Artigo Destaque dos editores

Transplante de órgãos e tecidos post mortem e a autonomia da vontade do doador versus autorização da família do de cujus

Exibindo página 2 de 5
10/08/2019 às 15:02
Leia nesta página:

3DIREITOS FUNDAMENTAIS, BIOÉTICA E BIODIREITO NA QUESTÃO DAS DOAÇÕES DE ÓRGÃOS E TECIDOS

O notório desenvolvimento da medicina, um dos ramos mais importantes das ciências biológicas, possibilitou a realização de transplantes de órgãos e tecidos do corpo humano post morte; hoje uma técnica muito discutida e estudada pela maioria da área médica, pois trata-se de procedimentos  capazes de salvar vidas.

A importância do tema nos parece maior quando analisados os índices de pessoas que estão com seus nomes na lista à espera de um transplante, dependendo dessa operação para ter uma melhora de vida, ou até mesmo, sobreviver.

Ligados ao doador e ao receptor estão alguns dos direitos fundamentais dos seres humanos, que vão desde o aceite em dispor de um de seus órgãos ou tecidos, até o mesmo ser transplantado. Direitos estes tais como direito a vida, a formação dos direitos de personalidade, a integridade física e o direito ao próprio corpo, a liberdade de consciência e o poder de disposição do próprio corpo.[57]

Os direitos e garantias fundamentais estão expressos na Constituição Federal, subdivididos em cinco capítulos: os direitos e deveres individuais e coletivos; os direitos sociais; a nacionalidade; os direitos políticos e os partidos políticos. Esses direitos não podem ser abolidos ou restringidos, pois constituem uma das cláusulas pétreas da Constituição Federal. [58]

Nesse sentido, entende-se que os “direitos fundamentais nascem para reduzir a ação do Estado aos limites impostos pela Constituição sem, contudo desconhecerem a subordinação do indivíduo ao Estado [...]”.[59]

Quanto ao tema abordado, o direito fundamental atua como defensor do próprio corpo, impondo limites admissíveis de interferência no corpo humano em todas as fases e dimensões da vida humana. [60]

Contudo, conforme se observa quanto à disposição de órgãos e tecidos e a autorização dos familiares sobre a doação, esses direitos fundamentais são violados, pois a disposição de partes do corpo humano é regulada pela ordem pública, através de uma lei especifica, tendo em vista sempre os valores da dignidade humana e do direito a vida. À vista disso, apesar do ser humano, em vida, se manifestar favorável a ser doador, ou mesmo contra, ele não tem direito real sobre seu próprio corpo, pois uma vez constatada a morte encefálica, a família tem o direito de ir contra sua decisão. [61]

Outras duas disciplinas surgiram a partir das crescentes inovações das ciências biomédicas que permitiram a medicina aperfeiçoar técnicas e consequentemente chegar a inovações espetaculares. Há alguns anos essa inovações jamais seriam imaginadas, ouseriam consideradas como “loucura”, como é o caso dos transplantes de órgãos.

Com o objetivo de [...] “estabelecer regras, padrões éticos mínimos, que venham determinar os limites aceitáveis para as experiências e procedimentos a serem executados, em um primeiro momento, surge a Bioética”.[62]

Em um segundo momento, devido a pressão social, por tratar-se de tema que requer o resguardo ao direito a vida e o respeito adignidade da pessoa humana, direitos como já vistos, fundamentais, surge a disciplina intitulada Biodireito, que tem como tarefa a positivação das normas da bioética, ou seja, a positivação jurídica que delimita o comportamento medico-cientifico, garantindo sempre, em primeira colocação, todos os direitos que este resguarda e aplicando sanções pelo descumprimento dessas normas. [63]

Conforme análise, tanto os direitos fundamentais expressos na Constituição Federal, assim como as disciplinas de Biodireito e Bioética, têm como objetivo geral garantir a defesa do próprio corpo, em consonância, impondo limites a todas as fases de interferência do corpo humano, tanto no caso dos transplantes como outras formas de intervenção que existem ou que surgiram por meio do crescente avanço da medicina.

