Programa de Demissão Voluntária mais conhecido como "PDV" é algo que atualmente está na "crista da onda", é a "bola da vez".
Em recente sentença de primeiro grau, a Justiça do Trabalho do DF (10ª Região) decidiu que o aviso prévio, o indenizado, não projeta 30 dias no tempo do empregado para os efeitos da contagem do prazo prescricional, ou seja, assinado o PDV, a partir daquele dia inicia-se a contagem dos 2 anos da prescrição extintiva.
Não vou, logicamente, posicionar-me sobre a justiça ou a injustiça do r. decisum judicial. Não é esta a minha intenção.
Também é certo que numa simples análise como esta, seria por demais ousado pretender esgotar o debate sobre este tema, mas, tão-somente, provocar uma ampla discussão sobre as conseqüências do aviso prévio indenizado em PDVs. E eles estão aí de "vento em popa" e muitos são os casos de adesões a este tipo de programa e muitos são os obreiros que encerram seus contratos movidos pelos supostos "benefícios" que trazem tal programa.
Inicio a provocação do debate afirmando que este tipo de rompimento do liame traz pelo menos as indagações seguintes:
O aderente ao PDV:
– tem direito ao pagamento do aviso prévio indenizado?
– beneficia-se da projeção do aviso para os efeitos de acréscimo de 1/12 no seu tempo de serviço para os efeitos de 13º salário, férias+1/3, FGTS+40% e até para os efeitos do seguro-desemprego?
– beneficia-se da contagem da prescrição bienal do art. 11/CLT com início após os 30 dias da assinatura do PDV, ou esta contagem do prazo prescricional não leva em conta estes 30 dias da projeção do aviso?
Vamos transcrever a OJ/TST nº 82. Ela diz:
"A data de saída a ser anotada na CTPS deve corresponder à do término do prazo do aviso prévio".
Seguindo esta OJ 82/TST, o meu modesto entendimento me diz que o obreiro que venha a aderir ao PDV não perde o direito aos efeitos provocados pela projeção de 30 dias do aviso, inclusive anotação da CTPS com data de 30 dias após a assinatura do respectivo programa.
Não podemos deixar de afirmar que um rompimento de contrato laboral via PDV não é igual a um comum pedido de demissão, ou seja, um rompimento assim, merece uma análise mais abalizada.
Logicamente que não tenho respaldo para afirmar e todos concordarem com tal assertiva, portanto, vamos adentrar no direito. Ainda que tivesse tal atributo e até mesmo se tivesse o dom de escrever de modo persuasivo, ou seja, fosse eloqüente, tais características não poderiam constituir-se em fato norteador de concordância com o que debato neste momento. Em Direito a característica predominante é a do questionamento e é o que estou fazendo com esta provocação.
A proposta de tal programa, PDV, vem do empregador que, de alguma forma, busca conter despesas, busca amenizar os efeitos do risco da atividade.
Risco! Eis aí uma palavra que, quando se trata de relação de trabalho, tem "cheiro forte", é uma palavra chave, portanto! Todo e qualquer risco de uma relação empregatícia deve ser assumida pelo empreendedor, pois é ele que, em havendo grandes lucros, será o grande beneficiado. O mesmo não ocorrendo em relação ao empregado que continuará com o seu salário previamente ajustado. Sendo assim, até no PDV que, como se disse, é uma estratégia de melhorar o empreendimento, tal estratégia implica em que o empregador haverá de assumir todos os riscos, inclusive os que pertinem ao reconhecimento e pagamento de todos os benefícios daqueles empregados que venham a aderir ao programa.
A Súm. 276/TST é bastante inteligente, pois, como que antepondo-se a estes programas, desde de mar/1988, diz:
O direito ao aviso prévio é irrenunciável pelo empregado. O pedido de dispensa do cumprimento não exime o empregador de pagar o respectivo valor, salvo comprovação de haver o prestador dos serviços obtido novo emprego.
E, dando suporte a esta inteligência, a CLT, em seu art. 468, diz:
Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições, por mútuo consentimento, e, ainda assim, desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.
