Aspectos sociopolíticos da posição destinada à mulher brasileira no século XXI

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14/02/2018 às 12:10
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Com a expansão dos movimentos feministas no Brasil e o olhar mais detido sobre os anseios sociais e políticos das minorias, observa-se quais as mudanças legislativas que pretendem minorar a violência de gênero e evitar o rebaixamento das mulheres na sociedade.

RESUMO: A eclosão e recente expansão dos movimentos feministas no Brasil e no mundo, que trouxeram à tona – e à mídia – questões antes consideradas tabus, forçou os diversos setores da sociedade a lidar com “verdades ocultas” e problemas graves antes “jogados para debaixo do tapete”. Uma dessas questões, que há muito existe e há pouco ganhou força para ser discutida e exposta, é a violência de gênero, que vem conquistando espaço na sociedade e, consequentemente, na legislação brasileira, obrigando a população a encarar – e atender – as necessidades da mulher e aceitar que os padrões antiquados de comportamento social não mais cabem no atual contexto. O presente artigo tem como objetivos discorrer, num contexto histórico, as razões que ocasionaram a posição rebaixada da mulher na sociedade, e busca verificar as legislações em relação aos direitos da mulher, os aspectos da violência de gênero, e medidas que podem –e precisam – ser tomadas em busca da igualdade factual.

Palavras-chave: violência de gênero. Legislação brasileira. Comportamento social.


1 INTRODUÇÃO

A Constituição federal e a Declaração Universal dos Direitos Humanos declaram que não há distinção entre o homem e a mulher, e ambos gozam dos mesmos direitos na sociedade. Entretanto, a realidade social os mantém em patamares distintos de importância e destaque.

É sabido que as sociedades clássicas, Grécia e Roma, deixaram legados marcantes que foram aproveitados na construção do ocidente, a exemplo do direito, política, literatura, e, como ônus, um modelo de sociedade que preza pela valorização do homem como cidadão ativo, e a mulher como ser inferior. A partir disso, há o estabelecimento da sociedade dominada pelo patriarcado e sexismo imperante, empurrando qualquer outro padrão que não se encaixe no perfil homem, adulto, de classe média ou alta, e majoritariamente branco, para as periferias sociais.

Daí, fazer-se ouvir quando não se faz parte do patamar de destaque, ou seja, em maioria quando se é mulher, torna o processo laborioso, moroso, e seus direitos, desrespeitados e francamente ignorados em diversos casos.

A partir do supracitado, e a partir da facilidade que esse cenário ocasiona em se agredir, violar, sabotar, violentar uma mulher em um sem número de modos; a partir do fato de que, mesmo com as leis e decretos que pregam a proteção física, moral e psicológica da mulher, os índices de violência continuam a se elevar; a partir da dificuldade feminina em adentrar o cenário político e lutar efetivamente pela eficácia e validade de seus direitos, o que a impede de opinar em decisões como o próprio direito de ter ou não um bebê; a partir do fato de que não há, para a mulher, qualquer garantia de que sair sozinha, andar à noite, vestir a roupa que quiser, ou mesmo pegar o transporte público, é seguro; a partir do fato de que, pela falta de representação política, são homens –homens criados num modelo de sociedade patriarcal e majoritariamente católica- que criam, extinguem, votam nas leis que dizem respeito exclusivamente à vida da mulher no meio social; a partir de todos esses fatores, há a necessidade de se discutir as condições impostas ao gênero feminino, que, mesmo correspondendo a 52% da população, é considerado minoria.


2 O LUGAR DA MULHER NA HISTÓRIA OCIDENTAL

Ao se falar do gênero feminino, é interessante trazer à tona seu lugar na sociedade ao longo do tempo, de forma a observar-se, de fato, qual a importância, o valor e a proteção dispensados à mulher em uma análise de retrospecto histórico.

