5 A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NO TRIBUNAL DO JÚRI
Conforme destacado ao longo desse trabalho, a origem do Tribunal do Júri é bem antiga e traz consigo a ideia de realizar um julgamento justo do acusado através de seus iguais, por esse motivo a função do jurado possui a obrigatoriedade e adquire elevada importância.
Salienta Macedo que “o Júri, por ser formado por juízes leigos, desprovidos de conhecimentos técnicos da área jurídica se torna o grande problema no que se refere às consequências trazidas pela divulgação do julgamento pela mídia”. (MACEDO, 2013, p.31).
Os jurados possuem uma grande função, absolver ou condenar a pessoa do réu a partir dos fatos e provas demonstrados na audiência.
Eis que aqui, surge um problema, pois alguns crimes adquirem proporções midiáticas tão elevadas e assim bombardeiam diariamente através dos meios de comunicação tudo sobre o crime, através de histórias, depoimentos e até mesmo reconstituições do delito.
Devido a tanta informação, os jurados, pessoas comuns, de todo tipo de classe, com educação diferente e cultura diversa, acabam por se deixar influenciar, misturando fatos e provas realizadas na audiência com as informações da mídia e o pior, ainda realizam o julgamento do acusado com essa mescla de informações recebidas, sem conseguir ao menos separar o que é real do que é fictício.
5.1 Casos de maior repercussão e audiências televisionadas
Os programas jornalísticos com enfoque policial, como o extinto Linha Direta ou ainda os recentes Brasil Urgente, Cidade Alerta e Balanço Geral, estão lotados diariamente dos crimes dolosos contra a vida.
Esses crimes também lotam as páginas policiais dos jornais populares, são matérias de capa, bem como a internet e rádio, um “bom crime” vende e permea e circula por todos os meios de comunicação existentes.
Crimes como esses costumam chamar atenção por diversos motivos, desde o perfil do indivíduo, como por exemplo, um famoso, ou pela brutalidade do crime, assassinar com diversas tesouradas, ou ainda pelo motivo que levou o cometimento do crime, matar por causa de herança.
O fato é que esses crimes chocam, produzem comoção em toda a população por isso ganham enorme repercussão midiática, pois vendem bem e alcançam os melhores índices de audiência.
Nessa parte do estudo, busca-se citar e exemplificar alguns dos casos midiáticos que causaram grande repercussão e comoção na população. Ressalta-se que não serão todos, pois existem milhares, mas talvez aqui estejam os que causaram maior comoção social e despertaram o interesse amplo da mídia.
Inicia-se com o caso de Daniella Perez, filha da famosa autora de novelas da Globo Glória Perez. Daniella foi assassinada, com apenas vinte e dois anos de idade, através de uma emboscada, com dezoito golpes de punhal, que perfuraram seu pescoço, pulmão e coração, por seu ex-colega de trabalho e ex-ator Guilherme de Pádua e por sua ex-mulher Paula Nogueira Thomaz.
Na noite de 29 de dezembro de 1992, foi assassinada a atriz da Rede Globo, Daniella Perez, que à época interpretava a personagem Iasmim na novela De corpo e alma (levada ao ar de agosto de 1992 a março de 1993). A jovem foi assassinada pelo ator Guilherme de Pádua, com quem contracenava nas telenovelas. Nos dias seguintes ao assassinato, jornais, revistas e emissoras de televisão dedicaram páginas e páginas ao assunto. As reportagens, assim como leitores e telespectadores, participavam da confusão entre Daniela e Iasmim. (ARBEX JR, 2001, p.45).
Esse crime causou grande indignação na população por inúmeros motivos, a vítima era uma atriz, filha de renomada autora, o assassino era seu colega de trabalho, além do que um fato chamou a atenção de todos pela frieza, o casal de assassinos, poucas horas depois de atirar o corpo da vítima em um matagal, foram ao encontro da família da vítima para lhes prestar solidariedade.
Em 1997, após cinco anos do crime, ambos foram julgados e condenados por homicídio duplamente qualificado, por motivo torpe e impossibilidade de defesa da vitima. Guilherme de Pádua foi condenado em janeiro, por cinco votos a dois, a dezenove anos de prisão, já Paula Thomaz, teve seu Júri em maio, sendo condenada por quatro votos a três, a dezoito anos e seis meses de prisão.
