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Regramento e tratamento dos honorários periciais médicos no Direito Processual do Trabalho: atualidades e possibilidades futuras

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Resumo:


  • Antes da Emenda Constitucional nº 45/2004, as perícias no processo do trabalho eram limitadas a questões de insalubridade, periculosidade e cálculos de sentenças;

  • A realização de perícias médicas tornou-se mais comum na Justiça do Trabalho após alterações normativas e jurisprudenciais;

  • A remuneração dos peritos médicos é feita através de honorários periciais, sendo a responsabilidade pelo pagamento atribuída à parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, salvo se beneficiária da Justiça Gratuita.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Em geral, os Juízes determinam a realização de perícias nas ações que versam sobre acidentes do trabalho e sobre doenças ocupacionais, salvo em situações excepcionais. Analisa-se neste artigo o regramento e tratamento do tema dos honorários periciais pela legislação vigente, pelo projeto de reforma trabalhista e pela jurisprudência.

1.    Breve Histórico

Até a promulgação da Emenda Constitucional nº 45/2004, as perícias no processo do trabalho resumiam-se, geralmente, àquelas destinadas à constatação do labor em condições de insalubridade ou periculosidade e à liquidação (cálculo) de sentenças.

Diante dessa realidade e da própria característica de simplicidade do processo do trabalho, inexiste um regramento detalhado da atividade pericial e da remuneração dos peritos na legislação trabalhista.

Há referências à atuação e remuneração de peritos: (1) no art. 195, § 2, da CLT, que determina a produção da prova pericial quando debatida a existência de insalubridade e/ou periculosidade em juízo; (2) nos arts. 852-H, § 4º, e 3º da Lei nº 5.584/70, que prevêem a realização da prova pericial quando necessária, a sua produção por perito único designado pelo Juiz e a possibilidade das partes indicarem assistentes técnicos; (3) nos arts. 789-A, IX, e 879, §, 6º da CLT, que estabelecem que os cálculos de liquidação possam ser realizados por perito ou pelo contador do juízo, bem como o pagamento de custas pelo trabalho deste; (4) nos arts. 827 e 848 da CLT, quando estabelecem a possibilidade de oitiva dos peritos e assistentes técnicos em audiência; e (5) no art. 790-B da CLT, quando prevê a responsabilidade do pagamento dos honorários periciais pela parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, salvo se beneficiária da Justiça Gratuita.

Essa realidade sofreu uma grande alteração com a promulgação da EC nº 45/04 e, principalmente, pela confirmação pelo C. STF da competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar as demandas destinadas à reparação de danos materiais e morais decorrentes de acidentes do trabalho e doenças ocupacionais no julgamento do Conflito de Competência nº 7204 e, posteriormente, pela edição da Súmula Vinculante nº 22:

“CONSTITUCIONAL- COMPETÊNCIA JUDICANTE EM RAZÃO DA MATÉRIA- AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PATRIMONIAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DO TRABALHO, PROPOSTA PELO EMPREGADO EM FACE DE SEU (EX)EMPREGADOR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. ART. 114 DA MAGNA CARTA- REDAÇÃO ANTERIOR E POSTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL N° 45/04. EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PROCESSOS EM CURSO NA JUSTIÇA COMUM DOS ESTADOS. IMPERATIVO DE POLÍTICA JUDICIÁRIA.

Numa primeira interpretação do inciso I do art. 109 da Carta de Outubro, o Supremo Tribunal Federal entendeu que as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho, ainda que movidas pelo empregado contra seu (ex-) empregador, eram da competência da Justiça comum dos Estados-Membros.

2- Revisando a matéria, porém, o Plenário concluiu que a Lei Republicana de 1988 conferiu tal competência à Justiça do Trabalho. Seja porque o art. 114, já em sua redação originária, assim deixava transparecer, seja porque aquela primeira interpretação do mencionado inciso I do art. 109 estava, em boa verdade, influenciada pela jurisprudência que se firmou na Corte sob a égide das Constituições anteriores.

.3. Nada obstante, como imperativo de política judiciária — haja vista o significativo número de ações que já tramitaram e ainda tramitam nas instâncias ordinárias, bem como o relevante interesse social em causa —, o Plenário decidiu, por maioria, que o marco temporal da competência da Justiça trabalhista é o advento da EC 45/04. Emenda que explicitou a competência da Justiça Laborai na matéria em apreço.