De fato, os registros resgatados da sociedade clássica grega são claros em afirmar, logo de início, que os cidadãos são aqueles adequados a certos requisitos: homens, acima de 21 anos, gregos, filhos de gregos. Não há mulheres ativas, o que é ratificado por Georges Duby e Michelle Perrot (1990):

E afinal, que sabemos nós delas? Os ténues vestígios que elas nos deixaram provêm não tanto delas próprias –pois << rien ne sçay; oncques lettre ne lus>> -como do olhar dos homens que governam a cidade, constroem a sua memória e gerem os seus arquivos. O registro primário do que elas fazem e dizem é mediatizado pelos critérios de seleção dos escribas do poder. Indiferentes à vida privada, eles dedicam-se à vida pública, em que elas não participam.

Ademais, Aristóteles, em seus escritos, dispensou parte de seus estudos a existência feminina, a qual afirmava ele ser duplamente inferior ao homem, anatômica e fisicamente (Duby e Perrot, 1990), dotadas de um cérebro mais pequeno, e o “corpo é inacabado como o de uma criança, está desprovido de sémen como o de um homem estéril”.E, sobre o lugar da mulher em sociedade, afirmava que:

Mulheres em Atenas são juridicamente dependentes de um tutor, na maioria das vezes do pai ou do marido. O cônjuge não é escolhido livremente; negociações são monitoradas pelo tutor, um direito legítimo de sucessão está ausente, mas elas podem, como filhas herdeiras, passar o patrimônio aos seus filhos. (Hoffe, 2008)

Em relação à sociedade romana, a mulher também ocupava um lugar inferior jurídica e politicamente, sem direito a opinar, mesmo na escolha conjugal. Sêneca (55 a. C – 44 d. C), filosofo romano, escreveu "Se teu escravo, teu escravo liberto, tua mulher ou teu cliente começam a responder, tu te enraiveces" (Simmonet, 2002). 

A idade média, marcada pela presença imperante da igreja católica, tinha a mulher marcada pelo pecado original no papel de Eva, e como a imagem da imperfeição, pois “houve uma falha na formação da primeira mulher, por ter sido ela criada a partir de uma costela recurva, [...] E como, em virtude dessa falha, a mulher é animal imperfeito, sempre decepciona a mente.” (KRAMER E SPRENGER, 1486 apud PRIORE, 2006, p.46). O apostolo Paulo em seus escritos dizia que a mulher está sujeita ao marido, e que não cabe a ela ensina-lo, e sim permanecer em silêncio. “Não foi Adão que foi seduzido, mas a mulher que, seduzida, caiu em transgressão”. (SÃO PAULO apud PRIORE, 2006, p. 46). O gênero feminino é, ao mesmo tempo, a pecadora original, a bruxa, a santa e a mãe, a qual deve se manter em silencio e submissa ao pai e/ou ao marido.

No período colonial brasileiro, de acordo com Stamatto, a mulher era destina ao lar, ao casamento, os trabalhos domésticos, controle de pais e maridos, e orações. O ensino escolar era negado a elas, e exclusivo aos homens da elite branca. O direito a educação só foi concedido em 1827, e permitia que aprendessem a ler, escrever as quatro operações da aritmética, praticar os quebrados, decimais e proporções, gramática nacional e religião, além de ensinos da economia doméstica. O ensino da geometria era negado, exclusivo aos homens. O direito ao voto, por sua vez, só chegou a ser conquistado no governo de Getúlio Vargas, em 1932.

É notável a subserviência e inferioridade das mulheres na sociedade. Do classicismo à atualidade, o papel dado a elas era o de irmã, mãe, aquela que cuida dos filhos, do marido e da casa, que fica restrita ao lar. Não havia lugar para elas–ou permissão- na sociedade “dos homens”, na política, no direito, no contexto externo ao lar. Dessa forma, a contribuição para uma criação da imagem da mulher como frágil, servente, um objeto de uso para o homem, é clara. E a conquista de seus direitos e respeito social, duplamente árdua.


3 A PARCELA FEMININA NA SOCIEDADE BRASILEIRA E SUA REPRESENTATIVIDADE POLÍTICA

A Declaração Universal dos Direito Humanos, datada de 10 de dezembro de 1948, ainda em seu preambulo estabelece que “os povos das Nações Unidas proclamam, de novo, a sua fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres”, e mais adiante, em seu artigo 1º, afirma: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos”. A própria Constituição brasileira, em seu artigo 5º, caput, fixa que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”.

Entretanto, quando se atenta para a realidade brasileira, nota-se uma discrepância significativa de diversas naturezas, e, mais significativo ainda, entre gêneros. Desde a presença no mercado de trabalho até os índices de violência e participação política, as mulheres ocupam posições de desvantagem em relação ao gênero oposto.

De acordo com dados do IBGE, de 2010, mulheres entre 25 e 64 anos com ensino superior completo são maioria de 60% em relação aos homens. Entretanto, nessa mesma faixa etária, ganham 27% a menos que eles. Sobre a ideia, Pereira e Santos (2010) apontam que

[..] mesmo a mulher sendo mais escolarizada, continua recebendo menos do que os homens, principalmente em virtude da questão da inserção consideravelmente maior da mulher no mercado de trabalho doméstico, motivo que leva a identificar que está atrelado aos estereótipos de gênero.

Na política, a desvantagem se repete. Ainda, quando se fala no cenário político, e com base no Inter-Parliamentary Union, o Brasil apresenta apenas 10% de deputados federais mulheres, ocupando o 154º lugar num ranking de 193 países em relação a participação feminina no Legislativo.

A Lei nº 12.034, de 2009, em modificação à Lei dos Partidos Políticos, estabeleceu em seu artigo 10, § 3º, “cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% (trinta por cento) e o máximo de 70% (setenta por cento) para candidaturas de cada sexo.”, como forma de incentivo ao aumento da participação feminina na política.

Entretanto, as pesquisas do STF em relação as eleições para vereador no ano de 2016 apontam que, mesmo com o declarado na Lei, as eleições permanecem com seu caráter homogêneo, apresentando 1 (uma) vereadora mulher para cada 7 vereadores homens.

Bruno Carazza dos Santos, Doutor em Direito (UFMG), mestre em Economia (UnB) e bacharel em Ciências Econômicas e Direito (ambas pela UFMG), sobre isso diz que:

embora as candidaturas femininas tenham crescido nos últimos anos – para atender à nova exigência da lei de 2009 –, o percentual de votos recebidos pelas mulheres caiu no mesmo período. E, como consequência, a parcela de vagas conquistadas por elas nas Câmaras Municipais permaneceu bastante baixa, abaixo de 15%. Isso significa que, no Brasil, há sete vereadores (homens) para uma vereadora (mulher). Em resumo, a imposição de uma quota de candidatura das mulheres para os partidos políticos não está surtindo efeito. Nos últimos anos, nós votamos menos em mulheres, e um percentual ainda menor delas conseguiu se eleger.

Além disso, o STF também aponta que 18.244 candidatas nem chegaram a ser votadas. Ou seja, 12,5% de todas as mulheres inscritas, para apenas 2,6% dos candidatos homens que não receberam sequer um voto. Bruno Carazza dos Santos aponta os números como um claro indicativo de que os partidos políticos praticam fraude, inscrevendo mulheres apenas para completar a exigência legal dos 30% de vagas para o sexo, como declarado em lei. O mesmo ainda comprova, com base nas pesquisas estatísticas do STF, que o mal desempenho das mulheres na política não tem correlação com o perfil dos eleitores, em aspectos como IDH, renda, educação e saúde, e “justifica” o fato dizendo:

É provável que exista uma questão cultural, ligada a preconceito e discriminação. Responsabilidades muito maiores (muitas vezes sem contar com qualquer colaboração masculina) na criação da família e nos afazeres domésticos, barreiras no mercado de trabalho e o preconceito impedem que as mulheres pratiquem a política e sejam ouvidas da mesma maneira que os homens. Mas, evidentemente, não estamos nas últimas posições do ranking internacional de participação feminina na política apenas por isso. Há um fator institucional que dificulta a chegada ao poder das mulheres. Essa barreira institucional tem origem tanto na legislação eleitoral, quanto nas relações de poder no âmbito dos partidos políticos brasileiros.

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Logo, é óbvia a desvantagem da mulher na sociedade em diversos setores, mesmo no século XXI e com o declarado na Declaração Universal dos Direitos e na Constituição brasileira.


4 VIOLÊNCIA DE GÊNERO E AS LEIS DE PROTEÇÃO

      Quando agregados os fatores históricos do lugar admitido à mulher nas sociedades ocidentais ao longo do tempo, somado ao seu atual posicionamento na realidade brasileira, é facilmente cognoscível a desvantagem da parcela feminina em se fazer ouvir e valer seus direitos.

Por isso, quando abordado o tema da violência contra a mulher, em um primeiro momento, toma-se com estranheza a incompatibilidade entre a quantidade elevada de medidas de proteção a mulher, leis, campanhas, projetos de conscientização por parte de órgãos como a ONU e Unesco; e o índice de violência ainda constante.

Mas, analisada a visão de inferioridade que cerceia a mulher, torna-se cognoscível a controvérsia. O IPEA, em 2014, definiu a sociedade como patriarcal e “heteronormativa”, o que impede a mulher de galgar facilmente posições de destaque, e definiu:

Por ordenamento patriarcal e heteronormativo da sociedade entende-se uma organização social baseada no poder masculino e na qual a norma é a heterossexualidade. A sociedade se organiza com base na dominação de homens sobre mulheres, que se sujeitam à sua autoridade, vontades e poder. Os homens detêm o poder público e o mando sobre o espaço doméstico, têm controle sobre as mulheres e seus corpos. Por maiores que tenham sido as transformações sociais nas últimas décadas, com as mulheres ocupando os espaços públicos, o ordenamento patriarcal permanece muito presente em nossa cultura e é cotidianamente reforçado, na desvalorização de todas as características ligadas ao feminino, na violência doméstica, na aceitação da violência sexual. A família patriarcal organiza-se em torno da autoridade masculina; para manter esta autoridade e reafirmá-la, o recurso à violência – física ou psicológica – está sempre presente, seja de maneira efetiva, seja de maneira subliminar. (Grifo nosso).

  Sobre o assunto da violência especificamente direcionada ao sexo feminino, a lei nº11.340, de 7 de agosto de 2006, popularmente conhecida como Lei Maria da Penha, em seu artigo 7º, categoriza

Art. 7o  São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;

III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria

De fato, a ofensa à figura da mulher, por se tratar de mais de um tipo, é, em muitos casos, de difícil identificação, e executada por agentes que supostamente são de confiança; junção que acarreta danos profundos à vítima. De acordo com Griebler e Borges (2013):

Desta forma, evidenciam-se riscos tanto físicos quanto psíquicos desta situação, uma vez que estas mulheres estão expostas a violência, em geral, dentro de seus lares, sendo que o agressor é uma pessoa do convívio, com o qual tem envolvimento emocional. (Grifo nosso)

Em razão disso, do laço emocional entre vítima e agressor, e dos padrões da sociedade em relação aos supostos objetivos da mulher – casamento, filhos, administração do lar-, a mulher agredida pelo marido ou namorado se vê em ciclo de culpa e medo de se desfazer da aparente segurança e estabilidade familiar e ser vista com maus olhos pela sociedade.

A busca de uma manutenção do modelo familiar sagrado e dos papéis de homens e mulheres num casamento são variáveis a serem consideradas pertinentes na discussão da violência de gênero. O casamento simboliza um status de segurança, estabilidade e até mesmo equilíbrio nas relações afetivas. Desta forma, muitas mulheres permanecem presas ao ciclo de violência por buscarem manter o casamento idealizado. (Idem).