3.1 CONCEITO E DIMENSÃO JURÍDICA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Os Direitos Fundamentais surgiram a partir de uma evolução histórica, depois chamadas gerações ou dimensões, consequência de diversas transformações ocorridas no decorrer da história. Contudo, esses direitos não nasceram todos de uma única vez, foram sendo criados no momento em que o homem posicionava seu poder sobre o outro homem. [64]

Sobre a ótica do aparecimento dos Direitos Fundamentais, como consequência de eventos no decorrer da história, interessante lembrar alguns desses eventos que marcaram o início sobre duas vertentes. De um lado, concepção jusnaturalista lutava pela existência de um direito natural sem permissão de controle estatal, absoluto, perfeito e imutável. De outro lado, a doutrina do cristianismo, que pregava o homem como sendocriado a semelhança de Deus, possuidor de direitos de alto valor, garantidor de uma liberdade e que deveria ser respeitado por todos, inclusive pela sociedade politica. [65]

Com o surgimento das teorias contratualistas, do Estado de John Locke, com base no jusnaturalismo, oportunizou-se conteúdos de direitos oponíveis ao próprio Estado, partindo inicialmente “[...] do pressuposto de que os homens se reúnem em sociedade para preservar a própria vida, a liberdade e a propriedade [...]”.[66]

A teoria apontada foi utilizada como inspiração para a Declaração de Independência dos Estados Unidos da América (1776) e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1779). Apesar de serem esses documentos o marco inicial da história dos direitos individuais, não são os únicos. A Magna Carta, de 1215, dada pelo Rei João Sem-Terraaos barões e bispos ingleses, concedendo privilégios a esses senhores, tem sua importância por ser um dos primeiros vestígios de limitação do poder dos monarcas. [67]

Em virtude dessa evolução histórica e de mudanças futuras, os Direitos Fundamentais não possuem um conceito único, inalterável.

Os Direitos Fundamentais poderiam ser conceituados como:

Aqueles direitos atribuídos a todos os seres humanos, de todas as nacionalidades, que têm como finalidade assegurar condições mínimas para uma existência digna, livre, igual e fraterna. Com os quais cada ser humano deve dispor de modo a conduzir sua vida de modo pleno e sadio. [68]

Já no ensinamento de Alexandre de Moraes seria:

Conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser humano que tem por finalidade básica o respeito e a sua dignidade, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal e o estabelecimento de condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana.[69]

Assim como os conceitos acima citados, existem muitos outros, Sendo assim, o que se busca é conceituar de uma melhor forma o que vem a ser direitos fundamentais do homem, muito embora, como já apontado anteriormente, não exista uma definição completa, única e plena, pois os referidos direitos foram sendo ampliados e transformados no decorrer da história. [70]

Conforme já exposto, os direitos fundamentais foram surgindo no decorrer da história, em conformidade com a necessidade de cada época, motivo pelo qual os estudiosos costumam dividi-los em gerações ou dimensões, contudo a distinção e consequente discussão gerada em torno de nomenclaturas diferentes é tema meramente acadêmico. [71]

Existem hoje, reconhecidos nas doutrinas, direitos de primeira, segunda e terceira geração, e não podemos deixar de mencionar que possuem doutrinadores que defendem a existência de direitos de quarta geração. Dentre esses doutrinadores temos Noberto Bobbio, Paulo Bonavides, Marcelo Novelino entre outros que vêm promovendo o reconhecimento desses direitos..[72]

Os direitos fundamentais de primeira geração são os da liberdade, que são os direitos civis e políticos. Como exemplos de direitos fundamentais de primeira geração, temos a liberdade de consciência de reunião e a inviolabilidade do domicilio, valorizando o homem singular. A partir desses direitos se requer do Estado uma prestação negativa, ponto como objetivo principal a valorização da liberdade do individuo. [73]

Segundo Paulo Bonavides Direitos Fundamentais de primeira geração “[...] traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa e ostentam uma subjetividade que é seu traço mais característico; enfim, são direitos de resistência ou de oposição perante o Estado”. [74]

Os direitos fundamentais de segunda geração são os direitos sociais, culturais e econômicos, assim como os direitos coletivos ou de coletividade, tendo como razão o princípio da igualdade que ampara e estimula a garantia destes direitos. [75]

Nesse período se exigia do Estado prestações positivas, em função da justiça social, contudo muitas das ações que se esperava do Estado eram impossíveis de serem cumpridas, permanecendo por muito tempo os direitos de segunda geração na esfera programática, ficando sem observância ou execução, cujo fim se deu com recentes Constituições, assim como a do Brasil, que elaboraram preceito de aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais, não se aceitando o descumprimento destas, apenas com a argumentação do caráter programático da norma. [76]

Vale salientar que os direitos de segunda geração não são apenas direitos de prestação do Estado ao individuo, mas também, liberdades sociais e direitos dos trabalhadores. Podemos apontar como exemplo o direito a greve, direito ao repouso semanal remunerado, salário mínimo, assim como outros. [77]