Na sentença, ficou demonstrado que o motivo para o crime foi a ambição e a cobiça, tendo em vista que o ator se sentiu excluído da novela. A premeditação foi reconhecida pelo Conselho de Sentença e foi expressa com clareza na sentença:
A conduta do réu exteriorizou uma personalidade, violenta, perversa e covarde, quando destruiu a vida de uma pessoa indefesa, sem nenhuma chance de escapar ao ataque do seu algoz, pois, além da desvantagem da força física, o fato se desenrolou em local onde jamais se ouviria o grito desesperador e agonizante da vítima. Demonstrou o réu ser uma pessoa inadaptada ao convívio social, por não vicejarem no seu espírito os sentimentos de amizade, generosidade e solidariedade, colocando acima de qualquer valor sua ambição pessoal. (1º TRIBUNAL DO JÚRI DO RIO DE JANEIRO. j. 25.01.1997. Juiz Presidente José Geraldo Antônio).
A comoção popular que acompanhou esse homicídio resultou na alteração da legislação penal, mediante iniciativa popular com o recolhimento de diversas assinaturas, culminando com a publicação da Lei 8.930 de 06.07.1994, que incluiu no rol dos crimes hediondos o homicídio qualificado, tornando-o mais severo.
Ambos já se encontram em liberdade, cumprindo apenas seis anos da pena. Guilherme de Pádua cumpriu até o ano de 2010 e atualmente mora em Belo Horizonte, nunca mais viu seu filho, que teve com sua ex-mulher Paula Thomaz, o ator não gosta de ser reconhecido nas ruas e casou-se novamente com outra pessoa. Já Paula Thomaz, mudou seu nome para Paula Nogueira Peixoto, casou-se com um advogado com quem teve mais dois filhos.
Outro caso midiático, que rendeu bastante discussão foi o do menino João Hélio Fernandes Vieites de apenas seis anos de idade, que no dia 07 de fevereiro de 2007, foi arrastado por sete quilômetros durante um assalto no Rio de Janeiro, após não conseguir sair do carro da família quando o mesmo estava sendo roubado.
A criança ficou presa ao cinto de segurança e não conseguiu se soltar, em depoimentos, as testemunhas disseram terem sinalizado que havia uma criança sendo arrastada pelo veículo e que os ladrões ironizaram tal fato, com os seguintes dizeres “o que estava sendo arrastado não era uma criança, mas um mero boneco de Judas”.
O corpo do garoto ficou totalmente irreconhecível, durante o trajeto ele perdeu várias partes do seu corpo, os dedos e suas pontas, além da cabeça que não foi toda encontrada.
No julgamento, cinco pessoas foram condenadas, Carlos Eduardo Toledo Lima a quarenta e cinco anos de prisão, Diego nascimento da Silva a quarenta e quatro anos e três meses, Carlos Roberto da Silva e Tiago de Abreu Matos a trinta e nove anos de prisão cada um.
Ezequiel Toledo de Lima, adolescente, foi condenado pela 2º Vara de Infância e Juventude da Capital a cumprir medida socioeducativa em uma instituição para jovens infratores.
A mídia muito falou sobre esse caso, tendo em vista a forma brutal como a criança faleceu, além do que o fato de ter um menor como um dos culpados, muito se fez difundir a possibilidade de redução da maioridade penal no país, o Congresso Nacional se mobilizou, mais o certo é que até hoje nada foi feito.
No ano seguinte, aproximadamente em 29 de março de 2008, outra criança foi brutalmente assassinada. Uma menina de cinco anos sofreu uma queda da janela do quarto andar do edifício do seu pai, em São Paulo. Isabella de Oliveira Nardoni, após a queda, foi encontrada com uma parada cardiorrespiratória e veio a óbito em seguida.
