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Apropriação indébita da contribuição para financiamento da Seguridade Social (Cofins)

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07/03/2005 às 00:00
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CONCLUSÃO

Conclui-se com a presente pesquisa que a legislação infraconstitucional afronta diretamente a Constituição Federal promulgada em 1988, conforme se verificou ao longo do trabalho, que demonstrou que após a criação da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), pela Lei Complementar nº 70/91, inúmeras Leis, Medidas Provisórias, Portarias, dentre outras, foram editadas, formando um verdadeiro entranhado de normas, que ao serem analisadas mostram-se quase que totalmente irregulares, sem o devido respeito à democracia e a ordem.

Ferem-se diretamente direitos e garantias dos cidadãos valendo-se de modos ardis para empurrar problemas evidentes para outras gestões políticas. Aliás, o que parece é que as referidas normas são elaboradas por pessoas despreparadas, que visam não uma sociedade como um todo criando normas que sirvam para o futuro, mas ao contrário, procuram corrigir problemas da sociedade como se fossem operários tapando buracos no asfalto, sem se preocupar com as conseqüências futuras ou mesmo com a verdadeira regularidade e constitucionalidade das normas que criam.

O uso indiscriminado de Medidas Provisórias vem ferindo o artigo 1º, § 1º da CF/88, que expressamente afirma que o poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, pois, quem é eleito para fiscalizar e criar leis não é o Presidente da República, por meio de Medidas Provisórias, mas sim, do poder legislativo, eleito com este específico fim.

Conclui-se ainda, que não pode existir apropriação indébita de Cofins, pois a conduta de deixar de recolher o tributo não caracteriza o tipo penal, uma vez que, para haver este crime deve haver a entrega da coisa pelo sujeito passivo ao sujeito ativo, que num segundo momento nega-se a restituí-la, o que não acontece com a retenção de tributos, que simplesmente não saem da posse do "sujeito ativo", por tanto não passam de débitos.

Como também não se pode imputar crime de apropriação indébita de um tributo quase que plenamente irregular e inconstitucional, já que desde sua constituição vem sendo alterado, tendo tido sua base de cálculo aumentada de forma irregular, sua alíquota, aumentada mais de uma vez, também por meio inadequado e inconstitucional. Afinal se o tributo é irregular e/ou inconstitucional, não deve ser recolhido e sendo assim, não há que se falar em apropriação de valor pertencente à fazenda pública.

Caso se entendesse, mesmo que de forma equivocada, que o tributo é regular e exigível, o não recolhimento no prazo enseja, de acordo com previsão da lei 8.137/98, crime contra a ordem pública, sujeito à pena de prisão e multa.

No entanto, conclui-se, embora fugindo ao foco do trabalho, que nem mesmo neste caso se poderia imputar pena de prisão, pois, trata-se de dívida e sendo assim haveria que se observar o disposto na Constituição Federal que proíbe expressamente a prisão por dívida.

Também se pode concluir que caso realmente fosse crime, como menciona o texto legal (embora segundo nosso entendimento, inconstitucional) haveria que se respeitar o contraditório, a ampla defesa, o princípio de inocência, ao contrário do que vem acontecendo atualmente, além do princípio da isonomia, dando ao acusado o direito de permanecer calado, incluindo-se aí o de não declarar nada que pudesse comprometê-lo, ou mesmo mentir sobre os fatos como é assegurado a todo acusado por crime, seja de qual for à espécie, mesmo aqueles contra a vida, que "supostamente" se sobrepõe ao direito do fisco de cobrar dívidas.

Mas o que acontece é o contrário, o contribuinte é obrigado a declarar ao fisco todas as operações que realiza, sob pena de multas exorbitantes como é o caso das multas por atraso na entrega da declaração denominada Dacon, que é de 5 mil reais, independentemente da capacidade contributiva da empresa, mais 100 reais por erro encontrado, caso ocorra.

Infelizmente, o que se tem visto, cada vez mais, é o uso da força, de forma irracional, como meio de se combater supostos ilícitos, seja qual for sua magnitude, inclusive, em muitos casos com o "apoio" da inércia popular.

Desta forma, trazem de volta ideais como o da ditadura, mas de forma ainda pior do que a que conhecemos, pois, os ditadores do passado, demonstravam de forma clara suas idéias, de forma que se podia perceber, apoiar ou repudiar.

Ao contrário, os atuais governantes "pregadores da democracia", fazem o que querem e de forma sutil impõem aos cidadãos que façam aquilo que é a obrigação do Estado, como a apuração dos tributos, por exemplo, sob pena como vimos, de multas exorbitantes e até confiscatórias, ou, até mesmo, de restrição à liberdade, agindo de forma contrária ao seu principal papel junto à sociedade, que é a defesa das garantias e dos princípios constitucionais.


REFERÊNCIAS

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Julgado STF - RE 351.717-Pr, Rel. Min. Carlos Velloso, j. em 08-10-03, in Boletim Informativo STF nº 324.

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Lei Complementar nº 70/91; Leis Ordinárias 8.212/91, 9.430/96, 9718/98, 10833/03, 10865/03, 10925/04; Emenda Constitucional 20/98 – disponíveis em http://www.planalto.gov.br.

MACHADO, Hugo de Brito – Algumas questões Relativas aos Crimes Contra Ordem Tributária, disponível em: www.forense.com.br/Atualida/Artigos_DP/344dou03.htm, acessado em 20/09/2004.