Com fundamento no principio da solidariedade ou fraternidade, surge no final do século XX, os direitos fundamentais de terceira geração; direitos estes que não se destinam a interesses de um único indivíduo, ou um grupo em si ou um único Estado, mas um todo coletivo, os grupos sociais. Já foram identificados cinco direitos fundamentais de terceira geração: o direito ao desenvolvimento; o direito a paz; o direito ao meio ambiente; o direito de propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade e o direito de comunicação. Contudo, podem existir outros ainda em fase de produção, podendo esse número ser alargado. [78]

O autor Paulo Bonavides ainda refere-se a chamada quarta geração de direitos fundamentais mencionando que:

A globalização política na esfera da normatividade jurídica introduz os direitos da quarta geração, que, aliás, correspondem à derradeira fase de institucionalização do Estado Social. São direitos da quarta geração o direito à democracia, o direito à informação e o direito ao pluralismo. Deles depende a concretização da sociedade aberta do futuro, em sua dimensão de máxima universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as relações de convivência.[79]

O lema revolucionário francês do século XVIII, delimitou em três princípios todo o conteúdo abarcado pelos direitos fundamentais, seguindo até mesmo a ordem cronológica de sua positivação. Apresentado por fim, a terceira geração: LIBERDADE (primeira geração), IGUALDADE (segunda geração) e FRATERNIDADE (terceira geração). [80]

Finalmente, em relação aos destinatários dos direitos fundamentais, conforme artigo 5º da Constituição Federal, é garantido aos brasileiros e estrangeiros residentes no país todos os direitos e garantias fundamentais, sem haver qualquer distinção. [81]

3.2 DESDOBRAMENTOS JURÍDICOS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Os direitos fundamentais como já estudados, surgiram para assegurar a todas as pessoas o direito a uma vida digna, igualitária e livre, dispostos na Constituição Federa, do artigo 5º ao 17º.

O artigo 5º da Constituição trata das garantias e direitos fundamentais que cada cidadão dispõe. Conforme a letra da lei, todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito a vida, a liberdade, a igualdade, a segurança e a propriedade.[82]

Foi a promulgação da Constituição Federal de 1988 que, além de reestruturar a vida dos cidadãos brasileiros, representou o grande passo para a proteção dos direitos que analisaremos a seguir: direitos de personalidade; de dignidade da pessoa humana; direito fundamental a vida; direito a integridade física; direito a liberdade; direito a saúde; e direito ao próprio corpo.

3.2.1 Direito da personalidade

A concepção dos direitos de personalidade apoia-se na ideia de que não deve o homem apenas ser protegido em seu patrimônio. Há os direitos econômicos apreciáveis, mas principalmente em sua essência, pois existem direitos não menos importantes, inerentes a pessoa humana, valiosos e merecedores de proteção jurídica, ligados de maneira perpétua. São os direitos da personalidade, destacando-se, entre outros, o direito a vida, a liberdade, ao nome, ao próprio corpo, a imagem e a honra. [83]

Os direitos de personalidade, disciplinados em um capítulo próprio (arts. 11 a 21) no Código Civil de 2002, representaram uma das principais inovações para a época e isso demostra a significativa mudança na codificação brasileira, que sofria modificação em seus valores, deixando de ter um perfil apenas patrimonial, característica do Código Civil de 1916, para se preocupar com o indivíduo, harmonizando assim com a Constituição Cidadã de 1988. [84]

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

O grande evento para a proteção dos direitos de personalidade ocorreu com o reconhecimento expresso na Constituição Federal no artigo 5º, X, nestes termos:

“X- São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

Mas enfim, o que se pode entender por direito de personalidade?

A personalidade é atributo inerente à pessoa. Todo ser humano é dotado de personalidade, tanto a pessoa física como a pessoa jurídica, desde o início de sua existência. Contudo, nem todos podem proceder ao exercício dos seus direitos, pois para tanto é necessário capacidade de fato. Neste caso são subtraídos dessas pessoas sua autodeterminação de exercê-los pessoal e diretamente, exigindo sempre a participação de outra pessoa, que as represente ou assista. [85]

A capacidade se entrosa com a personalidade e assim, pode-se afirmar que a capacidade é a medida da personalidade. Para uns, ela é plena e para outros, limitada.