Em depoimento, seu genitor declarou que, na data dos fatos, chegou a sua residência acompanhado de sua mulher Anna Carolina Jatobá e de seus três filhos adormecidos. Assim, levou a vítima ao apartamento, onde a colocou na cama e, posteriormente, retornou a garagem a fim de ajudar sua esposa à subir com seus outros filhos, contudo ao retornar ao seu apartamento, notou que a luz do quarto de seus filhos estava acessa e a grade de proteção da janela estava cortada, bem como que sua filha havia sumido, ocasião em que percebeu que o corpo dela estava caído no jardim. Ainda, relatou na época dos fatos, que acreditava que sua filha havia sido atirada pela grade de proteção por alguma pessoa que não gostava dele, relatando que suspeitava de um pedreiro com quem recentemente havia discutido. (DILLMANN, 2012, p.44).
Seu depoimento não convenceu a população, nem a mídia e muito menos a polícia que tratou de investigar todos os detalhes de tal crime. No laudo da Medicina Legal, ficou provado a impossibilidade de ter ocorrido simplesmente acidente, sendo assim ficou destacado o dolo no crime ocorrido. O que inicialmente parecia um mero acidente se tornou um crime terrível.
No momento em que o dolo ficou evidente para o crime a mídia tratou de achar os culpados, e assim foi feito, pai e madrasta, viraram o foco da mídia que tratou de julgá-los e condená-los antes de qualquer investigação ou julgamento prévio causando grande comoção populacional e aguçando o sentimento de justiça populacional.
Diversos estudantes de direito e muitos curiosos vieram de todo o canto do país para assistir o julgamento do ano, pois não é todo dia, que o pai mata uma filha, ainda mais em situação tão trágica.
Ressalta que ambos os acusados nunca confessaram o crime e, desde o início, e até os dias de hoje, se declaram inocentes. O julgamento deles ocorreu em março de 2010, dois anos após o crime, em sentença com o áudio transmitido ao vivo em rede nacional, o pai de Isabela, Alexandre Nardoni e a madrasta Anna Carolina Jatobá foram condenados a penas que se somadas chegam a cinquenta e nove anos de reclusão. Atualmente ambos ainda se encontram presos no regime fechado.
Em uma entrevista concedida, após o término do julgamento pelo advogado dos réus, o mesmo constatou “não acredito que tenha tido chance de defendê-los porque tamanha foi à exposição que todo mundo sabia o resultado antes de começar o Júri. Foi só uma etapa formalmente a ser cumprida”.
Ainda no mesmo ano de 2008, para ser mais preciso, em outubro, um outro caso marcante e com forte exposição pela mídia, a adolescente Eloá Cristina Pimentel, de quinze anos, foi assassinada, pelo seu ex-namorado, Lindemberg Farias, após ser mantida por mais de cem horas em cárcere privado, junto com alguns de seus amigos.
No dia 13 de outubro, os jovens estudavam no apartamento da vítima em um conjunto habitacional de Santo André no ABC Paulista. Dois dos garotos mantidos refém, foram liberados na mesma noite, no entanto as meninas permaneceram refém. No final da noite do segundo dia, Nayara foi libertada, porém decidiu voltar ao local para ajudar nas negociações para que amiga também fosse libertada.
No dia 17 de outubro, Grupo de Ações Táticas Especiais invadiu o apartamento culminando com uma troca de tiros, onde as duas amigas foram atingidas. Eloá levou um tiro na virilha e na cabeça, não resistindo aos ferimentos, faleceu no meio da noite, já Nayara, foi baleada no rosto, mas sobreviveu.
Destaca Macedo “que várias emissoras se mantiveram presentes durante todo o desenrolar dos fatos, cobrindo e transmitindo todos os acontecimentos ao vivo em rede nacional”. (MACEDO, 2013, p.32).
De fato tudo foi transmitido ao vivo por todas as emissoras de televisão e rádio na forma instantânea em que os fatos ocorriam como se fosse uma novela ou um filme e todos ficavam esperando ansiosos pelo desenrolar do próximo capítulo.
Nesse ponto, resta destacar a frase da secretária-executiva da época de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, Lourdes Bandeira, “Eloá teve várias mortes: em sua exposição midiática, sua perda de dignidade, de identidade, de humanidade e de sua morte física”. (CAMARA FEDERAL, SPM-PR, 31/05/2013).
