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Da constitucionalidade da tributação operada por via de contribuições

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3) DOS PRINCIPIOS CONSTITUICIONAIS TRIBUTÁRIOS RELEVANTES PARA AS CONTRIBUIÇÕES

Como todos os tributos, as contribuições estão sujeitas aos princípios constitucionais do Direito Tributário

O artigo 149 da Constituição Federal determinou que as contribuições devem observar os princípios previstos no artigo 150 da Constituição Federal de 1988, em especial o princípio da legalidade, o princípio da anualidade e mais recentemente o princípio da anterioridade nonagesimal, previstos na constituição da seguinte forma :

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;

......

III - cobrar tributos:

a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;

b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;

c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)

PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

O inciso I do artigo 150, positiva um principio, cujo germe remonta a própria organização do Estado Moderno, o princípio legalidade, o qual determina que um tributo somente poderá ser exigido ou aumentado mediante lei.

Infelizmente vai longe o tempo em que o princípio da legalidade bastava para garantir uma relação jurídico-tributária adequada.

Sobre o assunto alerta Hugo Brito Machado [8]:

"São tantos os exemplos que podem ser citados, de abusos do poder estatal praticados pela via legislativa que ninguém mais duvida quanto à insuficiência do principio da legalidade como garantia do contribuinte. O legislador no mais das vezes submete-se às pressões do governo, que dispõe numerosos instrumentos exercer para influenciar sobre o parlamento."

De fato, muitas das inovações na legislação tributária, que foram posteriormente julgadas inconstitucionais pelo judiciário, foram efetuadas seguindo formalmente o princípio da legalidade.

Contribui para este quadro, a possibilidade do Poder Executivo legislar através de Medidas Provisórias sobre assuntos tributários, o que distorce sobremaneira o instituto, que somente pode ser utilizado para tratar assuntos relevantes e com urgência inquestionável.

Ora, a sucessão de Medidas Provisórias em matéria tributária ferem o principio da segurança jurídica, pois os agentes sociais nunca terão certeza sob qual legislação estarão submetidos aos estabelecer seus negócios jurídicos.

Lamentavelmente este assunto foi analisado por nossos Tribunais Superiores, que decidiram pela correção deste procedimento a luz da Constituição de 1988.

As contribuições não passaram ilesas por este processo, a recente Medida Provisória n° 164/2004, convertida pelo congresso na Lei n° 10.865/2004, instituiu a cobrança do PIS/PASEP e da COFINS sobre a importação de bens e serviços, com base em uma modificação trazida ao texto da Constituição Federal de 1988, efetuada pela Emenda Constitucional n° 42/2003.

Sob esta aparente legalidade, foram aprovadas diversos dispositivos que oneram sobremaneira as operações de importação, fazendo com que estas duas contribuições integrassem sua própria base de calculo, bem como, fossem carreadas nesta mesma base de calculo, outros impostos incidentes sobre a importação, o que na verdade demonstra a preocupação única em aumentar a arrecadação do federal, em detrimento do contribuinte.

E mais. No bojo da Lei 10.865/2004, foram aprovados, pelo legislativo é bom que se ressalte, diversos dispositivos, cuja única finalidade foi restringir o exercício da não cumulatividade pelo direito de creditamento, destas contribuições, aprovada pelas Lei 10.637/2002 e 10.833/2003.

Vale ainda ressaltar que, sob o pretexto de manter a carga tributária sobre a sociedade, o Poder Executivo, utilizando de mecanismos de pressão, conseguiu a aprovação, pelo Poder Legislativo, juntamente com a sistemática da não cumulatividade, um brutal aumento nas alíquotas de tais contribuições, praticamente triplicando-as.

PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE TRIBUTÁRIA

Outro princípio expresso na constituição que devemos observar quando estudamos as contribuições é aquele, segundo o qual o tributos não pode ser exigido em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que o instituiu ou aumentou.

