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Religião e Estado.

Críticas da Teoria Pura à Sociologia Compreensiva

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27/11/2004 às 00:00
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Críticas kelsenianas à sociologia do direito

Foram apresentados acima, sumariamente, o pensamento kelseniano e o pensamento weberiano, seguidos de um resumo da sociologia da religião que este último autor realiza em sua obra "Economia e Sociedade". Devo agora apresentar as críticas que Kelsen formula à sociologia compreensiva do estado e, sem seguida, a mostrar aplicabilidade destas mesmas críticas à sociologia da religião.

Em verdade, as críticas que o autor formula à sociologia do estado não são dirigidas apenas à teoria weberiana. De fato, Weber é apontado por Kelsen como o autor da mais bem sucedida tentativa sociológica de explicação do fenômeno jurídico e do fenômeno a que chamamos "estado".


O Estado como ente "natural"

Crítica à sociologia do estado em geral

Analisaremos primeiramente as críticas que Kelsen dirige à sociologia do estado em geral e apenas posteriormente suas críticas à sociologia weberiana. Anteriormente foi apresentada a definição que Kelsen aceita para a natureza, qual seja, a de um conjunto de elementos vinculados entre si por um elo causal. O estado, na medida em que se presta a um estudo sociológico, é um elemento desta mesma "natureza". Isto porque, a sociologia explica o estado ao encontrar e aclarar as relações de causa e efeito que este mantém com outros elementos. Praticamente todos os estudos que hodiernamente se realizam sobre o estado, assumem esta forma.

(…) todas las teorías actuales de alguna importancia hállanse de acuerdo en la cuestión substancial, que puede formularse de modo semejante a éste: el Estado, considerado como una asociación de hombres, cae bajo la categoría de la Sociedad; y en tanto que a la Sociedad se la considera como una conexión de causas y efectos, al estilo de la Naturaleza, o como una sección de la Naturaleza, se atribuye al Estado una realidad psíquica y aun física, en el sentido de la realidad que se dice poseen las cosas del reino naturalista; mientras que del Derecho, en cuanto conjunto de normas, es decir, de proposiciones que expresan un deber ser, se predica tan sólo una cierta idealidad que, en el caso del Derecho positivo, no es más que relativa.(KELSEN, 1934: 7)

Assim, o estado é considerado como parte da sociedade, e esta como um fenômeno natural. O estado seria distinto, portanto, de fenômenos meramente ideais. Não se trata de uma "realidade" subjetiva, existente apenas como processos cognitivos na mente de seres humanos. Quando se distingue o estado do direito, reservando àquele uma existência concreta da qual este é uma expressão ideal, tem-se no estado um ente concreto, independente das consciências individuais.

Esta dicotomia entre direito e estado, permite a separação correspondente das formas de estudar estes objetos. A chamada "teoria geral do estado" pretendia unificar o estudo do estado em uma ciência que compreendesse tanto o estudo do fenômeno especificamente ideal quando do fenômeno concreto [8].

Si se plantea la antitesis de Estado y Derecho como un antítesis de ser y deber ser (la cual es, a su vez, una antítesis de puntos de vista, una contraposición de métodos y, por tanto, de objetos del conocimiento), es una consecuencia natural distinguir, como es frecuente, entre la teoría sociológica del Estado (metódicamente orientada en las ciencias naturales) y la teoría jurídica del Derecho – si se permite el pleonasmo – (orientada en sentido normativo). La primera se pregunta cómo se comportan de hecho los hombre, cuáles son las causas que han determinado ese comportamiento, con arreglo a qué leyes naturales se regula, creyendo de este modo poder llegar a la entraña de ese objeto específico llamado "Estado". La otra doctrina se pregunta, en cambio, cómo se deben comportar los hombres, qué conducta les prescribe el Derecho, el Derecho positivo, por qué razones deben comportarse así y no de otro modo; y de esta suerte va ascendiendo a leyes jurídicas cada vez más generales y, en consecuencia, llega a poder determinar su objeto especifico, el Derecho, como un complejo sistemático sometido a leyes propias, diferente de la conexión causal de la naturaleza (o de la sociedad considerada como estructura naturalista). 7 3

Assim, a sociologia busca responder à pergunta acerca do comportamento efetivo de seres humanos, enquanto que a jurisprudência busca responder à pergunta sobre qual deve ser o comportamento humano em determinada situação de acordo com uma determinada ordem considerada como válida. São perguntas essencialmente diferentes e que exigem diferentes métodos para serem respondidas. Ora, esta diversidade metodológica não pode levar senão a uma construção cognitiva diversa. Não querem e não podem tais pontos de vista convergir em seu resultado.

Esta "teoría de las dos naturalezas" del Estado debe ser considerada como la doctrina dominante en la actualidad. Pero es impotente para salvar una objeción suscitada por la Teoría del conocimiento no está garantizada más que por la identidad del proceso cognoscitivo, es decir, por la identidad de la dirección, de los caminos del conocimiento.(KELSEN, 1934: 8)

Resulta daí que aquilo que a sociologia chama de "estado" deveria ser algo distinto daquilo que a jurisprudência designa pelo mesmo nome. As diversas tentativas de elaboração de uma teoria sociológica acerca do estado se esforçaram por encontrar as características fundamentais do estado que seriam especificamente sociológicas. Ou seja, a sociologia, enquanto mantém a pretensão de ser uma ciência empírico-causal do comportamento humano, e, ao mesmo tempo, ter o estado como objeto de conhecimento, deve definir este objeto como parte da "natureza" no sentido kelseniano, ou seja, um fenômeno psíquico ou físico submetido a relações de causalidade.

Diversos foram os caminhos buscados, desde a concepção do estado como uma espécie de órgão de algum ser vivo, de alguma maneira sobre-humano, a sociedade, até o estado como um complexo de ações humanas individuais dirigidas, por seu sentido, a outros seres humanos, sendo este sentido aquilo que confere unidade a tais ações e permite reconhecê-las como o "estado". O caminho que aponta para a reciprocidade de ações individuais é aquele do individualismo metodológico e, portanto, como nosso estudo se volta para a sociologia compreensiva, é aquele que nos é relevante neste momento.

Segundo Kelsen,

Para probar que el Estado es una realidad natural, se acude a la explicación de la unidad de los elementos en la cual consiste el Estado como un caso de acción recíproca, como una interacción psíquica. Una multitud de hombres llega a constituir una unidad si estos hombres mantienen relaciones espirituales recíprocas, es decir, si el alma de uno ejerce un determinado efecto sobre la de otro, siendo a su vez influenciada por ésta (Simmel). Es claro que no sólo los hombres entre sí, sino que todo – si se prescinde del específicamente psíquico – está en conexión mutua, porque este princípio de la acción recíproca es el principio sintético con arreglo al cual puede ser comprendido el mundo como una unidad, desde el punto de vista de la ciencia de la naturaleza. Luego si el Estado ha de poseer alguna característica especial que lo distinga de los restantes objetos constituidos en unidad por la interacción psíquica, es preciso que se añada alguna nota a la de acción recíproca. En esta nueva nota si piensa cuando se lanza esta afirmación: hay grados diversos de interacción psíquica y, en correspondencia, grupos sociales humanos más o menos sólidos. El Estado es aquella especie de la interacción psíquica cuyos elementos mantienen entre sí relaciones espirituales mutuas más intensas; el Estado constituye, pues, el grado más potente de la acción recíproca. Dejemos a un lado lo que haya de entenderse propiamente por "grados" de la acción recíproca. Demos por establecido únicamente que semejante determinación psicológica (o si se prefiere, psicológico-social) del Estado está en abierta contradicción con los hechos. Los hombres que forman y pertenecen al mismo Estado no necesitan en modo alguno hallarse perpetuamente entre sí en la relación de acción recíproca intensa, es decir, no tienen por qué mantener entre sí un intercambio de sus energías espirituales más intenso que con cualesquiera individuos no pertenecientes al mismo Estado.(KELSEN, 1934: 10)

Em primeiro lugar, destaca-se que não basta que existam relações entre seres humanos ou ações humanas para que possam ser consideradas como "estado". Por certo há relações entre todos os elementos que compõe a natureza, sejam eles seres humanos ou não. É necessário, portanto, determinar quais relações específicas implicam no pertencimento a um estado determinado.

Uma saída possível é encontrar a especificidade das relações que compõe o estado em interações psíquicas de seres humanos. Destas aquelas mais intensas formariam o que chamamos de estado. A crítica que Kelsen formula a esta visão é simples e clara: o fenômeno a que normalmente damos o nome de estado muito freqüentemente não implica em relações psíquicas intensas, se é que implica em alguma interação. Um acriano não tem relações mais intensas com um gaúcho do que as têm com um boliviano.

De fato, a não ser que se renuncie completamente a identificar o conceito de estado àquilo que normalmente se entende por este nome, restringindo-o a pequenos grupos de indivíduos que surgem e desaparecem freqüentemente, não se pode definir o estado por interações psíquicas intensas.

Outra forma bastante mais bem sucedida de encontrar "sociologicamente" a unidade do estado é apontar para um tipo específico de interação psíquica. O estado poderia, assim, ser definido pela relação de "poder" ou de "dominação"

Para fundamentar la realidad sociológica del Estado, se suele poner a contribución el tipo de la "motivación" psíquica junto al de la analogía o paralelismo de los procesos psíquicos. El Estado es una relación de dominio, es decir, una relación en la cual la voluntad de uno se convierte en motivo de la conducta de otro, a la cual se dirige la primera voluntad; o bien el Estado es el mismo titular del "imperium", cualificado de algún modo, cuya voluntad vincula a los individuos que le están sometidos (¿podría decirse también que "forman" esa voluntad?) en el sentido de que los "motiva". Para una consideración realista, no existe más que una multitud de tales motivaciones; pero ni la unidad del imperante ni la de los dominados es dada realiter en modo alguno. Si a esta unidad se la convierte en Estado, se da por supuesto lo que debía ser psicológicamente investigado y probado de antemano, con lo cual resulta que la supuesta unidad del Estado es de carácter extrapsicológico y, como puede demostrarse, jurídico. 12 2

Tem-se aqui o que segue: se o estado é definido como uma determinada relação de dominação, então poderíamos identificar uma infinidade de estados em cada cidade, em cada bairro, em cada casa. Com algum esforço poderíamos restringir o estado a uma relação de dominação um tanto mais ampla, mas ainda assim jamais seríamos capazes de identificar o estado àquilo que normalmente se entende por este nome. Jamais poderíamos dizer que há um e só um estado brasileiro ou chileno. Determinadas fazendas comporiam um estado, uma favela seria outro, e os estados cessariam de existir e nasceriam com uma freqüência embaraçosa.

De fato, a relação de dominação que poderíamos encontrar entre o ser humano individual Fernando Henrique Cardoso e outro ser humano determinado não é a mesma relação que se encontra entre outro ser humano individual, Luis Inácio Lula da Silva, e o mesmo ou os mesmo seres humanos anteriores. Aquele estado, portanto, teria sido extinto e um novo nascido?