No julgamento realizado em 13 de fevereiro de 2012, Lindemberg foi condenado a aproximadamente a noventa e oito anos de prisão por todos os crimes pelo Conselho de Sentença. No dia 06 de junho de 2013 teve sua pena reduzida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, para trinta e nove anos e três meses de reclusão em regime fechado. Ressalta-se que atualmente, Lindemberg ainda se encontra encarcerado no regime fechado.
Caso extremamente midiático, Bruno Fernandes de Souza, ex-goleiro que atuava no time do Flamengo, foi preso no ano de 2010 por suspeita de participação no sequestro de Eliza Samudio e o seu filho, com quem tinha um relacionamento.
A estudante paraense Eliza Samudio foi dada como desaparecida desde o dia 04 de junho de 2010. De acordo com as investigações, Eliza e seu filho teriam sido sequestrados no Rio de Janeiro e mantidos em cárcere privado no sitio do Bruno em Esmeraldas, lá mesmo ela foi assassinada no dia 10 do mesmo mês. A criança foi localizada pela polícia e atualmente vive com a avó materna, o corpo de Eliza nunca foi encontrado.
Durante todo o tempo em que esteve preso, Bruno Fernandes negou qualquer tipo de envolvimento no crime, mas em seu julgamento no ano de 2013, ele confessou e reconheceu que tinha conhecimento de que a vítima Elisa Samudio iria morrer e assim foi condenado a uma pena de vinte e dois anos e três meses de prisão.
Esse crime, além do Bruno teve inúmeros outros personagens, mas a sua explosão midiática, se deve ao crime ter como mandante um goleiro de um time conhecido mundialmente.
Um parêntese a ser feito nesse ponto, é que o corpo da vítima jamais fora encontrado, apesar da confissão final do goleiro Bruno, onde relatou que tinha conhecimento de que a vítima iria morrer. Pode-se considerar a existência de um crime sem corpo, não seria necessário fazer o uso princípio importante do direito penal, in dubio pro reo.
Destaca Boff que “todo o processo judicial deve respeitar duas regras básicas do direito: a presunção da inocência, e em caso de duvida, este deve favorecer o réu”. (BOFF, 2013).
Sabe-se que a prisão é a exceção, pois a liberdade é a regra da Constituição, no entanto, Bruno esta preso praticamente desde o dia em que a Eliza desapareceu, desde o momento em que todos os holofotes viraram para ele, e então o Poder Judiciário viu a necessidade de demonstrar para a sociedade, que este não seria mais um crime que ficaria impune.
Aqui, tem-se outro caso que trouxe consigo uma alteração legislativa, o menino Bernardo Boldrini, foi assassinado, aos onze anos, exatamente no dia 04 de abril de 2014. Seu corpo foi encontrado enterrado em uma cova na área rural. De acordo com as investigações da Polícia Civil local, o menino morreu em razão de uma superdosagem do sedativo midazolan.
Após uma série de investigações policiais, resultados periciais e depoimentos de testemunhas, a polícia concluiu que sua madrasta, Graciele Ugulini e uma amiga dela Edelvânia Wirganovicz, além de seu pai Leandro Boldrini e um irmão de Edelvânia, Evandro Wirganovicz, todos planejaram e tiveram participação direta na morte de criança e assim foram presos por estarem envolvidos no crime. Esse crime ainda aguarda julgamento, ainda sem previsão para ocorrer.
O fato é que esse caso possui grande apelo midiático arrancando muita comoção populacional, pois de acordo com os fatos e depoimentos, o menino vinha sofrendo maus tratos e não queria morar mais com o pai e a madrasta.
Devido isso, em busca de se proteger a integridade física das crianças e prevenir futuros crimes, surge uma nova Lei 13.010 de 26 de junho de 2014, no mesmo ano de sua morte, essa lei teve foi denominada Lei da Palmada ou ainda Lei Menino Bernardo, em homenagem ao garoto, que traz em seu texto: “para estabelecer o direito da criança e adolescente de serem educados e cuidados sem o uso de castigos físicos ou de tratamento cruel ou degradante, e altera a lei 9.394 de 20 de novembro de 1996”.
