deve tutelar uma determinada relação jurídica.

No sistema de DIPr brasileiro, são estes os principais elementos de conexão: a) domicílio; b) nacionalidade; c) residência; d) lugar do nascimento ou falecimento; e)lugar da constituição da pessoa jurídica; f) lugar da situação do bem; g) lugar da constituição ou execução da obrigação; h) lugar em que se encontre o proponente do contrato; i) lugar da prática do ato ilícito.

Assim, observa-se que apesar de existir o princípio de que as leis não valem ou não produzem efeitos ultraterritorialmente, na verdade ele é mitigado, pois vários são os ordenamentos jurídicos que inserem normas e mecanismos relativos ao seu DIPr, propiciando formas de aplicação em seu território da legislação estrangeira e estabelecendo critérios para que suas leis também possam aplicar-se em outros países, quando for o caso.


3NOÇÕES DE DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO DO TRABALHO

O Direito Internacional Privado do Trabalho resolve os conflitos de lei no espaço, em virtude da possível incidência da lei trabalhista estrangeira. Os conflitos de lei em matéria trabalhista decorrem não só do deslocamento de mão-de-obra, mas do desenvolvimento dos transportes internacionais, da necessidade de técnicos estrangeiros nos países de menor desenvolvimento, da crescente internacionalização do comércio, da extensão internacional das atividades das empresas com filiais em diversas partes do mundo, daí porque não é pequeno o número de assalariados em razão dos quais surge questão de aplicação espacial da lei [6].

O intérprete brasileiro, para decidir os conflitos de lei no espaço, inicialmente, não recorre a códigos, tratados ou convenções internacionais referendados pelo Brasil, mas à lei brasileira genérica de conflitos espaciais; somente depois verificará se há lei brasileira específica ou tratado internacional [7] multilateral ou bilateral, para a hipótese concreta, que afastará o conflito.

3.1. O CONFLITO DE LEIS DO TRABALHO NO ESPAÇO

O que fazer quando houver lei estrangeira envolvendo a relação de direito material trabalhista? Qual a lei que deve disciplinar os direitos e obrigações das partes no contrato de trabalho em caso de conflito: a lei nacional ou a lei alienígena?

A primeira norma aplicável seria a Lei de Introdução ao Código Civil (D.L. 4.657/42), que é vestibular a todas as normas não penais e consagra o sistema brasileiro de direito internacional privado [8].

De acordo com o art. 9º da LICC, "para qualificar e reger as obrigações aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem". E os §§ 1º e 2º do mesmo artigo complementam que "destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo da forma essencial, será esta observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira, quanto aos requisitos extrínsecos do ato" (§1º); " a obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente"(§2º).

Este princípio privilegia o princípio da lex loci executionis [9]ou do ius loci contractus para qualificação e regência das obrigações, inclusive contratuais [10].

Todavia, de acordo com Valentin Carrion, salvo em circunstância muito excepcional, é muito inadequado que empregados que trabalhem no Brasil habitualmente, estrangeiros ou não, tenham regulados seus direitos e obrigações por lei estrangeira, em virtude de ter pactuado seu contrato em outro país ou porque a empresa empregadora proponente nele resida [11].

A opinião crítica de Carrion em relação a este dispositivo da LICC se funda no fato de que o protecionismo universal do direito do trabalho [12], que é sua razão de ser, só é possível com a sua territorialidade, ou seja, com o princípio jurídico da lei do lugar onde deva ser cumprida a execução (lex loci executionis), mesmo que tenha sido contratada noutro país. Daí o motivo pelo qual a regra geral das obrigações não se aplicaria às obrigações decorrentes de contrato de trabalho.

Corrobora com essa opinião Haroldo Valadão, segundo o qual o Direito Internacional Privado do Trabalho é tão especial que se destacou do Direito Internacional Privado clássico [13].

A territorialidade do Direito do Trabalho é evidenciada no direito comparado e nos tratados internacionais. Esse princípio já tinha adeptos como Jitta, em 1916, e do mesmo modo entendem internacionalistas como Oscar Tenório os Espínola, bem como estudiosos especializados, tais como Süssekind.

O próprio Código de Bustamante (DLeg 5.467/29) [14]afirma em seu art. 198 que é "territorial a legislação sobre acidentes do trabalho e proteção social do trabalhador".

