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Prequestionamento e conflito jurisprudencial

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19/11/2004 às 00:00
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1.O que é o questionamento

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Todo operador do Direito sabe que deve, ao peticionar em juízo, questionar aqueles aspectos legais específicos que ele entende lhe beneficiam. Aliás se um Direito abstrato, tido por aplicável ao caso concreto, não for postulado, não lhe poderá ser concedido pela via judicial, pois configuraria algo ultra petita ou extra petita.

Da mesma forma, cumpre ao interessado, autor ou réu, alegar, adicional e tempestivamente, qual jurisprudência ou entendimento doutrinário lhe socorre, conquanto se pudesse, ou devesse, confiar no velho brocardo "dá-me os fatos e eu te darei o Direito" segundo o qual o julgador "sabe tudo" em matéria de leis e demais fontes do Direito, inclusive a jurisprudência, a doutrina e o consuetudinarismo, somado à imparcialidade do Estado-Juiz. Ou seja, se alguém comparecer a um juízo e expuser, detalhada e satisfatoriamente, seu(s) problema(s), em tese, isso seria o bastante para que o juiz lhe desse ou negasse aquilo que viera postular, uma vez que ele, juiz, conhece a lei e sabe aplicar adequadamente o Direito abstrato a cada caso concreto.

Circula no anedotário jurídico a idéia de que melhor que ter um bom Direito é ter o melhor advogado, isto é, quem tem o melhor advogado nem sempre precisa ter o melhor (ou algum) Direito, o que de certa forma invalida o brocardo antes citado.

Se entre nós impera o Direito Positivo, também prepondera a verdade processual. Eis outra razão para que um Direito assegurável, efetivo e cristalino, a despeito disso, não seja obtido ou reconhecido a seu titular ou detentor, não advindo decisão judicial em seu favor. O formalismo da legislação adjetiva, quanta vez, leva a que não se faça aquela justiça que, se diz, era a praticada por Salomão, o rei sábio.

Em prejuízo da parte, incorre, freqüentemente, a aplicação do rigorismo processual, do apego, da inafastabilidade e do dever de ofício do juízo quanto ao que literalmente diga a legislação processual e as demais disposições legais, conforme o Direito que se esteja a discutir na lide (aquela pretensão resistida, seja ela uma pretensão na área constitucional, administrativa, trabalhista, previdenciária, tributária ou fiscal, eleitoral, militar, econômica, agrária, e de cunho cível ou criminal, aplicáveis isolada ou combinadamente). Conseqüentemente, o Poder Judiciário se revela impossibilitado de dar o exato ou completo amparo no tocante àquilo a que o postulante teria direito, de acordo com a letra fria da lei.

Na esfera penal, ainda se pode considerar a existência do princípio do livre convencimento do juiz, que lhe concede um certo poder investigativo, policialesco, maior até do que o poder de investigar que tanto se discute quanto a ser, também, prerrogativa do Ministério Público, e não apenas da Polícia Judiciária, prevista na Constituição Federal brasileira de 5 de outubro de 1988.

Dessa forma, ao postular como autor ou réu, a parte tem que pedir explicitamente aquilo que acha que a lei lhe garante, deixando que sua pretensão, ou sua resistência à pretensão alheia (ainda que do Estado), seja analisada e decidida pelo Judiciário. Tanto ou mais do que o previsto na legislação como um Direito seu que não deve ser ofendido impunemente segundo o Direito Substantivo, deve ele (ele não; seu advogado) fazer bom uso do Direito Adjetivo, o Processual, sem o que dificilmente logrará êxito, principalmente se para eximir-se de ser condenado e vencido na batalha judicial. Sem o Direito Processual não há como aplicar o Direito estabelecido pelos códigos e pela legislação complementar pertinente.


2.Duplo grau

de jurisdição

Nosso sistema judiciário estabelece como princípio, o duplo grau de jurisdição, salvas as raras hipóteses - basicamente na área trabalhista - em que o recurso é inadmitido por lei. Como tanto se propala, o duplo grau se justifica pelo natural e humano inconformismo de quem restou vencido, pressupondo-se que o órgão ad quem julgará com maior acerto, por se tratar de juízes mais experientes (o que nem sempre é rigorosamente verdadeiro) e, sobretudo, por se tratar de uma decisão colegiada, diferentemente da decisão monocrática da Primeira Instância, mesmo que o CPC já admita decisão monocrática, pelo Relator, nas instâncias mais altas.