Ademais, a relação de dominação ou de poder que se tem em mente quando assim se define o estado não é mera capacidade de influência no comportamento alheio. O autor ressalta que:

De no ser así, podría decirse que la llama "domina" a la columna de mercurio que se eleva, en el mismo sentido que se afirma del príncipe que domina sobre sus súbditos. Pero con la idea de "dominio" va unida la representación de uno que debe mandar, que posee capacidad y derecho de mandar, y de otro que está obligado a obedecer. Lo que busca su expresión en el concepto de dominio no son los hechos escuetos, integrantes del nexo causal de la manifestación de una orden o mandato y de una conducta conforme a dicha orden. Ante un análisis refinado, el sentido enteramente normativo de este concepto no puede quedar oculto durante mucho tiempo. (KELSEN, 1934: 13)

Quando, portanto, se refere à específica relação de poder que constitui o estado, não se tem em mente a capacidade de causar eficazmente determinada conduta, mas antes o reconhecimento da "capacidade" (no sentido de autorização para tal) para emitir ordens válidas, ou seja, que devem ser obedecidas, de um lado, e de outro a "obrigação" e obedecer.

Apesar disto, a sociologia continua a reconhecer a unidade do estado e tal unidade coincide, sempre e invariavelmente, com a unidade jurídica do estado. O Brasil sociológico é sempre o mesmo Brasil jurídico. As dimensões territoriais em que ocorrem as relações sociais de dominação propriamente sociológicas que constituem o estado brasileiro coincidem de maneira pouco plausível com as dimensões da jurisdição brasileira.

Si a pesar de esto si sigue admitiendo la unidad del Estado, la razón tiene que ser, evidentemente, otra que el criterio de interacción psíquica real, pues todo el planteamiento del problema sociológico va a parar a lo siguiente: ¿están también los que jurídicamente pertenecen a un Estado – y se presupone tácitamente que ésta es la unidad decisiva – en aquella acción recíproca en virtud de la cual el Estado es considerado necesariamente como una unidad psíquica real o sociológica? Ya este modo de plantear el problema denuncia claramente la tendencia a la ficción, es decir, a afirmar como ser lo que sólo puede ser fundamentado como deber ser. 10 3

O critério sociológico para a definição de estado é a adequação à definição jurídica. Um conceito sociológico de estado é tanto melhor quanto mais seja capaz de se aproximar do conceito jurídico de estado. Isto denuncia, como coloca o autor, que o estado não é propriamente um fenômeno sociológico, que não é composto de interações psíquicas ou de ações recíprocas de seres humanos, mas antes um construto ideal (não ideal típico no sentido weberiano). Se definíssemos o estado como um conjunto de relações sociais que têm como sentido subjetivo o "amor à pátria", seríamos refutados pela apresentação de uma série de relações sociais, que se sabem pertencentes ao estado, mas não têm tal sentido. Sabe-se que são pertencentes ou componentes do estado porque são abrangidas pela definição jurídica do estado.

Crítica à sociologia weberiana do estado

Kelsen demonstra profundo respeito pela obra de Max Weber que, segundo ele, foi o autor da mais bem sucedida sociologia do direito já escrita. Isto não o impede, entretanto, de tecer severas crítica a tal sociologia, críticas estas que, assim entendo, a atingem não em questões periféricas mas na própria teoria que lhe sustenta.

O fenômeno que chamamos "estado" não se restringe a comportamentos recíprocos de indivíduos, e isto a sociologia é capaz de perceber. O que Kelsen nota, entretanto, é que, apesar de o comportamento dos indivíduos ser um fenômeno "natural", assim como as crenças subjetivas presentes na psique individual, os fenômenos "coletivos" e em especial o "estado" não o são. São estes fenômenos, entretanto, que recebem desde há muito o qualificativo de "sociais". O sociólogo, portanto, não se sente satisfeito com a mera descrição, por assim dizer, "behaviorista" do comportamento humano.

Pero lo que él sociólogo constata aquí no es meramente el hecho de que los hombres ven en el Estado una autoridad; el sociólogo no se conforma con señalar que hay hombres que se dejan motivar por representaciones cuyo contenido es una autoridad, sino que convierte en su propio objeto el contenido de dichas representaciones, y caracteriza, en principio, al Estado como una autoridad dotada de fuerza de obligar. Y de este modo, el sociólogo equipa al Estado con elementos de valor que no pueden hallarse en una Sociología o Psicología social orientada en las ciencias de causalidad. El Estado, considerado como autoridad dotada de fuerza de obligar – y no es posible expresar de otro modo su esencia -, es pues, un valor o – si se prefiere la versión normativa del valor – una norma o sistema de normas; y, cuanto tal, esencialmente diverso del hecho real específico, indiferente al valor, de la representación o volición de una norma. (KELSEN, 1934: 19)

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Ao sociólogo não basta dizer que determinados homens orientam sua conduta pela representação subjetiva de uma "autoridade", mas pretende também definir e explicar o que é a "autoridade". Não basta que certos indivíduos pareçam se comportar conforme o "direito", mas é necessário explicar o "direito".

Esta é, especificamente, a pretensão da sociologia compreensiva, ou seja, estabelecer a "conexão de sentido" bem como a "probabilidade" de determinado comportamento. Por certo que Weber aponta em primeiro lugar para o sentido subjetivamente mentado pelos indivíduos agentes, mas isto é logo abandonado (por impossível) por métodos distintos, como o método tipológico.