A regra do lugar do trabalho é coroada pela Convenção de Roma e é universalmente aceita. Eis o seguinte entendimento jurisprudencial que trata do princípio da territorialidade na relação jurídica trabalhista:

Princípio da territorialidade. Lex loci executionis. "A relação jurídica trabalhista é regida pelas leis vigentes no país da prestação de serviço e não por aquelas do local da contratação". Decisão: Não conhecer dos embargos quanto à incompetência da Justiça do Trabalho brasileira. Conhecer dos embargos quanto à legislação aplicável e acolhê-los, determinando o retorno dos autos à MM. Junta de Conciliação e Julgamento de origem para que a ação seja julgada nos termos da legislação vigente no Iraque á época da execução do contrato. [15]

E nesse mesmo sentido foi a decisão da 1ª Turma do TST no recurso de revista 184.441/95.2:

Serviços prestados no Iraque. Consta no v. acórdão regional que o contrato celebrado somente previa o aviso prévio a título de indenização, não sendo assegurada naquele a sua integração para efeito de contagem de tempo de serviço. Assim, não há como se elastecer os termos do contrato, como pretende o reclamante, mesmo porque, no caso dos autos, sequer se poderia invocar a legislação brasileira, uma vez que, nos termos da jurisprudência firmada no Enunciado 207, a lei aplicável é aquela do país onde foram prestados os serviços e não aquela do país onde foi celebrado o contrato de trabalho [grifo nosso]. [16]

De acordo com Octavio Bueno Magano, tem-se ainda outro argumento para se aplicar a lei do lugar da prestação do trabalho, advindo da própria redação do art. 17 da LICC, segundo a qual "as leis(...)de outro país, bem como quaisquer declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes" [17].

Nesse sentido acrescenta Carrion que essa hipótese se verifica quando a lei estrangeira outorga proteção inferior à brasileira. E ainda ressalta que a questão é preliminarmente distinta: ou se aplica a lei originária ou a do lugar de execução. Mais e o princípio da lei mais favorável ao trabalhador? Teria aplicação nesse caso?

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Parece-nos que nesse assunto não há genericamente o princípio da lei mais favorável; só se houver expressa determinação, porque o contrato entre as partes assim o tenha disposto, ou porque a lei do país de origem ou do país de execução o determine, de forma a integrar-se no direito do trabalhador [18]. O princípio do direito mais favorável só ocorre dentro do mesmo ordenamento interno.

Sendo assim, o trabalho subordinado, prestado no Brasil, é em princípio, regido pela lei material brasileira; o Direito do Trabalho se aplica em todo o território nacional, desde que haja relação de emprego, independentemente da nacionalidade ou do domicílio das partes (empregado ou empregador).

O embasamento legal para tanto está no art. 1º da CLT, que nenhuma exceção faz à aplicação geral da lei material trabalhista no Brasil, e no próprio conceito que se dá às leis territoriais: "são criadas no intuito particular de garantir a organização social" [19].

Vejamos o que diz a Súmula n.º 207 do TST: "A relação jurídica trabalhista é regida pelas leis vigentes no país da prestação de serviço e não por aquelas do local da contratação".

No entanto, cabe salientar que nada impede o trabalhador de fazer jus à aplicação da lei estrangeira, quando assim houver contratado e em face da autonomia da vontade, quando aquela lhe garantir uma condição mais favorável.

Faz-se necessário mencionar ainda que o princípio da lei do lugar da execução, ou seja, lex loci laboris, comporta duas exceções, quais sejam: a) o trabalho prestado para as pessoas jurídicas de direito público internacional; b) o trabalho prestado no Brasil, a título esporádico, inserido numa relação laboral continuada, desenvolvida em outro país ou em vários outros países e subordinada habitualmente a matriz ou filial no estrangeiro.

Com relação ao contrato executado em um país e que passa a ter seqüência em outro, rege-se pelas leis do Estado onde o trabalho está sendo prestado.

Vejamos o seguinte entendimento jurisprudencial:

Contrato de trabalho celebrado e parcialmente executado no Brasil, com prestação de serviço também no exterior. Legislação aplicável. A lei do local da prestação dos serviços regerá o julgamento da controvérsia, mesmo se a parte, tendo sido contratada no Brasil, e aqui tiver trabalhado, postula direitos decorrentes da prestação de serviços no exterior [grifo nosso]. [20]

A lei brasileira também se aplica aos empregados de empresas estrangeiras no Brasil, estatais ou não, excluindo-se os que trabalhem para os serviços diplomáticos.

3.1.1.Caso de transferência de empregado do Brasil para prestar serviços em outro país

Do ponto de vista das leis brasileiras, continuará regendo-se por estas, o empregado transferido do Brasil para prestar serviços em outro país, em decorrência dos efeitos jurídicos do contrato vigente quando da transferência.

Tratando-se de empresas prestadoras de serviços de engenharia, projetos e obras, etc., a norma específica – L.7.064/82 – manda aplicar a lei brasileira, quando mais favorável (art. 3º), sempre que o trabalhador seja: a) cedido; b) removido, ou c) de início contratado por empresa sediada no Brasil [21].

Nas hipóteses supra determina-se aplicação da lei mais favorável (art. 3º). Para tanto a norma deve ser examinada pelo confronto de cada instituto trabalhista, não pela comparação de preceitos isolados ou pelo cotejo global de toda a legislação aplicável. Isso se deve ao fato de que o sentido exato das normas jurídicas não é apurado quando da análise isolada, mas sim quando da sua relação com outras normas que digam respeito à mesma matéria [22].

De acordo com o entendimento supra, os preceitos referentes a hora prorrogada, intervalos adicionais, hora noturna devem ser inseridos no instituto jurídico de maior amplitude, que é o da duração do trabalho.

Já no caso de empresa contratação por empresa estrangeira para trabalho no exterior, garantem-se certos direitos de viagem e retorno, além de expressa menção ao cumprimento da lei do país onde o trabalho se der (art. 14 da L. 7.064/82 [23]).

Assim, de acordo com Magano, os princípios constantes na referida lei devem ser aplicados pro analogia aos empregados de outras atividades nela não previstas [24].

3.1.2.O princípio da autonomia da vontade e os contratos entre nacionais cumpridos em outros países

As partes podem ajustar, livremente, as condições de trabalho que prevalecerão nos seus contratos de trabalho, bem como eleger a legislação sob cujo império será resolvido.

Assim, entre uma empresa norte-americana e um trabalhador dessa mesma nacionalidade pode ser pactuado que o contrato de trabalho a ser cumprido numa filial do Brasil deva respeitar determinadas cláusulas coerentes com o sistema jurídico positivo do país de que ambos são nacionais, e a jurisdição brasileira, se chamada a resolver a questão, não pode deixar de reconhecer eficácia ao ajuste firmado nessas condições, em face da autonomia da vontade [25].

Também entre um trabalhador e uma empresa brasileira pode ficar contratado que a sua prestação de serviço para filial fora do Brasil venha a ser regulada segundo a lei brasileira ou a do local.

Com relação ao contrato de trabalho entre um nacional e um estrangeiro, mesmo sendo a autonomia da vontade norma imperante, é preciso reconhecer que as leis locais não poderão ser postergadas. Assim, o princípio predominante será o da territorialidade, respeitadas as condições mais vantajosas estabelecidas pelos interessados, ineficazes as condições de trabalho menos favoráveis que as garantias mínimas do direito positivo do país [26].

3.1.3A lei aplicável aos tripulantes de embarcações

Esta questão é bastante controvertida, sendo que cada hipótese modifica os critérios para fixar o elemento de conexão, que é meio técnico de permitir a indicação do direito estrangeiro ou nacional aplicável. [27]

Tratando-se de trabalho realizado preponderantemente em alto-mar, prevalece a lei da bandeira, ou da matrícula do navio, o que termina por ser a lei do local da prestação de serviços.

No entanto convém mencionar que a lei da bandeira do navio ou embarcação não é critério definitivo em matéria de competência jurisdicional trabalhista; ocorre que a relação de emprego se estabelece entre o tripulante e a empresa que explora o navio, e não entre entre aquele e o proprietário da embarcação, o que também é verdade em face do direito brasileiro, não só pelos princípios que o iluminam como direito posto em geral quanto ao armador, inclusive no que se refere às embarcações pesqueiras [28] e pelas possíveis fraudes de "bandeira de favor".

Por esse motivo, mesmo os que aderem ao critério da lei de bandeira do navio, estabelecem exceções importantes de serem mencionadas, como o caso de empresa sediada no Brasil que arrenda navio estrangeiro.

Russomano refere-se à nacionalidade da empresa, mas no Brasil o que pesa é o lugar onde são desenvolvidas as atividades ou onde se deu a contratação, a fim de que, sempre que possível, prevaleçam a norma e jurisdição nacionais, evitando-se artifícios que deixem o trabalhador desprotegido e vulnerável quanto ao direito material específico e previdenciário, assim como quanto ao processual [29].

3.2 ANÁLISE DO ARTIGO 651, §2º, DA CLT: COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO DE TRABALHO NO EXTERIOR

Eis a redação do art. 651, caput e §2º da CLT:

Art. 651 - A competência das Juntas de Conciliação e Julgamento é determinada pela localidade onde o empregado, reclamante ou reclamado, prestar serviços ao empregador, ainda que tenha sido contratado noutro local ou no estrangeiro.

§1º (...)

§2º A competência das Juntas de Conciliação e Julgamento, estabelecida neste artigo, estende-se aos dissídios ocorridos em agência ou filial no estrangeiro, desde que o empregador seja brasileiro e não haja convenção internacional dispondo em contrário.

