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Consequências jurídicas do abuso de direito nas relações de família

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09/10/2017 às 15:00
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2. O ABUSO DE DIREITO SOB A ÉGIDE DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

2.1 Dos elementos para configuração do abuso de direito

Nos termos do art. 187 do Código Civil, para se verificar a existência do abuso de direito é necessário que o sujeito exerça seu direito de forma irregular, não respeitando os limites indispensáveis à finalidade econômica e social, ao princípio da boa-fé e dos bons costumes, ocasionando prejuízo a um terceiro.

Nesse diapasão, entende-se que os requisitos necessários para a caracterização do abuso de direito são: exercício de um direito; não observância do fim econômico e social, da boa-fé e dos bons costumes; existência de dano e nexo de causalidade entre o dano provocado e o exercício irregular do direito.

Não é despiciendo mencionar que o elemento subjetivo não é exigido, pois, como visto alhures, o ordenamento jurídico adotou a teoria objetiva para a responsabilidade decorrente do abuso de direito.

2.1.1 Exercício de um direito

O abuso de direito se verifica quando não há ilícito civil, isto é, quando inexistir ação ou omissão decorrente de dolo ou culpa que cause dano a outrem. Nesse diapasão, insta salientar que:

Uma observação importante deve ser feita: quem age em abuso de direito invoca um poder que, formal ou aparentemente, lhe pertence, embora não tenha fundamento material, ou seja, o abuso de direito pressupõe logicamente a existência do direito (direito subjetivo ou mero poder legal), embora o titular se exceda no exercício dos poderes que o integram. Mesmo porque quem alega a ausência de direito não pode validamente alegar a existência de abuso de direito, isto é, a alegação de ausência de direito (ato ilegal) é prejudicial à alegação da ocorrência de abuso de tal direito. (BOULOS apud STOCO, 2007, p. 121).

Assim, deve haver o exercício anormal de um direito e não apenas violação de um preceito normativo.

2.2.2 Violação do fim econômico e social, do princípio da boa-fé e dos bons costumes

Quanto ao fim econômico e social, importante se faz perquirir acerca do motivo da criação do abuso de direito. Nesse contexto, diz-se que:

O abuso ocorre, justamente, quando se despreza a economia interna do negócio, ou da situação jurídica preexistente, para perseguir fim lesivo a outrem, sem proveito lícito para o titular do direito subjetivo. Para ser regular, o exercício do direito, haverá o titular de praticá-lo dentro da finalidade que econômica e socialmente se lhe reconhece. Fugindo desse padrão, estar-se-á agindo abusivamente; sair-se-á do exercício regular para entrar no exercício ilícito ou abusivo do direito. Ter-se-á a conduta antissocial ou antieconômica, reprimida pelo art. 187. (THEODORO JÚNIOR, 2003, p. 124).

No que tange ao fim econômico, Cavalieri Filho (2012, p. 177), o define como “[...] o proveito material ou vantagem que o exercício do direito trará para seu titular, ou a perda que suportará pelo seu não exercício”.

Como exemplo de inobservância à finalidade econômica e social, faz-se mister citar que:

[...] o direito de propriedade sobre determinado bem existe para satisfazer as necessidades humanas, sendo esta a sua finalidade econômica e social. Logo, se seu titular utiliza o direito de propriedade com fins apenas espúrios, sem que tenha proveito, estará abusando do seu direito de propriedade. Assim, quando o proprietário, no exercício dos atributos da propriedade, desrespeita a política de defesa do meio ambiente, também age em abuso de direito, porque desrespeita a finalidade social do direito à propriedade. (NERY JÚNIOR e NERY apud CONCEIÇÃO, 2014, p. 39).

Quanto à finalidade social, preleciona-se que:

[...] Toda sociedade tem um fim a realizar: a paz, a ordem, a solidariedade e a harmonia da coletividade – enfim, o bem comum. E o direito é o instrumento de organização social para atingir essa finalidade. Todo direito subjetivo está, pois, condicionado ao fim que a sociedade se propôs. (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 182).