Para isso estão aí constituídos e em funcionamento os Tribunais e as Turmas Recursais. São eles ditos "de Justiça" ou "de Alçada", consoante a organização judiciária de cada Unidade da Federação (no caso da Justiça Federal e no da Justiça do Trabalho, "Regionais", podendo abranger mais de uma UF, se bem que no Estado de São Paulo haja dois Tribunais Regionais do Trabalho).

A eles, sobem as Apelações, os Agravos e os Recursos Ordinários, quando não forem eles próprios os foros de origem da demanda. Fosse a organização judiciária algo muito rígido, todas as causas encontrariam seu encerramento e trânsito em julgado nessa Segunda Instância, o que, sabidamente, não é o caso comum: existe e funciona um "terceiro" grau (quando não um "quarto"), nossas Cortes Superiores, aquelas a que sobem os recursos transordinários, relativos às AC e aos RO. São os Recursos Especiais, ditos "de Revista" na esfera trabalhista, e os Extraordinários, ao envolverem matéria constitucional questionada, ademais dos Agravos de Instrumento ante a negativa de seguimento aos mesmos ditadas pelos Tribunais a quo.

Havendo, como de fato há, a previsão de uma quantidade enorme de recursos na legislação processual brasileira, não pode constituir surpresa que nossa Justiça seja lenta, demorada, cansativa, desgastante, desestimulante, quem sabe, decepcionante. Principalmente, ao se levar em conta os aspectos da verdade processual e do formalismo processual.

Algumas vezes imagino que o juiz, desembargador ou ministro, ao sentenciar ou votar, se sentiu incomodado por não poder conceder ou negar o que fora pedido (e que seria "justo" conceder ou negar), em vista de um detalhe, de um acaso, de uma especificidade, de um descuido da parte, ou de um senão, um pormenor que seja. Não é fácil nem simples praticar a Justiça com letra maiúscula. A decisão judicial nem sempre é, pois, justa. Em decorrência disso, cada caso é um caso, e os efeitos, de regra, são inter pars, constituindo a exceção o efeito erga omnes de uma decisão.

Para complicar, mais ainda, a boa e equânime aplicação do Direito abstrato ao caso concreto, existem os conflitos jurisprudenciais, fazendo com que a sorte da parte dependa da Vara, da Turma ou do Relator a que for distribuída sua questão. Se o sorteado para julgar for adepto do formalismo, bastará uma cópia menos legível ou um equívoco, ao citar um dispositivo legal ou uma jurisprudência, malgrado evidente erro de digitação, para aplicar o rigor da lei processual e denegar o que poderia ser concedido, nos termos da legislação básica. Esses conflitos não se limitam à interpretação da lei, o que, segundo prevê a legislação processual, tem foro e forma de serem resolvidos. Verifica-se, também, conflito entre Turmas de um mesmo Tribunal, formando verdadeiras correntes, indesejáveis e prejudiciais, o que enseja a insegurança do cidadão e do operador do Direito.

O Direito Processual estabelece os pressupostos de admissibilidade, objetivos e subjetivos, sem o atendimento dos quais a postulação não pode ter curso. Tais requisitos, compreensivelmente, vão se tornando mais complexos ou onerosos, como a que pretender desestimular a interposição de recursos pela parte vencida inicialmente.

Veja-se o caso dos Juizados Especiais, em que, até determinado Valor da Causa, excepcionalmente, as partes detêm o jus postulandi e estão dispensadas da assistência advocatícia, dita indispensável à administração da justiça pelo art. 133 da CF/88. Também não pagam custas nem emolumentos na fase inicial, quer dizer, no primeiro grau. Muito menos há condenação em honorários, ainda que a assistência advocatícia seja exigida. Entretanto, para recorrer, faz-se mister serem representadas por advogado, devendo o recorrente pagar as taxas recursais, inclusive aquelas de que estivera dispensado na instância anterior, sendo a falta de seu recolhimento motivo de deserção. E se o recorrido sair vencedor na Turma Recursal, cabe a condenação em honorários.


