Mandado de injunção como supedâneo para instituição de impostos sobre grandes fortunas

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Resumo:


  • O artigo discute a possibilidade de impetrar Mandado de Injunção para regulamentar o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF), previsto na Constituição Federal do Brasil, mas ainda não implementado.

  • Aborda a inércia legislativa como uma violação ao princípio da capacidade contributiva e da justiça fiscal, argumentando que a não regulamentação do IGF contribui para a desigualdade tributária e social.

  • Analisa a legitimidade do Mandado de Injunção como instrumento para coagir o Poder Legislativo a regulamentar o IGF, visando garantir a cidadania e a igualdade tributária, fundamentais em um Estado Democrático de Direito.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

3. TRIBUTOS, IMPOSTOS E O IMPOSTO SOBRE AS GRANDES FORTUNAS

Preliminarmente o Código Tributário Nacional prevê quais são as formas de tributo em seu art. 5º: “Os tributos são impostos, taxas e contribuições de melhoria. ”

Como também empréstimo compulsório e contribuições sociais. E assim conceitua: “Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada. ”

Conforme ensina Nogueira (1995).

os tributos (...) são as receitas derivadas que o Estado recolhe do patrimônio dos indivíduos, baseado no seu poder fiscal (poder de tributar, às vezes consorciado com o poder de regular), mas disciplinado por normas de direito público que constituem o Direito Tributário.

Os impostos estão previstos na Constituição Federal em seu artigo 145, inciso I: Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: I - impostos;

O Código Tributário Nacional o define: Art. 16. Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.

Para Carvalho (2008), “podemos definir imposto como o tributo que tem por hipótese de incidência um fato alheio a qualquer atuação do Poder Público”.

Nesse ponto de vista Sabbag (2012) define imposto, “como tributo não vinculado à atividade estatal, o que o torna atrelável à atividade do particular, ou seja, ao âmbito privado do contribuinte”.

(...) alguns doutrinadores mais críticos afirmam que o tributo não foi criado porque as grandes fortunas estariam muito bem representadas no parlamento federal, de forma a inibir qualquer iniciativa no sentido de exercício da competência”. (ALEXANDRE, 2010, p.583).

Instituída na nossa Carta Maior de 1988 através de uma ideologia socialista, o IGF buscando equacionar a cobrança dos impostos, ou seja, quem “ganha” mais contribui mais, e quem “ganha” menos contribui menos.

Costa (2010) afirma que: “o legislador constituinte originário brasileiro de 1988, para criar o IGF, inspirou-se no modelo francês, que se denominava de Impót sur Les Grandes Fortunes, desde 1982 já inserido em seu sistema tributário” (COSTA, 2010, p. 12).

A base de criação surgiu da França, com intuito de ser um imposto razoável, claro e preciso, de acordo com Costa:

(...) o então candidato à presidência da França, Françõis Mitterand, propôs, em 1981, com base na ideologia socialista, a criação de um imposto que fosse socialmente justo, economicamente razoável e tecnicamente simples, claro e preciso. (COSTA, 2010, p. 12)

Instituído na França, por meio da Lei nº 81-1160 de dezembro, foi cobrado a partir de 1º de janeiro de 1982, se retirando do sistema tributário francês alguns anos após com a edição da Lei nº 86-824 de 11 de julho 1986. Com a reeleição de Mitterrand, o imposto sobre grandes fortunas voltou com uma nova denominação: Impôt de Solidarité sur La Fortuna (Imposto de Solidariedade Sobre Fortunas - ISF), por meio da lei nº 88-1149, de 23 de dezembro de 1988.

No Brasil na Assembleia Nacional Constituinte em 1987-88 foi cogitada a ideia de um imposto sobre as ostentações, no qual se incide sobre os bens suntuosos, inspirado no modelo espanhol, o Impuesto Extraordiário sobre el patrimônio de las Personas Fisícas.