O princípio da irretroatividade tributária decorre da necessidade de segurança jurídica entre os cidadãos, que não podem ver atingidos fatos pretéritos por lei tributária nova.

Fato interessante sobre a irretroatividade da lei tributária se revela quando ela (Lei) for declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal.

Neste caso poderá ser aplicada a Lei 11898 de 11.11.1999, a qual em seu artigo 27 dispõe :

Art. 27 – Ao declarar a incostitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração de ou decidir que ele só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado

Note-se que pela mesma segurança jurídica, que é informadora da irretroatividade da lei tributária, inspira a previsão legal para que a declaração de inconstitucionalidade possa ter seus efeitos modificados.

De fato, o próprio Supremo Tribunal Federal [9] firmou posição de que a declaração de incostitucionalidade de uma lei alcança, inclusive fatos pretéritos, de modo que a decisão proferida consiste em remover do ordenamento jurídico esta emanação estatal,

Na verdade, o que se buscou foi flexibilizar conceitos jurídicos para minimizar os efeitos de decisões desfavoráveis para o fisco, em detrimento do contribuinte.

Sempre que se está diante de um julgamento que questiona constitucionalidade de uma lei tributária, ouvem-se as vozes daqueles que profetizam a quebra dos cofres públicos se prosperar o pleito para a declaração de inconstitucionalidade na norma.

Vale observar ainda a irretroatividade nonagesimal, que foi incorporada à Constituição Federal pela Emenda Constitucional 42 de 19/12/2003, a qual determina que os tributos somente poderão ser cobrados a partir de noventa dias da data da vigência da lei que o aumentou ou instituiu.

Para as contribuições, no entanto, esta regra sempre foi aplicada por força do parágrafo 6º do artigo 195 da própria Constituição de 1988, que comentaremos a seguir.

PRINCÍPIO DA ANUALIDADE

O princípio da anualidade esta previsto na alínea "b" do inciso III do artigo 150 da Constituição Federal determina que é vedado a cobrança de tributos no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou.

Para no nosso estudo devemos nos ater também ao artigo 149 da CF/88 determina que seja observado o parágrafo 6° do artigo 195 que determina que

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

.............................

§ 6º - As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, "b".

Embora seja considerado de menor importância para a doutrina em geral, o princípio da anualidade, mesmo que não aplicável às contribuições sociais, constitui-se balizador de nossa analise, pois como vimos as contribuições têm participado mais no montante da arrecadação federal, e um dos motivos é fato de não estarem submetidas ao princípio da anualidade.

Não podemos, porém perder nosso pé na realidade concreta, pois o princípio da anualidade tem provocado verdadeiras reviravoltas tributárias ao findar-se o exercício financeiro.

Tem se tornado comum, grandes modificações implementadas nos impostos sobre a renda, ainda submetidos à anualidade, exatamente na última semana de cada ano, em função do interesse dos governos em implementar novas políticas tributárias.

DA REPARTIÇÃO DAS RECEITAS TRIBUTÁRIAS

Em que pese não se tratar de um princípio constitucional, a repartição das receitas tributárias, interessa para nosso estudo em função das contribuições serem tributos de competência exclusiva da União, portanto não submetidos à repartição das Receitas Tributárias.

De fato, no Seção VI, do Capítulo I do Título VI da Constituição Federal de 1988, não existe qualquer menção quanto a repartição das receitas oriundas das contribuições.

Este pode ser um dos motivos pelo qual, os governos têm sistematicamente aumentado a participação das contribuições no volume total da arrecadação federal, pois não havendo repartição com os demais membros da federação ocorre de fato um incremento do volume financeiro a disposição do governo central.

Vimos contudo, que as contribuições possuem como característica diferenciadora dos demais tributos a finalidade, que deve ser expressa.