No mesmo ano de 2014, no mês de maio, um crime diferente, um linchamento que teve como fato gerador o maior erro dos meios de divulgação em massa, após um excesso de informações equivocadas publicadas na internet um dos meios de comunicação mais rápido.
No dia 03 de maio, Fabiane Maria de Jesus, de 33 anos de idade, dona de casa, mãe de duas crianças, foi linchada e levada em estado grave para um hospital por policiais, não resistiu aos ferimentos veio há falecer dois dias depois.
A motivação para o crime seria um boato na internet, que levou a população local de Guarujá, no litoral de São Paulo, a confundir a vítima com uma suposta sequestradora de crianças para a prática de magia negra.
O fato causou grande comoção populacional, algumas pessoas foram presas, mas nada de concreto até o momento foi apurado.
Em busca de finalizar os exemplos, volta-se um pouco no tempo, mais precisamente no ano de 2010 a advogada Mércia Nakashima, foi assassinada pelo ex-namorado e ex-sócio Mizael Bispo de Souza, após o mesmo estar inconformado com o fim do relacionamento.
Segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo, o julgamento de Mizael foi o primeiro do país a ser transmitido ao vivo. Através do vídeo, foi possível acompanhar não só os depoimentos como as brigas quase diárias entre acusação e defesa, como se estivessem diante de uma nova novela.
Aos jurados e as testemunhas foi dada a opção de escolha, se queriam que suas imagens fossem exibidas ou não. Somente a votação dos jurados, transcorreu na sala secreta, sem a presença da mídia, conforme dispõe e obriga o Código de Processo Penal, em seu artigo 485.
A iniciativa de transmitir o julgamento partiu do juiz Leandro Jorge Bittencourt Cano, da Vara do Júri de Guarulhos, que optou por essa medida para evitar tumulto no Fórum na Cidade, cujo espaço não comportaria o numero de interessados a acompanhar o julgamento. (MACEDO, 2013, p.32).
Apesar de o Tribunal de Justiça informar que o julgamento do Mizael foi o primeiro a ser transmitido no país, lá no Rio Grande do Sul, vinte três anos atrás do julgamento de Mizael, no ano de 1990, foi transmitido pela extinta TV Guaíba, o julgamento de um deputado acusado de matar a tiros outro parlamentar. (MACEDO, 2013, p.32).
Mizael nunca assumiu o crime e se diz inocente por tal fato, seu julgamento ocorreu no ano de 2013 e a sentença o condenou a pena de vinte anos de reclusão, o mesmo até escreveu um livro onde relata a história e se diz vítima de preconceito racial, da família de sua vítima. Atualmente, o mesmo ainda se encontra preso no regime fechado.
Todos os casos aqui destacados foram amplamente divulgados pela mídia e toda essa divulgação maçante criou na população certa “sede” de justiça. Aqui, cabe indagar até que ponto esse apelo populacional ajudou ou atrapalhou o julgamento de todos os acusados expostos.
Como saber, se a exposição midiática desses crimes não tivessem sido amplamente divulgados, se os réus que aqui foram todos condenados, teriam alguma chance de sair de seus julgamentos inocentados. Na duvida, a lei é clara em afirmar, decide-se pelo réu, será que o Júri não tinha qualquer dúvida.
5.2 Caso midiático
Suzane Louise Von Richthofen, uma estudante do curso de direito de dezenove anos de idade pertencente a uma família de classe media alta, não trabalhava, suas despesas e gastos eram custeadas pelos seus pais.
Ré confessa de arquitetar, planejar e colocar em prática o assassinato de seus pais junto com a seu namorado na época, Daniel Cravinhos de Paula e Silva, e o seu irmão Cristian Cravinhos de Paula e Silva.
Na noite de 31 de outubro de 2002, um casal de classe média alta, Manfred Albert Von Richthofen de quarenta e nove anos e Marísia Von Richthofen de cinquenta anos, foram assassinados na casa onde moravam no Brooklin, na Zona Sul de São Paulo, enquanto dormiam, com golpes de barra de ferro na cabeça.
