Resumo: Esta pesquisa trata do real valor do inquérito policial para com o processo penal. Num primeiro momento, após a conceituação do procedimento policial, é descrito um breve estudo do órgão competente a tal investigação, a Polícia Judiciária, qualificando-a e desdobrando competências. Logo após, é esclarecido sobre os procedimentos adotados neste tão polêmico poder investigatório, como também acerca das formas de instauração do inquérito e seu valor probatório. Em seguida, apresentar-se-á uma triagem de determinadas garantias constitucionais, as quais constituem suposto duelo no referido procedimento administrativo, mas de valor fundamental ao processo. Finalizando, verifica de que forma os direitos e garantias fundamentais – precipuamente o contraditório e a ampla defesa – vão intervir no procedimento pré-processual. Assim, busca-se demonstrar qual a importância do inquérito para com o processo penal, seja como alicerce à propositura da ação penal, seja como diretriz na condução dos trabalhos, auxiliando, sobremaneira, ao convencimento do juiz quando da sentença.
Palavras-chave:Investigação; inquérito; princípios; provas; processo.
INTRODUÇÃO
Este trabalho buscará informar noções basilares que norteiam o inquérito policial para demonstrar sua inegável importância ao processo-crime. Isso porque, não raro, o caderno investigativo é a base para a persecução penal em juízo, se não verdadeira diretriz aos trabalhos elaborados por acusação e defesa, assim como ao julgador do feito.
Para tanto, principia discorrendo acerca da formação do conceito do procedimento investigativo desenvolvido pela Polícia Judiciária à apuração de delitos, análise acerca desta instituição – um rápido estudo de seu significado, o objetivo perante o Estado, o responsável à sua condução e referidas competências, além dos procedimentos realizados em adequação a amparos constitucionais que possui o investigado –, somando-se com as formas de sua instauração e o entendimento doutrinário e jurisprudencial de seu valor probatório. Em seguida, discorrer-se-á sobre os princípios constitucionais principais inseridos no processo penal e sua incidência no inquérito policial, em especial no concernente ao contraditório e a ampla defesa.
Encerra-se apresentando os pontos conclusivos, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre o mérito do inquérito policial ao processo criminal.
INQUÉRITO POLICIAL: NOÇÕES GERAIS
O inquérito policial é o conjunto de diligências realizadas pela Polícia Judiciária para a apuração de uma infração penal e de sua autoria, a fim de que o titular da ação penal possa ingressar em juízo (CAPEZ, 2006, p. 72).
Surgiu com tal denominação em 20 de setembro de 1871, pela Lei n.º 2.033, regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 2.824 em seu art. 42. Mehmeri (1992, p. 03), porém, salienta que “desde a remota Antiguidade, sempre houve o processo investigatório para apuração dos delitos, suas circunstâncias e seus autores”, e que, antes de sua denominação como a conhecemos hoje, “havia lei disciplinando os trabalhos de investigação policial dos crimes”. De fato, segundo a Lei n.º 261, de 03 de dezembro de 1841, as autoridades policiais deveriam “remeter, quando julgarem conveniente, todos os dados, provas e esclarecimentos que houverem obtido sobre um delito, com uma exposição do caso e das circunstâncias, aos juízes competentes, a fim de formarem a culpa” (MEHMERI, 1992, p. 03). Atualmente, encontra respaldo no Código de Processo Penal de 1941, sendo, na lição de Reis e Gonçalves (1999, p. 05), “um procedimento investigatório prévio, constituído por uma série de diligências, cuja finalidade é a obtenção de provas para que o titular da ação penal possa propô-la contra o autor da infração penal (CPP, art. 4.º)”.
Como se verá adiante, mesmo não sendo o único procedimento de averiguação à disposição nas leis, o inquérito policial é o mais conhecido e, muitas vezes, auxiliado pelo poder das mídias escritas, faladas e televisionadas, a única gênese de qualquer procedimento de investigação, destinando-se à apuração de infrações penais e sua autoria. Capez, citado por Reis e Gonçalves (1999, p. 64), descreve:
É instaurado pela autoridade policial que tem como destinatários imediatos o Ministério Público, titular exclusivo da ação penal pública (CF, art. 120, inciso I), e o querelante, titular da ação penal privada (CPP, art. 30); como destinatário mediato tem o juiz, que se utilizará dos elementos de informação nele constantes, para o recebimento da peça inicial e para formação do seu convencimento quanto à necessidade de decretação de medidas cautelares.
