Delação premiada como método de combate à criminalidade econômica

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7  DELAÇÃO PREMIADA ADMINISTRATIVA

Instituída pela Lei nº 12.846/2013 (Lei anticorrupção), inovou o direito brasileiro ao permitir a responsabilização das pessoas jurídicas. Ainda não é um tema pacificado pela jurisprudência e as suas penas não são bem detalhadas na legislação, porém há de se comemorar a grande evolução em tê-la como ato criminoso, passível de punição. (GRILLO, 2017)[43]

O professor Alexandre Kawakami, do Instituto de Direito Público de São Paulo (IDP), diz a respeito da Lei anticorrupção administrativa: “Introduziu a pena de morte da pessoa jurídica”. (GRILLO, 2017)[44]

Neste sentido, há de se afirmar que antes da presente lei, acreditava-se que a responsabilização pela corrupção no setor privado só alcançava as pessoas físicas, deixando de ser puníveis as jurídicas, mas que com a atual legislação essa “morte administrativa” encontra-se possível. (GRILLO, 2017)[45]

7.1 Programa de Leniência- CADE

Prevista em diversas legislações do mundo, como nos Estados Unidos (Leniency Program,), em Portugal (programa de clemência), na Itália (programma di clemenza ) e na Comunidade Européia (conditional immunity ), dentre outros, é um mecanismo utilizado para combater cartéis, poupando esforços e recursos públicos. (BAGNOLI, 2013)[46]

   O programa de Leniência – CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) foi instituído no Brasil desde o ano 2000, firmando seu primeiro acordo de Leniência em 8 de outubro de 2003. Após essa data, diversos casos de Cartéis foram descobertos no país, tornando possível a penalidade ao crime. (BAGNOLI, 2013)[47]

Em vigor atualmente pela Lei nº 12.529/2011 (Lei de defesa da concorrência), celebra acordos entre pessoas físicas e jurídicas, ajudando no combate aos crimes contra a ordem econômica do país. Como benefícios, proporcionam a redução da pena de um a dois terços da pena, mas para que isso seja concretizado é necessária a colaboração efetiva com as investigações e o processo administrativo e que dessa colaboração resulte a identificação dos demais envolvidos. (BAGNOLI, 2013) [48]

O acordo de leniência é sigiloso, exceto quando surgir o interesse das investigações e do processo administrativo. Esse meio sigiloso preserva tanto o leniente quanto as informações oferecidas por ele, resguardando a integridade das investigações. (BAGNOLI, 2013)[49]

7.2 Acordo de Leniência no acordo de corrupção

Leniência significa lenidade, brandura, suavidade. É a confissão do acusado juntamente com a colaboração dos órgãos investigatórios para identificação dos demais participantes do ato ilícito e elucidação dos fatos. (SALES; BANNWART, 2013)[50]

O acordo de leniência se iniciou na década de 70, nos Estados Unidos, cujo nome era Leniency Program, com o intuito de buscar a repreensão de atos ilícitos anticoncorrenciais, sobretudo os cartéis, dado que estes eram de difícil apuração. Contudo, devido à discricionariedade do acordo, não ganhou grande notoriedade na época, sofrendo reforma em 1993, ao qual passou a ser chamado de Amnesty Program. A partir desse momento, o mecanismo reformulado passou a vigorar no país com grandes repercussões e resultados positivos. (SALES; BANNWART, 2013)[51]

No Brasil, o instituto surgiu no ano de 2000 por intermédio da Medida Provisória nº 2.055-4 e, posteriormente, convertida na lei nº 10.149 de 2000. (SALES; BANNWART, 2013)[52]

Atualmente tem previsão do Acordo de Leniência no combate à corrupção no artigo 16 da Lei nº 12.846 de 2013:[53]

“A autoridade máxima de cada órgão ou entidade pública poderá celebrar acordo de leniência com as pessoas jurídicas responsáveis pela prática dos atos previstos nesta Lei que colaborem efetivamente com as investigações e o processo administrativo, sendo que dessa colaboração resulte.”

A competência para a celebração dos acordos de leniência é da entidade pública máxima de cada órgão, porém quanto à Administração Pública Federal, a supracitada lei em seu artigo 16, § 10, trouxe de forma expressa: “A Controladoria-Geral da União - CGU é o órgão competente para celebrar os acordos de leniência no âmbito do Poder Executivo federal, bem como no caso de atos lesivos praticados contra a administração pública estrangeira.” (SALES, BANNWART, 2013) [54]

Sendo assim, nos atos de corrupção contra a Administração Pública Federal ou Estrangeira a competência será da Controladoria Geral da União.(SALES; BANNWART, 2013)[55]

Para que o acordo de Leniência seja celebrado, são necessários alguns requisitos, sendo todos aceitos de maneira cumulativa: (SALES, BANNWART, 2013)[56]

1) - A pessoa jurídica seja a primeira a se manifestar sobre seu interesse em cooperar para a apuração do ato ilícito;

2) - A pessoa jurídica cesse completamente seu envolvimento na infração investigada a partir da data de propositura do acordo;

3) - A pessoa jurídica admita sua participação no ilícito e coopere plena e permanentemente com as investigações e o processo administrativo,comparecendo, sob suas expensas, sempre que solicitada, a todos os atos processuais, até seu encerramento.

Para tanto, existem alguns benefícios aos quais são oferecidos a quem colaborar com a justiça, como a redução de um a dois terços da pena, bem como a isenção da pessoa jurídica, a publicação extraordinária da decisão condenatória e, por fim, quanto ao âmbito judicial, mas cível, isenção de proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações e empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo Poder Público. Vale lembrar que as demais punições serão mantidas, como a perda de bens, suspensão ou interdição das atividades e até mesmo dissolução compulsória da pessoa jurídica poderão ser aplicadas normalmente, mesmo na existência de um Acordo de Leniência. ( SALES;BANNWART.2013)[57]

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Os benefícios do Acordo de Leniência podem ser estendidos ao Grupo econômico de que faz parte a empresa que o firmou. (SALES; BANNWART,2013)[58]


8. OS BENEFÍCIOS CONCEDIDOS EM FACE DA DELAÇÃO PREMIADA

Por ser um método de negociação com o Estado, requer dentre outras exigências, alguns benefícios ao réu para que o acordo seja celebrado. (SILVA, 2012)[59]

A lei nº 12.850/2013 elenca alguns requisitos de forma objetiva (relacionados ao fato) e subjetiva (relacionados ao agente colaborador) para que se possa homologar um acordo de delação premiada. O artigo 4º desta lei relata: (DÂMASO, 2016)[60]

Art. 4o  O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados:

I - a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas;

II - a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;

III - a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa;

IV - a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa;

V - a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.

Como exposto no artigo acima, o réu para receber as benesses que a delação premiada oferece deve preencher os requisitos que a lei exige. (SILVA, 2012)[61]

O primeiro benefício ao qual está elencado em todas as leis em que proporciona a delação premiada é a redução da pena. Essa concessão deve observar em linhas gerais o comportamento do agente, a voluntariedade, sem nenhum tipo de coação. No tocante, há de ressaltar que cada lei tem seus requisitos próprios e que estes são somente os elencados para todos, de um modo geral. (SILVA, 2012) [62]

Outra benesse concedida ao delator é a mudança de regime, progredindo para uma punição mais branda em regime semi-aberto, dependendo das informações prestadas. (SILVA, 2012)[63]

O perdão judicial não é previsto em todas as leis, mas somente nas leis de Proteção as vítimas e testemunhas e Lavagem de dinheiro. Portanto só é aceito nesses casos, se preenchidos os requisitos. Dessa forma, havendo o perdão judicial, não mais haverá punibilidade ao crime praticado pelo delator. (SILVA, 2012)[64]


9  A RENÚNCIA DO DIREITO DE RECURSO DA DELAÇÃO PREMIADA

A Delação premiada é encontrada em várias leis brasileiras, com características em comum em todas elas, como os crimes de coautoria ou participação, redução da pena dependendo do acordo entre o delator e o Estado, chegando, em alguns casos, até ao perdão judicial, como nos crimes de lavagem de dinheiro.

Dentre as várias benesses concedidas ao delator, em nenhuma é imposta a renúncia a qualquer tipo de recurso para que o acordo seja firmado. A exigência é ilegal e não merece apreciação em qualquer das hipóteses previstas de delação.

Há somente uma possibilidade de renúncia, à qual se refere o artigo 4, §14, da lei nº 12.850/2013, que relata[65]:“Nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade.”

Como exposto, somente ao silêncio é que estará o réu, sujeito a renunciar, tendo o compromisso de dizer somente a verdade dos fatos.

O Pacto de San José da Costa Rica de 1969, ratificado pelo Brasil por meio do decreto nº 678/92, em seu artigo 8, alínea h, expõe de maneira óbvia o discutido em questão, POR JEFERSON BOTELHO: Artigo 8º- Garantias judiciais: h) direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior.

A renúncia como requisito para a homologação de uma delação premiada é totalmente inconstitucional e passível de nulidade ao caso concreto, em face de ferir também os direitos humanos, tornando-se também irrenunciável ao direito internacional.

Sendo assim, o delator que não se contentar com a redução imposta pelo juiz, poderá solicitar uma redução maior ou até mesmo a concessão de um perdão judicial se for o caso.

     “A Constituição Federal de 1988 assegura o aludido, em seu artigo 5º, LV:” Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela

inerentes. ”[66]

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Sobre os autores
Jeferson Botelho Pereira

Jeferson Botelho Pereira. Ex-Secretário Adjunto de Justiça e Segurança Pública de MG, de 03/02/2021 a 23/11/2022. É Delegado Geral de Polícia Civil em Minas Gerais, aposentado. Ex-Superintendente de Investigações e Polícia Judiciária de Minas Gerais, no período de 19 de setembro de 2011 a 10 de fevereiro de 2015. Ex-Chefe do 2º Departamento de Polícia Civil de Minas Gerais, Ex-Delegado Regional de Governador Valadares, Ex-Delegado da Divisão de Tóxicos e Entorpecentes e Repressão a Homicídios em Teófilo Otoni/MG, Graduado em Direito pela Fundação Educacional Nordeste Mineiro - FENORD - Teófilo Otoni/MG, em 1991995. Professor de Direito Penal, Processo Penal, Teoria Geral do Processo, Instituições de Direito Público e Privado, Legislação Especial, Direito Penal Avançado, Professor da Academia de Polícia Civil de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-Graduação de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Estácio de Sá, Pós-Graduado em Direito Penal e Processo Penal pela FADIVALE em Governador Valadares/MG, Prof. do Curso de Pós-Graduação em Ciências Criminais e Segurança Pública, Faculdades Unificadas Doctum, Campus Teófilo Otoni, Professor do curso de Pós-Graduação da FADIVALE/MG, Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-Teófilo Otoni. Especialização em Combate à corrupção, crime organizado e Antiterrorismo pela Vniversidad DSalamanca, Espanha, 40ª curso de Especialização em Direito. Mestrando em Ciências das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Participação no 1º Estado Social, neoliberalismo e desenvolvimento social e econômico, Vniversidad DSalamanca, 19/01/2017, Espanha, 2017. Participação no 2º Taller Desenvolvimento social numa sociedade de Risco e as novas Ameaças aos Direitos Fundamentais, 24/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Participação no 3º Taller A solução de conflitos no âmbito do Direito Privado, 26/01/2017, Vniversidad DSalamanca, Espanha, 2017. Jornada Internacional Comjib-VSAL EL espaço jurídico ibero-americano: Oportunidades e Desafios Compartidos. Participação no Seminário A relação entre União Europeia e América Latina, em 23 de janeiro de 2017. Apresentação em Taller Avanco Social numa Sociedade de Risco e a proteção dos direitos fundamentais, celebrado em 24 de janeiro de 2017. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino, Buenos Aires – Argentina, autor do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas: Atividade sindical complexa e ameaça transnacional, Editora JHMIZUNO, Participação no Livro: Lei nº 12.403/2011 na Prática - Alterações da Novel legislação e os Delegados de Polícia, Participação no Livro Comentários ao Projeto do Novo Código Penal PLS nº 236/2012, Editora Impetus, Participação no Livro Atividade Policial, 6ª Edição, Autor Rogério Greco, Coautor do Livro Manual de Processo Penal, 2015, 1ª Edição Editora D´Plácido, Autor do Livro Elementos do Direito Penal, 1ª edição, Editora D´Plácido, Belo Horizonte, 2016. Coautor do Livro RELEITURA DE CASOS CÉLEBRES. Julgamento complexo no Brasil. Editora Conhecimento - Belo Horizonte. Ano 2020. Autor do Livro VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. 2022. Editora Mizuno, São Paulo. articulista em Revistas Jurídicas, Professor em Cursos preparatórios para Concurso Público, palestrante em Seminários e Congressos. É advogado criminalista em Minas Gerais. OAB/MG. Condecorações: Medalha da Inconfidência Mineira em Ouro Preto em 2013, Conferida pelo Governo do Estado, Medalha de Mérito Legislativo da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, 2013, Medalha Santos Drumont, Conferida pelo Governo do Estado de Minas Gerais, em 2013, Medalha Circuito das Águas, em 2014, Conferida Conselho da Medalha de São Lourenço/MG. Medalha Garimpeiro do ano de 2013, em Teófilo Otoni, Medalha Sesquicentenária em Teófilo Otoni. Medalha Imperador Dom Pedro II, do Corpo de Bombeiros, 29/08/2014, Medalha Gilberto Porto, Grau Ouro, pela Academia de Polícia Civil em Belo Horizonte - 2015, Medalha do Mérito Estudantil da UETO - União Estudantil de Teófilo Otoni, junho/2016, Título de Cidadão Honorário de Governador Valadares/MG, em 2012, Contagem/MG em 2013 e Belo Horizonte/MG, em 2013.

Juliana Nogueira Rodrigues

Bacharela em Direito pela Universidade Presidente Antônio Carlos, campus Teófilo Otoni-MG; Estagiária do Escritório Marcos Ganem E Advogados Associados

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Tema de extrema relevância social e jurídica. O instituto da delação premiada transformou a sociedade brasileira, em especial com a nova roupagem de colaboração premiada que vem detalhado no artigo 4º da Lei nº 12.850/2013, o que possibilitou a sua aplicação na fase de investigativa.

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