Sobre esta aspecto Hugo Brito Machado [10] ao analisar a Contribuição de Iluminação Publica – CIP, assim se manifesta :

Realmente admitir a possibilidade de contribuições com a finalidade indicadas na constituição, mesmo que para o custeio dos serviços estatais de interesse geral, para cujo custeio se destinam os impostos é caminhar para a supressão do orçamento público como instrumento de divisão e harmonia dos poderes do Estado.

Quando a Constituição veda a vinculação das receitas de impostos a órgão ou despesa, ela o faz em atenção à separação dos poderes dos Estado tendo em vista que ao Poder Executivo cabe formular a proposta de orçamento anual para as receitas e despesas públicas. Se feita a vinculação na própria Constituição, estaria decretada a supremacia do Poder Legislativo, titular do poder de reforma da Constituição, e retirada do Poder Executivo a possibilidade de elaborar o seu plano de governo, que a final é consubstanciado no orçamento."

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Com o devido respeito que o grande tributarista merece, nos permitimos divergir da opinião por expressada, pois como vimos anteriormente, o Poder Executivo, na pratica tem influenciado sobremaneira o comportamento do Poder Legislativo no Brasil, muitas vezes utilizando "expedientes" para ver aprovadas iniciativas de sua autoria, ou patrocinada por aliados políticos, fazendo com que, através de Emendas Constitucionais e Medidas Provisórias sejam modificadas as bases constitucionais e infra-constitucionais do Sistema Tributário Nacional.

Assim nos parece que não é o Poder Executivo que têm perdido espaço em detrimento do Poder Legislativo. Não nos parece inteiramente desarrazoada a idéia de que, não só o Poder Executivo tem fomentado esta situação, como utiliza de todos os meios a sua disposição para ver aprovadas medidas que a perpetuem.


4) DA CONSTITUICIONALIDADE DAS CONTRIBUIÇÕES NO STF

Compete ao Superior Tribunal Federal o controle a constitucionalidade dos atos normativos.

Tendo em vista o crescente volume de normas versando sobre as contribuições, muitas deles têm sua constitucionalidade questionada no judiciário,

De modo geral, o STF tem admitido constitucionalidade das contribuições, cujas comandos normativos não contrariem o artigo 149 da constituição.

Existem, contudo julgados que declaram inconstitucionais determinadas contribuições..

Um exemplo a ser citado é a decisão proferida no Recurso Extraordinário n° 148.754-2/210/RJ, que suspendeu a eficácia dos Decretos-Leis n° 2.445/88 e 2.449/88.

Reproduzimos a seguir alguns comentários de Aldemario Araujo de Castro [11] em relação a jurisprudência do STF :

O Superior Tribunal Federal ao julgar o RE 214.206, registrou a necessidade de lei complementar para a instituição de contribuição de intervenção no domínio econômico. Entretanto, ao julgar o RE 138.284, o mesmo STF reconheceu que a instituição de contribuição de intervenção no domínio econômico não reclama lei complementar. Observe-se a instituição de contribuição de intervenção no domínio econômico (destinada a financiar o Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa para o Apoio à Inovação) por intermédio da Lei n. 10.168, de 2000. Por outro lado, a instituição, pela Lei n. 10.336, de 2001, da contribuição de intervenção no domínio econômico incidente sobre a importação e a comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados, e álcool etílico combustível foi precedida de alteração constitucional (Emenda n. 33, de 2001) onde se exigiu tão-somente lei para a criação do tributo. Recentemente, ao julgar o RE 396.266, o STF parece ter resolvido a eventual dúvida afastando a necessidade de lei complementar para a instituição da contribuição em favor do SEBRAE (contribuição social de intervenção no domínio econômico, segundo o STF).

No julgamento do RE 396.266, o STF considerou que "a contribuição instituída em favor do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas - SEBRAE possui natureza de contribuição social de intervenção no domínio econômico - não exigindo, portanto, a vinculação direta do contribuinte ou a possibilidade de que ele se beneficie com a aplicação dos recursos por ela arrecadados, mas sim a observância dos princípios gerais da atividade econômica (CF, arts. 170 a 181)".