A capacidade de direito ou de gozo é adquirida por todos ao nascer com vida, sem qualquer distinção, também conhecida como capacidade de aquisição de direitos. Só não possui capacidade de aquisição de direitos o nascituro, pois lhe falta personalidade, contudo, a lei assegura a proteção do nascituro, outorgando-lhe direitos personalíssimos compatíveis com a situação do ser humano em desenvolvimento. [86]

A capacidade de fato, nem todas as pessoas possuem, que é a aptidão para exercer, por si só, os atos da vida civil. Por faltarem a algumas pessoas requisitos materiais como maior idade, saúde, desenvolvimento mental e outros, a lei, com o primordial objetivo de protegê-los, nega-lhes a capacidade de adquirir direitos, exigindo como já posto a participação de outra pessoa. [87]

Dessa forma, “Personalidade, na acepção clássica, é a obrigação de direito ou de gozo de ser titular de direito e obrigações, independentemente de seu grau de discernimento, em razão de direitos que são inerentes a natureza humana e sua projeção para o mundo exterior”. [88]

Convém, nesse passo, denominar os direitos de personalidade por Pablo Stolze Gagliano “Conceituam-se os direitos da personalidade como aqueles que têm por objeto os atributos físicos, psíquicos e morais da pessoa em si e em suas projeções sociais”. [89]

Roberto Senise Lisboa afirma que os “Direitos de personalidade são direitos intrínsecos ao ser humano, considerado em si mesmo e em suas projeções ou exteriorização para o mundo exterior”. [90]

Em conclusão, de acordo com a definição clássica, “os direitos da personalidade são o conjunto de caracteres e atributos da pessoa humana, referentes ao seu desenvolvimento físico, moral, espiritual e intelectual. Eles estão intimamente atrelados a ideia de direitos existenciais (extrapatrimoniais)”. [91]

Normatizar a matéria de direitos de personalidade tem como propósito garantir ao sujeito o reconhecimento de uma série indeterminada de valores, pelo ordenamento jurídico, valores estes que não podem ser reduzidos a um valor pecuniário, como a vida, a integridade física, a intimidade e a honra, entre outros. [92]

Por fim, importante destacar as características particulares dos direitos da personalidade, absoluto, gerais, extrapatrimoniais, indisponíveis, imprescritíveis, impenhoráveis e vitalícios. [93]

Analisaremos cada uma dessas características separadamente.

Comecemos primeiramente com o caráter absoluto dos direitos da personalidade, no qual não se permite ao titular do direito renunciar ou cedê-los a terceiros .Um direito que se formaliza com a oponibilidade erga omnes, ou seja, seus efeitos devem ser respeitados por todos da coletividade. Essa característica está intimamente ligada aindisponibilidade que será estudada a seguir.[94]

A indisponibilidade do direito de personalidade, resguardado pelo artigo 11 do Código Civil Brasileiro, abarca tanto a intransmissibilidade como a irrenunciabilidade. Contudo, a expressão indisponibilidade traz o significado que nem o indivíduo propriamente dito poderá, por meio de sua vontade, transferir esse direito a outro titular. Então passamos a explicitar as expressões apontadas acima: irrenunciabilidade nada mais é do que a proibição de abrir mão desse direito. Por exemplo, ninguém pode dispor de sua vida. Já a intransmissibilidade é a medida que não admite a transferência de um direito de determinado sujeito a outro, lembrando que de forma excepcional se admite a transmissibilidade  de certos direitos de personalidade, contudo não entraremos no mérito da questão.[95]

Sendo a característica da impenhorabilidade, consequência da indisponibilidade, ou seja, não pode o titular do direito de personalidade cedê-lo a terceiros, ou mesmo vendê-lo. Contudo, merece destaque a questão de que determinados direitos se manifestam patrimonialmente, como os direitos autorais, assim a penhora dos direitos morais do autor nunca poderão ser penhoradas, mas nada  impede que os créditos advindos dos direitos patrimoniais não os possam. [96]

A característica da generalidade significa que os direitos de personalidade são pertencentes a todas as pessoas pelo simples motivo destas existirem. Quanto aextrapatrimonialidade, esta consiste na ausência de um conteúdo patrimonial dos direitos de personalidade, embora nada impeça que algumas espécies desses direitos sejam postos no comércio jurídico, e havendo violação destes direitos, sejam determinadas penalidades econômicas.[97]

A imprescritibilidade significa que os direitos de personalidade nascem com o homem e não vão deixar de existir, caso não sejam utilizados, não existindo um prazo para seu exercício. Porém é importante lembrar uma diferença,quando se fala em prescritibilidade, estamos se referindo a pretensão do direito de reparação de violação de um direito da personalidade, tendo prazo para o titular do direito violado requerer a sua reparação.[98]

Quanto a vitaliciedade, os direitos de personalidade acompanham a pessoa desde o seu nascimento até a morte e, sendo pertencentes a mesma, irão desaparecer com seu titular. Contudo, existem direitos da personalidade que se manifestam até depois da morte, e que correspondem ao direito a honra do individuo falecido como ao corpo do morto, ou seja, cadáver.[99]

3.2.2 Dignidade da pessoa humana

Antes de analisarmos o princípio da dignidade da pessoa humana num todo, importante realizarmos distinções entre as expressões, direito do homem, direitos fundamentais, direitos humanos que aparecem cotidianamente no estudo do princípio em questão.

