Indenização ao pai por aborto cometido sem seu consentimento

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O trabalho objetivou analisar as responsabilidades jurídicas existentes ao aborto praticado pela gestante sem o consentimento do genitor, buscando-se avaliar num plano teórico a responsabilização da gestante perante o ordenamento jurídico brasileiro.

INTRODUÇÃO

Responsabilidade é uma obrigação jurídica imposta a todos como forma de responder por ação ou omissão imputável que signifique lesão ao direito de outrem, protegido por lei. Para Cristiano Chaves[1], desde a era de Aristóteles havia teoria da responsabilidade jurídica, essa que por sua vez, se subdivide em duas, a civil que ocorre numa relação entre indivíduos servindo como critério de resolução de litígios e/ou nas questões indenizatórias; e a penal que é quando o ato de um indivíduo conflita as normas de ordem pública e de toda a sociedade, a exemplo, cometimento de um crime.

            Dessa forma, há-se a duplicidade de responsabilidades da gestante que comete essa conduta delituosa, e aqui não querendo nos aprofundar abundantemente na esfera criminal, mas, devendo ressaltar que, há a tipificação legal no Código Penal brasileiro de 1940 vedando essa prática, mais precisamente, em seu artigo 124[2].

            Analisaremos a seguir, a possibilidade de efetivar-se a responsabilidade civil da agente delituosa para com a sociedade, tendo em vista que, por ser uma violação de norma de ordem pública, que atinge não só as pessoas interligadas a ela, como a sociedade no geral.

            Insta observar quais seriam os fatores genéricos que motivaram a gestante a cometer tamanha barbaridade, causando assim um dano irreparável não só a ela, mas como ao genitor e à sociedade como o todo, tendo em vista essa enorme atrocidade. Sejam as raízes preconceituosas por ser mãe ainda muito nova de idade, não estar casada, desamparo da família, do genitor (e aqui falaremos de uma possível responsabilidade concorrente) gerando a discussão se há mesmo o direito de reparação (se houver esse litisconsorte) e analisar métodos psicológicos como demais fatores.   

            Responsabilidade essa que, tendo em vista o nexo de causalidade[3], onde a conduta dela praticada gerou o então resultado pretendido, caracteriza por si só a possibilidade de responsabilização na esfera Cível, observando as suas funções, reparatória, punitiva, inibitória. Não obstante, resultado que é um ato ilícito, pois está em desacordo com a norma jurídica de ordem pública violando direitos e trazendo prejuízos irreparáveis.

Ademais, além de dispositivos previstos expressamente, seja na Carta Magna, leis esparsas e/ou qualquer outro meio de Direito possível, é de suma importância a verificação de posicionamentos jurisprudenciais e doutrinários em busca de saber se há essa efetivação de possível indenização ao pai por aborto cometido sem o seu consentimento.


METODOLOGIA

O presente trabalho foi realizado mediante uma análise bibliográfica de doutrinadores brasileiros renomados como Cristiano Chaves, Nelson Rosenvald, Maria Helena Diniz; dispositivos legais e obras literárias, buscando trazer uma importante contribuição para a vida acadêmica e social, mostrando que essa conduta (aborto) é por sua vez ilícita não só na esfera Cível como igualmente em outros ramos do Direito.

Esse trabalho partiu-se do método dedutivo, mediante premissas para se obter definição lógica de determinado raciocínio, com o objetivo da conclusão lógica, nesse caso, a indenização ao pai por aborto cometido sem o seu consentimento.


RESPONSABILIDADE CIVIL

A Responsabilidade Civil “ é obrigação imposta a uma pessoa de ressarcir os danos que causou a alguém”[4]. Dessa forma, há previsão legal que regulamente esse dever de reparar o dano causado, a exemplo, o Código Civil de 2002, vejamos:

“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente mora, comete ato ilícito.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”[5].

É notável a pretensão de amparo legal para com o ofendido, não o deixando desamparado por parte do Estado. Além da lei dar essa proteção a ele, é o entendimento pacífico da doutrina e jurisprudências, que este deverá ser de alguma forma compensado pelo dano sofrido, seja de forma pecuniária ou não.