Na época do crime, todos pensavam se tratar de um crime de latrocínio, roubo seguido de morte, no entanto após o andar das investigações foi crescendo certa desconfiança em torno da própria filha do casal, essa desconfiança foi confirmada com a prisão dos seus comparsas e sua confissão.
Segundo a própria Suzane, a motivação para o crime teria sido “o amor”, pois os seus pais eram contra o seu relacionamento com o Daniel Cravinhos; apesar de Suzane confessar ter matado por amor, foi por toda a mídia veiculada que a motivação maior para o crime fora a herança deixada pelos seus pais, uma fortuna de aproximadamente 10 milhões de reais.
Esse crime causou grande repercussão, pois matar os pais além de ser considerado um crime gravíssimo, fere todos os princípios morais e éticos que permeiam uma sociedade, pois honrar pai e mãe é consagrado como um dos dez mandamentos bíblicos.
O julgamento aconteceu no ano de 2006 e durou sessenta e cinco horas, Suzane e Daniel foram condenados a pena de trinta e nove anos de reclusão e seis meses de detenção cada um, já Cristian, irmão do Daniel foi condenado a trinta e oito anos de reclusão e seis meses de detenção.
Destaca-se que na sentença proferida pelo juiz Alberto Anderson Filho do 1º Tribunal do Júri de São Paulo, ficou evidentemente demonstrado o clamor publico e as consequências do crime atuando de maneira qualificadora para a dosagem da pena dos réus. (ANDERSON FILHO, 2006).
Macedo destaca “que mais de cinco mil pessoas se inscreveram a fim de conseguir um dos 80 lugares disponíveis na platéia do Tribunal do Júri em São Paulo”. (MACEDO, 2013, p.13).
Na época, houve até pedido para que o julgamento fosse televisionado, no entanto foi negado pelo Tribunal, com a seguinte decisão no acórdão:
A publicidade do processo é uma garantia de que os atos nele praticados são feitos com lisura, daí a permanência das portas abertas de forma a que qualquer pessoa que esteja no Fórum possa ingressar e assistir à cerimônia solene. Daí a se pretender que todo o país possa assistir ao lamentável drama que se desenvolve no Plenário do Tribunal do Júri, inclusive com repasse de trechos para os jornais internacionais, vai a uma longa distância. (TJ SP, 5º CAMARA DA SEÇÃO CRIMINAL, HC 972.803.3/0-00, ACORDÃO REGISTRADO SOB O Nº 01036668, RELATOR DES. JOSÉ DAMIÃO PINHEIRO MACHADO COGAN).
Apesar de o julgamento não ter obtido a devida autorização judicial para ser transmitido ao vivo, a todo instante os meios de comunicação atualizavam informações de dentro do Tribunal do Júri, inclusive com as frases ditas no momento exato do julgamento.
Atualmente, Daniel e Cristian Cravinhos estão no regime semi-aberto que lhes foi concedido desde o ano de 2013. Já Suzane Richthofen, apesar de ter inúmeros pedidos de progressão para o regime semi-aberto negados por diversos motivos, no ano passado, mais precisamente em outubro de 2015 adquiriu direito ao regime.
Suzane Von Richthofen é uma das criminosas mais famosas do Brasil e talvez até do mundo, tudo que acontece com ela vira notícia e explode em todos os meios de comunicação.
A exemplo disso foi o que aconteceu recentemente no dia 04.05.2016, após ser veiculada por toda a mídia que a condenada obteve o direito de sair temporariamente do presídio em algumas datas específicas, onde se inclui o dia mães, gerou certo desconforto populacional.
É de se destacar que a concessão desse benefício de saídas temporárias é direito previsto na lei, no artigo 122 e seguintes da Lei de Execução Penal, que garante a todo condenado que possui bom comportamento, independente do crime cometido, pois de acordo com a Constituição em seu artigo 5º “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”.
Dessa forma, por força da lei, a Suzane possui o direito de obter o benefício da saída temporária, como qualquer outro preso, independentemente de ter matado seus pais.
A notícia dessa concessão a condenada trouxe novamente à tona a comoção social vivida na época do crime e com isso a mídia teve muita matéria para tratar a respeito do assunto.