Este art. 468/CLT nos dá elementos que também não autorizam a retirada, a perca, a eliminação dos efeitos da projeção do aviso àquele empregado que tenha aderido ao PDV, pois o prejuízo do obreiro se escancararia.
Isto porque a adesão ao PDV se constitui em alteração das condições contratuais (o fim do contrato é uma alteração; é colocar um ponto final no contrato).
Só que esta alteração, especificamente nesta, é sempre motivada por interesses do empregador e, portanto, da mesma não poderá resultar, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado.
Assim, o contrato de adesão ao "PDV" não pode trazer no seu bojo, nem implicitamente, algo "tendente", ou com "cheiro" de agredir direitos individuais dos trabalhadores, direito este contemplado no Cap. I, do Título II, DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS da CF.
Ora, se nem mesmo uma norma legal e nem mesmo uma norma de emenda à Constituição podem ferir direitos e garantias individuais (CF, art. 60, § 4º, IV), e esta proibição constitui-se em cláusula petrea, muito menos uma norma particular (uma norma entre as partes!) poderia vir a ferir, a agredir um direito individual que está, como se disse agasalhado no Cap. I, DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS, do Tít. II da CF.
CF, art. 60, § 4º – Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
Inc. IV – os direitos e garantias individuais.
O PDV, insisto, não é equivalente a pedido de demissão. O PDV é uma estratégia do empregador. É um "gol de placa" do empregador, através do qual, ele busca amenizar e, por conseguinte, melhorar todo o seu acervo (conjunto de bens que constituem um patrimônio), piorar é que não seria! Então, esta medida tem relação com o risco da atividade, risco este que só pode ser suportado pelo empregador.
Incabível admitirmos que o empregador "bola" esta estratégia com o intuito de dar dinâmica, fôlego, vida, às suas atividades e, ainda contar com uma ajuda do empregado que perderá direitos irrenunciáveis, ou seja, um empregado nestas condições estará assumindo riscos. Pois uma coisa é certa: o fato de ter que perder um direito e uma garantia individual (o aviso – e seus efeitos) como o que está previsto na CF/88, Título II, art. 7º, XXI, em proveito do empreendimento de seu empregador, será assumir riscos, pelos quais nenhum benefício ele terá.
O aviso prévio, portanto, só não será objeto de projeção no tempo para todos os efeitos se a hipótese for daquele "ordinário pedido de demissão" e, claro, se não houver o seu cumprimento pelo empregado.
Portanto, ao assinar este programa, por questão de lei (questão de direito) e não como direito do empregador, o aviso torna-se irrenunciável e o empregado fará jus a todos os efeitos decorrentes da projeção destes 30 dias.
Por conseguinte, entendo ser perfeitamente aplicável a OJ/TST 82 ao caso em debate, ou seja, o empregador:
- pagará o aviso de 30 dias na forma indenizada, o qual, por força do entendimento contido na Súm. 305/TST, repercutirá no FGTS;
- assegurará ao obreiro a baixa na CTPS, com data de 30 dias após a adesão ao PDV;
- pagará 1/12 a mais sobre 13º salário e férias+1/3;
- terá que observar que a prescrição extintiva, a bienal do art. 11/CLT, só terá seu curso iniciado a partir do primeiro dia após os 30 dias desta projeção. Assim, vindo a ser assinado por algum empregado o PDV, por exemplo, no dia 10.04.2003, a cobrança de eventuais direitos que entenda devidos poderá ser feita até o dia 09.05.2005. Isto porque o último dia do contrato, por força da projeção do aviso, efetivamente se deu em 09.05.2003 e, em até 2 anos desta data, uma ação trabalhista poderá ser proposta.
Também é certo que estes 30 dias repercutirão para efeitos de seguro-desemprego, se for o caso.
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Uma pequena observação:
Nesta análise, não enfrentei qualquer tema referente à justiça ou injustiça do rompimento do liame ou à possibilidade de se anular a adesão ao programa com posterior retorno do empregado ao serviço. Abordei, tão-somente, o tema dos reflexos do aviso neste tipo de rompimento do liame.