O direito do homem é expressão utilizada pela disciplina do jusnaturalismo, que representa direitos ainda não escritos. Embora se saiba de suas existências não se sabe onde estão. São direitos que fazem parte da essência humana, todavia ainda não positivados. Em contra partida os direitos fundamentais estão escritos no texto constitucional. São direitos constitucionalizados. Já os direitos humanos são direitos fundamentais posicionados ao plano internacional. E a dignidade da pessoa humana é abase de fundamento moderno dos direitos humanos. [100]

A Constituição Federal de 1988 intitulou como fundamento do Estado democrático de direito, a dignidade da pessoa humana como princípio fundamental, que reconhece a todo ser humano o respeito a sua essência como pessoa, não podendo ser prejudicada a vida, o corpo e a saúde. [101]

A dignidade da pessoa humana é protegida pela Constituição, através dos direitos fundamentais, considerada valor supremo e núcleo da constituição, atributo inerente a todo ser humano independente de qualquer requisito ou condição. [102]

Um conceito único e concreto acerca do princípio da dignidade da pessoa humana é extremamente complicado, devido a sua grande abrangência, pois engloba diversas concepções e significados. O que se reconhece é que o homem nunca esteve separado de sua dignidade, se consideramos que o principio da dignidade da pessoa humana tem relação com o direito natural, e se o mesmo nasce com o homem, a dignidade sempre fez parte deste. [103]

Na busca de conceituar o princípio da dignidade da pessoa humana, necessário se faz a análise da existência do Estado. Primeiramente criou-se o Estado para atender aos interesses do homem. Quando o homem vivia em seu estado natural, entendeu-se que o mesmo não poderia viver em sociedade se não tivesse proteção de seus interesses em relação os outros indivíduos do meio. Então, se fez necessário a criação de um ente que receberia parte da autonomia de cada indivíduo para garantir a proteção de seus interesses. Nesse momento percebemos que o Estado surgiu não para atuar de forma absoluta e sim para o benefício do homem. O Estado deve sofrer restrições em sua atuação, para que não implique na ofensa a natureza de quem o criou, limites ligados intimamente ao indivíduo humano.[104]

É justamente neste sentido que assume particular relevância a constatação de que a dignidade da pessoa humana é simultaneamente limite e tarefa dos poderes estatais e, no nosso sentir, da comunidade em geral, de todos e de cada um, condição dúplice esta que também aponta para uma paralela e conexa dimensão defensiva e prestacional da dignidade.[105]

Por fim, enfatiza-se que a dignidade da pessoa humana não pode ser vista como direito absoluto, pois encontra limites nos demais direitos resguardados pelo texto constitucional. Em outros casos, o principio em questão será considerado absoluto e deverá ser exercido sem distinção. [106]

3.2.3 Direito fundamental a vida

O direito a vida é essencial a todo ser humano, sendo objeto do direito assegurado pela Constituição Federal, em seu artigo 5º, caput, e tutelado como direito fundamental. Dessa forma, deve ser respeitado e protegido contra tudo e contra todos.

A vida é o direito mais importante do ser humano, pois do que adiantaria a Constituição garantir e pormenorizar a proteção de outros direitos fundamentais como a igualdade e a liberdade, sem garantir a vida humana entre um desses direitos? [107]

Por não existir uma única e absoluta definição, não se pode definir isto que se chama de vida. O que se deve saber é que a vida é um direito irrenunciável e inviolável e sua proteção faz parte de vários ramos do Direito, não havendo qualquer possibilidade de mensurá-la. [108]

A vida deve ser protegida contra todos, até mesmo contra seu próprio titular, pois esta não é um domínio da vontade livre, ou seja, o próprio titular desse direito deve respeitar a vida, pois se assim não fosse o entendimento, consideraríamos a licitude em legitimar o suicídio. Entende-se que o possuidor desse direito não vive somente para si, mas deve cumprir sua missão em sociedade. [109]

Quando não houver menção em contrário na própria Constituição Federal, havendo conflito entre dois direitos, prevalecerá o direito mais importante a vida. Por exemplo, se surgir a necessidade de mutilar uma perna de um paciente em atendimento emergencial decorrente de acidente para salvar a vida deste, isso será feito, mesmo que ofenda a integridade física do indivíduo, pois a vida está acima de todos os outros direitos como já visto.[110]

3.2.4 Direito a integridade física

O direito a integridade física, assim como o direito a vida, são protegidos pela Constituição Federal entre os direitos fundamentais, assim como pelo Código Civil no sistema dos direitos de personalidade e no Código Penal, atribuindo penalidades aqueles que cometem crimes de perigo a vida ou a saúde. [111]