§3º (...).

O Direito Internacional Privado, como já vimos, regula o conflito de leis no espaço entre normas de Estados soberanos. O disposto no art. 651, caput e §2º, é norma de direito interno em sua primeira parte e norma de direito internacional privado no final.

Ao mencionar que a competência das Varas do Trabalho é determinada pela localidade onde o empregado presta serviço, mesmo que tenha sido contratado no estrangeiro, está admitindo a competência brasileira, mesmo que alguma outra norma estrangeira adote o critério da lei do lugar onde se deu a contratação.

É o entendimento jurisprudencial:

A justiça brasileira é competente para julgar ação de trabalhador brasileiro contratado no Brasil (CLT, art. 651, §2º e CPC, art.88) por empresa estrangeira para trabalhar no exterior. Isto porque a norma imperativa brasileira impõe a essas empresas a obrigatoriedade de terem domicílio no Brasil e percentual acionário nacional (L. 7.064/82, arts. 13, 19 e 20). Essa conclusão processual não impede que o juiz brasileiro aplique a lei estrangeira de direito do trabalho material, em virtude do princípio de prevalência da norma do lugar da prestação de serviços: lex loci laboris [grifo nosso]. [30]

Aplica-se nesse caso a CLT por ser ela mais específica que a LICC; esta diz em seu art. 12 que "é competente a autoridade judiciária brasileira, quando for réu domiciliado no Brasil, ou aqui tiver de ser cumprida a obrigação".

No que se refere ao critério de ser esta ou outra Vara do Trabalho a competente, depois que se fixou a competência nacional, pertence, pelos princípios internacionais, à lei local. Assim, o Código de Bustamante, que é lei no Brasil, dispõe em seu art. 332: "Dentro de cada Estado contratante, a competência preferente dos diversos juízes será regulada pelo seu direito nacional".

O §2º do art. 651 da CLT deve ser entendido como visando os "litígios decorrentes da prestação de trabalho no estrangeiro" subordinados a "agência ou filial" no exterior [31].

Outra questão motivo de crítica é a proteção dada ao "empregado brasileiro" e não ao "domiciliado no Brasil", com o que ficariam abrangidos não só os nacionais como também os que aqui adotaram o país com ânimo definitivo. Segundo CARRION resta violada, nesse caso, a tradição nacional. Mesmo que o dispositivo se dirija imediatamente à competência territorial internacional, se se interpretasse literalmente, estar-se-ia criando casos de competência em razão da condição da pessoa [32].

No entanto cabível a seguinte pergunta: qualquer brasileiro que trabalhe no exterior, para qualquer empresa, terá direito à jurisdição nacional? A preocupação nesse caso deve ser com o "elemento de conexão" e com a "qualificação", ou seja, determinar-se a natureza de uma situação de fato que se liga com dois ou mais sistemas jurídicos.

A indagação supra também é de direito processual e neste é insuficiente que o trabalhador seja brasileiro para a competência jurisdicional deste país. Pelos princípios e costumes internacionais, impõe-se um nexo maior entre a demanda e a competência; o critério de o demandante ser nacional ou domiciliado em certo país não basta.

A LICC pode ser aplicada por analogia, como complementação (art. 12). Já o CPC, no art. 88, caput, I e par. único, que também contém norma de direito internacional privado menciona que:

Art. 88 - É competente a autoridade judiciária brasileira quando:

I - o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil;

II – (...);

III – (...).

Parágrafo único. Para o fim do disposto no n. I, reputa-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que aqui tiver agência, filial ou sucursal.

De acordo com Süssekind está implícito no dispositivo legal que a empresa tenha domicílio no Brasil [33]. Em sentido amplo de domicílio pode-se deduzir como sendo qualquer agência, filial ou sucursal aberta ou instalada no Brasil, como indica o CPC e não apenas a matriz da empresa.

Com base no supra exposto, tem-se de deduzir, com apoio nos textos legislativos mencionados, especialmente no CPC brasileiro, que a competência da Justiça nacional é mais ampla, desde que o réu-empregador seja domiciliado no Brasil, pela sua matriz, agência, filial ou sucursal, mesmo que o trabalho tenha se dado no exterior, sem qualquer vínculo com o país. Se as normas internacionais se inspiram na proteção do trabalhador, não haveria maior contra-senso que obrigá-lo a dirigir-se a um país onde não reside, para poder requerer "Justiça".

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Sobre a autora
Daiana Vasconcellos Ledel

acadêmica do curso de Direito na UNISINOS/RS

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LEDEL, Daiana Vasconcellos. Aspectos de Direito Internacional Privado do Trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 442, 22 set. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5731. Acesso em: 22 dez. 2024.

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