E por fim como explica Costa (2010):

Por tratar-se de um modelo de tributação analítica, ou seja, só englobava algumas espécies de bens e direitos, o modelo espanhol foi descartado pelo Constituinte brasileiro, cuja preferência recaiu sobre um modelo sintético que incidisse sobre o patrimônio global, seguinte então a experiência francesa. (COSTA, 2010, p. 13)

Os Impostos Sobre Grandes Fortunas estão previstos na nossa Carta Magna em seu art. 153. e inciso VII: Art. 153. Compete à união instituir impostos sobre: (...) VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar.

O quorum de aprovação da lei complementar é de maioria absoluta, conforme o artigo 69 da Constituição Federal - para ser aprovada precisa da maioria dos componentes, do total de membros integrantes da Casa, enquanto que na maioria simples, necessita na maioria daqueles que compareceram na votação, ou seja, para serem aprovados os impostos sobre grandes fortunas, precisa da metade de todos os membros da casa, mais um, independente da presença na votação ou não.


4. PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA E DA JUSTIÇA SOCIAL E FISCAL

Esse princípio merece devoção, já que está previsto em nossa Constituição Federal:

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: § 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.

Em sua essência busca-se a Justiça Social, pois vem reforçar o princípio da Isonomia Tributária, propondo o seguinte: sempre que possível, ou seja, sempre que o legislador for criar algum imposto, se possível que seja pessoal e que seja graduado segundo a capacidade econômica do contribuinte, traduzinho no brocardo “quanto mais se ganha, mais se paga”, e vice-versa. Por meio dele, também, é possível entender o conceito progressividade de alíquotas, a progressividade fundamenta o princípio da capacidade do contribuinte.

Quanto maior for a base de cálculo, tanto maior for o Salário, maior será sua alíquota, a isso se denomina progressividade. A progressividade é uma forma de onerar mais quem tem mais riqueza, não se confundindo com proporcionalidade na qual não busca a justiça social, pois atribui alíquotas idêntica a casos semelhantes.

Segundo Sabbag (2010): ”É a técnica de incidência de alíquotas capaz de realizar o preceito constitucional da Isonomia Tributária, à medida que se onera mais gravosamente a riqueza tributável maior”.

O Cardoso traz uma reflexão mais profunda sobre o tema: “O princípio da capacidade contributiva, em síntese, está voltado à construção de uma democracia plena, onde a dignidade humana e a cidadania devem ser sopesados quando da elaboração da norma tributária” (CARDOSO, 2010, p.48).

Cortella e Ribeiro (2010) fazem uma crítica em relação à justiça social e o direito tributário “A tributação não é proporcional ao rendimento das pessoas, desta forma em termos relativos os mais pobres pagam ao fisco um percentual bem maior que os ricos, em relação aos seus salários”.

No sentido de que o estado busca sempre uma justiça voltada a cidadania e a coletividade, a justiça social conforme Amaral (2000) nos traz o conceito:

A justiça social defende a luta contra os privilégios, exaltando a dignidade humana no sentido de fazer com que cada um contribua para o desenvolvimento, em todos os seus aspectos, da comunidade, conduzindo o direito positivado à função de equilibrar a atividade e os interesses dos vários setores sociais. (AMARAL, 2000, p. 17-18).

Em um Estado Democrático de Direito, todos devem contribuir para o seu funcionamento, no entanto cada indivíduo deve pagar seus tributos sem prejudicar o seu sustento e de sua família, na medida da sua capacidade contributiva.

E nesse ponto de vista que os Impostos Sobre Fortunas deve ser aplicado, para buscar uma melhor arrecadação e assim a sua redistribuição em prol de toda a sociedade, inclusive daquele que foi tributado pelo próprio IGF, sendo o Impostos Sobre Grandes Fortunas uma forma de aplicar a Justiça Fiscal.

Conforme explica Cardoso: “Consequentemente, não é o fato das políticas sociais serem menos dirigidas aos mais ricos, que legitimam estes últimos a levar menos dinheiro aos cofres públicos” (CARDOSO, 2010, p. 37).

Ao encontro de Cortella e Janine Ribeiro, Cardoso nos traz uma reflexão:

Pelo princípio da solidariedade social tributária devemos abandonar interpretações que pareçam melhores individualmente, para analisar o tributo como instrumento de justiça social. O Estado Social e democrático de Direito está obrigado a criar um Direito justo, sobretudo, um Direito Tributário justo. (CARDOSO, 2010, p. 39).