No entanto, tendo em vista que o aborto é um ato ilícito que viola disposições normativas vigentes como forma de regulamentar o convívio social, a sua realização gera portanto um dano, esse que por sua vez, é impossível repará-lo de forma integral.

Não obstante, deve haver a efetivação dessa responsabilidade, como forma de sanção para a gestante delituosa, pois nesse caso há o nexo causal entre a conduta por ela praticada e o resultado, uma vez que só decorreu da realização por parte da gestante.

Dessa forma, levando em consideração que foi um fato próprio, ou seja, derivado de si mesma, a gestante deverá ser responsabilizada independentemente da responsabilização em outras esferas do Direito, pois as responsabilidades são totalmente independentes, como discorre o art. 935 do CC:

“Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.”[6]

Insta observar que como esse ato é violação de norma de ordem pública, deverá haver punição na forma prevista em lei própria, tendo em vista a sua tipificação (Código Penal); e conforme disposição civilista, se provada existência do fato ou sobre quem seja o autor, não poderá ser rediscutida quanto na responsabilização civil. Mas, contudo, aqui é possível a analogia extensiva, ou seja, por ser um ato ilícito e causar dano irreparável a outrem (o genitor), deverá ter ao menos o dano amenizado.

Portanto, o aborto praticado sem o consentimento do pai, gera a este o direito de ser reparado, pois, além da irreversibilidade lesiva, atinge além do pai as famílias e a sociedade em geral. No entanto, tem-se como centro desse ato ilícito, o pai, que será privado de ter o seu filho (esperado), conviver com ele, exercer o poder familiar, compor a linha sucessória um para com o outro, além do dano moral em face do pai.

De tal modo, não há argumento jurídico ou possível que justifique a prática do ato ilícito, criminoso, em se tratar de uma sociedade evoluída, com meios de comunicações atuantes informando as consequências de relações sem proteção, sendo assim, aquele que comete-lo deverá indenizar o ofendido na medida possível satisfatória, o que jamais ocorrerá nessa tentativa de indenizar o pai pelo aborto cometido sem o seu consentimento.

3.1 AMPARO LEGAL

O aborto por se tratar de um crime previsto no Código Penal, em seu artigo 124, e como a maioria dos crimes tipificados no referido código, existe a possibilidade de acarretar ilícitos na esfera civil em que o conceito de ato ilícito é mais abrangente.

Faz-se mister analisar o artigo 186 do Código Civil, que disserta sobre o que é ato ilícito:

“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”[7]

Portanto, o aborto, além de ser uma conduta delituosa do ponto de vista penal, pode ser vislumbrada a ilicitude na seara civil, pois não resta dúvidas que essa conduta acarretará danos incomensuráveis, não só ao pai do nascituro, mas também aos seus avós, que de certa forma, aguardavam a sua chegada.

Pois bem, como o próprio artigo legal mostra, não há necessidade alguma de haver dano material para se configurar o ato ilícito, por entender o legislador que o dano moral ser tão importante como o dano material, e diante do dano, decorre a obrigação de indenizar, conforme o artigo 927 do Código Civil, que dispõe:

“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo Único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”[8]

Diante desse dispositivo legal, fica mais claro que o aborto feito pela mãe é um ato ilícito, gera danos (morais), e é reconhecida a obrigação de indenizar, em virtude de que não só o nascituro foi ofendido em seu direito à vida, mas o pai também foi lesado, houve uma expectativa investida no momento que foi confirmada a gravidez.

Da mesma forma que a mãe cria um laço de afeto durante a gestação, o pai também se envolve com o nascituro, tendo em vista que para eles o filho já existe.

Na maioria dos casos, o pai é acusado de ser ausente, de maltratar, de não arcar com suas responsabilidades, o que acarreta em uma visão distorcida no que tange a figura do pai, se tornando assim uma figura mais distante do filho, em contrapartida da mãe, que é atribuída como figura intrínseca na criação da prole, sendo mais próxima destes e mais afetuosa.