Weber, portanto, procura caracterizar o estado não como mera reciprocidade de ação ou confluência de representações subjetivas, mas como relações sociais permanentes, que são, por sua vez, ações sociais recíprocas por seu sentido, sendo que é este sentido específico que confere unidade às relações sociais em questão e, portanto, ao estado. Kelsen afirma que:

El proceso mental seguido por esta concepción, mantenida recientemente por autores egregios, es algo semejante a esto: los juristas pueden conformarse en buena hora con no ver en el Estado más que una estructura normativa, un orden jurídico, y por eso su existencia puede radicar – para ellos – en el dominio de la validez ideal; pero para la Sociología, que aspira a conocer la realidad vital, que quiere conocer empáticamente, y, por tanto, explicar causalmente la conducta real del hombre, las acciones humanas, que son parte de la cadena de causas y efectos, el Estado no puede ser más que un transcurso y una conexión de esta conducta, un complejo específico del obrar humano en común (Weber). Desde el punto de vista de esta "Sociología comprensiva", todos los agregados sociales constituyen tales "complejos del obrar en común". De aquí deriva para ella la tarea de destacar un criterio con arreglo al cual se pueda comprobar que un determinado complejo de acciones humanas es precisamente el "Estado", y de señalar el principio sintético que permita seleccionar un determinado complejo de entre la abigarrada multitud de acciones reales humanas y elevarlo a la categoría de la unidad del Estado, constituyendo de este modo una "estructura social" con una multitud inconexa de actos humanos. En el momento que la Sociología comprensiva – que se presenta como ciencia causal – pretende cumplir esta misión, su punto de mira desplazase de la superficie del ser a la del deber ser; pues el criterio según el cual las acciones humanas son enlazadas en "complejos" especiales, es el "sentido" que contienen las representaciones que orientan la actuación de los hombres. (KELSEN, 1934: 25)

É importante notar que quando Kelsen afirma que a sociologia compreensiva, no momento em que procura o critério pelo qual determinadas ações recíprocas constituem o estado, passa do "ser" para o "dever ser", não se deve entender que ele está acusando Weber de abandonar-se a juízos subjetivos de valor. Em Kelsen a palavra "normativo" tem um sentido diferente. Normativo significa relativo a normas, o que não é necessariamente apreciação segundo valores subjetivos, mas pode ser a descrição de normas.

No trecho acima apresentado o autor afirma que Weber, no momento em que busca encontrar a unidade do estado, a razão pela qual determinadas ações de seres humanos individuais são agrupadas sob o conceito de estado, tem de passar para a descrição de um corpo normativo, ou seja, para a descrição do "sentido" da ação. De fato, para Weber a unidade do estado radica no sentido específico que orienta as ações dos indivíduos em questão.

Assim, a sociologia do direito weberiana estuda as ações humanas que se orientam pelo direito. Da mesma forma a sociologia do Estado estuda as ações humanas que se orientam pela ordem estatal, ou seja, a tem como sentido, como motivo. A crítica de Kelsen se resume, portanto, à singela afirmação de tal sentido, motivo ou ordem não é aquele existente na mente dos indivíduos em questão, tampouco a "média" de tais sentidos ou a "probabilidade" de que existam em determinado grau aproximado a um tipo construído. Este "sentido" é, antes, o "sentido objetivo" que Weber busca afastar de seus estudos.

Como saber se determinado ato é ou não um ato de estado? Interrogando o indivíduo que o praticou? Encontrando uma média das opiniões de determinados indivíduos sobre o assunto? Construindo um tipo ideal de estado e comparando tal ato ao tipo assim construído? Ou não seria comparando-o com uma ordem ideal determinada, a saber com a ordem estatal ou ordem jurídica em questão?

Tomemos um caso específico como, por exemplo, a derrubada de determinados barracos por certos homens em tratores. Este ato será um ato de um determinado estado se os indivíduos que manejam os tratores tiverem recebido ordens de um "coronel", dono da fazenda em que se encontram os barracos, e, por isso, acharem que têm o "dever" de derrubar o barraco? Ou o será se acharem eles, erroneamente, que o dono da fazenda é, também, o prefeito do município? Ou ainda se os moradores do barraco, vendo os uniformes, se convencerem, erroneamente, de que os homens que efetuam a derrubada são funcionários do município? A resposta, evidentemente, não é qualquer destas. Tal ato seria um ato do estado se estivesse determinado ou autorizado de determinada maneira pela ordem jurídica, ou seja, se o ser humano individual que ordenou seu cumprimento estivesse autorizado para tanto por uma determinada norma jurídica. E este ato continuaria sendo um ato estatal se os moradores resistissem; não deixaria de sê-lo se sua resistência fosse eficaz; nem tampouco se os funcionários desconhecessem por completo a natureza do ato que estivessem praticando, ou se, mal informados, acreditassem estar agindo em nome do indivíduo que determinou o cumprimento do ato.

El orden ideal que constituye el contenido de esas representaciones que determinan la conducta real del hombre es el criterio decisivo de valoración. 25 1

Quando a sociologia compreensiva estabelece as "conexões de sentido", tenta trazer para a "natureza" (como conjunto de elementos vinculados por elos causais) o que é parte da "sociedade" (conjunto de elementos vinculados por elos normativos). Isto resulta em profundas dificuldades no sentido da eficácia causal de tal ordem. Este problema é resolvido com a afirmação deveras problemática de Weber segundo a qual o estado consiste na "probabilidade" (que jamais é expressa matematicamente) do comportamento orientado pela ordem, ou na "possibilidade" do mesmo. Estes termos vagos e imprecisos recebem acolhida na teoria weberiana graças à construção ideal típica que, como pretende objetivar e tornar coletivas representações subjetivas, as "generaliza" tornando-as "imprecisas", donde a necessidade de se aceitar tranqüilamente que se tenha, na realidade, comportamentos destoantes daqueles que seriam esperados de acordo com a teoria.

