Responsabilidade Civil por Ato de Terceiro

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14/01/2018 às 08:56
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MODALIDADES DE CULPA NA RESPONSABILIDADE CIVIL

Breves Considerações

É cediça a existência de diversas formas ou meios de infringência ao dever jurídico de cuidado, todos corroborando para a mesma idéia, que, de certa forma é imutável, que é o cerne do conceito de culpa em si. A essas diversas formas dá-se a denominação de modalidades ou espécies, conforme veremos abaixo.

Culpa Grave, Leve e Levíssima

A culpa, como vimos, é a violação de determinado dever de cuidado, de trato, no sentido de zelo. Destarte, o fenômeno da culpa é recheado de pormenores conceitos que servem para nos ajudar a entender melhor a manifestação do descuido, que nada mais é que o inverso do dever principal, quando se trata de culpa, e, tudo isto sem modificar, em nenhum momento o conceito ontológico deste instituto. Destarte, a culpa pode ser: Grave, leve e levíssima.

A culpa grave se caracteriza, principalmente, pela grosseira falta de cuidado no trato com as coisas normais do cotidiano e que venham a causar dano. Doutrinariamente se mede a extensão dessa grosseria em comparação com o homem médio, ou normal. Como exemplo dessa modalidade de culpa, temos a culpa consciente, que muito se assemelha ao dolo eventual. A diferença consiste no fato de que na culpa consciente o agente acredita, sinceramente, que o resultado danoso previsto não ocorrerá.

Tratando-se de culpa leve verificamos outras características. A primeira é quanto à atenção, que é ordinária no sentido de ser capaz de evitar o dano. Outra característica é que esta atenção ordinária deve se notabilizar pela habilidade especial ou conhecimento singular, inerente ao homem mediano.

Por seu turno, tem-se na Culpa Levíssima a ausência de atenção extraordinária notabilizada pela ausência de habilidade especial ou conhecimento singular, também inerente ao homem médio.

Culpa Contratual e Extracontratual

Essas duas modalidades de culpa advêm das modalidades de Responsabilidade Civil que já vimos no presente trabalho. Note-se que quando a culpa advier de uma responsabilidade contratual, ou seja, de uma convenção firmada entre duas partes, ela também será denominada contratual. Da mesma sorte, quando advier de uma responsabilidade extracontratual ela também será denominada, elementarmente, extracontratual.

Culpa Concorrente

Ocorre culpa concorrente quando há divisão na responsabilidade pelo dano, ou seja, a vítima também participa da conduta causadora do dano. Daí dizer que a vítima concorreu para o resultado danoso. Esta concorrência pode ser dar por imprudência, negligência ou imperícia.

Culpa Presumida

A culpa presumida surgiu como uma espécie de remédio (solução) para situações em que a possibilidade de se provar a culpa é praticamente impossível e, quando imposta à vitima, surge como mais um dano do que um exercício de direito.Vale lembrar que essa modalidade de culpa tem sua origem no seio dos tribunais por meio das reiteradas decisões.

Nessa esteira tem-se um voto que entrou para a história do direito brasileiro, no que tange à Responsabilidade Civil. Citado na obra de SÉRGIO CAVALIERI, o voto do então Desembargador Ebert Chamoum, relator da Apelação julgada pela 5ª. Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro tratou deste assunto da seguinte maneira:

“No caso vertente a exigência da comprovação de culpa, por parte do autor da ação, é uma demasia, porque resulta às escâncaras do próprio fato: o vão do viaduto desabou sobre a via pública, ocasionando a morte de 29 pessoas e ferimentos em muitas outras, além de danos materiais. Culpa existe, transparente e indiscutível, da pessoa jurídica de Direito Público ou da empreiteira. Se aquela a culpada, malogrará no exercício do direito ao regresso; se culpada esta última, arcará com os ônus das indenizações. Mas exigir do particular que demonstre, em tais circunstâncias, a obviedade da existência da responsabilidade e a demonstração de que incumbe ela a um dos réus, indigitando qual deles, ou a ambos, é até mesmo juridicamente inadmissível. Normas técnicas relativas à elaboração do projeto ou das especificações , ou à execução da obra, foram indiscutivelmente violadas.”