4. A nova orientação alcança os processos em trâmite pela Justiça comum estadual, desde que pendentes de julgamento de mérito. É dizer: as ações que tramitam perante a Justiça comum dos Estados, com sentença de mérito anterior à promulgação da EC 45/04, lá continuam até o trânsito em julgado e correspondente execução. Quanto àquelas cujo mérito ainda não foi apreciado, hão de ser remetidas à Justiça do Trabalho, no estado em que se encontram, com total aproveitamento dos atos praticados até então. A medida se impõe, em razão das características que distinguem a Justiça comum estadual e a Justiça do Trabalho, cujos sistemas recursais, órgãos e instâncias não guardam exata correlação.

5. O Supremo Tribunal Federal, guardião-mor da Constituição Republicana, pode e deve, em prol da segurança jurídica, atribuir eficácia prospectiva às suas decisões, com a delimitação precisa dos respectivos efeitos, toda vez que proceder a revisões de jurisprudência definidora de competência ex ratione materiae. O escopo é preservar os jurisdicionados de alterações jurisprudenciais que ocorram sem mudança formal do Magno Texto.

6. Aplicação do precedente consubstanciado no julgamento do Inquérito 687, Sessão Plenária de 25.08.99, ocasião em que foi cancelada a Súmula 394 do STF, por incompatível com a Constituição de 1988, ressalvadas as decisões proferidas na vigência do verbete. 

7. Conflito de competência que se resolve, no caso, com o retorno dos autos ao Tribunal Superior do Trabalho.” (CC 7204, Relator Ministro Ayres Britto, Tribunal Pleno, julgamento em 29/06/2005, DJ de 09/12/2005).

SÚMULA VINCULANTE Nº 22. “A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho propostas por empregado contra empregador, inclusive aquelas que ainda não possuíam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação da Emenda Constitucional nº 45/04.”

Embora já houvesse atuação de peritos médicos em demandas em que se discutia, principalmente, se o trabalhado ocorria em condições de insalubridade, essa nova realidade normativa causou uma alteração significativa do perfil dos processos que tramitam na Justiça do Trabalho e tornou as perícias médicas muito mais comuns.


2.    Obrigatoriedade da Perícia Médica

Embora inexista previsão legal expressa de obrigatoriedade das perícias nas ações que versam sobre acidentes do trabalho e sobre doenças ocupacionais, salvo em situações excepcionais, a realização da perícia médica é obrigatória.

Isto porque, conforme Mauro Schiavi:

“(...) o juiz é um técnico em direito, habilitado, como regra geral, em concurso público. Como o processo é destinado à composição de litígios dos mais diversos campos do conhecimento humano, muitas vezes, a controvérsia dos autos exige análise de questões técnicas que refogem à órbita jurídica, necessitando o juiz de profissionais especializados na matéria discutida no processo. Para dirimir a controvérsia técnica do processo, o juiz se vale da prova pericial.” (SCHIAVI, 2016, p. 772).

Assim, o art. 156 do CPC, aplicável ao processo do trabalho, estabelece que “o juiz será assistido por perito quando a prova do fato depender de conhecimento técnico ou científico”.

Nas ações que versam sobre acidentes do trabalho e doenças ocupacionais na Justiça do Trabalho, normalmente, há necessidade de diagnosticar a existência de doença e de definir os órgãos atingidos, a existência de restrição da capacidade funcional (e de sua extensão) e as causas do surgimento e/ou agravamento da enfermidade. Conforme o disposto no art. 4º, XII e XIII, da Lei nº 12.842/2013, tais diagnósticos e avaliações são privativas de médicos, concluindo-se que a perícia médica é essencial para a solução deste tipo de controvérsia.

A prova pericial pode ser realizada por perito (externo) nomeado pelo juízo (arts. 852-H, § 4º, da CLT, 3º da Lei nº 5.584/70 e 465 do CPC), por servidor concursado integrante do quadro de pessoal do Poder Judiciário ou por órgão público conveniado (art. 95, I, do CPC).

Um exemplo de órgão público conveniado, no Estado de São Paulo, é o Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo – IMESC que realizou diversas perícias no âmbito de processos deslocados para a competência da Justiça do Trabalho com a EC nº 45/04 e a Súmula Vinculante nº 22 do C. STF.