4.1. DA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA E O ARTIGO 11 DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL (LC 101/2000)

Sabbag (2012) traz o conceito de competência tributária: “é a habilidade privativa e constitucionalmente atribuída ao ente político para que este, com base na lei, proceda à instituição da exação tributária”.

É a forma de criar tributos, repartidos entre os entes políticos, União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios, cada um tendo suas competências, de acordo com a Constituição, estando dividido nos artigos 153 a 156 da Carga Maior.

A competência tributária é indelegável de acordo com art. 7. do Código Tributário Nacional, e político também, pois o chefe do poder executivo pode manobra-lo de acordo com seu plano de governo e conveniência, ressaltando os limites legais. A competência tributária também é intransferível, inalterável e irrenunciável.

Ocorre que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LC n. 101/2000) diz em seu artigo 11:

Art. 11. Constituem requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal a instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os tributos da competência constitucional do ente da Federação.

Parágrafo único. É vedada a realização de transferências voluntárias para o ente que não observe o disposto no caput, no que se refere aos impostos.

Deixa claro que deverão ser instituídos todos os tributos, sem exceção, sob pena de sanção, Oliveira (2010) comenta o artigo:

É requisito essencial da responsabilidade que o Poder Público institua, preveja e arrecade “todos os tributos da competência constitucional do ente da Federação” (art. 11. da LC 101/2000. Evidente que nada pode ficar de fora. Como é o agente público responsável pelo destino dos recursos arrecadados, deve ser responsável pela previsão da receita. Como a lei estabelece todos os recursos do ente federativo, deve exercer o poder tributário em toda sua plenitude. Omitir-se na arrecadação também enseja responsabilidade. (OLIVEIRA, 2011, p. 140).

Existe corrente a favor da facultatividade, que entende que o ente incumbido de instituir o imposto tenha o direito de decidir ou não se o cria, conforme Eduardo Sabbag:

O dispositivo merece interpretação cautelosa, pois o legislador quis, salvo melhor juízo, estimular a instituição do tributo economicamente viável, cuja competência estaria inadequadamente estanque. Portanto, entendemos que é defensável a facultatividade do exercício da competência tributária, uma vez que o art. 11. da Lei de Responsabilidade Fiscal não traduz, incontestavelmente, mecanismo efetivo de obrigatoriedade. (SABBAG, 2012, p. 385).

Marcelo Figueiredo (2001) entende que sendo facultativo ocorreria:

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Também poder-se-ia argumentar, a favor da nova regra, questão puramente econômica e não jurídica. A de que, na verdade, a se entender como faculdade a instituição tributária, sua imposição e arrecadação, o Estado iria a falência, bastando contar com sucessivos governantes irresponsáveis que por demagogia ou desvario, simplesmente não exercessem sua competência tributária. (FIGUEIREDO, 2001, p. 11)

Desta forma, entende-se que de acordo com o caso concreto deve ser analisada tal hipótese, pois para o caso em tela é justa à finalidade. Por fim nesse caso concreto é viável a obrigatoriedade e não a facultatividade do exercício da competência tributária.


5. CIDADANIA E TRIBUTAÇÃO

O princípio da igualdade tributária é chamado pela doutrina também de princípio da proibição dos privilégios odiosos, este principio esta previsto em nossa Constituição Federal de 1988:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

(...)

II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;

Na Constituição brasileira foi criado esse dispositivo a fim de evitar tais regalias ocorridas na Ditadura Militar, que dependendo do cargo exercido ou função desempenhada, existiam diversos privilégios de cunho politico, diversas desigualdades tributárias, e por esse motivo o legislador originário incluiu no rol dos princípios da Carta Maior esse da igualdade tributária.

A cidadania é uma arma importante para a emancipação da sociedade, sendo por ela que a população participa da vida politica da nação, na qual se cria o senso crítico, escolhendo a melhor forma de desenvolver o país, com seu direito de escolha.