3.Prequestionamento

Particularmente no tocante aos recursos excepcionais (Especial, de Revista e Extraordinário), embora a lei não diga, requer-se que a matéria de interesse, o fulcro da pretensão do recorrente (ou, em contrapartida, da parte recorrida), haja sido previamente alegada e sobre ela se pronunciado o órgão julgador a quo. Chama-se isso de "prequestionamento" da matéria, sem o que nossas Cortes Superiores, por construção jurisprudencial, encontram-se autorizadas a não admitirem, não conhecerem e, principalmente, não darem provimento ao REsp, RR ou RE e, obviamente, aos conseqüentes AI, AgR, ED, EI ou que outros nomes ou siglas lhes dêem os respectivos Regimentos Internos. E, sem dúvidas, a ausência de prequestionamento favorece o Judiciário, porque resulta em ser menos um caso a lhes ocupar gabinetes e prateleiras ou arquivos, se bem que não dispense a tramitação e o envolvimento do magistrado e da máquina judiciária até o trânsito em julgado do processo.

Uma pesquisa sobre a jurisprudência do STF relativa ao requisito do prequestionamento conduz a cerca de 6.000 julgados entre junho de 1950 e agosto de 2004. Destes, quase 3.000 são posteriores à CF atual. Dificilmente um dos Ministros que compuseram aquela Corte nesses últimos 54 anos deixou de atuar como Relator em casos nos quais se discutiu se houvera ou não o prequestionamento. Provavelmente mais de 70% delas para decretar que se caracterizara a ausência de prequestionamento como motivo bastante para desprover a postulação submetida à Corte.

O Superior Tribunal de Justiça, incumbido constitucionalmente de dizer em última instância quanto às matérias infraconstitucionais, excetuadas as de competência das Justiças Especiais Trabalhista, Militar e Eleitoral (que têm seus próprios Tribunais Superiores), sendo muito mais "jovem", certamente, apresenta números mais modestos, posto que todos os seus Ministros também já hajam sido levados a verificar se a matéria em julgamento pela Corte, a ele distribuída, fora prequestionada, como parte preliminar de sua análise acurada. O mesmo ocorre nas demais Cortes Superiores, sem dúvida.

Como dito antes, trata-se de uma construção jurisprudencial, formalizada pelo STF em 16/12/1963, mediante duas Súmulas que se completam:

Súmula 282

É inadmissível o Recurso Extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada.

Súmula 356

O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de Recurso Extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento.

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Nem mesmo a legislação posterior (como a L. nº. 8.038/90) impõe o prequestionamento como requisito aos Recursos Especiais e Extraordinários.

Na esteira do entendimento da Corte Suprema, o STJ também firmou seu posicionamento jurisprudencial:

Súmula 211

Inadmissível Recurso Especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal "a quo". (DJ de 03/08/1998).

Por sua vez, o TST também tem seus Enunciados sobre o prequestionamento, quais sejam:

Enunciado 297

Prequestionamento. Oportunidade. Configuração

1. Diz-se prequestionada a matéria ou questão quando na decisão impugnada haja sido adotada, explicitamente, tese a respeito.

2. Incumbe à parte interessada, desde que a matéria haja sido invocada no recurso principal, opor embargos declaratórios objetivando o pronunciamento sobre o tema, sob pena de preclusão.

3. Considera-se prequestionada a questão jurídica invocada no recurso principal sobre a qual se omite o Tribunal de pronunciar tese, não obstante opostos embargos de declaração

.

(Nova redação - Res. 121/2003, DJ 21.11.2003; Redação original - Res. 7/1989, DJ 14.04.1989: "Diz-se prequestionada a matéria quando na decisão impugnada haja sido adotada, explicitamente, tese a respeito. Incumbe à parte interessada interpor embargos declaratórios objetivando o pronunciamento sobre o tema, sob pena de preclusão").

Enunciado 298

Ação rescisória. Violência de lei. Prequestionamento

A conclusão acerca da ocorrência de violação literal de lei pressupõe pronunciamento explícito, na sentença rescindenda, sobre a matéria veiculada

. (Res. 8/1989, DJ 14.04.1989).

4.Competência

e sua evolução

Temos que analisar cada Súmula no tempo em que vieram à lume, mais do que no espaço. Até a CF/88, a competência do STF era extremamente abrangente em termos de recurso extremo. Não se falava em REsp, e ensejaria RE todas "as causas decididas em única ou última instância por outros tribunais ou juízes":

a)quando a decisão fosse contrária a dispositivo da Constituição ou à letra de tratado ou lei federal;

b)quando se questionasse sobre a validade de lei federal em face da Constituição, e a decisão recorrida negasse aplicação à lei impugnada;

c)quando se contestasse a validade de lei ou ato de governo local em face da Constituição ou de lei federal, e a decisão recorrida julgasse válida a lei ou ato; ou

d)quando a decisão recorrida desse interpretação da lei federal invocada fosse diversa da que lhe houvesse dado qualquer dos outros tribunais ou o próprio STF (CF de 1946, art. 101, III).

Com pequenas alterações, o art. 114, III, da CF de 1967 atribuía ao STF a competência para decidir também matéria infraconstitucional, basicamente quando a decisão recorrida desse "à lei interpretação divergente da que lhe haja dado outro tribunal ou o próprio Supremo Tribunal Federal". A redação já não previa a hipótese de decisão de juiz singular permitir a interposição de RE, embora permanecesse a referência à "única instância". O conteúdo do dispositivo não foi alterado significativamente pela Emenda 1/69 (art. 119, III), mas o foi, com profundidade, pela conjugação dos arts. 102, III, e 105, III, da CF/88, que transferiu a competência para dizer em última instância, mediante REsp, ao STJ em tudo o que não fosse expressamente constitucional., em suma, deixando com o STF parte do que dispunham as alíneas a) e c) anteriormente transcritas.

Também se deve ver que Código de Processo Civil estava em vigor, se o de 1939 ou o de 1973, e suas respectivas alterações ou inovações. Note-se que o instituto dos Embargos Declaratórios deu o respaldo desejado ao STF para exigir o prequestionamento, sumuladamente a partir de 1963. Na verdade, uma sentença ou um acórdão pode se omitir quanto a um ponto crucial em favor ou desfavor de um dos litigantes. Não fossem os ED, o decisum iria chegar à Corte ad quem faltando o pronunciamento preliminar, anterior, prévio, de quem já julgara e analisara com presumida maior acuidade, inclusive analisando provas e ouvindo testemunhas. Em sede de recurso, julga-se se a lei foi bem aplicada, bem interpretada e se o rito processual foi observado, não sendo admitidas novas alegações, ou provas, salvo se supervenientes, naquilo que a lei nova possa ou deva prevalecer e não resulte em um reformatio in pejus ("Tempus regit actum").

E, ainda em defesa e justificativa para o prequestionamento, se a matéria fora analisada e, explicitamente (jamais se admitiu o prequestionamento implíciito, embora se fale em prequestionamento ficto), houvera pronunciamento judicial sobre ela, quer dizer, quanto a ela o tribunal a quo se manifestara, ou se poderia verificar a má aplicação do Direito (conduzindo à possibilidade ou conveniência de ser a decisão reformada) ou estaria configurada a boa aplicação e o acerto no que constava da sentença ou do acórdão recorrido, em razão do que a decisão deve ser confirmada. Por outro lado, se o colegiado ordinário deixou de apreciar a matéria e, a partir dos ED ou em função deles, a reapreciou e, pelo menos, prestou esclarecimentos sobre a parte anteriormente omitida na Ementa e no Acórdão (o Voto não faz coisa julgada), igualmente, pode-se julgar, nas Cortes Superiores, se cabe reformar o julgado, dando provimento ao recurso, ou se, desprovendo-o, deve-se confirmar a decisão recorrida. Quem sabe, com esse pronunciamento do tribunal a quo, evitar-se-ia o recurso extremo, excepcional, especial ou extraordinário.

Contudo, a questão não se resolve por si só meramente pelo protocolar dos Embargos de Declaração. Turmas e Tribunais podem, olimpicamente, continuar deixando de se pronunciar sobre a matéria suscitada, por mais que o pobre embargante insista e interponha novos ED. As faculdades de Direito ensinam que cabem ED em ED em ED em ED, de forma interminável. Arre contra a teimosia ou relutância de uma Corte, em não dar provimento aos ED ou, ao dar-lhes provimento parcial, ainda assim, não abordar o ponto relevante a que tanto volta o prequestionador insatisfeito.

E é precisamente aí que o entendimento jurisprudencial brasileiro enfia um parafuso na cabeça de todos nós.


5.O qüiproqüo

Humberto THEODORO JÚNIOR (Código de processo civil anotado. Forense) seleciona, como jurisprudência relativa ao art. 541, diversas decisões do STJ e do STF, das quais se pode destacar:

"Mesmo as nulidades absolutas não poderão ser examinadas no especial se a matéria pertinente não foi, de qualquer modo, cogitada pelo acórdão recorrido, excetuando-se apenas aquelas que decorram do próprio julgamento" (REsp nº. 3.409/AL, 3ª. T, em 29/10/1990).

"O recurso especial não devolve ao tribunal a integralidade da matéria julgada. Limita-se a analisar a legalidade do julgado, no âmbito da legislação federal infraconstitucional" (REsp nº. 6.328/SP, 2ª. T, em 03/12/1990).

Recurso especial. Julgamento extra petita. Prequestionamento. Ocorrendo julgamento extra petita, os embargos de declaração são indispensáveis, a fim de obrigar o tribunal a pronunciar-se, de modo expresso, sobre a matéria, aceitando ou repelindo as alegações do embargante e viabilizando, em face do prequestionamento, o recurso especial" (REsp nº. 4.407/RJ, 4ª. T, em 22/02/1994).

"Faz-se imprescindível que os embargos sejam acolhidos pela Corte de origem para que seja sanada a possível omissão constante do v. acórdão embargado. Se o órgão julgador persistir na omissão, rejeitando os embargos, deve a parte veicular no recurso especial a ofensa às regras processuais pertinentes e não insistir na violação aos preceitos legais relativos ao mérito da causa, sem que sobre eles haja o tribunal a quo emitido juízo explícito" (REsp nº. 63.200/SP, 3ª. T, em 31/05/1995).

"Tem-se como não prequestionada a matéria constitucional quando o dispositivo apontado como objeto de afronta é examinado no tribunal a quo sob ângulo diverso do aventado no extraordinário ou quando, apesar de entender que a ofensa à Carta surgiu no acórdão recorrido, a parte não opõe embargos de declaração para que a origem debata o tema" (RE nº. 155.479, 2ª; T, em 26/06/1995).

Nélson NERY JÚNIOR (Código de processo civil comentado, RT), também no tocante ao art. 541, traz julgado pela 2ª; Turma do STF, relatado pelo Min. Marco Aurélio., sobre a ausência de prequestionamento e o acesso ao Judiciário, datado de 13/04/1992 (DJ de 15/05/1992), cujo teor não é muito diferente dae várias outras decisões da lavra daquele magistrado, inclusive monocráticas:

"Se a Corte de origem não adotou entendimento explícito sobre a matéria veiculada no recurso extraordinário, impossível é proceder-se ao cotejo indispensável à conclusão sobre o enquadramento do recurso no permissivo constitucional. A conclusão sobre a ausência de atendimento a pressuposto de recorribilidade previsto na legislação não implica óbice ao acesso ao Judiciário. Revela, isto sim, que a defesa apresentada discrepa das normas pertinentes" (Agravo Regimental nº. 138.554).

Abordando o art. 535 do CPC, como Nota 15, NERY JÚNIOR diz: "EDcl e pré-questionamento. Podem ser interpostos EDcl quando á decisão for omissa quanto a ponto ou matéria que deveria ter decidido, ou porque a parte o requereu expressamente, ou porque é matéria de ordem pública que exigia o pronunciamento ex officio do órgão jurisdicional. Persistindo o tribunal na omissão cabem novos Edcl ou, por derradeiro, REsp por ofensa ao CPC 535. Neste último caso, o REsp deve ter como matéria de mérito a violação ao dispositivo legal sobre o qual o acórdão se omitiu de decidir (pré-questionamento implícito), bem como a violação do CPC 535, sob pena de não conhecimento pelo STJ".

Sobre esse assunto, é emblemática a decisão prolatada pelo Min. Adhemar Maciel, em julgado da 2ª. Turma do STJ, REsp nº. 6.720 /PR (processo nº. 90.013060-3 na origem), em 10/10/1996 (DJ de 04.11.1996):

"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. REQUISITO DE ADMISSIBILIDADE DO PREQUESTIONAMENTO: CONCEITO. CUMPRIMENTO DO REQUISITO DO PREQUESTIONAMENTO PELA SIMPLES INTERPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO: INOCORRÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO DAS QUESTÕES FEDERAIS NOVAS: IMPRESCINDIBILIDADE. RECURSO NÃO CONHECIDO.

I - Quando da prolação da sentença em ação de indenização, o juiz de primeiro grau excluiu o réu-denunciante (ora recorrente do processo e condenou o denunciado (DETRAN/PR) a ressarcir o autor. Inconformado, o DETRAN/PR apelou, pleiteando a reforma da sentença em razão de error in judicando cometido pelo juiz de direito. Quando do julgamento da apelação, o TJPR anulou a sentença, por ter o juiz de primeiro grau cometido error in procedendo. Irresignado, o ora recorrente interpôs embargos de declaração a fim de que o tribunal estadual se pronunciasse acerca das regras insertas nos arts. 480, 512 e 515 do CPC. O TJPR rejeitou os embargos, ao fundamento de inexistência de omissão a ser suprida, não emitindo, por conseqüência, juízo sobre os dispositivos retro. Não se dando por vencido, o réu-denunciante recorreu de especial, alegando que o acórdão proferido pelo TJPR contrariou os princípios do ne eat judex ultra petita partium, do tantum devolutum quantum appellatum e da proibição da reformatio in pejus.

II - O requisito de admissibilidade do prequestionamento consiste na existência de que o tribunal a quo tenha apreciado e solucionado a questão federal suscitada no recurso endereçado aos tribunais superiores. É prescindível, para que esteja satisfeito esse requisito de admissibilidade, que o tribunal inferior faça menção aos dispositivos legais apontados como violados, bastando que decida sobre as matérias jurídicas neles insertas.

III - Não basta, para que esteja cumprido o requisito do prequestionamento, a simples interposição de embargos de declaração, sendo necessário que o tribunal inferior emita juízo acerca da questão federal a ser suscitada no recurso excepcional.

IV - Se, apesar de provocado via embargo de declaração, o tribunal a quo se nega a emitir pronunciamento acerca dos pontos tidos como omissos, contraditórios ou obscuros, deve o recorrente especial alegar contrariedade ao art. 535 do CPC, pleiteando a anulação do acórdão proferido quando o julgamento dos embargos, ao invés de insistir na tese da violação aos dispositivos legais, cujas matérias não foram apreciadas e solucionadas.

V - As questões federais - inclusive os errores in procedendo - surgida no julgamento da apelação devem ser prequestionadas, sob pena de não-conhecimento do recurso especial.

VI - Precedentes do STJ: Resp nº 69.096/SP, Resp nº 99.796, Resp nº 4.407/RJ, Resp nº 26.621/SP, Resp nº 65.977/SP, Ag nº 62.048/RJ - AgRg nº 71.795/SP - AgRg, Ag nº 72.162/RJ - AgRg e do Resp nº 36.996/SP."

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Sobre o autor
João Celso Neto

advogado em Brasília (DF)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CELSO NETO, João. Prequestionamento e conflito jurisprudencial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 500, 19 nov. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5954. Acesso em: 24 abr. 2024.

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