Ainda, segue-se exemplificando o descumprimento desse fim social no âmbito familiar, in verbis:

No campo do Direito de Família, o abuso do pátrio poder (hoje, poder familiar) nos oferece muitos exemplos de exercício do direito com violação da sua finalidade social. Todos sabemos que a finalidade do pátrio poder é proporcionar aos pais a autoridade necessária para poderem educar e prestar assistência aos filhos. Todas as vezes que o pai (ou mãe) usa dessa autoridade para limitar sem razão a liberdade do filho, ou para castigá-lo indevidamente, não usa, mas abusa do poder que a lei lhe confere. (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 182).

Diante do exposto, é perceptível que o direito deve buscar atender o interesse público, uma vez que a nova ordem jurídica vem conferindo primazia aos interesses coletivos em detrimento dos particulares.

É cediço que, para a teoria do abuso de direito, o que interessa é a boa-fé objetiva, a qual está relacionada com o comportamento do sujeito, sendo prescindível ser analisada a boa-fé subjetiva, a qual está ligada à intenção do agente. Nesse sentido, Nery Júnior e Nery apud Conceição (2014, p. 40) aduzem que “a boa-fé objetiva está intimamente relacionada com o ideal de eticidade, o qual serviu de princípio orientador de todo o Código Civil”.

A boa-fé objetiva impõe às partes uma conduta lastreada na honestidade, lealdade e probidade, trazendo equilíbrio para as relações sociais. Nesse diapasão:

Boa-fé objetiva significa, portanto, uma atuação “refletida”, uma atuação refletindo, pensando no outro, no parceiro contratual, respeitando-o, respeitando seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis, seus direitos, agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem excessiva, cooperando para atingir o bom fim das obrigações: o cumprimento do objetivo contratual e a realização dos interesses das partes. (MARQUES, 2006, p. 216).

A boa-fé objetiva possui três funções, sendo elas identificadas por Cavalieri Filho (2012, p. 183) como “[...] a) função interpretativa – regra de interpretação dos negócios jurídicos (art. 113); b) função integrativa – fonte de deveres anexos dos contratos (art. 422); c) função de controle – limite ao exercício dos direitos subjetivos (art. 187)”.

Desse modo, entende-se que a primeira função do princípio da boa-fé objetiva é a de interpretação e está prevista no art. 113 do Código Civil, segundo o qual “os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração”. (BRASIL, 2002).

O segundo papel deste relevante princípio consiste na atuação como cláusula geral, da qual decorrem os deveres anexos, que embora não estejam consubstanciados no contrato, devem orientar a conduta das partes. Calha trazer à baila que:

Ora, neste contexto, a boa-fé atua como importantíssimo elemento ético no contrato. Traz uma dimensão ética fabulosa para as relações jurídicas. Passa-se a exigir mais dos contratantes, que não podem simplesmente utilizar o cumprimento do dever principal como escudo para proteção contra toda sorte de desonestidades cometidas no curso da relação contratual. (GARCIA, 2003, p. 103).

Torna-se evidente que os integrantes de uma relação jurídica devem respeitar os deveres acordados e também possuir a conduta pautada nos valores éticos.

Além das duas funções susomencionadas, a boa-fé objetiva tem a incumbência de propiciar o controle dos limites do exercício de um direito. Nesse sentido, dispõe-se com clareza que:

Em sua função de controle [...] a boa-fé representa o padrão ético de confiança e lealdade indispensáveis para a convivência social. As partes devem agir com lealdade e confiança recíprocas. Essa expectativa de um comportamento adequado por parte do outro é um componente indispensável na vida de relação. Conforme já destacado, a boa-fé, em sua função de controle, estabelece um limite a ser respeitado no exercício de todo e qualquer direito subjetivo. E assim é porque a boa-fé é o principio cardeal do Código de 2002, que permeia toda a estrutura do ordenamento jurídico, enquanto forma regulamentadora das relações humanas. Considera-se violado o princípio da boa-fé sempre que o titular de um direito, ao exercê-lo, não atua com lealdade e a confiança esperáveis. (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 183).

No que tange aos bons costumes, apresenta-se o seguinte conceito:

Os bons costumes constituem um complexo de regras e princípios impostos pela moral, complexo este que traduz a norma de conduta dos indivíduos em suas relações sociais e contratuais, para que estas se articulem segundo as finalidades das próprias pessoas vivendo em sociedade e aceitando as normas materializadas em lei. (STOCO, 2007, p. 122).