Todavia, com a aprovação do Parecer nº 361/2008 da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (disponível em http://www.imesc.sp.gov.br/), o IMESC deixou de atuar nas demandas em trâmite na Justiça do Trabalho.

Assim, como inexiste quadro próprio de peritos médicos no Eg. Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região – TRT15 e não se tem notícia de sua existência nos quadros funcionais de outros TRT’s, tais provas periciais passaram a ser realizadas unicamente por médicos nomeados pelos juízes das Varas do Trabalho.


3.    Remuneração dos Peritos Médicos

Como se tratam de profissionais externos ao quadro de servidores do Judiciário e que atuam, conforme Título IV do CPC, como Auxiliares da Justiça, a legislação previu a sua remuneração mediante pagamento de honorários periciais.

É interessante ressaltar que o termo “honorários” é utilizado para designar a forma de retribuição do profissional liberal por serviço específico dentro de sua especialidade, bem como que podem se dividir em honorários contratuais, decorrentes de contrato firmado com o cliente, e legais/processuais, decorrentes da atuação (ou vitória do cliente assistido, no tocante aos honorários advocatícios) em processo administrativo ou judicial.

 Em relação aos médicos que atuam em feitos que tramitam na Justiça do Trabalho, os honorários contratuais seriam aqueles devidos pela parte ao assistente técnico de sua confiança e os processuais/legais, aqueles devidos pela atuação de perito nomeado pelo juízo (honorários periciais).

Ambos estão situados dentro do conceito de despesas processuais, sendo relevante ressaltar o entendimento consolidado na Súmula nº 341 do C. TST:

HONORÁRIOS DO ASSISTENTE TÉCNICO. A indicação do perito assistente é faculdade da parte, a qual deve responder pelos respectivos honorários, ainda que vencedora no objeto da perícia.

Portanto, no processo do trabalho, o assistente técnico é remunerado apenas pelo valor ajustado diretamente com a parte e esta não poderá ser ressarcida, ainda que venha a vencer na pretensão objeto da perícia judicial.

Em relação aos honorários periciais, como não há previsão legal de valores (e nem seria razoável que existisse), esses são fixados pelos Juízes considerando-se a qualidade do trabalho, a complexidade da matéria, o grau de zelo profissional, o lugar e o tempo exigidos para a prestação dos serviços, as peculiaridades regionais e o cumprimento dos prazos fixados (art. 3º da Resolução nº 66/2010 do CSJT).

Conforme informações levantadas no Fórum de São José dos Campos/SP, o valor dos honorários totais fixados pelos 10 Juízes do Trabalho Titulares e Auxiliares Fixos em atuação representa uma média de R$ 3.115,00.

Em breve pesquisa da jurisprudência das Câmaras do Eg. TRT15 no julgamento de recursos que postulavam a redução dos valores de honorários periciais fixados em sentenças, foi constatada uma média de R$ 2.833,33, destacando que há diversos acórdãos que registram entendimentos colegiados de ser o valor de R$ 2.000,00 razoável para o trabalho desempenhado pelos peritos médicos (Processos nº 434-10.2011.5.15.0115, 26000-66.2009.5.15.0135, 1582-54.2011.5.15.0051, 349-89.2013.5.15.0103, 2722-77.2013.5.15.0076 e 11684-21.2014.5.15.0152).

Como o valor dos honorários periciais é fixado conforme uma avaliação do laudo pericial pelos magistrados, é importante destacar o disposto no art. 473 do CPC:

“Art. 473. O laudo pericial deverá conter:

I - a exposição do objeto da perícia;

II - a análise técnica ou científica realizada pelo perito;

III - a indicação do método utilizado, esclarecendo-o e demonstrando ser predominantemente aceito pelos especialistas da área do conhecimento da qual se originou;

IV - resposta conclusiva a todos os quesitos apresentados pelo juiz, pelas partes e pelo órgão do Ministério Público.”

Conforme Nelson Nery Júnior, esse dispositivo:

 “(...) inova ao expor de forma clara quais os requisitos que devem constar do laudo pericial. Pode-se mesmo dizer que esse dispositivo cria uma metodologia para que o perito exponha seu raciocínio. Os incisos que compõem o caput do CPC 473 indicam os capítulos que devem constituir o documento, os quais, por sua vez, permitirão ao juiz analisar a situação envolvida de forma clara e decidir com tranqüilidade.” (NERY JÚNIOR, 2016, p. 1190).