Culpa Contra a Legalidade

Ocorre culpa contra a legalidade quando o agente infringe ato ou norma legal, ou seja, preconizada em lei. Um exemplo bastante recorrente na doutrina é o descumprimento de normas técnicas pré-estabelecidas, como o caso da construção de uma parte, onde os serventes seguem as recomendações dos engenheiros, que por sua vez, seguem as especificações do projeto que devem estar de acordo com as normas do órgão que forneceu o Alvará de Construção que nada mais fez do que cumprir a lei, como, por exemplo, o Plano Diretor. Note-se que quaisquer dos agentes acima trabalham sob um alto nível de previsibilidade acerca do que vão executar e, qualquer deles que praticar ato em desconformidade com o esperado, o previsto, responde por culpa contra a legalidade, pois descumpriu norma legal.

Culpa “in eligendo”, Culpa “in vigilando” e Culpa “in custodiando”  

Como já mencionamos neste trabalho, o Código Civil anterior, o de 1916, era eminentemente subjetivista em se tratando de Responsabilidade Civil, o que não ocorre com o Código de Reale. No tocante a estas modalidades de culpa, o atual Diploma Civilista tratou de mudar essa concepção ao estabelecer no artigo 933, como veremos adiante, que a responsabilidade dos pais, patrão, comitente, etc. é, agora, de natureza objetiva. Não obstante, é salutar trazer à baila uma síntese do conceito de cada uma das modalidades acima mencionadas. Vejamos:

A culpa “in eligendo”, que era a culpa em eleger, ou seja, era a culpa do empregador (patrão) que ao indicar, nomear ou delegar determinada tarefa ao empregado ou outro subordinado, fazia presumir que os atos por estes praticados eram de responsabilidade daqueles. Neste sentido, tinha-se em vigor a letra da Súmula 341 do Supremo Tribunal Federal, littheris:

É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto.

A culpa “in vigilando”, culpa em vigiar, refere-se à responsabilidade daquele que detinha o dever de cuidar, de vigiar determinados procedimentos de responsabilidade direta de outrem. Nesse sentido, a falta dessa diligência, atenção, fiscalização, constituía elemento principal e caracterizador dessa modalidade de culpa.

Por seu turno, a culpa “in custodiano”, caracterizava-se pela ausência  de atenção e cuidado em relação a coisa ou animal que se encontrasse sob a guarda do agente.


NATUREZA JURÍDICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Importante no presente tema é não confundirmos a natureza jurídica da responsabilidade civil com sua função no ordenamento jurídico, por isso é salutar que se consigne que a natureza jurídica é sancionadora, enquanto que a função é meramente reparadora, compensatória, ou seja, tem a função de aliviar a dor, daí dizermos que ao impor uma obrigação (sanção) é também exemplificativa para a sociedade.


RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATO DE TERCEIRO

Breves Considerações

Este tema é o cerne do presente trabalho no vasto cenário da Responsabilidade Civil no ordenamento jurídico brasileiro. O que caracteriza esse segmento é o nexo de legalidade obrigacional entre o causador do dano e aquele que possui o dever de indenizar. Note-se que quando se configura o vínculo causal entre o dano e a conduta e dessa relação jurídica surge uma terceira pessoa, como responsável legal, a esta caberá o dever de reparar o dano causado.

O ordenamento jurídico pátrio passou por grande transformação, recentemente, em razão do novo Diploma Civil. Note-se, conforme visto, que no Diploma de 1916 a Responsabilidade Civil por Ato de Terceiro era supedaneada na subjetividade, pois as situações pertinentes ao tema, e que trataremos em momento oportuno, eram presumidas suas responsabilidades, como no caso dos pais em relação aos seus filhos menores. Já no novo Código Civil, situações como estas deixaram de ser presumidas, saindo do campo da subjetividade e passando para o da objetividade, com amparo nos artigos 932 e 933 do referido Código e que trataremos à frente onde procuraremos deixar claro o instituto da solidariedade existente entre o causador do dano e aquele a quem será imputado o dever legal de reparação. Contra aquele, este poderá ajuizar ação regressiva, o que lhe permitirá ser ressarcido. A exceção se dá por conta de situação onde o agente causador do dano é descendente de quem tem o dever legal ou ainda, quando for considerado, nas conformidades do Código Civilista, pessoa absolutamente incapaz.