Ocorre que, enquanto sentido o estado não é sujeito a um estudo "psicológico" ou "sociológico" da mesma forma que não se pode empreender um estudo psicológico da matemática. Pode-se explicar psicologicamente o comportamento de um indivíduo que realiza cálculos matemáticos, mas não se pode explicar "psicologicamente" o conceito de "raiz quadrada".

Del mismo modo que el "pensar" una ley lógica o matemática es un acto psíquico, y sin embargo el objeto de la Matemática o de la Lógica – el pensamiento "pensado" – no es psíquico, no es un "alma" lógica o matemática, sino un contenido espiritual objetivo, porque la Lógica y la Matemática extraen dicho contenido del hecho psicológico del pensar; el Estado, en cuanto objeto de una consideración específica diversa de la Psicología, es un específico contenido espiritual, pero no el hecho de pensar y querer tal contenido; es un orden ideal, un sistema específico de normas, p ero no el pensar y querer dichas normas. (KELSEN, 1934:18)

Por isso, quando a sociologia compreensiva tenta explicar não somente o comportamento humano, que pode ou não ter alguma relação com determinados estados psíquicos ou conteúdos subjetivos de sentido do indivíduo concreto em questão, mas também o próprio "estado", o "direito", a "autoridade", a "moral", a "religião", acaba por embrenhar-se em uma tarefa tão árdua quanto a explicação psicológica das inequações matemáticas.

Kelsen prossegue:

Según esta teoría, existe un "Estado", desde el punto de vista "sociológico" – es decir, como complejo de un específico obrar común –, en tanto que determinados hombres orientan su obrar en el sentido de representarse que existe el Estado como orden jurídico normativo, es decir, de admitir que hay un sistema de normas dotadas de validez ideal. La "Sociología comprensiva" designa, pues, con la palabra Estado tanto el orden jurídico normativo (que, en cuanto contenido de ciertas representaciones, posee validez ideal), como el hecho real de las representaciones de este contenido, motivadoras de una conducta adecuada; y de este modo cree haber distinguido la existencia meramente "jurídica" de la existencia "sociológica" del Estado. Esta última consistiría tan sólo en la "probabilidad" mayor o menor de que se realice de hecho un determinado obrar, cuyo "sentido" radicaría justamente en su orientación al orden jurídico estatal, atendiendo a su validez normativa. (KELSEN, 1934: 25)

Na medida em que une o sentido da ação ao comportamento efetivo dos indivíduos, a sociologia compreensiva atropela sem qualquer análise mais profunda problemas importantíssimos de qualquer estudo do comportamento humano. Em primeiro lugar a "ordem" ou o "sentido" ideal tipicamente construído pelo pesquisador não corresponde, ao menos não necessariamente, ao sentido existente efetivamente na psique de qualquer dos indivíduos objetos de estudo. Em segundo lugar, ainda que tal ocorresse, isto não implica, necessariamente, que o indivíduo se orientasse por esse sentido específico em sua conduta. Em terceiro lugar, ainda que se oriente por tal sentido, pode não fazê-lo da forma esperada, pode ir contra ele ou utilizá-lo para fins diversos. Isto sem falar em todos os "motivos irracionais" como Weber coloca e na possibilidade de o comportamento exterior ser semelhante mas com sentido diverso, ou o contrário e em outros problemas que decorrem do simples fato de ainda não sabermos como os seres humanos se comportam.

A saída de Weber para todos estes problemas está em aceitar que todos eles serão abarcados quando o comportamento ideal típico for comparado ao comportamento efetivo, revelando, então, os "desvios" "irracionais" da ação.

Enfim, tanto para Kelsen quanto para Weber, o que há de especificamente "social" no estudo do comportamento humano é o "sentido" da ação. Ambos os autores concordam que tal sentido, enquanto subjetivamente pensado por um ser humano concreto está sujeito a relações de causa e efeito de alguma espécie. Discordam, no entanto, apenas em um ponto: quanto à possibilidade de descrição e explicação causal de sentidos que poderíamos chamar de coletivos. A religião e o direito não estão inteiros na mente de nenhum dos indivíduos objetos do estudo da sociologia da religião e do direito. No entanto, se não estão ali, não estão em lugar nenhum. A única conclusão realista que pode encontrar quem busca um sentido coletivo por meio de um estudo empírico causal é a de que não existe qualquer sentido fora de uma mente, não existem sentidos supra-humanos e, portanto, sociologicamente (enquanto uma ciência empírico-causal) não existem estados nem religiões, mas apenas seres humanos se mexendo e pensando, sem que tais pensamentos constituam qualquer ente distinto deles mesmos.

O Estado, a Religião, a Moral, a Etiqueta, a Música, a Arte, a Família, a Ciência, todos estes conhecidos objetos de estudo da sociologia não passam de construções lógicas ideais. Um estudo científico do comportamento dos seres humanos não é capaz de explicar o "Estado", e um estudo científico do "Estado" não é, tampouco, capaz de explicar o comportamento dos seres humanos. São duas realidades distintas. No entanto estes estudos, como é óbvio, não necessitam ser distribuídos a pesquisadores diferentes.

O conhecimento do sentido objetivo de uma ordem pode ser de grande valia ao pesquisador que busca explicar o comportamento empírico dos indivíduos, desde que mantenha em mente que se trata de mero construto lógico e, portanto, um instrumento de trabalho. De fato, a sociologia da religião de Weber é largamente ancorada no conhecimento do "sentido objetivo".