Todavia, existem casos e casos, é muito fácil encontrar casos em que o pai é ausente, não participa na criação dos filhos e é necessário o Estado o coagir em contribuir para o sustento e educação dos filhos. Porém, existem muitos casos em que a mãe aborta, mata depois de nascido, em estado puerperal ou não, abandona os filhos em locais inimagináveis, tais como latas de lixo, beiras de rio, na rua, e em tantos outros. O que se deve entender é que tanto o pai como a mãe podem abdicar os filhos, de forma correta/legal, ou de forma ilegal, que na maioria das vezes só prejudicará a criança.

Além das previsões legais que já foram citadas anteriormente, temos o artigo 387 do Código de Processo Penal, que em seu inciso IV traz a possibilidade de o juiz criminal atribuir um valor mínimo da indenização:

“Art. 387. O Juiz, ao proferir sentença condenatória:

IV – fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido;”[9]

Em um primeiro momento esse referido texto legal pode ser tratado como uma aberração jurídica que o legislador positivou, um juiz criminal estar decidindo matéria cível.

Porém, numa reflexão mais apurada, obsta salientar que o processo cível, nesse caso, mesmo que não dependa da sentença penal condenatória, a cognição sumária do juiz criminal é muito mais próxima da verdade dos fatos que a do juiz cível.

Portanto, aquele é quem pode dizer o que o réu deve indenizar de forma mínima, e isso está ligado diretamente a extensão do dano sofrido pela vítima, que demonstrará em juízo cível, para que a medição do dano seja mais preciso, ou seja, em juízo criminal será atribuído apenas o mínimo que se possa atribuir, e em juízo cível dirá o tanto “quantum sufficit”[10] que é cabível diante ou não da sentença penal condenatória.

Tendo em vista que não é necessária a condenação na esfera penal para que se pleiteie em juízo a reparação na esfera cível, levando em consideração as independências harmônicas entre as duas responsabilidades.

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3.2 DOS DIREITOS DO NASCITURO

No que tange aos direitos do nascituro, a primeira previsão legal que pode ser aplicada é o artigo 2º do Código Civil, que versa:

“Art. 2º. A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.”[11]

Pois bem, o que se tem a observar nesse artigo é que além das pessoas que nascem com vida, o nascituro também tem seus direitos resguardados, mesmo ainda não possuindo personalidade civil. Consoante isso, a doutrina de Maria Helena Diniz mostra que essa personalidade civil pode ser dividida em duas: material e formal. Formal é aquela mais restritiva, são direitos de personalidade, presentes em âmbito constitucional. Material é aquela que é adquirida do nascimento com vida, que é aquela mais abrangente, plena.

Ainda há um projeto de lei nº 478/2007, o estatuto do nascituro busca proteger direitos do nascituro, que no Código Civil já é positivado, e a doutrina reconhecia, inclusive, os nascituros concebidos “in vitro”, além de incluir os produzidos através de clonagem.

O referido texto legal é bastante inconveniente. Dentre os vários defeitos, o nascituro é equiparado a criança nascida com vida, sendo previsto a possibilidade deste ser legitimo a sucessão (art. 17). Além de tipificar como crime o aborto culposo (art. 23), e dentre outros. O estatuto do nascituro acaba com a possibilidade de aborto legal no caso de estupro, previsto no artigo 128, inciso II, do Código Penal, posto que o referido projeto de lei, em seu artigo 13, faz com que este nascituro não possa ser abortado, mas sim, entregue a adoção, devendo o pai, que no caso é o estuprador, obrigado a prestar pensão alimentícia, e pior ainda, se este não puder arcar com a pensão, o Estado fica obrigado, ou seja, qualquer nascituro se o pai não tiver meios para prestar a pensão alimentícia, nada acontece, mas o fruto de um abuso sexual o estado deve arcar com as custas?

Ora, o aborto legal vem para preservar a dignidade da mulher que foi vítima de abuso sexual, o estado está assegurando o direito mais importante do nosso ordenamento, que é a dignidade sexual, ai vem o estado e obriga a vítima de um estupro a conceber o fruto de um episódio que esta procura esquecer, sem contar que o estuprador também não terá interesse na criança, sendo essa rechaçada e com uma figura paterna de estuprador.

3.3 FATORES CONTRIBUINTES AO ABORTO

O aborto ou abortamento no caso da gestante, é dado como método de expelir ou expulsar o embrião ou feto ainda em formação na mulher, ou seja, sem a sua total concepção, conforme Carlos Eduardo Silveira[12]. Há repúdio por uma considerável parte da sociedade, exceto nos casos que estão previstos legalmente e que possuem embasamento na doutrina e jurisprudências.