O abuso de direito, nesse caso, ocorrerá quando a conduta for provida de dissonância com a ética e hábitos aprovados por determinado meio social.

Nery Júnior e Nery apud Conceição (2014, p. 41), sobre o assunto, dispõem que “bons costumes, portanto, diz respeito à moral de uma determinada sociedade. Não se confunde com costumes, que diz respeito ao direito consuetudinário, ligado à ideia de uso reiterado por determinada comunidade acreditando ser obrigatório”.

Assim, “boa-fé e bons costumes andam sempre juntos, como irmãos siameses, pois, assim como se espera de um homem de boa-fé conduta honesta e leal, a recíproca é verdadeira: má-fé se casa com imoralidade, desonestidade e traição”. (CAVALIERI FILHO, 2012, p.185).

2.2.3 Do dano

O dano também consiste em elemento essencial para a existência do abuso de direito.  Assim, “se o titular do direito excede seus fins sociais, por exemplo, mas não causa dano a terceiro, não terá havido abuso de direito, para fins jurídicos”. (NERY JÚNIOR; NERY apud CONCEIÇÃO, 2014, p. 42).

Desse modo, a ausência de prejuízo enseja na inexistência do dever de indenizar, não havendo, portanto, responsabilização do sujeito.

Não obstante, o prejuízo pode não ser a um sujeito determinado, podendo ser à coletividade, atingindo, então, agentes indeterminados.

Salienta-se que o exercício do direito dentro de seus limites que ocasione dano não constitui abuso de direito, pois se está agindo dentro de suas prerrogativas.

2.2.4 Nexo causal

É preciso que o prejuízo seja decorrente da conduta pautada no exercício de um direito fora da normalidade. 

Assim, o agente que faz uso de seu direito extrapolando os limites impostos e causando prejuízo alheio tem o dever de indenizar decorrente da responsabilidade objetiva.

Analisados os requisitos previstos no ordenamento jurídico brasileiro para configuração do abuso de direito, passa-se à explanação do instituto sob a ótica da responsabilidade civil.

2.3 Consectários jurídicos com ênfase na responsabilidade civil

Antes de expor as consequências jurídicas advindas do abuso de direito, importante se faz trazer algumas noções propedêuticas, de caráter geral, sobre a responsabilidade civil, sendo que serão, sucintamente, evidenciados os pressupostos para constituição do instituto e as modalidades.

2.3.1 Requisitos para configuração da responsabilidade civil

Conforme já explicitado alhures, a responsabilidade advém de um ato ilícito, o qual se evidencia pelo desrespeito ao ordenamento jurídico. Esse instituto recebe tratamento pelo art. 186 do Código Civil, o qual estatui que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. (BRASIL, 2002).

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A partir do conteúdo do referido dispositivo normativo, é evidente que os pressupostos da responsabilidade civil são: conduta do agente, nexo causal, dano e culpa.

O primeiro requisito, ou seja, a conduta, pode ser compreendido como o comportamento provido do elemento volitivo, cuja exteriorização ocorre mediante uma ação ou omissão que irá produzir consectários jurídicos. Ressalta-se que a conduta deve ser provida de voluntariedade, a qual diz respeito ao discernimento da pessoa na concretização ou omissão da ação.

O dano é imprescindível para existir o dever de ressarcir os prejuízos causados. Nesse sentido, dispõe-se que:

O dano é, pois, elemento essencial e indispensável à responsabilização do agente, seja essa obrigação originada de ato ilícito ou de inadimplemento contratual, independente, ainda, de se tratar de responsabilidade objetiva ou subjetiva. (STOCO, 2007, p. 128).

Ainda, no que concerne ao dano, este pode ser de cunho patrimonial/material ou extrapatrimonial/moral. O primeiro ocorre quando a conduta do agente ofende bem de caráter econômico, enquanto o segundo transgride bem sem cunho econômico, que não pode ser quantificado.

O dano material pode ser dividido em danos emergentes e lucros cessantes. Nesse sentido, o art. 402 do Código Civil dispõe que “salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidos ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar”. (BRASIL, 2002).