De fato, baseado nas informações contidas no inquérito policial, na maioria dos casos, é que o Ministério Público oferece a denúncia, pois através dele que se tem provada a justa causa, como legisla a Constituição Federal ao dizer ser atribuição do parquet promover, privativamente, a ação penal pública (art. 129, I) e requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais (art. 129, VIII). Aliás, cumpre o inquérito, segundo lição de Lopes Junior (2002, p. 46), função de verdadeiro filtro processual contra acusações infundadas, servindo como elo de ligação entre a investigação preliminar e o processo ou o não-processo. No mesmo sentido, Moraes (1999, p. 259), in verbis:
É um procedimento básico para a ação penal, pois, tratando-se de peça que carreira os elementos suficientes para a denúncia, não pode o Ministério Público dele prescindir para tal mister (embora alguns “doutrinadores”, desavisados, procurem argumentar ao contrário, com exceções), quando a realidade jurídico-forense mostra que mais de 95% (noventa e cinco) dos processos criminais nasceram de inquéritos bem feitos, número que só veio a diminuir recentemente, com a Lei 9.099/95 (art. 77, § 1.º).
Conclui-se, portanto, ser o inquérito policial – primeiro instituto do processo penal, disciplinado entre os arts. 4.º a 23 do CPP – um procedimento preliminar, discricionário (pois não está adstrito a normas do processo em geral, por isso também extrajudicial) e preparatório à ação penal, sendo instaurado pela Polícia Judiciária com a finalidade de apurar a infração penal e sua respectiva autoria, sendo considerado como a primeira fase da persecutio criminis, completada pela fase em juízo. No dizer sintético de Tourinho Filho (1993, p. 02), “nada mais é do que um conjunto de informações sobre a prática da infração, isto é, sobre o fato infringente da norma e a respectiva autoria”.
POLÍCIA JUDICIÁRIA
O procedimento conceituado retro é confeccionado pela Polícia Civil – e também pela Polícia Federal, a depender da competência, como adiante será analisado. Para Mirabete (2002, p. 88), pelo fato de a Constituição Federal atribuir à Polícia Civil as atribuições da polícia judiciária e apuração das infrações penais, costuma-se confundir a nomenclatura da Polícia Civil e da Polícia Federal, chamando-as de Polícia Judiciária, o que se afigura apenas como uma de suas funções. Contudo, neste trabalho, ao se ler Polícia Judiciária estaremos tratando das Polícias Civil e Federal. Tal se faz necessário a fim de não abarcar a definição as duas espécies de polícias, civil e militar, com funções bem diferenciadas. Capez (2006, p. 72-3), inclusive, faz a divisa, ao ensinar que a Polícia Judiciária tem caráter repressivo, atuando quando os fatos que a Polícia de Segurança (ou administrativa) visava prevenir não puderam ser evitados, ou ainda, quando sequer foram imaginados por esta. Somando-se a isso, a Polícia Judiciária só é exercida por autoridades policiais (art. 4.º, do CPP), o que não exclui a atuação de outras autoridades, que são denominadas como “administrativas” (art. 4.º, Parágrafo único, do CPP). A autoridade policial para fins de exercício da Polícia Judiciária é o delegado de polícia de carreira (art. 144, § 4.º, CF).