Como fato que ressalta os interesses da pesquisa atual estão os fatores causadores da prática utilizada por algumas gestantes, com finalidades variadas, tanto aquelas que fundamentam sua decisão pelo aborto como uma segunda chance para as consequências de uma gestação antes do momento adequado, para se livrar do nascituro que seria um peso, uma responsabilidade muito grande e que traria com ela a necessidade da gestante se dispor de etapas que são importantes para sua vida, como a busca pela sua estabilidade financeira e profissional; e também por fatores atípicos ou psicológicos, como a reação da genitora e sua futura vivência após a prática do aborto.

Conforme Carlos Eduardo Silveira[13], por causa de grande maioria das mulheres que engravidam serem jovens, tendo estas uma mínima condição financeira para se bancar e consequentemente bancar o filho, observa-se o aborto como uma solução desumana ao problema de renda das genitoras, e dessa forma faz possível observar o aborto como benefício da economia social por ter controle a taxa de natalidade e de rendas da mãe, concomitante com a sua melhora na subsistência.

A maioria das mulheres que engravidam são jovens que não tem condições financeiras de criar seus filhos. A prática do aborto seria uma solução – mesmo que desumana – para esse problema, já que assim, aconteceria um efetivo controle de natalidade, diminuindo a pobreza e consequentemente um possível índice marginalidade no país.

Traz-se aqui também como forma de análise dessa situação, a psicologia, observando essa prática e buscando amparar além do feto as consequências que são geradas à genitora que praticou o aborto, como ela se encontra após a cessão de sua prole, seu herdeiro, à quem se destina boa parte da sua atenção e carinho no decorrer dos próximos anos. Analisa-se também o peso moral gerado pela sociedade hoje, ou maior parte dela, que ainda não aceita a prática do aborto ou não vê com bons olhos quem praticou.

Através desse viés psicológico que faz parte da situação da gestante tanto em momento anterior ao aborto, como uma possível causa da prática do crime para o momento posterior, que é a sensação e todo o peso ao saber que deixou de conceber sua prole em detrimento de uma forma de vida moral e ética que é modelo de vida para a sociedade, e conforme Micael Lacerda Leite e Carla Priscila Ferreira da Silva[14], há um reforço no entendimento ético-moral que se tem da vida, onde não pode dessas afastar-se, visto que o aborto implica inevitavelmente na morte de um para a sobrevivência do outro, ou de determinadas circunstâncias.

Passando a analisar os efeitos causados pelo aborto na vida tanto individual quanto social da genitora, pode-se observar quatro fazes:

De acordo com LEITE e DA SILVA (2013):

1.alívio de que a gravidez tenha sido ultrapassada e que a vida possa continuar como antes. É uma fase de curta duração onde muito frequentemente (80%) aparece sentimentos de angústia;

2.uma fase que dura semanas ou mesmo meses mas sem qualquer tipo de intervenção. As mulheres que fizeram o aborto por motivos eugênicos apresentam sentimentos de angústia muito mais duradouros. É também aqui que podem surgir os sentimentos de culpa;

3.corresponde à fase da doença, ou seja, a angústia transforma-se em doença. Clinicamente é classificada como doença depressiva embora alguns autores se refiram a síndrome pós-abortivo, uma vez que o fator precipitante é o aborto;

4.aparece algum tempo depois do aborto e é descrita como um luto reativado. No que respeita ao tratamento, este depende da fase em que se encontra a doente e nos tratamentos anteriormente ministrados. Parece-nos sensato inferir que o apoio e aconselhamento estão indicados para a angústia, mas quando surge a doença depressiva, é necessário fazer um tratamento farmacológico. O aconselhamento deve centrar-se, sobretudo no trauma e permitir à doente que reconheça a morte do seu filho. Sabe-se, porém que a escassez de evidência sobre a eficácia duma série de tratamentos assim como dos prognósticos, tanto a curto como a longo prazo, exige mais investigações. É fundamental dar informação clara, providenciar conhecimentos e confiança às doentes.[15]

Dadas tais fases, pode-se observar o quanto o aborto é prejudicial tanto para a vida do feto quanto para o da genitora, ficando aquela que aborta, passível de sofrer do arrependimento pela morte do feto, por não querer ter praticado tal ato.

É importante observar que mesmo o aborto sendo uma medida de escape para aquelas mulheres que buscam se realizar profissionalmente ou que tem um modelo de vida a ser seguido que foi em grande parte modificada com a concepção do feto, há de se observar que não há causa que supre o direito à vida pelo qual se tem um prezo muito grande, sendo ele um dos princípios mais importantes, estando previsto na Constituição Federal em seu artigo 5º.

Em meio de uma sociedade bastante evoluída em alguns aspectos, mas ainda preconceituosa em outros, como mulheres serem mães solteiras; essa fragilidade com qual as tratam, não só as constrangem como também viola princípios constitucionais e a sua honra, deve-se partir da premissa: tratar os iguais com igualdade e os desiguais nas medidas de suas desigualdades para que todos se igualem, assim estaria buscando minimizar a mulher como um sexo frágil.

No entanto, essas raízes “culturais” já se estenderam desde os primordiais até a presente sociedade, e ainda existirá por um tempo indeterminado, até que se evolua, a ponto que venha admitir a independência feminina não só no meio familiar, mas social, político, econômico, ou seja, de forma genérica.

Ademais, insta observar que, nessa sociedade onde elas (mulheres) são tratadas como sexo frágil, há uma série de fatores proponentes a fragilização para cometer esse ato criminoso, ilícito, intitulado como aborto. Fatores esses que em algumas situações está diretamente ligada a discriminação familiar, social, abandono por parte do genitor, envolvimento com drogas, bebidas alcoólicas, e outros meios tóxicos e meios psíquicos.

Mas, fatores esses que não excluem a ilicitude da sua conduta, e nem a justifica, nem a torna lícita. De forma que a sua prática deve ser combatida e responsabilizada, em se tratar de um dano irreparável, pois se trata de um direito fundamental, à vida, que foi cessado no momento da expulsão do embrião/nascituro, não sobrevindo a vida se concretizar.

3.4 PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL

Para Cristiano Chaves, “o princípio da reparação integral possui por finalidade repor o ofendido ao estado anterior à eclosão do dano injusto, assumindo a árdua tarefa de transferir ao patrimônio do ofensor as consequências do evento lesivo”[16]. Porém, diante de trágica situação, prática do aborto, vê-se a possibilidade de reparação mas não integral, pois patrimônio algum irá conseguir reparar as consequências do seu ato ilícito causado não só ao pai, mas as famílias e a sociedade como um todo.

Esse princípio está previsto no próprio Código Civil de 2002, em seu art. 944: “a indenização mede-se pela extensão do dano”. O dispositivo resguarda o direito do ofendido em ter a restituição integral, mas o fato é que, nesse caso, de aborto praticado sem o consentimento do pai, há como medir a extensão do dano? A priori deverá ser amparado com a indenização, de forma a ao menos amenizar o dano causado, contundo, impossível repara-lo de forma absoluta.

            Para Maria Helena, a reparação importaria em uma determinação diretamente ao conteúdo do que se pretende reparar. Ou seja, deve-se haver a delimitação do conteúdo que será reparada pelo agente delituoso, nesse caso, a gestante que abortou. Não obstante, o conteúdo nesse caso seria a vida, que foi cessada ainda enquanto in vitro, na vida intrauterina, mas até o presente momento, não se sabem como devolver a vida, logo, há a impossibilidade de reparação integral por dano de aborto.

            Levando em consideração que a indenização tem cunho satisfatório para vítima e lesados, e punitivo para o agente delituoso, não há como dizer o quantum é necessário para essa reparação. Tendo em vista que se trata de uma vida, e não é simples uma quantificação dela, mas deve-se basear no fato, nexo causal e resultado, na situação econômica do(a) ofensor(a) para que não se arbitre um valor consideravelmente alto, tornando-se impossível que o então devedor venha a adimplir, e não havendo bens suficientes para isso, permaneceria então inadimplente por tempo indeterminado, e aqui concretizaria novamente a afirmação da não efetivação do princípio da reparação integral.

3.5 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O DIREITO À VIDA

O princípio da dignidade da pessoa humana é um princípio constitucional previsto expressamente na Carta Magna de 1988 em seu art. 1º, III CF/88[17], onde há a composição do Estado Democrático de Direito, e tem-se a dignidade da pessoa humana como um dos seus fundamentos.

            Dessa forma, carece levar em consideração esse preceito fundamental e a quão importância do mesmo, pois qualquer discrepância estará por sua o violando e acarretará num possível dano, que pode por sua vez ser irreparável ou reparável, mas de qualquer forma, gerará o direito de indenizar.

            De tal modo, o direito à vida é também um preceito fundamental e previsto constitucionalmente no seu art. 5º, caput. No entanto, além dessa previsão, há também outros dispositivos legais que regulamente e garanta a efetuação desse direito, como Pacto de São José da Costa Rica, dispõe art. 4º:

“Artigo 4º - Direito à vida

1. Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente.” ... (grifo nosso)”.[18]

Diante de tantas previsões constitucionais e legais é inadmissível a audácia da gestante em decidir enquanto na vida intrauterina, se o seu filho irá ou não sobrevier a vida extrauterina. O respeito deve ser assegurado, pois desde a sua concepção o embrião/nascituro é possuidor de direitos que devem ser observados a todo instante, resguardando a segurança jurídica do ordenamento pátrio.

Insta observar que, a interrupção da gestação por qualquer que seja o motivo, caracteriza-se como ato ilícito passível de reparação e responsabilidade jurídica. Essa que por sua vez, deverá ser regida pelas normas de direito público previstas no ordenamento jurídico. 

3.6 EFEITOS DO ABORTO NO DIREITO SUCESSÓRIO

Ao direito de sucessão e o aborto, destaca-se o aborto como uma violação a esse direito inerente ao pai que reconhece o nascituro, mesmo sendo gerado de forma inesperada, como seu herdeiro, representando a figura daquele que herdará seus bens e valores. Como Silvio Rodrigues[19] cita, o direito de sucessão é reconhecido como uma ideia de sucessão na qual são transmitidos àqueles que são sucessores, o direito sobre bens e os valores que anteriormente eram pertencentes aquele indivíduo que por causa mortis, deixou de exercê-los.

O direito de sucessão ou hereditário, tem suas origens desde as antigas civilizações, sendo ele fundamentado também por religiões àquela época, civilizações como os egípcios e babilônios já reconheciam esse direito hereditário antes mesmo do período cristão, segundo Silvio Rodrigues.

Analisa-se ainda o viés da sucessão e da ligação que tem o pai com o seu herdeiro, aquele que além de herdeiro patrimonial é também herdeiro do patrimônio genético do pai, sendo também o filho portador desse direito à sucessão em que ao momento do aborto além de aniquilar o direito à vida que recai sob o nascituro, destrói-se a possibilidade da convivência do filho e do pai e a possibilidade da criança além de manter-se viva, carregará também consigo a herança genética do pai.

Como nos explica Fustel de Coulanges[20], além de levar em conta todo um valor de culto e aplicado também o valor da família, sendo esse filho um herdeiro genético e do culto da família do pai, ele deverá herdar também os bens do pai (se houver), dessa forma, o direito das sucessões não baseia-se somente por uma simples convenção entre os homens, mas também de uma convenção religiosa e que é uma força sobre as almas dos indivíduos, sendo assim, não há necessidade de estipulação pelo pai da certificação da herança para este filho, sendo reconhecendo a herança direta do filho ao momento do falecimento do pai.

Com o aborto, a sucessão tanto quanto ao filho como quanto ao pai é violada, por um lado, deixa-se de ter um herdeiro que se tinha certeza, aquele que representaria as heranças pessoais do pai como genes até a possível personalidade, quando o pai falecesse; e no caso do filho que lhe é retirado todo o direito à família, à se relacionar em sociedade, a aprender, aos sentimentos, e a todos os momentos que se passa enquanto começa o ciclo com seu nascimento com vida e posteriormente a sua evolução e a sua relação com o mundo, sendo passados por algumas das situações já apresentadas e muitas outras.

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Sanderson Borges

Estudante de Direito

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