A proteção jurídica tanto da vida humana como da integridade física, tem como central objetivo a preservação desses diretos, a garantia da não alteração da estrutura e trabalho normal do corpo humano, desde o começo da vida até o ultimo minuto desta, pois o valor desses direitos é de extrema importância.[112]

A integridade física é o respeito ao corpo humano de maneira ampla; bem estar ou saúde física; o estado ou a qualidade do corpo intacto, que não sofreu dano. O direito a integridade física é acima de tudo o acatamento a esse respeito e proteção contra tudo que possa feri-lo, repelindo lesões causadas ao funcionamento natural do corpo humano.[113]

O direito a integridade física, compreende, como já visto, a saúde individual, tanto física como mental, mas não pode ser confundida com o direito a saúde, garantido pela Constituição Federal.[114]

Dentro desse direito um questionamento há de ser feito: até onde vão o respeito e os limites ao poder de vontade individual do ser humano sobre seu corpo e mesmo a necessidade de intervenção médica ou cirúrgica?[115]

3.2.5 Direito a liberdade

A liberdade é um elemento inerente ao homem. Essência da natureza humana e anterior até mesmo a sociedade, ao direito e ao Estado. A proteção desse direito é efetivada pela Constituição Federal, pois o Estado a reconhece, regulando e restringindo seu uso pelo homem. [116]

A liberdade é um direito fundamental de primeira geração que passou pelo desenvolvimento histórico, sendo hoje assegurada de diversas maneiras. A liberdade pode ser: de ação; de manifestação de pensamento; de consciência; de crença; de expressão intelectual; de informação jornalística; de exercício profissional; de locomoção; de reunião; e de associação. [117]

São diversas as colocações sobre a expressão liberdade. Poderia ser entendida como oposição ao autoritarismo do Estado; participação no exercício do poder ou ausência de coação; possibilidade de fazer-se aquilo que se deseja, ou mesmo, contrário a acepção de cativeiro. Contudo o que se sabe é que o direito a liberdade tem como primazia a proteção e limites a essa liberdade. [118]

3.2.6 Direito a saúde

O direito a saúde é extremamente relevante a vida humana, contudo foi reconhecido apenas na Constituição Federal de 1988 e elevado a direito fundamental nos títulos chamados direitos sociais. Antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, o Estado apenas oferecia atendimento a saúde aos trabalhadores com Carteira de Trabalho assinada e a suas famílias, deixando a mercê da sorte o restante da população. Hoje o Estado tem o dever de promover a saúde a todos os cidadãos.[119]

 Para um melhor entendimento, o direito a saúde pode ser dividido em duas vertentes ou funções, uma negativa que consiste em exigir do Estado assim como de todos a não prática de atos que prejudiquem a saúde, e outra positiva, a atuação de medidas e prestações visando a prevenção de doenças e o tratamento destas.[120]

A valorização desse direito deve ser preconizada, considerando-se que é um elemento de grande relevância ou, se não, indispensável à garantia do direito a vida com qualidade e dessa forma, se vislumbra que o direito a saúde está intimamente conectado ao direito a vida.[121]

De fato, a demonstração da importância de tal direito já foi superada, contudo a aplicação desse direito encontra diversos empecilhos à sua efetivação, seja por falta de agentes capazes, recursos humanos e financeiros ou políticas públicas atuantes. O que a sociedade civil não pode é deixar de exigir a prestação e concretização desse direito.[122]

3.2.7 Direito ao próprio corpo

A cada ser humano é dado elementos que o compõe, tais como nome, liberdades e informações públicas e privadas que se associam a um corpo. Sendo assim, nenhuma pessoa física se cria sem um corpo humano. A garantia de proteção ao corpo, nele incluído tecidos, órgãos e partes separáveis, e o direito ao cadáver, nada mais é do que uma extensão da proteção de outros direitos como o princípio da dignidade da pessoa humana e o direito a integridade física.[123]

Para a garantia do direito sobre o corpo humano, o ordenamento jurídico impõe ao seu titular diversas proibições frente a sua vontade sobre o corpo. Imaginemos a seguinte situação: um homem ou uma mulher tem direito absoluto sobre seu corpo sem restrição e estando em uma situação econômica difícil recebe a proposta de venda de um rim o que atenuaria a sua situação financeira. Este estaria dispondo exatamente daquilo que o direito quer assegurar, porém essa atitude lhe é proibida pela legislação.[124]