Dentro de seu mister, os indícios são colhidos pela Polícia Judiciária, conforme determina o art. 6.º do CPP. Tais indícios somente poderão redundar no indiciamento técnico para, posteriormente, prosseguir-se no processo com a denúncia. A prova indiciária está prevista na legislação pátria, especificamente no CPP em seu art. 239, considerando indício “a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias”. Mas, segundo Pinto (1999, p. 255), a atividade da Polícia Judiciária não se restringe à simples colheita de indícios, afirmando ter por objetivo a busca da verdade real. Quanto à metodologia utilizada pela instituição em busca dessa verdade real, esclarece Lopes Junior (2002, p. 57-9) que é a Polícia Judiciária que determinará as provas técnicas que julgar necessárias, decidindo também quem, como e quando será ouvido – daí derivando seu caráter discricionário, mas jamais arbitrário ou ilegal –, não sendo mero auxiliar, senão a titular (verdadeiro diretor da instrução preliminar), com autonomia para dizer as formas e os meios empregados na investigação e, inclusive, segundo o autor, sem poder afirmar que exista uma subordinação funcional em relação a juízes e promotores. Em teoria, esclarece, a atividade policial é mais célere, não só porque chega mais rápido ao local do delito (está em todos os lugares), senão também porque, ao estar mais próxima à população, conduz a investigação de forma dinâmica. Knecht (2006, p. 32) acrescenta:
As informações testemunhais ocorridas logo após o crime, tendem a ser mais precisas (é mais fácil lembrar-se de algo que aconteceu recentemente, do que alguma coisa que se verificou meses atrás), mais detalhadas, mais isentas (na medida em que não houve a possibilidade de “preparar” a testemunha, quando ela não avaliou friamente a questão, não pensou na necessidade de comparecer em audiência, julgamentos ou submeter-se, quem sabe, a represálias), não podendo esquecer, ainda, a possibilidade de perda de evidência como, por exemplo, o próprio óbito de uma testemunha.
Competência
Cumpre, primeiramente, indicarmos o que diz a Constituição Federal:
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
[...]
§ 1.º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a:
I – apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;
[...]
IV – exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.
[...]
§ 4.º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.
Como supra-analisado e com base na Carta Magna, aos delegados de polícia de carreira cabe a competência para presidir o inquérito policial de acordo com as normas de organização policial dos Estados. Há entendimentos contrários à exclusividade da Polícia Judiciária, atribuída pela Constituição, à Polícia Federal, contudo, o constituinte só reservou a exclusividade quanto à função de Polícia Judiciária da União, e não quanto à apuração de crimes, sobejando as demais competências à Polícia Civil, ressalvada as infrações penais militares, consoante o § 4.º do art. 144 da CF.
Lima (1997, p. 55), ademais, lembra-nos de que exceto o caso da Polícia Federal, quanto à Polícia Judiciária da União, o princípio que rege a atividade policial é o da não-exclusividade, ou seja, admite-se que mais de um órgão apure infrações penais, o que, inclusive, é de interesse público. Capez (2006, p. 76) indica exemplos, a saber:
[...] o inquérito realizado pelas autoridades militares para a apuração de infrações de competência da justiça militar (IPM); as investigações efetuadas pelas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI), as quais terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, e serão criadas pelas Câmaras dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de 1/3 de seus membros, para a apuração de fato determinado, com duração limitada no tempo (CF, art. 58, § 3º); o inquérito civil público, instaurado pelo Ministério Público para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos (CF, art 129, III), e que, eventualmente, poderá apurar também a existência de crime conexo ao objeto da investigação; o inquérito em caso de infração penal cometida na sede ou dependência do Supremo Tribunal Federal (RISTF, art. 43); o inquérito instaurado pela Câmara dos Deputados ou Senado Federal, em caso de crime cometido nas suas dependências, hipótese em que, de acordo com o que dispuser o respectivo regimento interno, caberá à Casa a prisão em flagrante e a realização do inquérito (Súmula 397 do STF). A lavratura de auto de prisão em flagrante presidida pela autoridade judiciária, quando o crime for praticado na sua presença ou contra ela (CPP, art. 307).
Ademais, relembra o mesmo autor, quando surgirem indícios da prática de infração penal por parte de membro da Magistratura ou do Ministério Público no curso das investigações, os autos do inquérito deverão ser remetidos, imediatamente, no primeiro caso, ao tribunal ou órgão especial competente para o julgamento e, no segundo, ao procurador-geral de justiça, a quem caberá dar prosseguimento aos feitos; em sendo o suspeito membro do Ministério Público da União, os autos do inquérito deverão ser enviados ao Procurador-Geral da República (2006, p. 76).