O dano emergente diz respeito ao efetivo prejuízo causado à vítima, ou seja, é a perca propriamente dita em razão da prática de determinada conduta. Já o lucro cessante consiste em algo que o indivíduo deixou de auferir em decorrência do dano causado, sendo um prejuízo quantificado ao longo do tempo, tendo em vista que diz respeito ao lucro futuro.

No que concerne ao dano moral, as consequências afetam os bens jurídicos extrapatrimoniais, tais como a vida; a integridade física, moral e psicológica e a honra.

O nexo de causalidade é a relação existente entre a conduta praticada e o resultado danoso produzido.

A culpa lato sensu envolve o dolo e a culpa stricto sensu. O dolo consiste na conduta intencional, de maneira que o agente, de forma consciente, quer ou assume o risco de produzir o resultado.

Já na culta stricto sensu, a conduta é voluntária, mas não existe o ânimo de prejudicar, de causar um dano, embora ainda assim o resultado seja produzido.

Tal distinção pode ser fornecida da seguinte forma:

Quando existe a intenção deliberada de ofender o direito, ou de ocasionar prejuízo a outrem, há o dolo, isto é, o pleno conhecimento do mal e o direto propósito de o praticar. Se não houvesse esse intento deliberado, proposital, mas o prejuízo veio a surgir, por imprudência ou negligência, existe a culpa (stricto sensu). (STOCO, 2007, p. 133).

Imperioso se faz mencionar que, no âmbito do Direito Civil, tal diferença não é salutar, tendo em vista que o escopo primordial é buscar a indenização da vítima e não a punição do agente.

2.3.2 Modalidades de responsabilidade civil

As modalidades do instituto levam em consideração o elemento culpa e a natureza da norma que fora violada. Nessa senda, a responsabilidade civil poderá ser objetiva, subjetiva, contratual ou extracontratual.

A responsabilidade subjetiva é aquela em que se verifica que a conduta foi produzida a título de culpa, que, em sentido amplo, engloba a culpa stricto sensu e o dolo. Com o passar do tempo, esse tipo de responsabilidade foi se tornando insuficiente para solucionar os problemas causados aos ofendidos. Assim, surge a responsabilidade objetiva.

Sobre a responsabilidade objetiva, Cavalieri Filho (2008, p. 137) preleciona que “todo prejuízo deve ser atribuído ao seu autor e reparado por quem o causou independente de ter ou não agido com culpa. Resolve-se o problema na relação de nexo de causalidade, dispensável qualquer juízo de valor sobre a culpa”.

O Código Civil conferiu tratamento à responsabilidade objetiva em seu art. 927 que dispõe que “haverá obrigação de reparar o dano, independente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”. (BRASIL, 2002).

Se o dano decorrer da violação de normas estipuladas em contrato ou em negócio jurídico unilateral, a responsabilidade será denominada contratual. Nesse sentido, as partes contratantes têm a obrigação de cumprir as obrigações que estipularam, sob pena de incorrer em dever de reparar o prejuízo advindo do descumprimento.

Já a responsabilidade civil ou aquiliana advém da infringência dos deveres legais. Sendo assim, não há uma prévia relação jurídica entre a parte causadora do dano e a parte lesada.

2.3.3 Consequências jurídicas do abuso de direito

É de conhecimento comum que o abuso de direito que causa dano a outrem gera o dever de indenizar. O que gera divergências no âmbito doutrinário é a natureza da responsabilidade. Nessa senda, Theodoro Júnior (2003, p. 116), destaca que “cinge-se em saber se trata-se de responsabilidade subjetiva, fundada na intenção maliciosa do agente, ou responsabilidade objetiva, extraída pura e simplesmente do resultado danoso indesejável eticamente”.

Não obstante, conforme retratado alhures, verificou-se que foi adotada a teoria objetiva, sendo dispensável a análise sobre a culpa do sujeito.

Segundo Nery Júnior e Nery apud Conceição (2014, p. 44) a responsabilidade civil pode ser vista como “um dever jurídico sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário”.

Assim, depreende-se que para haver o dever de reparação necessária se faz a existência do dano.