Getúlio Costa Melo (2013) exauriu a profundida da palavra:

Cidadania implica em vivência na sociedade, na construção de relações, na mudança de mentalidade, na consciência e reivindicação dos direitos, mas também no cumprimento dos deveres. Isto não se aprende com teorias, mas na luta diária, nos exemplos e principalmente com a educação de qualidade, grande propulsora para que o indivíduo possa desenvolver suas potencialidades e conscientizar-se de seu papel social que pode e deve fazer a diferença na construção de uma sociedade mais justa, livre e solidária. (MELO, 2013, p. 3).

A cidadania se reflete com a tributação quando o cidadão é aquele que cumpre com seus deveres e exige seus direitos. Nesse contexto a cidadania cria um senso critico de modo fiscalizatório para assim saber de que modo se arrecada e para onde é direcionada tal verba.

Assim explica Cardoso (2010): “O que está se afirmando, sim, é que a tributação deve funcionar como meio de se exigir participação do contribuinte sem, contudo, sufocá-lo em seu patrimônio, retirando- lhe viabilidade de se desenvolver”. Assim, a constituição exige que para impetrar o Mandado de Injunção exista a inviabilidade dos direitos, das liberdades, e prerrogativas, nessa última, esta prevista a cidadania.

Sendo certo que sem o IGF, se arrecada menos e de uma forma desigual, que indiretamente afeta na redistribuição dessa riqueza, consequentemente essa verba se direcionada para uma área prioritária, trará bons resultados.

Conforme Melo (idem), a educação é a grande propulsora para que se possa desenvolver uma potencialidade e conscientização de um papel social que se deve e pode fazer a diferença na construção de uma sociedade mais justa, livre e solidária, que nada mais é que o exercício da cidadania.

Entende-se que está sendo violado o exercício da cidadania, mesmo que de forma indireta. E desta forma se afasta qualquer entendimento de inépcia, fazendo surgir a tese da impetração do Mandado de Injunção para que a tão sonhada cidadania seja alcançada em total consonância com a nossa Carta Magna e demais preceitos legais, fazendo surgir o tão sonhado princípio da Isonomia.

O sentimento de injustiça diante deste quadro, e diante da passividade do Poder Legislativo para discutir e legislar sobre as prioridades brasileiras, surge uma postura beligerante do Poder Judiciário, o ativismo, buscando a efetividade do direito fundamental garantido pela Constituição. Nesta esteira caminha à discussão dos impostos sobre grandes fortunas, no qual tal omissão está privando os direitos fundamentais, a uma justiça tributária e social, e a busca da igualdade da arrecadação do tributo.

Conforme já se viu, nos princípios tributários estudados, as técnicas de controle das omissões passam a ter efetividade. Essa nova concepção, não busca incentivar uma invasão de poder, mas sim um judiciário que busca cumprir os direitos fundamentais, sendo o legislador positivo nesse caso concreto.

Existindo a inércia desarrazoada, desidiosa e negligente, conforme explica Lenza (2012), “dentro dos limites das técnicas de controle das omissões, busca-se a efetivação dos direitos fundamentais, seja pelo Mandado de Injunção (MI), seja pela ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO)”.

Nesse caso não se consegue usar a analogia para aplicar o Mandado de Injunção, pois não se busca a progressividade ou algum modelo existente, nem tão pouco existe algum caso semelhante que possa se valer, como ocorreu no Mandado de Injunção que discutia o direito de greve dos servidores públicos – MI-712/PA.

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Sobre os autores
Maico Pinheiro da Silva

Advogado, pós graduado em direito tributário pela Universidade de São Caetano do sul - USCS, mestre em políticas públicas pela Universidade de Mogi das Cruzes - UMC, professor das disciplinas de Direito Civil e Direito Tributário na Universidade de Mogi das Cruzes e das disciplinas de Legislação e MPC pela Fatec - Centro Paula Souza.

Leonardo Silva Oliveira

Bacharel em Direito pela Universidade de Mogi das Cruzes.

Irineu Martins Ruiz Junior

Advogado , Professor pela Universidade de Mogi das Cruzes.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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