Weber e o sentido objetivo

O chamado "sentido objetivo" consiste em uma abstração construída pelo estudioso de determinada ordem de sentido de forma logicamente coerente, ou "isenta de contradições". A interpretação de códigos e jurisprudência, ou dos livros sagrados e seus comentários constitui a principal tarefa de quem se ocupa de tal "sentido". Weber conhece esta metodologia e a apresenta ao leitor no início da parte de sua obra "Economia e Sociedade" dedicada à "Economia e Direito". Ali, ele apresenta de forma clara e detalhada o método jurídico e seus objetivos, resumindo-os na seguinte forma:

De acuerdo con nuestra manera actual de pensar, la tarea de la sistematización jurídica consiste en relacionar de tal suerte los preceptos obtenidos mediante el análisis que formen un conjunto de reglas claro, coherente y, sobre todo, desprovisto, en principio, de lagunas, exigencia que necesariamente implica la de que todos los hechos posibles puedan ser subsumidos bajo alguna de las normas del mismo sistema, pues, de lo contrario, éste carecería de su garantía esencial. (WEBER, 1997: 510)

Este método não é, porém, próprio da sociologia. Weber o afasta justamente porque resulta em uma construção distinta do comportamento efetivo e do sentido realmente pensado pelos agentes objetos de estudo. Toma, antes, tal modo de pensar como um objeto de estudo específico, certamente legítimo, perguntando-se por que os homens, juristas, pensam desta forma.

Entretanto, apesar de afirmar que a construção de um sentido objetivo, isento de contradições, e construído pelo pesquisador não faz parte do método sociológico por ele proposto, Weber se vale, e em larga medida, de um método semelhante.

Pretendo mostrar agora como Weber elabora uma construção parcial de um "sentido objetivo" sempre que pretende imputar aos agentes algum sentido subjetivo. Assim o faz em praticamente toda sua sociologia da religião, assumindo simplesmente, porém, que tal sentido objetivo tem alguma relação com o sentido subjetivo (o que ademais é óbvio) e que por isto exerce algum poder causal sobre o comportamento humano.

Surgimento do Monoteísmo

Segundo Weber, algumas crenças são pouco propícias para o surgimento do monoteísmo, como aponta na passagem que segue:

El relato de la marcha por el desierto del pueblo de Israel nos cuenta cómo el dios iba a la cabeza de su pueblo, lo mismo que los lares de la familia romana cambiaban de lugar con ella. Y, en contradicción con aquel relato, se tiene como algo específico de Jehová que es un dios que actúa "desde la lejanía", es decir, desde el Sinai, donde habita como dios de las tribus, y sólo en caso de guerra de su pueblo camina tempestuosamente con los ejércitos (Zebaoth). Se supone con razón que esta cualidad específica de actuar "desde lejos", consecuencia de la acogida por Israel de un dios extranjero, tuvo su parte en el desarrollo de la idea de Jehová como dios universal y todopoderoso. Pues, en general, la cualidad de un dios como dios local y también la "monolatría" exclusiva, que reclama a veces de sus adoradores, no es el camino que conduce al monoteísmo sino, al revés, a menudo significa una intensificación del particularismo de los dioses. (WEBER, 1997: 339)

A crença em deuses locais consiste na crença de que os deuses têm uma "jurisdição" determinada no espaço, seu "poder" não pode ser experimentado senão nas dimensões de determinado território. Como o autor observa, esta crença é perfeitamente compatível e sói vir acompanhada de uma monolatría, ou seja, da obrigação de adorar-se apenas ao deus do território em questão. Qual a razão, portanto, para que esta crença seja empecilho para o desenvolvimento da concepção monoteísta? A razão é a seguinte: se deus apenas exerce poder sobre este território e não alcança os demais, é logicamente aceitável que existam outros deuses que exercem seu poder em territórios distintos. Por mais poderoso e abstrato que possa ser um deus territorial, jamais será capaz de provocar a dedução lógica da inexistência de outros deuses.

Essa razão não decorre de qualquer comportamento empírico-causal de qualquer ser humano. Ainda que jamais tivessem existido deuses territoriais, ou que jamais tivesse existido o monoteísmo, seria possível deduzir, dados os conceitos, que o monoteísmo não decorre da monolatria. A afirmação de Weber que ultrapassa este mero silogismo lógico não passa da suposição de que os indivíduos em questão agirão conforme suas crenças, ou seja, que o adepto de uma religião monólatra crerá que pode haver outros deuses fora de sua região.

Do trato com os deuses

Segundo o autor, as divindades a que se imputa o controle de fenômenos naturais muito grandes ou amplos, têm um relacionamento peculiar com seus fiéis:

Estas divinidades que influyen en fenómenos naturales muy universales y que, por lo mismo, merecen gran consideración a la especulación metafísica, que a veces las considera como creadoras del mundo, no juegan un gran papel en la religiosidad cotidiana, precisamente porque esos fenómenos naturales no oscilan mucho y no despiertan en la vida práctica la necesidad de influirlos con los medios mágicos o por la intervención de los sacerdotes. (WEBER, 1997: 341)

Assim, temos que, por tratarem de assuntos diversos das necessidades diárias, tais deuses não se prestam a resolver pequenos problemas de relacionamento, econômicos, sexuais, etc. Ora, isto é, também mera dedução lógica, acrescida da suposição de que os indivíduos que se relacionam com esta "divindade" pensam logicamente e agem em conformidade. Se um determinado deus é o responsável pelo controle do movimento dos astros, por que razão pediria a ele que me desse uma oportunidade de pegar um inimigo em uma emboscada? Isto se deve negociar com o deus da vingança (justiça) ou com o deus da guerra, talvez.