Falando nestes outros tipos de persecução criminal, vem à baila questão concernente à promoção direta das apurações pelo parquet. Lima (1997, p. 84), por exemplo, possui entendimento de que “obviamente, não sendo a Polícia Judiciária detentora de exclusividade na apuração de infrações penais, deflui que nada obsta que o Ministério Público promova diretamente investigações próprias para apuração de delitos”. Todavia, tendo o Ministério Público competência para investigar, encontra, na realidade, dificuldades, como se manifesta Armenta Deu, citada por Lopes Junior (2002, p. 88):
O promotor investiga muito pouco pessoalmente e, na prática, não pode modificar substancialmente o resultado da atuação policial, pois esta já chega concluída – caráter inibitório [...] é uma prática habitual que a investigação recaia, quase exclusivamente, na polícia, limitando-se o promotor a uma mera revisão formal posterior.
Mesmo entendimento tem Costa (1999, p. 218), relatando que ainda mesmo presidindo o inquérito, na atual realidade, o Ministério Público precisa da Polícia Judiciária:
Há atividades tipicamente policiais e muitas vezes imprescindíveis à apuração do crime e da autoria, que não constam das atribuições do MP. Seus membros não foram preparados para ela, não se submetem a provas físicas para ingressar na carreira, não recebem aulas para utilização de armas de fogo. O MP tem poder de requisição, previsto na Constituição e nas leis. Pode investigar, até mesmo em função da titularidade da ação penal de iniciativa pública. Mas precisa da polícia quando necessário abandonar a compreensão intelectual do delito, para alcançar o corpo de delito verificado na realidade.
Tourinho Filho (2005, p. 197) reforça que a distribuição, quanto à competência para dirigir o inquérito policial, seja a seguinte:
Excluída a ressalva feita pelo parágrafo único do art. 4.º do CPP, e deixando de lado os inquéritos extrapoliciais (militar, judicial, parlamentar), a competência para a realização de inquéritos policiais é distribuída a autoridades próprias, de acordo com as normas de organização policial dos Estados. Essas autoridades são em geral Delegados ou Comissários que dirigem as Delegacias de Polícia, e, em se tratando de infrações da alçada da Justiça Comum Federal, a competência é dos Delegados de Polícia Federal, nos termos do art. 144, § 1.º, I, da CF.
Fragoso (2002, p. 224), ademais, registra a impossibilidade do parquet em acumular funções:
Não é possível [...] permitir que o Ministério Público possa acumular as funções de investigador (que a ninguém presta contas), e de instituição encarregada de promover a persecução criminal. Trata-se de um acúmulo perigoso de atribuições, que, sobre ser ilegal e inconstitucional, é absolutamente inconveniente, pois dá lugar, pelo excesso de poder, a abusos intoleráveis.
Capez (2006, p. 109) aponta decisão do STJ, da lavra do relator Ministro Jorge Scartezzini, proferida em 2003, que argumenta ser sabido que, pela Carta Magna, em seu art. 129, I, é atribuição do Ministério Público promover a ação penal pública; tal atividade depende, para seu efetivo exercício, da colheita de elementos que demonstrem a certeza da existência do crime e indícios de que o denunciado é seu autor, assim, entender-se que a investigação desses fatos é atribuição exclusiva da Polícia Judiciária, seria incorrer-se em impropriedade, já que o titular da ação é o Órgão Ministerial. Cabe, portanto, a este, o exame da necessidade ou não de novas colheitas de provas uma vez que, tratando-se o inquérito de peça meramente informativa, pode o acusador entendê-la dispensável na medida em que detenha informações suficientes para a propositura da ação penal. Conclui, dessa forma, que se o inquérito é dispensável, e se o parquet pode denunciar apenas com os elementos que possui, nada há que se imponha a exclusividade às polícias para investigar os fatos criminosos sujeitos à ação penal pública, sendo que o Ministério Público tem competência apenas para requisitar diligências investigatórias e a instauração do inquérito policial e de inquérito policial militar, podendo acompanhá-los; já a expedição de notificações para oitiva de testemunhas e a requisição de documentos fica limitada ao inquérito civil, conforme dispõe o inciso I do mesmo art. 129.