A Responsabilidade por fato de outrem é caracterizada também, no caso concreto, por falha de quem tinha o dever legal de cuidados, daí alguns autores a designam por outro nome, conforme leciona CAVALIERI[8], littheris:

“Em apertada síntese, a responsabilidade pelo fato de outrem se constituiu pela infração do dever de vigilância. Não se trata, em outras palavras, de responsabilidade por fato alheio, mas por fato próprio decorrente da violação do dever de vigilância. Por isso, alguns autores preferem falar em responsabilidade por infração dos deveres de vigilância, em lugar de responsabilidade pelo fato de outrem.”

Responsabilidade Civil por Ato de Terceiro no Código Civil Brasileiro

Conforme afirmamos anteriormente, o Código de Reale trouxe importantes mudanças no campo da Responsabilidade Civil, principalmente no tema da Responsabilidade Civil por Ato de Outrem. A mudança mais substancial foi que pelo novo Diploma Civilista, a responsabilidade por fato de outrem, que era presumida, portanto, subjetiva, passou a ser objetiva, conforme se verifica pelas letras dos artigos 932 e 933 do Código Civil, littheris:

Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:

I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;

II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições;

III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;

IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos;

V - os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia.

Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.

Conforme se verifica dos dispositivos acima, tem-se na objetividade desejada pelo legislador um aspecto garantidor da norma, ou seja, a norma veio com o objetivo de ampliar a possibilidade de a vítima ser reparada do dano que sofreu. Destarte, vejamos cada um dos dispositivos expostos acima em suas possibilidades e alcance no ordenamento jurídico.

Responsabilidade Civil dos Pais pelos Filhos Menores

Este primeiro dispositivo (Inciso I do artigo 932 do Código Civil) é um dos mais presentes na Seara Jurídica pátria. O dever de cuidar, de vigiar, de proteger e colocar os filhos no rumo certo é dever primário dos pais que detêm o poder familiar. Importante destacar aqui que a paternidade, per si, não possui o condão de imputar aos pais a responsabilidade por danos causados por seus filhos, há que se verificar se pais se encontram em pleno gozo do Poder Familiar, pois se assim não for, não responderão eles, mas aquele ou aqueles a quem a justiça imputou a responsabilidade por eventuais prejuízos causados. Destarte, é cediço que o fundamento desse instituto encontra-se no Poder Familiar e não no fato de, simplesmente, ser pai ou mãe.

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Neste sentido é Mister trazer à tona uma recente decisão oriunda do Tribunal de Justiça de Minas Gerais[9], de junho de 2008, littheris:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS - DISPARO DE ARMA DE FOGO - FILHO MENOR - VÍTIMA COM SEQÜELAS FÍSICAS E PSÍQUICAS - RESPONSABILIDADE PATERNA - LITISCONSÓRCIO AFASTADO - INIMPUTABILIDADE CIVIL E PENAL DO MENOR - NULIDADE DO PROCESSO REJEITADA - EMBARGOS DECLARATÓRIOS QUE NÃO SE PRESTAM AO FIM DESEJADO PELO APELANTE - NULIDADE REJEITADA - DESPESAS MÉDICAS COMPROVADAS - DANO MORAL FIXADO - ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA CONCEDIDA - RECURSO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO. Não há que se falar em litisconsórcio entre pai e filho menor à época dos fatos, uma vez que o último é inimputável civil e penalmente, não podendo retroagir responsabilidade por fato pretérito. Nulidade do processo rejeitada. Os embargos declaratórios não se prestam à assessoria judicial ou pedido de reconsideração. Nulidade da sentença rejeitada. Constatada a culpa, o dano e o nexo de causalidade, deve ser mantida a sentença que determinou a condenação do pai ao pagamento de indenização por dano moral e material à vítima, em razão de disparo de arma de fogo por seu filho, que gerou lesões físicas e psíquicas. responsáveis pelos danos causados. Dano moral fixado em valor não desarrazoado, e dano material devidamente comprovado.

Na mesma esteira temos decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios[10], littheris:

Ementa

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAL E MORAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. MENOR SEM HABILITAÇÃO. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE CULPA.

1. O ART. 932, INC. I, DO CÓDIGO CIVIL PREVÊ A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PAIS PELOS DANOS CAUSADOS PELOS FILHOS MENORES QUE ESTIVEREM SOB SUA AUTORIDADE E EM SUA COMPANHIA, CONTUDO, É OBJETIVA A RESPONSABILIDADE DOS PAIS, NÃO A DO FILHO.