Outra afirmação de Weber, esta de singular importância, é a de que os seres humanos se relacionam de forma diversa com as diversas espécies de seres supra-sensíveis, o que redunda em uma forma de crer e comportar-se também diferenciada. Assim, diante de espíritos antropomórficos os seres humanos buscam coagi-los a fazer o que desejam, mas, diante de deuses poderosos, buscam agradá-los.

Un poder concebido, de algún modo, por analogía con el hombre "animado", puede, lo mismo que la "fuerza" natural de un espíritu, ser forzado a ponerse al servicio de los hombres. Quien posee el carisma para ello, quien puede utilizar los medios adecuados, es más fuerte que el dios y puede obligarle según su voluntad. En este caso la acción religiosa no es "servicio divino" – culto – sino "coerción divina"; la invocación al dios no es una plegaria sino una fórmula mágica: un fundamento inextirpable de la religiosidad popular, sobre todo de las de la India, muy extendido por lo demás universalmente; incluso el sacerdote católico practica todavía algo de este poder mágico en la transustanciación de la misa o en la absolución de los pecados. (WEBER, 1997: 343)

Como evitar a conclusão de que isto decorre de mera dedução lógica? Ora, se os espíritos são semelhantes aos homens, se têm sentimentos, esperanças, crenças, dores e prazeres, provavelmente devem "funcionar" da mesma maneira que os homens. O modo mais rápido e eficaz de obter um comportamento de um homem é a coerção, e isto justamente em função de que possui sentimentos, e outras características psíquicas. Logo, se espíritos também têm tais características, devem ser coagidos da mesma forma. Não é necessário conhecer um espírito ou observar o comportamento de homens que os conhecem para chegar a esta conclusão. É necessário, isto sim, conhecer o significado objetivo de "espírito". Weber não está afirmando, em qualquer momento do texto, que esta conclusão é a inferência de dados observados, nem seria plausível, dada a diversidade do comportamento humano e dos sentidos subjetivos atribuídos.

Por outro lado, Weber procura mostrar que o conceito de deus está de alguma forma relacionado a um comportamento "ético". A idéia é a de que quanto mais poderoso é um deus, menos sujeito ele é à coerção humana, donde deve o homem encontrar outra forma de influenciar seu agir.

El progreso de las ideas acerca del poder de un dios y de su carácter como señor personal, condiciona entonces el predominio creciente de los motivos no mágicos. Dios se convierte en un gran Señor que se puede negar a discreción, y al que hay que acercarse, no con reglas mágicas coercitivas, sino con súplicas y dones. Pero todo lo que estos motivos traen de nuevo respecto a la simple "magia" son también prosaicos elementos racionales, como los de la misma magia. El rasgo fundamental es el do ut des. Este carácter se adhiere a la religiosidad cotidiana de las masas de todos los tiempos y pueblos y también a todas las religiones. (WEBER, 1997: 344)

Perante um ser humano mais "fraco" obtém-se o comportamento esperado pela coerção, perante um ser humano mais "forte", por meio de seus favores. Tornar-se agradável a deus é, portanto, imperioso.

Pero incluso allí donde el orden de la naturaleza y con él, colocado en el mismo nivel, el de las relaciones sociales, sobre todo las jurídicas, no valen como algo que está por encima de los dioses sino creaciones suyas – más adelante nos preguntaremos en qué condiciones aparece esto -, se presupone con cosa evidente que el dios garantizará contra la infracción este orden que él mismo ha creado. La elaboración conceptual de este postulado tiene vastas consecuencias para el actuar religioso y para la actitud general del hombre respecto a Dios. Da lugar al desarrollo de una ética religiosa, y a la separación de las exigencias divinas de aquellas otras exigencias de "naturaleza" a menudo tan deficiente. Al lado de los dos modos primitivos de influir en los poderes suprasensibles, ya sea sometiéndolos mágicamente al servicio de los fines humanos, ya sea ganándolos no por la práctica de alguna virtud religiosa sino por halago al dar satisfacción a sus deseos egoístas, tenemos ahora la práctica de los mandamientos religiosos como medio específico de asegurarse la buena voluntad del dios. (WEBER, 1997: 350)

Temos acima o seguinte quadro: deus é soberbamente poderoso, afastado das necessidades dos homens, não carece de homens mas pode influir em sua conduta. Este mesmo deus é o criador e regulador de todo o universo e, ademais, estabeleceu uma determinada "ética" que pretende que os homens observem. Ora, é claro que para tornar-se "agradável" a este deus alguém deve observar tal ética.

Este ponto, tão importante na sociologia weberiana, é mera dedução lógica de sentidos objetivos. Não se refere a qualquer "possibilidade" ou "probabilidade" de comportamento conforme a um tipo idealmente construído. Refere-se antes a uma dedução lógica aliada ao pressuposto de que os homens se comportarão, empiricamente, da maneira como pensam, e que a maneira como pensam é lógica. Não coloco em questão este postulados, mas pretendo apenas evidenciar que das premissas dadas decorre a conclusão de maneira dedutiva, não indutiva. E que tais premissas são a descrição de um sentido objetivo, no caso, a descrição de um significado específico do conceito de deus.

Do problema da teodicéia

Em nenhum outro momento resulta tão evidente intenso uso do sentido objetivo na sociologia compreensiva do que na análise acerca do problema da teodicéia. Este problema teológico tão debatido surge em Weber como uma importante chave para a compreensão do comportamento religioso. Aquilo que costuma estar restrito a mosteiros e reuniões teológicas é imputado ao comportamento do homem religioso.