Não é demais ressaltar que há situações em que ocorre o exercício de um direito que causa prejuízo alheio, mas não configura abuso de direito, como, verbi gratia, o uso da excludente da legítima defesa de forma moderada e direito de greve.

Por outro lado, há também abuso de direito que não causa dano a outrem. Exemplo disso é a propriedade rural que não cumpre sua função social, conforme determinado pelo texto constitucional.

Diante desses pormenores, é perceptível que a teoria do abuso de direito se diferencia do ato ilícito, não podendo, como já se enfatizou, serem considerados como institutos iguais.

Em que pese já ter mencionado a teoria objetiva como a adotada majoritariamente, não é despiciendo conferir tratamento às teorias subjetivas, as quais julgam necessária para configuração do abuso a intenção do agente em causar o dano. Essas teorias recebem muitas críticas, sendo que:

A maioria da doutrina moderna critica a adoção das doutrinas subjetivas, que nada mais são que um desenvolvimento da doutrina da aemulatio. Anota Guilherme Fernandes Neto que bizarro seria, como na realidade o é, querer utilizar-se do critério puramente subjetivo, que foi base para a construção da vetusta teoria da aemulatio (antecessora milenar da doutrina em foco), para, dela se utilizando, visar solucionar litígios em nossa era. (CARVALHO NETO apud CONCEIÇÃO, 2014, p. 47).

Entrementes, para as teorias objetivas, o abuso decorre do exercício irregular do direito, sem analisar o elemento volitivo do sujeito, sendo que é conferida relevância apenas ao fato em si. Nesse diapasão, Cavalieri Filho (2012, p. 173) aduz que “para a teoria objetiva, o abuso de direito estará no uso anormal ou antifuncional do direito. Caracteriza-se pela experiência de conflito entre a finalidade própria do direito e sua atuação no caso concreto”.

Ainda tratando sobre o assunto, leciona-se que:

Preferimos concluir, aderindo a parte da doutrina, que o melhor critério é o finalístico adotado pelo direito pátrio. O exercício abusivo de um direito não se restringe aos casos de intenção de prejudicar. Será abusivo o exercício do direito fora dos limites da satisfação do interesse lícito, fora dos fins sociais pretendidos pela lei, fora, enfim, da normalidade. (VENOSA, 2003, p. 608).

Quanto à reparação do dano, esta seguirá a forma específica tratada na lei e no caso de lacuna, será da mesma forma que a do ato ilícito. Não obstante, para a aplicação da teoria em comento, o operador do Direito deverá analisar as peculiaridades do caso concreto, quais sejam: o fim econômico e social, a boa-fé e os bons costumes.

Imperioso se faz mencionar que o abuso de direito nem sempre será resolvido com a indenização, pois esta pode não fazer sentido em determinados casos, como, por exemplo, no âmbito familiar, ocorrendo a aplicação de outras penalidades. Nesse sentido, exemplifica-se que:

Se o abuso é praticado no exercício do poder conferido pelo status familiar, como o pátrio poder ou o poder material, a repressão pelo dever de indenizar não faz sentido. Há de ser de outra espécie, admitindo-se, conforme a gravidade do abuso, a destituição do pátrio poder ou o divórcio. (GOMES apud CONCEIÇÃO, 2014, p. 59).

Os consectários decorrentes do abuso de direito podem compreender, então, desde a reparação do dano com supedâneo no art. 927 do Código Civil até a eliminação dos efeitos jurídicos.

Diante do exposto, nota-se que a teoria do abuso de direito tem incidência sobre várias áreas do Direito, ultrapassando o campo da responsabilidade civil, dando origem a outras consequências além do ressarcimento pecuniário do prejuízo causado à vítima.      

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Sobre a autora
Thaísa da Silva Borges

Delegada de Polícia do Estado de São Paulo. Ex-advogada. Graduada em Direito pela Universidade do Estado de Minas Gerais. Pós-graduada em Direito Civil e Processual Civil pelo Instituto Elpídio Donizetti. Pós-graduada em Direito Penal e Processual Penal pelo Instituto Elpídio Donizetti.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BORGES, Thaísa Silva. Consequências jurídicas do abuso de direito nas relações de família. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5213, 9 out. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60638. Acesso em: 26 abr. 2024.

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