2. A FALTA DE HABILITAÇÃO PARA CONDUZIR VEÍCULO AUTOMOTOR NÃO GERA A PRESUNÇÃO DE CULPA, DEVENDO ESTA SER PROVADA PARA QUE SURJA O DEVER DE INDENIZAR, NOS TERMOS DO DISPOSTO NO ART. 333, INC. I, DO CPC.

3. RECURSO DESPROVIDO

NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY[11] trazem em sua obra uma decisão que trata deste assunto, littheris:

Ato ilícito praticado por menor. Os pais são responsáveis pela reparação civil dos atos praticados pelos filhos menores que estiverem sob seu poder e em sua companhia, a teor do disposto no artigo 932 no Código Civil de 2002. Delineia-se, na espécie, uma presunção de culpa cuja fonte é justamente o pátrio poder. A momentânea ausência do pai por motivo de viagem na época dos fatos não desfigura a presunção, denotando falta de maior empenho paterno na admonição e preparação do filho. Também, a não imputabilidade deste não funciona como excludente da responsabilidade paterna pela simples razão de que sua fonte é o pátrio poder, abrangendo ela todos os atos ilícitos que pratique, em qualquer situação, porque a vigilância que lhe incumbe é universal e contínua, não podendo, pois, pretender que com relação a determinados atos submetidos a essa vigilância não se configure sua responsabilidade (RT 651/73).”

Uma modalidade de caso concreto bastante comum no ordenamento jurídico pátrio é o caso de acidente de trânsito onde um dos envolvidos é menor de idade e, conseqüentemente não possui habitação para conduzir veículos automotores. Note-se, que nesses casos, não há falar em presunção de culpa por ser o causador do dano menor de idade, ao contrário, a culpa deve ser provada, e, só então, é que nasce a responsabilidade objetiva dos pais ou responsáveis legais. Nesse sentido tem-se a recente decisão[12] emanada do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, littheris:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAL E MORAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. MENOR SEM HABILITAÇÃO. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE CULPA.

1. O art. 932, inc. I, do Código Civil prevê a responsabilidade civil dos pais pelos danos causados pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia, contudo, é objetiva a responsabilidade dos pais, não a do filho.

2. A falta de habilitação para conduzir veículo automotor não gera a presunção de culpa, devendo esta ser provada para que surja o dever de indenizar, nos termos do disposto no art. 333, inc. I, do CPC.3. Recurso desprovido.

Por fim, têm-se os casos concretos em que os responsáveis legais não possuem meios para subsidiar os prejuízos que lhe são imputados por força de lei. Nesses casos, os próprios incapazes deverão responder pelos prejuízos que causaram. Note-se que o legislador foi sábio e fez constar no Diploma civilista de Reale o artigo 928, littheris:

Art. 928. O incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes.

Parágrafo único. A indenização prevista neste artigo, que deverá ser eqüitativa, não terá lugar se privar do necessário o incapaz ou as pessoas que dele dependem.

Note-se que pelo referido artigo corrige-se eventuais injustiças, onde o incapaz, conhecedor de sua condição de inimputabilidade civil e penal, possa vir a tramar e causar prejuízos em face de seu responsável legal.

Responsabilidade Civil dos Tutores e Curadores pelos Tutelados e Curatelados

O instituto da tutoria encontra-se preconizado no Código Civil no artigo 1.728 que estabelece que os filhos menores é que são postos sob tutela e em quais condições isto ocorre, littheris:

Art. 1.728. Os filhos menores são postos em tutela:

I - com o falecimento dos pais, ou sendo estes julgados ausentes;

II - em caso de os pais decaírem do poder familiar.

É importante mencionar que o Poder Familiar, fundamento da reparação civil por ato de outrem, no caso dos pais, possui o mesmo sentido no caso dos tutores, uma vez que estes, que possuem a responsabilidade legal sobre aqueles, ao receber esse munus publicum recebe também o poder familiar daí estar apto a ser responsabilizado civilmente pelos danos que os tutelados venham a causar.

Nos casos de curatela, o Código Civil preconiza no seu artigo 1.767 as pessoas que estão sujeitas à interdição, littheris:

Art. 1.767. Estão sujeitos a curatela:

I - aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para os atos da vida civil;

II - aqueles que, por outra causa duradoura, não puderem exprimir a sua vontade;

III - os deficientes mentais, os ébrios habituais e os viciados em tóxicos;

IV - os excepcionais sem completo desenvolvimento mental;

V - os pródigos.

Fato bastante recorrente na doutrina e na jurisprudência é o entendimento de que, em casos de tutela e curatela, seria recomendável ao magistrado, ao se deparar em casos de Responsabilidade Civil por ato de outrem, especificamente a tutela ou a curatela, devesse ele ser benevolente para com os tutores e os curadores, por tratar-se de munus publicum. Ademais, tais personagens exercem seus cargos, geralmente sem receber qualquer remuneração pelos serviços que presta.

Responsabilidade Civil do Empregador ou Comitente Pelos Atos dos seus Empregados, Serviçais ou Prepostos no Exercício do Trabalho que lhes Competir, ou em Razão dele

Como se verifica nas letras deste tema, essa modalidade de responsabilidade possui duas vertentes, ou, digamos assim, duas submodalidades ou subespécies, como preferir. Notemos ainda que no caso da responsabilidade do empregador não resta muita celeuma em torno desse instituto. Deve-se, porém, observar que é elementar para a responsabilização do empregador a presença do vínculo empregatício entre este e o agente que, efetivamente, causou o dano.

Tratando-se de comitente[13], o fundamento pode se originar de n relações que dêem origem a vínculos obrigacionais entre as partes. Ressalta-se, porém, que o vínculo não pode ser empregatício, pois, se assim o fosse, ter-se-ia a figura do empregador e não do comitente.

Segue abaixo a Ementa de um acórdão[14] emanado do Tribunal de Justiça do distrito Federal, onde se verifica, no caso concreto, o uso dos dispositivos que ora tratamos, littheris:

INDENIZAÇÃO. PRELIMINAR. NULIDADE DA SENTENÇA E CERCEAMENTO DE DEFESA. FURTO EM UNIDADE INDIVIDUAL DE CONDOMÍNIO. ACERVO PROBATÓRIO INDICANDO ENVOLVIMENTO DOS EMPREGADOS DA CONSTRUTORA. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR. SENTENÇA MANTIDA.

1 - Trata-se de ação indenizatória em que os autores pretendem ser reparados por danos materiais que suportaram em decorrência de invasão e furto de seu apartamento. Consta dos autos que o acesso ao imóvel dos requerentes se deu pela obra contígua ao condomínio em que residem, sendo que tal obra é de responsabilidade da requerida e que o ato foi praticado supostamente por operários ali empregados.

2 - Suscita, a recorrente, preliminar de nulidade da sentença ao argumento de que o decisum não menciona os dispositivos legais em que se fundamenta, violando, assim, o art. 458, II e III, do CPC, e, por conseqüência, seu direito de defesa. Na hipótese, entretanto, o juízo monocrático, diante das provas produzidas, fundamentou sua decisão no art. 932, III, do Código Civil Brasileiro. Ademais, o inciso III, do art. 458, do estatuto processual civil, ao exigir que a sentença contenha dispositivo, não se refere a dispositivo legal, mas ao comando judicial, à decisão efetiva das questões discutidas.

3 - Assim, não há violação ao direito de defesa, por ausência de fundamentação porque a sentença foi adequadamente motivada, mencionando, inclusive, o dispositivo legal em que se baseou o julgador. Registre-se que toda a matéria ventilada nos autos foi examinada e decidida, tanto que a recorrente, no mérito, destacou os termos da fundamentação do decisum. Preliminar rejeitada.

4 - No mérito, ressalte-se que consta da sentença vergastada que "Na hipótese, o laudo pericial não fomenta por si só a conclusão de que os funcionários da empresa ré - responsável pela edificação dos blocos A e B do empreendimento Edifício Portal do Parque, tenham de fato invadido o apartamento dos autores e de lá subtraído pertences pessoais que foram declinados na Ocorrência Policial - fls. 47/49. O convencimento nesse sentido adveio do depoimento das partes em juízo, da prova testemunhal produzida, da clarividência dos autores no sentido de que delatar à Autoridade Policial ato ilícito que saibam inexistir os torna agente de crime - artigo 339 do CP e dá certeza de que os indícios consignados no laudo em referência traduzem a verossimilhança da alegação" (fl. 117).