Sendo assim, a disposição do corpo humano, na sua totalidade ou em partes, recebe proibições, sendo exceção certos atos de disposição. Começamos pelo plano constitucional que proíbe qualquer forma de comercialização ou venda de órgãos, tecidos e substâncias do corpo humano. As leis não permitem qualquer forma de disposição que resulte na diminuição permanente da integridade física ou ofenda aos bons costumes. [125]

Para assegurar o direito a proteção do corpo humano, só é permitido legalmente, a disposição de partes do corpo de forma gratuita e para fins científicos ou altruísticos, por conseguinte só é permitido a pessoa a tirar partes de seu corpo quando for destinado ao desenvolvimento de pesquisas ou para transplante e tratamento de outras pessoas. [126]

3.3 BIOÉTICA: CONCEITO E PRINCÍPIOS

Percebe-se que atualmente o corpo humano constitui-se em um domínio quase completo por parte dos cientistas, pois estes utilizam-se de técnicas avançadas e provem atos nunca antes imaginados, como por exemplo, a reprodução assistida in vitro, a definição do sexo dos filhos por nascer e mesmo o transplante de quase todas as partes do corpo humano. [127]

Segundo Maria da Graça Mello Ferracioli

Tal capacidade operou transformações profundas na sociedade, atônita e assustada ao observar o homem ocupar o lugar do Criador. Atônita e assustada, mas igualmente deslumbrada com a possibilidade de controlar males e dores, até então infinitos. [128]

Diante da evolução alucinante, que provoca perplexidade e forte impacto social, onde, não só a parte leiga da sociedade consegue observar valores sendo questionados, surgem a partir do processo de reflexão, inúmeras perguntas difíceis de serem esclarecidas, como por exemplo, “O que se pode fazer, como fazer, até quanto se fará?”. [129]

3.3.1 Abordagem conceitual da bioética

O termo bioética foi empregado pela primeira vez pelo oncologista e biólogo norte-americano Van Rensselder Potter, em sua obra, publicada em 1971, onde considerava-a a “ciência da sobrevivência”. Nesse primeiro momento, seu sentido era ecológico, ou seja, a bioética seria uma disciplina que se utilizaria das ciências biológicas para permitir uma melhor qualidade de vida para o ser humano, fazendo com que dessa forma, houvesse uma interação entre a participação do homem na evolução biológica, consequentemente preservando a harmonia do universo. [130]

Em sentido totalmente contrário e hoje utilizado pela atualidade, André Hellegers passou a considerar a bioética como a ética das ciências da vida. Contudo, não se terminou por ali. Diversos cientistas da área tentaram conceituar a bioética, por quanto não se tem um único conceito pronto, que se considere suficiente para este fim. A bioética é uma matéria que trata da interferência na vida humana, sendo um assunto frágil, com diversas discussões entre os diversos ramos da sociedade e da ciência, que está em constante evolução, tornando-se assim intricado estabelecer um conceito que se mantenha concreto e coerente por um longo prazo. [131]

Tratando dessa temática, Maria da Graça Mello Ferracioli

Conceituada como a “ética da vida”, a bioética tem por intuito proteger a dignidade da pessoa humana, sua sadia qualidade de vida e bem estar e regular a complicadíssima relação entre ciência, moral e ética, visando proteger o ser humano de práticas que, ao mesmo tempo, podem beneficiar extraordinariamente a sociedade, e também, podem trazer danos irreversíveis e insuportáveis para o homem, se não forem bem conduzidas.[132]

Sendo assim diante do já apontado progresso tecnológico e o grave abalo provocado pelas diversas inovações cientifica, incumbiu-se a bioética a difícil tarefa de estabelecer comportamentos éticos a serem prestados por aqueles que possuem o conhecimento cientifico. [133]

3.3.2 Princípios da bioética: Princípio da autonomia; Princípio da Beneficência, Princípio da Justiça.

A disciplina da bioética está baseada em princípios a serem estudados a seguir: o princípio da autonomia; o princípio da beneficência e o princípio da justiça; princípios estes que buscam honrar e elevar a pessoa humana.

O princípio da autonomia reconhece o controle do indivíduo sobre sua própria vida, mente e corpo, respeitado sua intimidade e proibindo a intromissão de outros sobre si mesmo ou quando este é submetido a um tratamento. Diante desse principio, o profissional da saúde deve respeitar a vontade do paciente, ou quando for o caso, de seu representante, levando em conta valores morais e crenças religiosas, se necessário. [134]

  Considerado o paciente capaz de fazer suas próprias escolhas e agir sob sua própria orientação, este deve ser tratado com autonomia, ou seja, ter conhecimento da causa e não ser atuante sob coação ou influência externa. Conquanto no momento em que o individuo tiver reduzido a sua vontade ou autonomia, este deverá ser protegido. Deste princípio se extrai a exigência do consentimento livre e informado.[135]