O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADInMC 2.556, reconheceu a natureza jurídica de contribuição social geral para as exações instituídas pela Lei Complementar n. 110, de 2001.

Ao julgar a ADC 3, o Supremo Tribunal Federal concluiu pela natureza de contribuição social do salário-educação e pela desnecessidade de seu tratamento por intermédio de lei complementar.

Observa-se que não são poucos os julgados de nossa corte suprema que tratam da constitucionalidade total ou parcial das contribuições, porem em sua esmagadora maioria questionam pontualmente dispositivos de contribuições, como vemos a seguir:

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. PIS-PASEP. PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE NONAGESIMAL: MEDIDA PROVISÓRIA: REEDIÇÃO. I. - Princípio da anterioridade nonagesimal: C.F., art. 195, § 6º: contagem do prazo de noventa dias, medida provisória convertida em lei: conta-se o prazo de noventa dias a partir da veiculação da primeira medida provisória. II. - Inconstitucionalidade da disposição inscrita no art. 15 da Med. Prov. 1.212, de 28.11.95 " aplicando-se aos fatos geradores ocorridos a partir de lº de outubro de l995" e de igual disposição inscrita nas medidas provisórias reeditadas e na Lei 9.715, de 25.11.98, artigo 18. III. - Não perde eficácia a medida provisória, com força de lei, não apreciada pelo Congresso Nacional, mas reeditada, por meio de nova medida provisória, dentro de seu prazo de validade de trinta dias. IV. - Precedentes do S.T.F.: ADIn 1.617-MS, Ministro Octavio Gallotti, "DJ" de 15.8.97; ADIn 1.610-DF, Ministro Sydney Sanches; RE nº 221.856-PE, Ministro Carlos Velloso, 2ª T., 25.5.98. V. - R.E. conhecido e provido, em parte." RE 232.896. Relator Ministro Carlos Velloso. Pleno. DJ de 01.10.1999.

"Contribuição de melhoria. Recapeamento de via pública já asfaltada, sem configurar a valorização do imóvel, que continua a ser requisito ínsito para a instituição do tributo, mesmo sob a égide da redação dada, pela Emenda n. 23, ao art. 18, II, da Constituição de l967." RE 116.148. STF. 1a. Turma. Unânime. Relator Ministro Octávio Gallotti. Julgado em 16.02.93.

"... a Constituição vinculou o legislador a essencialidade da restituição na mesma espécie, seja por força do princípio explícito do art. 110 do Código Tributário Nacional, seja porque a identidade do objeto das prestações recíprocas e indissociável da significação jurídica e vulgar do vocábulo empregado." RE 121.336. STF. Pleno.Unânime. Relator Ministro Sepúlveda Pertence. Julgado em 11.10.90.

"O empréstimo compulsório alusivo a aquisição de combustíveis - Decreto-Lei n. 2.288/86 mostra-se inconstitucional tendo em conta a forma de devolução - quotas do Fundo Nacional de Desenvolvimento - ao invés de operar-se na mesma espécie em que recolhido". RE 175.385. STF. Pleno. Unânime. Relator Ministro Marco Aurélio. Julgado em 01.12.94.

"O Tribunal, por maioria, reconhecendo a constitucionalidade da referida contribuição social (art. 1º, I, da LC 84/96), entendeu que a CF/88 não proíbe a coincidência da base de cálculo da contribuição com a base de cálculo de imposto já existente. Considerou-se que a remissão contida na parte final do art. 195, § 4º da CF restringe-se à necessidade de lei complementar para a criação de novas contribuições." Informativo STF 125. RE 228.321.

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Sobre o autor
Aloisio José Alves de Oliveira

Advogado ,especializando em Direito Empresarial na Universidade Mackenzie – SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Aloisio José Alves. Da constitucionalidade da tributação operada por via de contribuições. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 463, 13 out. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5807. Acesso em: 25 abr. 2024.

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