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Yong, Lúcia Helena Briski – Contribuições Sociais, Resumo Prático – 3ª Edição, Ed. Juruá


NOTAS

1 Idem

2 Greco, Marco Aurélio. Contribuições (uma figura sui generis). SP: Dialética, 2000.

3 COELHO, Sacha Calmon Navarro, Curso de Direito Tributário Brasileiro, p. 243-256; CARVALHO, Paulo de Barros, Curso de Direito Tributário, p. 42-44

4 AMARO, Luciano, Direito Tributário Brasileiro, p. 27 e 28.

5 CASSONE, Vittorio, Direito Tributário, 9ª ed.: Atlas, 1996, p. 60 e 61; MARTINS, Ives Gandara, Comentário ao Código Tributário Nacional; SPAGNOL, Werther Botelho, As Contribuições Sociais no Direito Brasileiro;.

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6 CTN "Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada."

7 Cofins garante arrecadação recorde em março/2004 – "O Estado de São Paulo, 15 de Abril de 2004".

8 Ações Cautelares nº 193, 260 e 265.

9 Art. 154. A União poderá instituir: I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição;

10 CF/88 Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

11 HARADA, Kiyoshi. COFINS: aspectos controvertidos. Jus Navigandi, Teresina, a. 8, n. 241, 5 mar. 2004. Disponível em: jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=4956>. Acesso em: 12 out. 2004.

12 RE 351.717-Pr, Rel. Min. Carlos Velloso, j. em 08-10-03, in Boletim Informativo STF nº 324.

13 HARADA, Kiyoshi. COFINS: aspectos controvertidos. Jus Navigandi, Teresina, a. 8, n. 241, 5 mar. 2004.

14 Yong, Lúcia Helena Briski – Contribuições Sociais, Resumo Prático – 3ª Edição, Ed. Juruá "Prefácio"

15 Regime Tributário Regulado pelo Regulamento do Imposto de Renda vigente (RIR/99), que vem a ser a apuração dos tributos somente sobre o lucro apurado com a soma das receitas e dedução das despesas e custos, assim determinados pelo referido regulamento.

16 O fato de a Medida Provisória ter sido convertida em lei, não faz desaparecer o vício, pois não foi resultado de projeto de lei, mas de conversão de Medida Provisória editada pelo executivo.

17 Art. 2º O valor da retenção da CSLL, da Cofins e da Contribuição para o PIS/Pasep será determinado mediante aplicação, sobre o valor bruto da nota ou documento fiscal, do percentual total de 4,65%, correspondente à soma das alíquotas de 1%, 3% e 0,65%, respectivamente, e recolhido mediante o código de arrecadação 5952.

18 HARADA, Kiyoshi. COFINS: aspectos controvertidos. Jus Navigandi, Teresina, a. 8, n. 241, 5 mar. 2004.

19 Salles Júnior, Romeu de Almeida – Apropriação Indébita, vol. 8, 3ª ed., editora Juruá. p.13

20 Art. 5°, LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel

21 disponível em http://www.cni.org.br/adins/1055.htm, acessado em 12/10/2004.

22 GRECO, Marco Aurélio – Notas à legislação sobre crimes fiscais. Caderno de direito tributário e finanças públicas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994 n. 8.

23 CANTO, Gilberto de Ulhôa e CARVALHO, Luiz Felipe Gonçalvez de. Crimes contra Ordem Tributária, In MARTINS, Ives Gandra da Silva. Crimes contra a ordem tributária. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.

24 Nesse regime a fonte pagadora substitui o contribuinte no momento em que surge a obrigação tributária.

25 A fonte pagadora fica obrigada ao recolhimento do imposto, ainda que não o tenha retido.(art. 722 RIR/99).

26 Neste caso, além da responsabilidade atribuída à fonte pagadora para a retenção e recolhimento do tributo, a legislação determina que a apuração definitiva seja feita pelo contribuinte.

27 TJRS – Ap. Crim. 2.914.489 – Câm. Esp. Crim. – Rel. Des. Reinaldo José Rammé – J. em 04.12.2001

28 Art. 5º LXVII, CF/88.

29 MIRABETE, Julio Fabbricio – Processo Penal 14ª edição, Ed. Atlas – São Paulo 2002, p. 54

30 MACHADO, Hugo de Brito – Algumas questões Relativas aos Crimes Contra Ordem Tributária, disponível em: www.forense.com.br/Atualida/Artigos_DP/344dou03.htm, acessado em 20/09/2004.

31 "No caso versado nos autos, não se constata o vinculo entre a substituição tributária indicada pela lei e o fato imponível dos tributos, o que viola o princípio da segurança jurídica", escreveu a juíza Cristiane Farias Rodrigues dos Santos, baseando sua decisão no art. 128 do ctn.

32 Jornal Valor Econômico de 07/10/2004 – edição 1112, por Marta Watanabe – São Paulo.

33 Referia-se à Lei 9.034/95 que dispõe sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas.

34 MEDEIROS, Osmar Fernando de – Devido Processo Legal e Indevido Processo Penal – Ed. Juruá – Curitiba, 2000, p. 104-105.

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Sobre o autor
Alecson Pegini

contador e bacharel em Direito em Maringá (PR)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEGINI, Alecson. Apropriação indébita da contribuição para financiamento da Seguridade Social (Cofins). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 607, 7 mar. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6407. Acesso em: 26 abr. 2024.

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