No Programa do Fantástico exibido em 08.05.2016, na emissora de TV Globo, a matéria para a chamada de capa do programa tinha os seguintes dizeres “Suzane engana a justiça: Ela deu endereço falso para obter o benefício da saída temporária”.
A ideia aqui não é julgar se Suzane fez certo ou errado em mentir sobre o tal endereço, mas sim saber se cabe a mídia fazer tal investigação paralela para descobrir tal fato. Além disso, quantas outras pessoas já utilizaram as mesmas táticas e outras ainda continuarão utilizando para obter o mesmo benefício, sem ao menos serem descobertas e muito menos investigadas pela mídia através de investigações paralelas.
Mas essas pessoas não são e jamais serão investigadas por qualquer meio de comunicação, pois elas nem de longe são tão “famosas” quanto Suzane Von Richthofen.
5.3 Caso não midiático
Vanderlei Domingues Gonçalves, vulgo “Foquinha” ou ainda “Nem” de vinte e seis anos de idade é acusado de arquitetar, planejar e colocar em prática junto a seu amigo Wanderson Oliveira Eduardo, vulgo “Manin” e “Maninho”, o assassinato de seu pai. (ALERTA RONDONIA, 2015).
Na noite do dia 18 de janeiro de 2014, Antônio Gonçalves foi assassinado, na cidade de Jaru no Estado de Rondônia. Após toda a investigação a polícia concluiu que o próprio filho Vanderlei teria contratado os serviços de Wanderson para exterminar o próprio pai, com o único intuito de ficar e usufruir da herança.
Na denúncia não restou dúvida de que ambos agiram juntos para matar o Sr. Antônio com a exclusiva motivação que objetivava receber a Herança. O Judiciário acatou toda a denuncia e resolveu pronunciar os réus a fim de serem submetidos ao julgamento pelo Tribunal do Júri.
Ambos os réus foram presos ainda no ano de 2014, precisamente desde o mês de julho e de lá não saíram mais até serem devidamente absolvidos pelo Conselho de Sentença.
Aqui existe um parêntese a ser feito, para o polícia não restou qualquer duvida de que os acusados arquitetaram e mataram o Antônio por motivo torpe, mas destaca-se que os meios de comunicação não apareceram nesse caso em nenhum minuto, não teve comoção populacional, ninguém quis assistir o Júri, não teve bagunça e muito menos qualquer tipo de exposição dos réus.
No julgamento realizado no Tribunal do Júri em meados de novembro de 2015, o Ministério Publico, entendeu não haver provas suficientes para imputar a autoria do delito aos acusados e pediu a absolvição. A dupla, Vanderlei e Wanderson, foram absolvidos pelo corpo de Jurados.
Aqui, foi aplicado o Princípio in dubio pro reo, ou seja, na duvida decidiu-se pelo réu, é o que foi feito, como segundo o Ministério Publico, não existiam provas para incriminar os réus ambos foram absolvidos.
Verifica-se, nesse caso, que em momento algum a mídia apareceu para contar a história do crime, para fazer reconstituições e muito menos para transformar os suspeitos em acusados. Para a imprensa, nesse caso restou somente uma notinha bem pequena onde relata o caso e absolvição dos acusados, no jornal local da região, Jarú Noticia com publicação em 11.11.2015.
Paira uma dúvida nesse caso, será que se existisse mídia presente e forte comoção populacional a decisão dos Jurados seria a mesma, trata-se de uma pergunta sem resposta.
O fato é que o Vanderlei Domingues, atualmente, é uma das partes de uma ação de Inventário que tramita em Rondônia para divisão da herança de seu pai, Antônio Gonçalves, morto naquele dia de 18 de janeiro de 2014.
Se Vanderlei Domingues Gonçalves junto a seu amigo Wanderson Oliveira Eduardo matou ou não seu pai é uma incógnita que talvez, jamais será descoberta, o fato é que o Antônio Gonçalves, esta morto desde o ano de 2014 e os únicos suspeitos do crime foram absolvidos pelo Conselho de Sentença, onde sua decisão possui a proteção constitucional do Princípio da Soberania dos Veredictos.