Em relação às perícias médicas realizadas em feitos em que se discute a existência de acidentes do trabalho e de doenças ocupacionais, as informações consideradas essenciais e que devem ser devidamente embasadas por exames clínicos, análise da documentação disponibilizada, vistorias e referência a bibliografia atualizada, são: (1) a existência de enfermidade; (2) se a enfermidade provoca perda total ou parcial da capacidade funcional do empregado (indicando-se o percentual de redução da capacidade funcional); (3) se a redução funcional é permanente ou provisória; (4) se há possibilidade de atuação do empregado em função adaptada e as condições para a readaptação; (5) se há nexo causal ou concausal entre a eclosão ou o agravamento da enfermidade e a prestação de serviços à(s) reclamada(s); e (6) a existência de fatores extra laborais que tenham causado ou concorrido para a eclosão ou agravamento da enfermidade.


4.    Responsabilidade pelo Pagamento dos Honorários Periciais

Em relação à responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais e o momento em que devem ser pagos, o art. 790-B da CLT, com redação dada pela Lei nº 10.537/2002, estabelece que:

“A responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, salvo se beneficiária de justiça gratuita.”

A responsabilidade final pelo pagamento dos honorários periciais está vinculada, portanto, à derrota da parte (sucumbência) em relação às pretensões que foram objeto da perícia.

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Como a cumulação de pedidos é comum nas reclamações trabalhistas, deve-se enfatizar que a sucumbência que gera a obrigação de pagamento dos honorários periciais é apenas aquela referente à pretensão que dependia da prova pericial. Assim, se um empregado postula adicional de insalubridade e horas extras e a sentença somente lhe defere horas extras (sucumbência parcial), ele será responsável pelo pagamento de honorários periciais. Ainda relembra Homero Silva que “pode até haver duas perícias no mesmo processo (uma de adicional de insalubridade e outra médica, por exemplo) e cada parte ter de arcar com as despesas de uma delas, de acordo com os resultados” (SILVA, 2010, p. 121).

 Também se deve enfatizar que a conclusão pericial e a decisão final podem ser distintas (laudo positivo e sentença negativa ou vice-versa). Isto porque, o art. 479 do CPC dispõe que:

“O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito.”

Conforme Daniel Neves, o sistema de valoração das provas adotado pelo direito processual brasileiro é o da persuasão racional, o que “significa dizer que não existem cargas de convencimento preestabelecidas dos meios de prova, sendo incorreto afirmar abstratamente que determinado meio de prova é mais eficaz no convencimento do juiz do que outro” (NEVES, 2016, p. 733).

Como a decisão contrária à conclusão pericial é algo que certamente não se espera no processo, a doutrina ressalta a necessidade de o juiz indicar expressamente na fundamentação da sentença os motivos pelos quais não adotou a conclusão pericial, com a indicação dos problemas que identificou no laudo e/ou das outras provas que entendeu suficientes à formação de seu convencimento (NEVES, 2016, p. 733/734; SCHIAVI, 2016, p. 778).

Assim, “o encargo recai sobre o sucumbente na pretensão (ou seja, depois de julgado o pedido e escoados os recursos) e não sobre o sucumbente no parecer pericial” (SILVA, 2010, p. 122).

Uma questão controvertida que surge dessa conclusão reside na responsabilidade e no efetivo pagamento dos honorários periciais quando a parte que sucumbir for beneficiária da Justiça Gratuita.

A doutrina registra que:

“(...) a jurisprudência escapava desse assunto espinhoso, afirmando que os benefícios da justiça gratuita abrangiam as custas, mas não os honorários periciais, porque aquelas eram destinadas aos cofres públicos (capazes de oferecer a isenção a expensas dos tributos arrecadados de outras fontes), enquanto estes são destinados ao particular, que atua em colaboração com o juízo (e o particular não pode auferir sua renda)” (SILVA, 2010, p. 122).

Mas condenação do beneficiário da Justiça Gratuita passou a estar vedada pelo texto do art. 790-B da CLT, devendo-se ressaltar que, na prática, seria inócua, porque dificilmente se conseguiria executar os valores dos honorários periciais do considerado juridicamente hipossuficiente.

