Lineamentos da reforma politica brasileira: O sistema proporcional e a possível mudança para o Sistema Distrital

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02/02/2018 às 00:27
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2. SISTEMAS ELEITORAIS

A organização partidária é a chave para a manutenção de um governo representativo, isto é, um sistema político em que os membros da sociedade, submetidos a um governo, escolhem indivíduos para representar seus anseios dentro do jogo político.[40] Essa forma de governo representativo justifica-se diante das dificuldades decorrentes do próprio sistema de decisões diretas, em que a população vota diretamente nas questões de seu governo, já que a realização de frequentes votações absolutas é demorada e muito pouco prática.

Dessa maneira, as organizações partidárias variam de acordo com o sistema eleitoral ao qual estão submetidas. Noberto Bobbio define um sistema eleitoral como os “procedimentos institucionalizados para atribuição de encargos por parte dos membros de uma organização ou de alguns deles.”[41]

Deste modo, de forma mais simples, e possivel dizer que um sistema eleitoral é a forma como são estipuladas as regras que determinam como os votos de uma eleição atuarão na definição do corpo político que exercerá o poder de um governo legítimo.[42]

Nas estruturas políticas dos países que vivem sob o regime democrático representativo, os partidos políticos são parte essencial de sua organização. Para tanto, a definição de “partidos políticos” esta como uma organização voltada para a disputa do controle legítimo do governo de uma nação por meio de um processo eleitoral, ou seja, pelo voto.[43]

As formas como se organizam esses grupos partidários dependem de como são estipuladas as regras de embate político de uma nação. Dito isso, os sistemas podem ser tanto unipartidários, em que apenas um partido único forma o cenário político de uma nação, bipartidários, em que apenas dois partidos políticos disputam o poder, ou pluripartidário, em que vários partidos diferentes envolvem-se na disputa política.

2.1 SISTEMA MAJORITÁRIO

O sistema eleitoral majoritário é utilizado em nosso país na definição de cargos do Poder Executivo, segundo dispõe o art. 77 da CF/88 para cargos de presidente, governador e prefeito e para os cargos do Senado Federal. Existem as classificações de sistema majoritário por maioria simples, dois turnos como ocorre nas eleições para o Executivo ou voto alternativo.[44]

O sistema majoritário em dois turnos considera um percentual mínimo a ser alcançado, geralmente acima de metade do total de votos, pelo candidato mais votado. Se esse candidato não conseguir alcançar o número de votos no primeiro turno, disputará um segundo turno com o segundo candidato mais votado.[45]

Uma das vantagens desse tipo de sistema eleitoral é que ele garante que os candidatos sejam eleitos com número de votos expressivos, o que garante maior legitimidade ao seu mandato. Outra vantagem é que os partidos extremistas tendem a ter maiores dificuldades em conseguir representação, já que dificilmente conseguem forjar alianças com partidos mais moderados. Um partido de extrema-direita, por exemplo, teria maior dificuldade em angariar apoio dos demais partidos de posição política mais branda.

No sistema majoritário com voto alternativo, o eleitor vota em mais de um candidato, construindo uma ordem de importância, de forma que caso seu candidato preferido não consiga ter votos expressivos, para que aquele voto não seja desperdiçado, ele é transferido para o segundo candidato ordenado na lista do eleitor. Esse é o sistema usado para a eleição de deputados na Austrália desde 1918.[46]                                              

2.2 SISTEMA PROPORCIONAL

Os sistemas proporcionais seguem conforme disposição do art. 105 do Código Eleitoral Brasileiro e baseiam-se na preocupação em relação à representatividade da sociedade dentro do Legislativo. Seus defensores argumentam que as diferentes opiniões que tenham força expressiva no meio social devem também ser representadas no cenário político. Assim sendo, o Poder Legislativo deve ser um espelho da sociedade que encabeça.

A obra do jurista Thomas Hare, em seu livro publicado em 1859 de nome “Tratando sobre eleição de representantes parlamentar e municipal”, foi uma das principais inspirações para a construção dos sistemas proporcionais de representação.[47] A idéia também foi fortemente defendida por Stuart Mills em sua obra “O governo representativo”, que defendia que a representação deveria alcançar também os anseios individuais dos eleitores, e não apenas os comuns ou os que são levantados por partidos.[48]

O objetivo da fórmula proporcional é garantir que as cadeiras de um Parlamento sejam distribuídas proporcionalmente à porcentagem de votos que cada partido conseguiu angariar. Dessa forma, se um partido consegue arrecadar 30% dos votos totais, teoricamente, ele deve receber 30% dos cargos que disputa.[49]

Para ficar mais claro, há que se imaginar que haverá uma eleição pelo sistema proporcional em que serão utilizadas fórmulas eleitorais bastante simplificadas. Cada partido receberá uma quantidade de cadeiras de acordo com a porcentagem direta de votos que conquistou. Nessa eleição imaginária, temos três partidos, “x”, “y” e “z”, que disputaram 10 cadeiras de um Parlamento. Digamos ainda que o partido “x” conseguiu conquistar 50% dos votos válidos, o que proporcionalmente lhe garante cinco das dez cadeiras em disputa. Já o partido “y” conseguiu angariar votos suficientes para conquistar 30% dos votos e obteve três cadeiras. O partido “z”, por sua vez, conseguiu apenas 20% dos votos, recebendo as duas últimas cadeiras.

A partir dessa distribuição, os cargos passam a ser distribuídos de acordo com a quantidade de votos de cada candidato dentro do partido. Tendo chegado a esse resultado, se o candidato “A” do partido “x” recebeu 10.000 votos; “B”, a segunda mais votada, recebeu 5000 votos; “C” recebeu 4000 votos; “D”, 3000 votos e “E”, 1000 votos. Como esses foram os cinco candidatos mais votados dentro do partido, eles receberiam as cinco cadeiras destinadas ao partido “x”. A distribuição seria feita da mesma forma nos demais partidos até que todas as cadeiras fossem ocupadas.