Dito isso, não só a identificação é mais difícil, mas a própria aceitação por parte da mulher de que é uma vítima, não culpada, e a coragem de denunciar e interromper o ciclo de violência. O que se vê nos casos de agressão –tanto física quanto psicológica-, é a negação de sua posição como vítima, e a tentativa de “desculpabilizar” o marido. Sobre isso, Menezes (2012) afirma

Essa tentativa de não culpar o homem pelo que aconteceu relaciona-se com a noção de representação. Se a mulher sente que deve desculpabilizar o companheiro, termina não o denunciando. Outra característica que a mulher em situação de violência pode apresentar é a insegurança.

O cenário é dificultado quando ela, a mulher, depende financeiramente do marido, o que a agrilhoa a ele para garantir o bem estar dos filhos e o seu próprio. “Ser mulher não é a única identidade. Ela se define também pela profissão, pelo lugar que se ocupa” (Menezes, 2012).

Entretanto, seja pela interferência – e influência – feminista crescente na sociedade, seja pelas tímidas, mas crescentes, denúncias de violência, a questão tem tomado forma e se tornado uma verdade conhecida pela sociedade, e alvo de discussão na política, o que desemboca em tomada de medidas protetivas às vítimas de violência de gênero. De acordo com uma pesquisa social realizada pelo IPEA em 2014,

A questão da violência contra a mulher, nos últimos anos, passou a ser conhecida por um público mais amplo. Na pesquisa, cerca de 73% dos(as) respondentes discordaram da afirmação de que “a questão da violência contra as mulheres recebe mais importância do que merece”. É um sinal positivo de que o grande espaço que a questão tem ganhado nos últimos anos na mídia e mesmo na agenda governamental é percebido como condizente com sua relevância para a vida das mulheres.

A partir disso, têm-se como mais notório exemplo a elaboração da Lei Maria da Penha, (lei 11.340, de 2006), que, nos termos do seu artigo 1º, tem como objetivos criar mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, além de estabelecer medidas de assistência e proteção as mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

Há, ainda, medidas governamentais anteriores referentes à proteção da mulher, como a Lei 10.778, de 24 de novembro de 2003, a qual define em seu artigo 1º que “Constitui objeto de notificação compulsória, em todo o território nacional, a violência contra a mulher atendida em serviços de saúde públicos e privados”. E decretos ulteriores, como o decreto nº 7.393, de 15 de dezembro de 2010, que dispõe sobre a Central de Atendimento à Mulher (ligue 180), e o decreto 7.958, de 13 de março de 2013, que trata das diretrizes de atendimento humanizado às vítimas de violência sexual no Sistema Único de Saúde.

E mais, a lei nº 13.104, de 9 de março de 2015, que modifica o Código Penal para prever o feminicídio como qualificadora do crime de homicídio (alteração do art. 121 do Decreto-Lei nº 2.848, de 1940), e inclui-lo no rol dos crimes hediondos (alteração do art. 1º da Lei nº 8.072, de 1990).

Contudo, como símbolo de incompatibilidade, as estatísticas de denúncias de violência contra a mulher continuam altas. De acordo com dados de pesquisa realizada pelo DataSenado, em parceria com o Observatório da Mulher do Senado, em 2017, o número de mulheres que afirmam ter sido vítimas de violência chegou a 29%, em comparação aos 18% em 2015. Também, 67% das entrevistadas afirmaram já terem sido vítimas de violência física, tornando esta a mais constante. Ademais, 71% (das entrevistadas) já afirmou conhecer alguma mulher que já sofreu violência doméstica ou familiar, e, em 74% dos casos, os agressores têm ou tiveram relações afetivas com a vítima, seja o marido, namorado, companheiro (41% das vezes) ou ex-marido, ex-namorado ou ex-companheiro (33%).

Não obstante, em disparidade, nessa mesma pesquisa, 90% dos entrevistado declarou disposição em denunciar, caso presenciasse, um episódio de agressão, destoando da pesquisa feita pelo IPEA, em 2014, na qual 63% dos entrevistados concordavam com a assertiva “casos de violência dentro de casa devem ser discutidos somente entre os membros da família” e 82% concordavam que “em briga de marido e mulher não se mete a colher”.

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Sobre a autora
Yasmin H. Lima Rocha

Graduanda do curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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