5 - Importa anotar, no que concerne à produção das provas, que a falta de degravação de fita magnética utilizada durante a solenidade de instrução e julgamento impõe o deslinde da questão somente com base nas provas colhidas durante a instrução processual, devidamente consignadas na sentença. Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado: DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS. PERÍCIA INCONCLUSIVA. AUSÊNCIA DE DEGRAVAÇÃO DE DEPOIMENTOS. IMPOSSIBILIDADE DE RECONSTITUIÇÃO DA DINÂMICA DO ACIDENTE EM SEDE RECURSAL. RECURSO IMPROVIDO.

Não tendo o informe pericial logrado alcançar conclusão acerca da dinâmica do acidente de trânsito que envolveu as partes e não existindo degravação dos depoimentos de testemunhas colhidos em Juízo, a sentença é o único fundamento em que pode se amparar a Turma Recursal para reexaminar os fatos da causa. Nessas condições, se o recorrente não traz alegações novas capazes de infirmar o que está contido na sentença, esta deve ser mantida. Recurso improvido. (20070110173305ACJ, Relator ESDRAS NEVES, Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do D.F., julgado em 11/03/2008, DJ 07/04/2008 p. 139).

6 - Registre-se que, de acordo com os artigos 932, III, e 933, ambos do Código Civil, o empregador é responsável, independentemente de culpa sua, pelos atos praticados por seus empregados, no exercício do trabalho ou em razão dele. Nesse sentido, foi editada a Súmula 341 do Supremo Tribunal Federal, in verbis: "É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto". Assim, ainda nos termos da sentença, "a outra conclusão não se pode chegar senão a de que há que prevalecer a tese dos autores para a condenação da empresa ré".

7 - Custas e honorários, que fixo em 10% (dez por cento) do valor da condenação (artigo 55, da Lei nº 9.099/95), pela recorrente.

8 - Sentença mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, com súmula de julgamento servindo de acórdão, na forma do artigo 46 da lei 9099/95.

Ainda no mesmo Tribunal, a Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais, assim se posicionou na ementa[15] a seguir:

AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANO. ACIDENTE DE TRÂSITO. ATO DE EMPREGADO OU PREPOSTO. ART. 932, CC. LAUDO PERICIAL. IMPUGNAÇÃO. MERA ALEGAÇÃO. ÔNUS DE PROVA.

- Acidente de trânsito, causado por empregado ou preposto, atrai a responsabilidade do empregador ou comitente.

- Existindo perícia realizada por órgão público especializado, para afastar suas conclusões, é preciso prova robusta em contrário. Meras alegações não invalidam o resultado do laudo pericial.

- Recurso improvido.

O Direito de regresso é o fato de alguém, por ter satisfeito o direito de outrem, adquire direito de reembolso contra terceiro. Esse instituto é bastante utilizado em casos de Responsabilidade civil por ato de outrem, no caso dos empregadores. O Artigo 934 do Código Civil é claro ao preconizar o direito de regresso em face do causador do dano. Nesse diapasão, é importante trazer à baila dispositivo da CLT que regula o mencionado direito de regresso em se tratando de relação com vínculo empregatício, littheris:

Art. 462 - Ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositivos de lei ou de contrato coletivo.

        § 1º - Em caso de dano causado pelo empregado, o desconto será lícito, desde de que esta possibilidade tenha sido acordada ou na ocorrência de dolo do empregado.

        § 2º -   É vedado à empresa que mantiver armazém para venda de mercadorias aos empregados ou serviços estimados a proporcionar-lhes prestações " in natura " exercer qualquer coação ou induzimento no sentido de que os empregados se utilizem do armazém ou dos serviços. 

        § 3º - Sempre que não for possível o acesso dos empregados a armazéns ou serviços não mantidos pela Empresa, é lícito à autoridade competente determinar a adoção de medidas adequadas, visando a que as mercadorias sejam vendidas e os serviços prestados a preços razoáveis, sem intuito de lucro e sempre em benefício dos empregados.

        § 4º - Observado o disposto neste Capítulo, é vedado às empresas limitar, por qualquer forma, a liberdade dos empregados de dispor do seu salário.