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A diferença básica dos dois principais sistemas eleitorais é que enquanto o sistema majoritário busca garantir a eleição de candidatos que conseguem arrecadar mais votos, o sistema proporcional busca garantir que os cargos sejam distribuídos de forma proporcional em relação à quantidade de votos recebidos pelos concorrentes.[50]

As discussões recentes que foram reacendidas nas propostas da reforma política que se desenrola em nosso sistema político debatem também os méritos e desméritos desses sistemas eleitorais. Aqueles que defendem a adoção de um sistema majoritário pautam-se na tendência ao bipartidarismo ou ao unipartidarismo. A vantagem estaria no maior controle que os eleitores teriam sobre seus representantes, que seriam diretamente escolhidos mediante a contagem absoluta de votos. Aqueles que advogam pelo sistema proporcional entendem que, no Parlamento de uma nação, a diversidade da comunidade que o elegeu deve estar representada. Teoricamente, as eleições proporcionais garantiriam que minorias conquistassem representação mesmo com uma quantidade pequena de votos.

2.3 SISTEMA DISTRITAL

Segundo definições encontradas na doutrina brasileira pertinente ao Direito Eleitoral, o sistema distrital puro é um modelo eleitoral que visa dividir uma determinada localidade em várias regiões, tantas quantas forem necessárias para o preenchimento de um determinado número de cadeiras disponíveis.[51] Em outras palavras, na esfera federal, o número de cadeiras disponíveis aos Deputados Federais são de 513 cadeiras (art. 45, Constituição Federal e Lei complementar n° 78 de 1993), sendo assim, o Brasil seria dividido em 513 regiões ou distritos, sendo que esses distritos seriam divididos proporcionalmente ao número de eleitores de cada região. 

Nesses distritos os partidos políticos lançariam apenas um candidato para tentar a vaga, e a eleição seria feita aos moldes do sistema majoritário naquela determinada região, assim como ocorre, atualmente, com os Senadores. Assim, o candidato mais votado seria eleito e responsável por aquela região que o elegeu, tornando a fiscalização da Justiça local, do Tribunal de Contas local, da Imprensa local e, fundamentalmente, da população que o elegeu, muito mais eficaz. O trabalho do deputado eleito nesses moldes seria, também, mais específico àquela determinada região, e como já mencionado, esses deputados estarão sendo observados bem de perto.

Quando a população percebe realmente o desvio de conduta de um determinado deputado, ela não o perdoa e não o reelege. Esse trabalho será muito mais fácil nos moldes do sistema distrital[52], pois a imprensa poderá vigiar e noticiar nos jornais locais, por conseguinte, a população verificará se o deputado eleito está ou não trabalhando corretamente, conforme as expectativas. Dessa forma, o cidadão irá sentir o poder de sua cidadania, que é muito mais do que um simples voto, é um voto de confiança, esperança e capacidade de avaliar, no futuro, se sua escolha foi acertada ou não.[53]

Podemos verificar que o sistema distrital puro, é um sistema que divide uma determinada localidade em várias regiões, e destas, serão eleitos os candidatos com o maior número de votos.

2.3.1 Sistema distrital misto

O sistema distrital misto é defendido pelo aspecto de dividir os parlamentares em “gerais”, os quais seriam eleitos pelo sistema proporcional, e os “específicos”, que seriam eleitos pelo sistema distrital. Seria um meio de integração da vontade popular de eleger seu partido e seu candidato específico.

Carlos Fernando Correa de Castro diz que

a adoção do sistema voto distrital misto para eleições para o Legislativo é necessidade imperiosa. Entre muitas razões, pelo efeito moralizador do processo eleitoral e responsabilização dos que venham a ser eleitos”, afirmando, também, que no sistema distrital misto “o eleitor dispõe de dois votos; um para o candidato distrital, outro para um candidato “geral” (ou de toda coletividade)[54]

Este sistema vigora na maior parte da Europa e dos Estados Unidos. Os parlamentares deixam de ser eleitos pelo sistema proporcional e passam a a ser eleitos pelo sistema majoritário, sendo que os mais votados vencem independentemente de cálculos sobre quociente eleitoral.[55]

2.3.2 Sistema “distritão”

Pela maioria simples, mais conhecido em nosso meio como “voto distrital” ou “distritão”, a contagem de votos é feita e o candidato que alcança a maioria absoluta de votos é eleito. Esse é o sistema utilizado no Reino Unido, para a eleição de deputados, e em inúmeros outros países, como os Estados Unidos, o Canadá e a Índia.[56]

A organização das eleições nesse sistema é feita a partir da divisão de distritos eleitorais com um número semelhante de eleitores. Na Inglaterra, por exemplo, o território é dividido em 659 distritos eleitorais, cada um com aproximadamente 69 mil eleitores. Cada um desses distritos deve eleger um representante, e cada partido apresenta apenas um candidato por distrito. O candidato mais votado de cada distrito é eleito.[57]

Por ser um modelo que enfraquece os partidos políticos, ele tem sofrido criticas de estudiosos e políticos. Já seus defensores o defendem com a alegação que ele anula o voto de legenda, de modo que os eleitos com votação menos expressiva não mais seriam beneficiados por aqueles de expressiva votação.[58]

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Sobre o autor
André De Jesus

Advogado, assessor parlamentar, professor universitário. Sou especialista em direito público e eleitoral, mestrando em Ciências da Educação e doutorando em Direito Constitucional pela Universidade de Buenos Aires.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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