Contudo, o STF, em análise do RE 593727 no final do ano passado, evidencia forte tendência a tornar sólido o entendimento oposto aos acima mencionados, isto é, de que o Ministério Público possa, sim, investigar, atendendo certos parâmetros. No julgamento em questão, o Ministro Luiz Fux esclareceu que não haveria motivo racional para alijar o parquet da condução dos trabalhos que precedem o exercício da ação penal de que é titular. Segundo o douto magistrado, isso milita em favor dos direitos fundamentais do investigado ao evitar, por exemplo, delongas desnecessárias no procedimento prévio de apuração de delitos e assegurar a independência na condução de investigações, especialmente em relação a crimes praticados por policiais; ao Ministro, ademais, os procedimentos investigativos conduzidos pelo Ministério Público devem seguir, no que couber, os preceitos que disciplinam o inquérito policial e os procedimentos administrativos sancionatórios. “O procedimento deve ser identificado, autuado, numerado, registrado, distribuído livremente” e, salvo as exceções constitucionais, “esse procedimento deve ser público” e “deve submeter-se sempre ao controle judicial, devendo haver pertinência do sujeito investigado com a base territorial e com a natureza do fato investigado”. O Ministro Fux prosseguiu registrando que o ato de instauração do procedimento deve formalizar o ato investigativo, delimitando o seu objeto e as razões que o fundamentam. Além disso, a instauração do inquérito deve ser comunicada imediatamente e formalmente aos respectivos chefes do Ministério Público ou Ministério Público Federal e as peças do inquéritos devem ser formalizadas de forma cronológica. “Entendo que seja dever do Ministério Público, no exercício de sua função investigativa, assegurar o pleno conhecimento dos atos de investigação à parte (ao investigado) e a seu advogado”, continuou, acrescentado que o procedimento investigativo deve submeter-se a um prazo e ao controle judicial quanto a seu arquivamento. Além disso, o Ministério Público também deve fundamentar o motivo de a polícia não poder investigar determinado fato. No julgamento, dos oito ministros votantes até sua suspensão, seis foram a favor do mesmo entendimento exarado pelo Ministro Fux[1].
Como se vê, a questão ainda está indefinida.
Voltando à competência da Polícia Judiciária, é ela territorial, portanto, resultante do local onde ocorreu a infração (art. 70 do CPP), se bem possam existir critérios inerentes à natureza do fato, como nos centros populosos, onde a organização policial prorroga o raio de ação de certos delegados para a repressão de determinados ilícitos penais. Mirabete (1995, p. 36) reforça o exposto, informando que essa atribuição é distribuída, de modo geral, de acordo com o lugar onde se consumou a infração (ratione loci), em obediência à lei processual que se refere ao território das diversas circunscrições; embora o CPP se refira aos atos da Polícia Judiciária em suas respectivas circunscrições, não se impede que a autoridade policial investigue uma infração penal cometida em outra, desde que repercuta em sua competência, já que os atos inquisitórios não estão sob a égide do art. 5.º, LIII, da CF, que se refere apenas ao processo pela autoridade judiciária competente.
O CPP, em seus arts. 290 e 308, descreve que a atribuição para a lavratura do auto de prisão em flagrante é da autoridade do lugar em que se efetivou a prisão, devendo os atos subsequentes ser praticados pela autoridade do local em que o crime se consumou. No entanto, Lopes Junior (2002, p. 90) sustenta que os atos praticados pela autoridade policial fora de sua circunscrição não são inválidos, mas com espeque em diferente argumento, qual seja, o de que um ato não é nulo, na medida que este não resulte em prejuízo para a acusação ou para a defesa (art. 563 do CPP, princípio do prejuízo) ou não influencie na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa (art. 566 do CPP), pois se o ato for praticado de outra forma, mas tiver atingido o fim pretendido pela norma, a irregularidade estará sanada (art. 572, II, do CPP e art. 65, caput e § 1.º da Lei n.º 9.099/95). Já Mirabete (1995, p. 36) como visto acima, indica que o CPP possibilita diligências da autoridade policial em outra circunscrição (art. 22) por, de qualquer forma, a incompetência ratione loci ser apenas relativa, não dando margem à nulidade do inquérito policial. No mesmo rumo, Capez (2006, p. 74) indica que na Capital, também dividida em circunscrições como se fosse um pequeno Estado, a autoridade poderá ordenar diligências em circunscrições de outra, independentemente de precatórias e requisições, segundo o art. 22 do CPP, mas adverte que no interior o delegado não poderá praticar qualquer ato fora dos limites de sua circunscrição, devendo, se assim necessitar, solicitar, via precatória, ou por rogatória, conforme o caso, a cooperação da autoridade local com atribuições para tanto.