Responsabilidade Civil dos Donos de Hotéis, Hospedarias e Estabelecimentos Educacionais por Ato dos seus Hóspedes, Moradores e Educandos

No dispositivo acima temos dois temas distintos sendo abordados no mesmo inciso. O primeiro diz respeito aos donos de hotéis e hospedarias, por ato dos seus hóspedes e moradores. O outro tema diz respeito aos estabelecimentos de ensino por atos de seus educandos. Com efeito, ambos os institutos foram, de certa forma, suprimidos, ainda na vigência do Código de 1916, pela chegada da Lei 8.078/90, o Código de Defesa do Consumidor. Isto aconteceu porque, por se tratar de um diploma disciplinador da prestação de serviços, fez surgir para o fornecedor o dever de prestar serviços de qualidade, sendo este, pois, o fundamento desta modalidade de Responsabilidade.

Nesse sentido vejamos a letra do artigo 14, caput e parágrafo 3º. do Código de Defesa do Consumidor, littheris:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

[...]

§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

        I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

        II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Importante notar que cada um dos dispositivos acima mencionados possui uma peculiaridade que entendemos ser importante trazer à baila no presente contexto. Senão vejamos: No caso dos donos de hotéis é comum encontrarmos avisos nas portarias, nos corredores e nos quartos com dizeres como: “não nos responsabilizamos por objetos deixados nos quartos”. Ainda: “não nos responsabilizamos por objetos furtados ou roubados no interior deste estabelecimento.”

É claro que diante de um direito tão atuante e garantista de direitos fundamentais como o é o direito brasileiro na atualidade, frases como estas podem soar como afronta ao direito posto, mas para os leigos, avisos deste tipo são normais ou, no mínimo, não chegam a causar mal estar moral. Entretanto, a verdade é que tais avisos não passam de ofensa aos princípios que militam em favor da valoração da moral nas relações de consumo.

Nessa esteira, alerta o ilustre doutrinador SÉRGIO CAVALIERI[16], littheris:

“Em nada favorece o hotel fixar avisos nos apartamentos, salas de recepção e outros locais ostensivos no sentido de que não se responsabiliza por eventuais danos pessoais sofridos por seus hóspedes, nem em relação aos seus valores e bagagens. A responsabilidade dos fornecedores de serviços é fixada por lei, não podendo ser afastada por cláusula de não indenizar unilateralmente estabelecida. O art. 51, I, do Código do Consumidor reputa abusiva essa cláusula, pelo quê nula de pleno direito. A responsabilidade do hoteleiro só poderá ser excluída nas hipóteses previstas no parágrafo 3º. do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor.”

Por seu turno, os estabelecimentos de ensino respondem, da mesma forma, objetivamente, pelos danos causados pelos seus educandos, mas somente no período em que estiverem sob sua vigilância, ou seja, na escola ou em eventos promovidos pela escola, como passeios e excursões, dentre outras atividades extra-classes.

Responsabilidade Civil pelo Produto de Crime

O primeiro ponto que desejamos chamar atenção nesta modalidade de Responsabilidade Civil é a solidariedade existente entre todos aqueles que vierem a participar, efetivamente, do produto de crime.

O segundo ponto, igualmente importante, é que se infere desta modalidade uma espécie de proibição à locupletação. Destarte, aquele ou aqueles que se beneficiam do produto do crime, devem, além de devolver o respectivo produto ou o que adquiriu por meio dele, também, ressarcir outro prejuízo que tenham causado em virtude do primeiro ato, pois entendemos que a simples devolução do produto não supre a carência de justiça, principalmente quando a locupletação se deu em virtude de dolo do agente.

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Sobre o autor
Antonio Sólon Rudá

Antonio Sólon Rudá é um Jurista brasileiro, especialista em ciências criminais, Ph.D. student (Ciências Criminais na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra); e MSc student (Teoria do Direito pela Fac. de Direito da Universidade de Lisboa); É membro da Fundação Internacional de Ciências Penais; É membro julgador do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-DF; Autor de artigos e livros jurídicos; É Advogado cível e trabalhista; e Sócio fundador do Escritório Sanches & Sólon Advogados Associados. E-mail: [email protected]. WhatsApp 61 9 9698-3973. Currículo: http://lattes.cnpq.br/7589396799233806. 

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

O presente trabalho foi elaborado durante o curso de doutorado na Universidade de Buenos Aires em fevereiro de 2011.

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