Como as reclamações que tramitam na Justiça do Trabalho são, normalmente, ajuizadas por ex-empregados e beneficiários da Justiça Gratuita, a possibilidade de não recebimento dos honorários periciais gerava a dúvida de “como fica a lisura da perícia diante da iminência de não remuneração dos honorários do profissional liberal?” (SILVA, 2010, p. 123).

Para solucionar a questão, firmou-se jurisprudência no sentido de responsabilizar o Estado pelo pagamento dos honorários periciais devidos pelo beneficiário da Justiça Gratuita, porque a Constituição Federal assegura o pleno acesso à Justiça e obriga o Estado a prestar assistência judiciária integral e gratuita às pessoas carentes (art. 5º, XXXV e LXXIV, da CF/88).

Para operacionalizar tais pagamentos no âmbito da Justiça do Trabalho foi editada a Resolução nº 35/2007 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho – CSJT que, posteriormente, foi revogada pela Resolução nº 66/2010 do mesmo CSJT, transcrita (em sua redação vigente) para facilitar a compreensão do tema:

“Regulamenta, no âmbito da Justiça do Trabalho de primeiro e segundo graus, a responsabilidade pelo pagamento e antecipação de honorários do perito, do tradutor e do intérprete, no caso de concessão à parte do benefício de justiça gratuita.

O PRESIDENTE DO CONSELHO SUPERIOR DA JUSTIÇA DO TRABALHO, no uso de suas atribuições regimentais,

Considerando o princípio constitucional de acesso dos cidadãos ao Poder Judiciário e o dever do Estado de prestar assistência judiciária integral e gratuita às pessoas carentes, conforme disposto nos incisos XXXV, LV e LXXIV do artigo 5º da Constituição Federal;

Considerando o direito social do trabalhador à redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (inciso XXII, art. 7º, da Constituição Federal);

Considerando a ampliação da competência material da Justiça do Trabalho, determinada pela Emenda Constitucional nº 45/2004, bem como a necessidade de prova pericial, principalmente nos casos em que se discute indenização por dano moral, dano material, doença profissional, acidente de trabalho, insalubridade ou periculosidade;

Considerando o artigo 790-B da Consolidação das Leis do Trabalho que dispõe que “a responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, salvo se beneficiária de justiça gratuita”;

Considerando a existência de rubrica orçamentária específica destinada a despesas resultantes da elaboração de laudos periciais, em processos que envolvam pessoas carentes;

Considerando a necessidade de regulamentar o pagamento de honorários periciais no âmbito da Justiça do Trabalho de 1ª e 2ª Instâncias, de modo a serem uniformizados os procedimentos atinentes à matéria;

Considerando as decisões proferidas nos autos dos processos nos CSJT-268/2006-000-90-00.4 e CSJT-2012616-70.2008.5.00.0000,

RESOLVE:

Regulamentar, no âmbito da Justiça do Trabalho de primeiro e segundo graus, a responsabilidade pelo pagamento e antecipação de honorários do perito, do tradutor e do intérprete, no caso de concessão à parte do benefício de justiça gratuita, nos termos da presente Resolução.

Art. 1º Os Tribunais Regionais do Trabalho deverão destinar recursos orçamentários para:

I - o pagamento de honorários periciais, sempre que à parte sucumbente na pretensão for concedido o benefício da justiça gratuita;

II - o pagamento de honorários a tradutores e intérpretes, que será realizado após atestada a prestação dos serviços pelo juízo processante, de acordo com a tabela constante do Anexo.

§ 1º Os valores serão consignados sob a rubrica “Assistência Judiciária a Pessoas Carentes”, em montante estimado que atenda à demanda da Região, segundo parâmetros que levem em conta o movimento processual.

§ 2º O juiz poderá ultrapassar em até 3 (três) vezes os valores fixados na tabela constante do Anexo, observados o grau de especialização do tradutor ou intérprete e a complexidade do trabalho, comunicando-se ao Corregedor do Tribunal.

Art. 2º A responsabilidade da União pelo pagamento de honorários periciais, em caso de concessão do benefício da justiça gratuita, está condicionada ao atendimento simultâneo dos seguintes requisitos:

I – fixação judicial de honorários periciais;

II – sucumbência da parte na pretensão objeto da perícia;

III – trânsito em julgado da decisão.

§ 1º A concessão da justiça gratuita a empregador, pessoa física, dependerá da comprovação de situação de carência que inviabilize a assunção dos ônus decorrentes da demanda judicial.

§ 2º O pagamento dos honorários poderá ser antecipado, para despesas iniciais, em valor máximo equivalente a R$ 350,00 (trezentos e cinqüenta reais), efetuando-se o pagamento do saldo remanescente após o trânsito em julgado da decisão, se a parte for beneficiária de justiça gratuita.

§ 3º No caso de reversão da sucumbência, quanto ao objeto da perícia, caberá ao reclamado-executado ressarcir o erário dos honorários periciais adiantados, mediante o recolhimento da importância adiantada em GRU – Guia de Recolhimento da União, em código destinado ao Fundo de “assistência judiciária a pessoas carentes”, sob pena de execução específica da verba. (NR)

Art. 3º Em caso de concessão do benefício da justiça gratuita, o valor dos honorários periciais, observado o limite de R$ 1.000,00 (um mil reais), será fixado pelo juiz, atendidos:

I – a complexidade da matéria;

II – o grau de zelo profissional;

III – o lugar e o tempo exigidos para a prestação do serviço;

IV – as peculiaridades regionais.

Parágrafo único. A fixação dos honorários periciais, em valor maior do que o limite estabelecido neste artigo, deverá ser devidamente fundamentada.

Art. 4º Havendo disponibilidade orçamentária, os valores fixados nesta Resolução serão reajustados anualmente no mês de janeiro, com base na variação do IPCA-E do ano anterior ou outro índice que o substitua, por ato normativo do Presidente do Tribunal.

Art. 5º O pagamento dos honorários efetuar-se-á mediante determinação do presidente do Tribunal, após requisição expedida pelo Juiz do feito, observando-se, rigorosamente, a ordem cronológica de apresentação das requisições e as deduções das cotas previdenciárias e fiscais, sendo o valor líquido depositado em conta bancária indicada pelo perito, tradutor ou intérprete.

Parágrafo único. O valor dos honorários será atualizado pelo IPCAE ou outro índice que o substitua, a partir da data do arbitramento até o seu efetivo pagamento.

Art. 6º As requisições deverão indicar, obrigatoriamente: o número do processo e o nome das partes; o valor dos honorários, especificando se de adiantamento ou se finais; o número da conta bancária para crédito; natureza e característica da atividade desempenhada pelo auxiliar do Juízo; declaração expressa de reconhecimento, pelo Juiz, do direito à justiça gratuita; certidão do trânsito em julgado e da sucumbência na perícia, se for o caso; e o endereço, telefone e inscrição no INSS do perito, tradutor ou intérprete. (Art. 6° com redação dada pela Resolução nº 115, de 28 de setembro de 2012)

Art. 7º Os Tribunais Regionais do Trabalho poderão manter sistema de credenciamento de peritos, tradutores e intérpretes para fins de designação, preferencialmente, de profissionais inscritos nos órgãos de classe competentes e que comprovem sua especialidade na matéria sobre a qual deverão opinar, a ser atestada por meio de certidão do órgão profissional a que estiverem vinculados.

Art. 8º As Presidências de Tribunais Regionais do Trabalho ficam autorizadas a celebrar convênios com instituições com notória experiência em avaliação e consultoria nas áreas de Meio Ambiente, Promoção da Saúde, Segurança e Higiene do Trabalho, e outras, capazes de realizar as perícias requeridas pelos Juízes.

Art. 9º O pagamento dos honorários está condicionado à disponibilidade orçamentária, transferindo-se para o exercício financeiro subseqüente as requisições não atendidas.

Art. 10. Nas ações contendo pedido de adicional de insalubridade, de periculosidade, de indenização por acidente do trabalho ou qualquer outro atinente à segurança e saúde do trabalhador, o Juiz poderá determinar a notificação da empresa reclamada para trazer aos autos cópias dos LTCAT (Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho), PCMSO (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional) e PPRA (Programa de Prevenção de Riscos Ambientais), e de laudo pericial da atividade ou local de trabalho, passível de utilização como prova emprestada, referentes ao período em que o reclamante prestou serviços na empresa.

Art. 11. Fica revogada a Resolução n.º 35/2007.

Art. 12. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 10 de junho de 2010.

Ministro MILTON DE MOURA FRANÇA

Presidente do Conselho Superior da Justiça do Trabalho.”

Acerca do tema, o C. TST editou a Súmula nº 457 com a seguinte redação:

“HONORÁRIOS PERICIAIS. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. RESPONSABILIDADE DA UNIÃO PELO PAGAMENTO. RESOLUÇÃO Nº 66/2010 DO CSJT. OBSERVÂNCIA. (conversão da Orientação Jurisprudencial nº 387 da SBDI-I com nova redação)

A União é responsável pelo pagamento dos honorários de perito quando a parte sucumbente no objeto da perícia for beneficiária da assistência judiciária gratuita, observado o procedimento disposto nos arts. 1º, 2º e 5º da Resolução n.º 66/2010 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho – CSJT.”

Basicamente, disciplinou-se o uso de verbas orçamentárias destinadas aos Tribunais para o pagamento dos honorários periciais devidos por beneficiários da Justiça Gratuita.

Como se tratam de recursos públicos e que dependem de disponibilidade orçamentária, fixaram-se os limites de R$ 1.000,00 para os honorários totais e R$ 350,00 para antecipação de despesas.

No âmbito do Eg. TRT15, conforme Comunicado GP nº 01/2015, os valores máximos foram fixados em R$ 806,00 para honorários totais e R$ 282,00 para despesas iniciais. As requisições de pagamentos são realizadas pelos magistrados em campo específico da extranet do Tribunal e os valores são transferidos diretamente para as contas bancárias dos peritos.

Embora tais regramentos representem grande avanço em relação à sistemática anterior, a grande diferença de valores que podem ser pagos conforme o resultado do laudo pericial não afasta questionamentos acerca da lisura do trabalho dos peritos.

Em 2016, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal deflagraram a “Operação Hipócritas” que investiga casos de corrupção e falsas perícias realizadas no âmbito de processos que tramitam e tramitaram nas Varas do Trabalho do Eg. TRT15 e, em comunicado à imprensa, o Procurador da República Fausto Kozo Kosaka, que coordenava a investigação, destacou que:

“a atual sistemática de atuação e de remuneração de peritos na Justiça do Trabalho estabelece um cenário que prejudica a imparcialidade dos laudos periciais e fomenta a prática de delitos como os investigados nesta operação.

(...)

A forma de remuneração do perito judicial é outro problema, avalia o procurador. Se o perito judicial apresenta um laudo totalmente favorável à empresa, o juiz determina que o trabalhador pague os honorários periciais. Como o trabalhador geralmente é beneficiário de justiça gratuita, os honorários são custeados pelo Poder Judiciário, em cerca de R$ 700,00 a R$ 1.500,00, a serem pagos mediante requisição de pagamento e o perito pode levar até 2 (dois) anos para receber o valor.

Por outro lado, se o perito judicial apresenta um laudo totalmente favorável ao trabalhador, o juiz determina que a empresa pague os honorários periciais, geralmente fixados entre R$ 2.000,00 a R$ 5.000,00, e recebidos pelo perito, à vista, no final do processo. Muitos peritos aceitaram a propina como ‘compensação’ entre o valor que receberia da Justiça e o que poderia receber da empresa caso emitisse um laudo isento e a parte processada fosse condenada.” (http://www.mpf.mp.br/sp/sala-de-imprensa/noticias-sp/operacao-hipocritas-mpf-revela-fraudes-em-pericias-medicas-em-campinas-e-sao-paulo. Acesso em 25/08/2017).

Portanto, sem emitir qualquer juízo de valor, tal distinção de valores é considerada por órgãos estatais de repreensão criminal como fator facilitador de apresentação de laudos com constatações e conclusões falsas. Portanto, o sistema de remuneração dos peritos gera contradições e merece ser repensado.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAMPOS, Rogério Princivalli Costa. Regramento e tratamento dos honorários periciais médicos no Direito Processual do Trabalho: atualidades e possibilidades futuras. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5183, 9 set. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60074. Acesso em: 23 dez. 2024.

Mais informações

Este artigo foi elaborado para subsidiar palestra proferida no painel “Honorários Periciais – suas Distorções e o Vínculo à Sucumbência” integrante da I Jornada de Perícia Médica do Vale do Paraíba realizada pela Associação Brasileira de Medicina Legal e Perícias Médicas – Regional de São Paulo – ABMLPM/SP em 26/08/2017.

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