O princípio da beneficência nada mais é que o direito de exigir do médico ou profissional da saúde uma atuação que vise o bem-estar e evite atos que possam trazer quaisquer danos, ou seja, o médico deve usar de tratamento para o bem do doente e nunca para fazer o mal ou praticar a injustiça. Contudo, quando houver exigências conflitantes, deve o profissional aconselhar aquele ato que trará porção maior do bem em relação ao prejuízo, mal.[136]

O princípio da justiça requer a imparcialidade e exige uma relação de distribuição de benefícios, riscos e encargos pelos servidores aos pacientes, tendo como ideal que os iguais devem ser tratados de forma igualitária. [137]

A bioética deve seguir tais princípios como critério em suas investigações e normas de parâmetro.

3.4 BIODIREITO: notas conceituais

O biodireito é um ramo do direito em desenvolvimento e tem como principal objeto a proteção dos valores fundamentais, analisados acima, direito a vida e sua dignidade e a liberdade. Para tanto age de tal forma a estabelecer normas limitadoras dentro das diversas áreas de conhecimento biotecnológicos, evitando e inserindo a proteção destes direitos, para que não venham causar danos físicos e morais tanto ao homem como aos demais seres vivos. [138]

Contudo tal prática não é a das mais fáceis a serem realizadas. Hoje, o biodireito sofre grandes dificuldades de acompanhar o rápido desenvolvimento cientifico, ocasionadas pela ausência de leis, que deveriam regularizar e limitar procedimentos que prejudicam o meio-ambiente e a vida.[139]

Segundo, Enéas Castilho Chiarini Junior:

[...] pode-se dizer de forma mais concisa que Biodireito é o conjunto de leis positivas que visam estabelecer a obrigatoriedade de observância dos mandamentos bioéticos, e, ao mesmo tempo, é a discussão sobre a adequação -sobre a necessidade de ampliação ou restrição- desta legislação. [140]

Isto posto, a bioética e o biodireito têm a função e objetivo de não admitir qualquer conduta que venha a reduzir a pessoa humano a "coisa", lhe roubando uma vida digna e sua própria dignidade. Para isso é necessária aimposição de limites a moderna medicina, que só poderá alcançar o que precisa quando estiver atenta ao respeito ao ser humano em todas as suas fases evolutivas. [141]

3.5 O PAPEL DA BIOÉTICA E DO BIODIREITO NOS TRANSPLANTES DE ÓRGÃOS HUMANOS

Conforme já demonstrado em diversos momentos, o progresso da ciência médica e o aperfeiçoamento das técnicas cirúrgicas e imunológica apresentaram ao mundo a possibilidade da realização de transplante de órgãos, tecidos e partes do corpo humano, surgindo a partir desse momento a valorização do corpo humano e provocando diversos questionamentos em relação a essa técnica.[142]

Notória e recente é a prática cirúrgica de transplantes de órgãos e, sem dúvida, de extrema importância por salvar milhares de vidas, proporcionando uma vida mais saudável aos inúmeros transplantados. Apesar desse progresso científico, observa-se diversos obstáculos, no campo da natureza ético-jurídica, a serem superados. Há a necessidade premente de se repensar no enorme impacto causado por essas modernas técnicas científicas na realidade social e de se revisar, num futuro próximo, as disposições que as orientam. A inovação apresenta receios e dúvidas,mas não pode ocorrer um retrocesso. Necessário se faz a adequação das normas à evolução dessa modalidade médica.[143]

Dentro desse campo, a bioética e o biodireito ao reconhecerem, acima de tudo o respeito a dignidade humana e ligados aos direitos humanos, se observados quaisquer atos que não assegurem estes preceitos, os mesmos serão repudiados por serem anversos às exigências ético-jurídicas dos direitos humanos. Sendo assim, diante do exposto, a sociedade nãopode aceitar intervenções cientificas que atinjam a vida e a integridade física sob o preceito da modernização do progresso cientifico em favor da humanidade.[144]

Dessa forma, na prática de transplantes, assim como em outras práticas que possam promover diversos benefícios a humanidade, os profissionais da saúde precisam estar atentos para não ultrapassarem os limites éticos-jurídicos, respeitando a integridade e a dignidade de cada ser humano. A bioética e o biodireito são instrumentos valiosos quem além de permitirem o resguardo do respeito aos princípios basilares, promovem às praticas cientificas a recuperação dos valores humanos. [145]

Assuntos relacionados
Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

WEBER, Fernanda. Transplante de órgãos e tecidos post mortem e a autonomia da vontade do doador versus autorização da família do de cujus. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5883, 10 ago. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/61234. Acesso em: 26 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos