O avanço da tecnologia e as novas concepções do Direito Tributário

15/08/2017 às 19:42
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Discorre-se sobre a evolução do Direito Tributário ao longo dos anos com o emprego de tecnologias disruptivas, visando aperfeiçoar a forma de fiscalização pelo Fisco e influenciando diretamente a forma de atuação e estratégia da Advocacia Tributária.

O célebre naturalista britânico Charles Darwin já prenunciava em meados de 1800 a teoria do evolucionismo das espécies, teoria essa fundada em diversos estudos sobre o tamanho do cérebro das espécies, comparação da coluna vertebral (medula óssea), pigmentações, dentre outros fatores internos e externos.

A teoria foi impactante na sociedade da época por trazer a vanguardista noção da constante “evolução dos seres vivos” e a concepção do “ancestral comum” como elo primitivo para as várias ramificações das espécies.

A difusão de tais ideias causou um novo paradigma na sociedade, que era fortemente influenciada pelas concepções da igreja, com o dogma absoluto que o “homem representava a imagem e semelhança de Deus”.

De posse dessas informações, percebe-se que o homem é, por natureza, um ser dinâmico e em constante evolução. Ao longo da história da humanidade se mostrou capaz de aperfeiçoar sua cognição ao ponto de não só aprender com as experiências empíricas, como também ser capaz de transmiti-las, ensiná-las às futuras gerações.

Esse é um dos grandes pontos-chave para o sucesso e a hegemonia de nossa espécie, de presa (tempo da pedra lascada – homem das cavernas) para atual caçadora e dominante.

Por meio de seu intelecto, o homem foi capaz de desenvolver ferramentas, utensílios e criações que melhoraram sua vida cotidiana, da descoberta do fogo ao acelerador de partículas.

Apesar do ser humano possuir tamanha capacidade cognitiva, ainda assim é um animal regido fortemente por seu lado emocional. Lado esse potencialmente causador de intrigas, intrigas que viram brigas, que viram batalhas, que viram guerras.

Um dos grandes estímulos para o contínuo avanço da tecnologia sem dúvidas foi a guerra. A guerra de alguma maneira desperta e estimula o lado criativo do ser humano.

A história comprova o grandioso avanço da tecnologia nesses períodos, sendo essa a diferença entre: vitória e derrota, para os agentes participantes, como por exemplo: i) a utilização das armas de fogo contra os povos nativos americanos; ii) invenção do radar; iii) nanotecnologia; iv) invenção das armas químicas e infectocontagiosas etc.

O campo de batalha era sempre o cenário perfeito de teste dessas novas tecnologias. A tecnologia militar influenciou fortemente o avanço de pesquisas entre outras descobertas.

Nos tempos atuais, a internet, a robótica, nanotecnologia e a ciência não são mais ramos isolados, se uniram e se difundiram perante a sociedade. A medicina, por exemplo, utiliza-se cada vez mais de aparelhos robóticos operados à distância com melhor precisão e procedimentos menos invasivos.

A forma de lecionar não é apenas com livros físicos e quadros brancos, mas, sim, com o apoio de tablets, quadros interativos, e-books, tecnologias que vêm se tornando cada vez mais accessíveis, com o devido incentivo governamental, e influenciam progressivamente no estímulo e desenvolvimento do saber.

E o que toda essa introdução, especificamente, tem haver com o Direito Tributário?

O Direito Tributário como se sabe é um sub-ramo do Direito Financeiro, responsável por reger a arrecadação das receitas derivadas do Poder de Imperium do Estado, os tributos.

A importância do Direito Tributário remonta desde as antigas civilizações do Egito, da Mesopotâmia, da Grécia Antiga e Roma. Todos esses povos foram marcados pela figura do chamado “cobrador de impostos”, responsável pela arrecadação dos valores destinados aos Faraós, Reis, Imperadores, que os empregavam como bem entendiam.

Como se vê, desde muito antes da bíblia já se falava em tributos e sua forma coercitiva de coerção.

O sistema tributário passou por uma profunda mudança na época da criação do Estado Moderno, representada pelas monarquias absolutistas, nesse sentido pode-se extrair um fato histórico interessante:

O Estado Moderno se desenvolveu a partir da noção da soberania, ou seja, o soberano (rei absolutista) tinha o direito de consolidar suas decisões perante seus súditos (ou governados). Para que o rei obtivesse o controle político, o Estado desenvolveu vários meios para centralizar a política. Alguns desses meios foram:

1) a burocracia: funcionários que cumpriam ordens do rei e desempenhavam as tarefas de administração pública. Estes cargos eram ocupados pela nobreza palaciana e pela alta burguesia;

2) poder militar, que incluía toda as forças armadas, como a marinha, o exército e a polícia civil, para assegurar a ordem pública na sociedade e o poder do governo.

3) centralização política e a legislação nacional.

4) sistema tributário, um sistema de impostos regulares e obrigatórios para manter o governo e a administração pública.

5) idioma oficial, que se referia a um mesmo idioma falado em todo o território do Estado, que transmitia as leis, ordens e tradições da nação, além de valorizar seus costumes e cultura.

6) moeda comum, que auxiliou o fortalecimento do comércio interno.

Esse período foi marcado pela teoria do Contrato Social, inspirada no ideal da troca da liberdade do cidadão em prol da segurança pública fornecida pelo Estado (representada pela figurada do soberano absoluto).

Como se vê, o custo da arrecadação foi ampliado não só para servir aos fins privados do Governante, como também, ainda que de forma embrionária, acabou por desencadear noção da responsabilidade do Estado com o cumprimento de seus “deveres” institucionais, devendo garantir a segurança dos súditos.

A história demonstrou o crescimento do Estado para o atual modelo então vigente, sendo o mesmo atribuído de várias funções, dotado de direitos e deveres, responsável pelo cumprimento de sua função social, a persecução do bem comum.

A função fiscal, arrecadatória, do Direito Tributário sempre esteve presente, ainda que não codificada (nos tempos antigos) e sempre estará, uma vez que é por meio dela que o ente estatal arrecada maiores quantias para realização de suas atividades e gerência do próprio Estado.

Percebe-se que até o presente momento ainda não foi explicado como a tecnologia influenciou diretamente no campo do Direito Tributário, uma vez que não houve muitas alterações com o dever de pagar tributos pelos contribuintes.

Tais influências serão mais bem detalhadas a seguir.

O dever de pagar tributos, de um modo geral, não teve grandes mudanças, alterando-se apenas a parcela/percentual que o Estado vem arrecadando em face do contribuinte, decorrente da “sede arrecadatória do Estado” e o custo que vem aumentando ao longo dos anos.

O que vem se atualizando ao longo da história é a forma de fiscalização dessas receitas para se certificar do cumprimento das obrigações pelos contribuintes.

Antes da invenção dos computadores, a declaração e a fiscalização era feitas por meios físicos, vários volumes de processos em papel.

Para assegurar o cumprimento das obrigações, os contribuintes eram obrigados a registrar as escriturações por meio de livros fiscais para posterior análise da Receita, assim como deviam possuir acervo para correta guarda e conservação dos documentos.

Com o barateamento dos computadores e o amplo acesso a internet, tais “obrigações acessórias” foram trazidas para o campo virtual, economizando tempo dos contribuintes com o transporte da “papelada”, diminuindo a burocracia no pleito desses documentos, uma vez que alguns podem ser acessados e baixados pela própria internet.

O cumprimento dos “Deveres Instrumentais” pelos contribuintes se tornou uma tarefa mais remota, sendo necessários menos servidores para a apuração dessas informações.

Por meio de avançados softwares, o Fisco desenvolveu uma brilhante plataforma que faz análises de dados de milhares de documentos em microssegundos, sendo capaz de rastrear a origem do débito, suas movimentações e destinos, assim como também conseguir apurar em vários âmbitos ao mesmo tempo: Federal, Estadual, Municipal, sendo o mais conhecido popularmente denominado de “Malha Fina” da Receita.

Por meio desses avançados softwares, o Fisco consegue reduzir seu custo, economizando tempo, dinheiro e oferta de servidores, bastando agora pouquíssimos apenas para checar as conclusões às quais o software, de forma automática, já chegou.

A tecnologia permite um maior controle do Fisco, mesmo estando a distância. Outro exemplo de avanço da tecnologia utilizada pode ser o uso de mapeamentos por satélite da cidade para averiguar ampliações de imóveis para fins de alargamento da base de cálculo do IPTU.

Por meio de um controle remoto, agentes fiscais fazem um mapeamento da cidade confrontando com seus antigos dados buscando reformas nos imóveis não informados à Prefeitura para fins de IPTU.

Há pouco tempo as declarações de importação eram feitas por meio físico, papel, hoje são disponibilizados tablets que informam o que foi comprado no exterior, já informando o valor do Imposto de Importação, se ultrapassada a faixa de isenção, sendo o processo de desembarque acompanhado de máquinas de Raio-X para averiguar os pertences, sem o antigo constrangimento de fiscalização de abrir as bagagens para a apuração.

Todos os estabelecimentos comerciais já estão atualizados o suficiente para emitirem notas fiscais eletrônicas e toda a transação por meio digital. Os Tribunais Superiores já estão julgando casos onde se discute a incidência de tributos em várias operações digitais antes não existentes, fruto dos novos costumes e da evolução da sociedade.

Como se vê, não só o Direito Tributário passa por mudanças, como também os próprios agentes envolvidos, principalmente a Advocacia Tributária.

A Advocacia Tributária, ao contrário das outras áreas do Direito que tratam muito com o fator humano (penal, cível, trabalhista), a tributária lida com dados fiscais: análises de mercados, análises contábeis, planejamentos societários, estudos doutrinários e jurisprudenciais dos temas, ou seja, dados fiscais.

Podemos dizer que já vivemos no momento da “Advocacia do Futuro”, com o uso de inteligências artificiais para analisar doutrinas e jurisprudências e conseguir formular, inclusive, “petições”, pelo que o trabalho do “advogado tributarista 2.0” será a checagem desses documentos e feitura dos casos mais complexos.

Tendo isso em mente, vários escritórios no Brasil já investem em vários softwares jurídicos para a economia de tempo, melhor gerência dos escritórios e menor custo com pessoal.

Tais influências já são captadas pelo mercado na hora da seleção por novos advogados tributaristas, dando enfoque na hora da contratação não só ao domínio da legislação, boa escrita, domínio do PJe, entendimento atualizado da doutrina e jurisprudência, como também a outros requisitos considerados indispensáveis: conhecimentos contábeis, bom domínio da informática, noções de mercado etc.

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O PJe é um exemplo de tecnologia recente, por volta de 2012/2013, com sua utilização em massa por todos os Tribunais, que veio para quebrar paradigmas. Na época, ainda vigia o Código de Processo Civil de 1973, onde não havia previsão nem regulação de tal hipótese.

Muitas dúvidas surgiam na forma de sua utilização. Muitos advogados, servidores e magistrados reclamavam que essa nova ferramenta teria vindo para piorar, uma vez que os mesmos já estavam acostumados com o costume processual forense.

Muitos causídicos costumavam falar nos corredores dos fóruns do pesado investimento em tecnologia que seus escritórios estavam fazendo, com a contratação de suporte técnico, pessoal de TI, pacotes de banda larga melhores, dentre outros.

Em 2017, com o Código de Processo Civil 2015 em vigor regulando especificamente as disposições do trâmite do processo judicial eletrônico e após o período de “intimidade” com o software, pode-se colher os bons frutos dessa tecnologia, por exemplo: i) acesso processual à distância; ii) desnecessidade de carga/vista dos autos pelos procuradores/advogados; iii) possibilidade de peticionar fora do horário processual forense, até às 23h59m; iv) economia com o gasto de impressão de papeis; v) economia de tintas para impressora; vi) economia para o meio-ambiente; vii) menor acervo físico das varas processuais com a guarda e conservação dos processos; viii) desnecessidade de protocolos físicos; ix) menos idas ao fórum e consequentemente menos gasto de transporte e perda de tempo pelo deslocamento; dentre outras inúmeras hipóteses.

Apesar de existir eventuais complicações (bugs) e falhas técnicas (tilts) na utilização do software, não há dúvidas de que a ferramenta veio para melhorar a forma de atuação de todos os agentes participantes da relação processual.

O profissional jurídico que queira ser incorporado ou reincorporado a esse novo mercado deve ter em mente que não pode de ir de encontro à utilização dessas novas ferramentas postas à disposição, uma vez que a tecnologia é disruptiva, surge para quebrar barreiras e impõe novas visões e paradigmas.

A infundada resistência só ocasionará prejuízos, fazendo-se uma analogia com a história e os argumentos já expostos, o domínio da tecnologia foi o que sempre fez a diferença entre ganhar ou perder, assim, os escritórios de advocacia mais equipados e preparados serão os mais aptos a angariar clientes e a suprir a nova necessidade jurídica dos mesmos, em comparação com a concorrência arcaica e conservadora.

Esse pequeno artigo pretendeu discorrer, de forma inicial e sem exaurir o tema, sobre as novas concepções que o Direito Tributário vem sofrendo com a influência direta do avanço da tecnologia, empregada em campo para aperfeiçoar o trabalho de fiscalização do cumprimento das obrigações tributárias do Fisco.

Como se procurou mostrar, todos os agentes envolvidos na relação são diretamente envolvidos, principalmente, a Advocacia Tributária com o emprego de novas ferramentas para agir, economizando tempo, custo, demanda de pessoal, influenciando, inclusive, na formação profissional e seleção dos novos advogados, uma vez que se alterou a forma de atuar, racionar e defender.

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Sobre o autor
Filipe Reis Caldas

Advogado Tributarista. Bacharel em Direito pela Faculdade Marista. Pós-graduado em Direito Público pela Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF. Pós-graduando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - IBET. Membro da Comissão de Assuntos Tributários da OAB/PE.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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