O problema da teodicéia, ou problema do mal, se coloca na medida em que são aceitas premissas como estas: deus é bom, deus é poderoso para criar ou alterar o mundo, o "mundo" entendido como o universo das coisas sensíveis comporta a maldade. Afirma o autor que:

Sin embargo, cuanto más discurre en la dirección de la concepción de un dios único supramundano y universal, tanto más agudo se hace el problema de cómo puede ser compatible el infinito poder de un dios semejante con el hecho de la imperfección del mundo que él ha creado y gobierna (WEBER, 1997: 412)

Assim, quanto mais se aproxima de uma concepção monoteísta de deus, mais se tem de enfrentar, se é que se pretende que as crenças tenham alguma coerência, o problema da teodicéia. Esta conclusão, como as demais, decorre de mera análise lógica dos conceitos envolvidos. Tem precisamente a forma que Kelsen atribui a sua jurisprudência. Da mesma forma a conclusão de que quanto mais poderoso é o deus, se considerado bondoso, tanto mais difícil a resolução do problema.

A teologia costuma colocar a seguinte situação para o problema da teodicéia: ou deus não é bom, ou não é todo-poderoso, ou não se importa com os homens ou, é claro, não há deus. É evidente que todas estas conclusões são incompatíveis com determinadas formas de cristianismo. Importando, portanto, na necessidade teológica de conciliar a existência do mal com a existência de um deus poderoso, bondoso e que se importa com os negócios humanos.

Como Weber bem nota, existem várias soluções possíveis para este problema. Anteriormente tratamos da teodicéia católica e calvinista e observei que Weber entende ser apenas a calvinista o desenvolvimento lógico do problema em questão, que ele identificará, posteriormente, como a causa de um caminho de salvação que implica uma conduta racionalmente orientada a um fim determinado: o aumento da glória divina.

Este nexo que o autor pretende estabelecer entre a teodicéia, ou melhor entre o sentido objetivo (definitivamente a teodicéia não é parte da "média" dos sentidos subjetivos) e a ação humana o leva a equívoco na descrição da teodicéia católica e, portanto, a uma apresentação inconsistente daquela doutrina, tomando-a por repleta de elementos "irracionais" e "mágicos".

A identificação de tais elementos mágicos aliados a uma tradição que se observa sem conhecimento do sentido é, evidentemente, normativa. Apesar de apontar corretamente, institutos católicos que evidentemente abrandam a necessidade de um seguimento estrito de sua ética de salvação, Weber erroneamente deixa de notar a coerência lógica desta doutrina [9]. De fato, porém, aceitando que as doutrinas religiosas afetem o comportamento humano, e que o fazem por meio de uma ética de salvação, resta claro que a ética calvinista é mais emocionalmente pesada ao indivíduo, não lhe deixando outra saída senão o comportamento conforme. Se, no entanto, o equívoco na caracterização do sentido objetivo da doutrina católica não resultou em prejuízos para o pensamento de Weber, isto parece resultar de sua erudição e do fato de não estar imediatamente preocupado com aquela doutrina.

Esta freqüente observação de que a erudição weberiana permita-lhe construir tipos ideais plausíveis e instrumentalmente relevantes aponta para a erudição não só histórica, mas também para o conhecimento do sentido objetivo dos objetos que estuda. Conhece o direito dos juristas e a religião dos teólogos. Por isto tem facilidade em encontrar as "conexões de sentido".

Os caminhos de salvação

Dados os dogmas da comunhão dos santos e da eficácia dos sacramentos, e dados ainda os sacramentos que são capazes de perdoar os pecados, decorre logicamente que o caminho de salvação católico não necessita ser absolutamente rigoroso no cumprimento dos preceitos éticos, mas meramente ter um "saldo positivo" de ações e intenções adequadas. [10] Esta conclusão, já discutida anteriormente, também não é decorrente de observações empíricas e de um processo indutivo qualquer. É mera dedução lógica do sentido objetivo.

Da mesma forma o caminho de salvação calvinista decorre logicamente do sentido objetivo. Weber cita textualmente a confissão de Westminster para caracterizar o calvinismo. A partir daí apenas necessita deduzir o comportamento devido daquele que se pretenda salvo. Impôs-se o dever de crer-se salvo, impôs-se o dever de cumprir os mandamentos divinos. Isto não porque o comportamento estivesse sujeito a um julgamento futuro, mas a uma sanção futura aplicada em virtude de um julgamento incognoscível ocorrido previamente, o que resulta no mesmo.

Neste ponto a análise weberiana se torna bastante mais sofisticada em virtude de que o comportamento do calvinista é decorrente de um determinado estado psicológico criado em função da frieza e desumanidade das "normas" que sobre ele se aplicam. Por "frieza" e "desumanidade" deve-se entender a mera falta de possibilidade de se obter um "perdão" de acordo com esta ordem normativa. Temos aqui, portanto, o sentido objetivo aliado a uma análise psicológica.

Toda a discussão weberiana sobre a forma como os deuses atingem a supremacia do panteão, também é, junto com várias outras, ao menos em grande parte, resultado de descrições de sentidos objetivos que, quando muito, estão aliadas a suposições bastante plausíveis e evidentes acerca do modo como os seres humanos se comportam. Tem-se nesta obra, portanto, um estudo do comportamento histórico de indivíduos, breves análises psicológicas e a descrição do sentido de ações humanas (tanto mais bem feita quanto mais semelhante ao sentido objetivo). Disto, o especificamente social é a descrição do sentido.

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Sobre o autor
Nelson do Vale Oliveira

sociólogo, mestrando em sociologia pela Universidade de Brasília (DF)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Nelson Vale. Religião e Estado.: Críticas da Teoria Pura à Sociologia Compreensiva. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 508, 27 nov. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5983. Acesso em: 24 dez. 2024.

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