A natureza condicional do adicional de insalubridade

30/06/2017 às 10:12
Leia nesta página:

O adicional de insalubridade, como verba de natureza condicional, sujeita-se à realidade fática que lhe serve de fundamento, de modo que supervenientes alterações na relação de trabalho podem refletir em sua aplicação.

O adicional de insalubridade encontra seu fundamento de validade no art. 7º, XXIII, da CRFB/88, que preceitua que a verba é devida, na forma da lei, pelo exercício de atividade insalubre.

O preceito legal que materializa esta previsão constitucional é o texto positivado nos arts 189 a 197 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que considera como atividade insalubre aquela que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponha os empregados a agentes nocivos à saúde acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos.

Como pode ser observado, a dicção do texto normativo acima mencionado dispõe que o adicional de insalubridade é devido em razão da submissão do empregado a uma situação especial na qual as condições de trabalho revelam-se prejudiciais à sua saúde, sendo, inclusive, denominado por parcela da doutrina trabalhista pelo termo “salário-condição”.

Sendo uma verba de natureza condicional, ou seja, devida em razão de um evento específico, tem-se por certo que a supressão de tal situação especial, geradora do dever de pagamento do adicional, provoca, consequentemente, a idêntica supressão da parcela salarial anteriormente devida.

Nestes termos, dispõe a CLT, em seu art. 194, que o direito do empregado ao adicional de insalubridade cessará com a eliminação do risco à sua saúde ou integridade física.

No mesmo sentido, a professora Vólia Bomfim Cassar (2009, p. 659), ao lecionar sobre verbas salariais, expõe em sua obra: “São devidos apenas enquanto perdurar a situação. Cessada a causa da nocividade, cessa a obrigação legal do empregador em pagar o respectivo adicional”.

Nestes termos:

RECURSO DE REVISTA.  ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. REMANEJAMENTO DO EMPREGADO PARA OUTRO SETOR. DIREITO QUE CESSA COM A ELIMINAÇÃO DO RISCO. Nos termos do artigo 194 da CLT, cessadas as condições especiais de trabalho, o pagamento do adicional de periculosidade não será mais devido. In casu, o remanejamento de setor não representa alteração contratual ilícita e encontra fundamento no jus variandi do empregador. Por esse entendimento, uma vez cessada a exposição ao risco, cessa o respectivo pagamento e, assim, a sua integração na remuneração. Recurso de revista não conhecido.

TST - RR - 175900-23.2001.5.22.0002, Data de Julgamento: 04/06/2008, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, Data de Publicação: DJ 06/06/2008.

 

Como visto, não mais existindo o fator de risco, os adicionais de periculosidade e insalubridade deixam de ser devidos.

Cabe observar, todavia, que, em determinados casos, o adicional de insalubridade é concedido por força de uma decisão judicial e, por esta razão, poder-se-ia indagar se a força cogente do comando judicial pode ser relativizada a fim de se excluir o direito do obreiro de percepção do adicional de insalubridade.

De fato, este questionamento não subsiste perante a análise dos institutos jurídicos que fundamentam este tema.

Uma decisão judicial, após o seu trânsito em julgado, é dotada imutabilidade, ou seja, não é passível de alteração em seu conteúdo.

Por esta razão, uma decisão judicial acobertada pelo manto da coisa julgada não é passível de revisão de seus termos, e, deste modo, seus efeitos são também imutáveis.

Entretanto, a relação jurídica trabalhista é caracterizada pelo trato sucessivo, cujos efeitos se prolongam no tempo, de modo que os direitos e deveres do empregado e do empregador não se exaurem em obrigações instantâneas.

Deste modo, a força definitiva e imutável da sentença deve ser observada de forma peculiar no que tange ao seu cumprimento na relação laboral (também peculiar). Isto quer dizer que, enquanto mantidas as condições nas quais a sentença foi proferida, a decisão deve ser observada em seus termos estritos; contudo, alterando-se o plano fático, quebram-se as balizas nas quais se funda a decisão judicial, razão pela qual esta não pode mais subsistir, sendo, portanto, passível de perda da sua eficiência na relação contratual.

Neste sentido, o eminente processualista Luiz Guilherme Marinoni[1] diz que:

“A coisa julgada não pode impedir a rediscussão do tema por fatos supervenientes ao trânsito em julgado, até por que a eficácia preclusiva só atinge aquilo que foi deduzido ou poderia ter sido deduzido pela parte à época”.

 

Por tais razões, pode-se afirmar que, modificados os fatos, a sentença perde sua aplicabilidade, legitimando, assim, a supressão do adicional de insalubridade do empregado.

A presente análise, sem pretensão de exaurir o tema em exame, nos permite concluir que, ainda que concedido por força de uma decisão judicial, o adicional de insalubridade não perde sua natureza condicional.

Ainda que o Estado-Juiz disponha em um comando cogente e obrigatório acerca da sua imposição, a alteração do cenário fático da relação de trabalho é capaz de alterar as bases nas quais a ordem judicial foi imposta, eliminando a obrigatoriedade do pagamento do adicional de insalubridade.

 

 


[1] MARINONI, Luiz Guilherme. O Princípio da Segurança dos Atos Jurisdicionais - A Questão da Relativização da Coisa Julgada Material. In Relativização da Coisa Julgada. Coordenação Fredie Didier Jr. 2.ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2008

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos
Assuntos relacionados
Sobre o autor
Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos