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A ilegalidade da exigência de atestados de experiência anterior para comprovação da capacidade técnico-operacional

20/10/2019 às 12:30
Leia nesta página:

É ilegal que se exija a comprovação de capacidade técnico-operacional da empresa licitante por meio de apresentação de atestados de comprovação de experiência anterior. Tal capacidade deve ser comprovada por outros documentos da empresa.

Há um bom tempo se discute em doutrina e jurisprudência quanto à possibilidade de se exigir em processos licitatórios a comprovação da capacidade técnico-operacional, tema que ganha ainda mais relevância em se tratando de licitações para obras e serviços de engenharia. Nesse texto defendemos que há, sim, a possibilidade de se exigir documentação comprobatória da capacidade operacional, no entanto, não é legal a exigência de atestados de experiência anterior para tal fim. 

Inicialmente, cabe breve explanação sobre a qualificação técnica para fins de habilitação em licitações. A qualificação técnica está disposta no art. 30 da Lei nº 8.666/93, que, em seu inciso II, dispõe que a referida se limitará a:

comprovação de aptidão para desempenho de atividade pertinente e compatível em características, quantidades e prazos com o objeto da licitação, e indicação das instalações e do aparelhamento e do pessoal técnico adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem como da qualificação de cada um dos membros da equipe técnica que se responsabilizará pelos trabalhos

Costuma-se dividir a qualificação técnica em duas modalidades. A primeira é a qualificação técnico-profissional, que diz respeito a comprovação pela licitante de que dispõe, para a execução da obra ou serviço, de profissional especializado e com experiência anterior comprovada em objetos de características assemelhadas ao do que está sendo licitado. Enquanto a segunda é a qualificação técnico-operacional, a qual se refere à capacidade da pessoa jurídica em desempenhar o objeto, demonstrando possuir aparelhagem, pessoal e demais elementos materiais para a execução da obra ou serviço.

Pois bem, ocorre que diversas Administrações Públicas exigem em suas licitações a comprovação tanto de capacidade técnico-profissional quanto técnico-operacional por meio de atestados de experiência anterior fornecidos por pessoas jurídicas de direito público ou privado, devidamente registrados nas entidades profissionais competentes, nos moldes do § 1º, do art. 30, da Lei de Licitações. E fazem isso, como dito, embasados em doutrina e jurisprudência favorável. No entanto, defendemos que se trata de conduta ilícita, no que se refere aos atestados de capacidade técnico-operacional.

Para que seja melhor compreendida a questão, é válida a transcrição dos dispositivos: 

Art. 30.  A documentação relativa à qualificação técnica limitar-se-á a: 

(...) 

II - comprovação de aptidão para desempenho de atividade pertinente e compatível em características, quantidades e prazos com o objeto da licitação, e indicação das instalações e do aparelhamento e do pessoal técnico adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem como da qualificação de cada um dos membros da equipe técnica que se responsabilizará pelos trabalhos; 

(...) 

§ 1º  A comprovação de aptidão referida no inciso II do "caput" deste artigo, no caso das licitações pertinentes a obras e serviços, será feita por atestados fornecidos por pessoas jurídicas de direito público ou privado, devidamente registrados nas entidades profissionais competentes, limitadas as exigências a:  (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) 

I - capacitação técnico-profissional: comprovação do licitante de possuir em seu quadro permanente, na data prevista para entrega da proposta, profissional de nível superior ou outro devidamente reconhecido pela entidade competente, detentor de atestado de responsabilidade técnica por execução de obra ou serviço de características semelhantes, limitadas estas exclusivamente às parcelas de maior relevância e valor significativo do objeto da licitação, vedadas as exigências de quantidades mínimas ou prazos máximos;  

II - (Vetado). (Incluído pela Lei nº 8.883, de 1994) 

a) (Vetado). (Incluído pela Lei nº 8.883, de 1994) 

b) (Vetado). (Incluído pela Lei nº 8.883, de 1994) (Destacamos.)   

Observe que o dispositivo, pela leitura combinada entre § 1º e inc. I, é bastante claro ao prescrever que a comprovação por atestados registrados em entidades profissionais se restringe à capacitação técnico-profissional. Inclusive, o inciso II que foi vetado, se referia justamente à capacidade técnico-operacional, mas foi retirado do texto legal. 

Ainda assim, desconsiderando o veto ao inciso que tratava da capacidade técnico-operacional, doutrina e jurisprudência defendem a possibilidade de exigência de atestados para comprovação de qualificação operacional. 

Parte do equívoco decorre do entendimento de que a interpretação literal desses dispositivos levaria à proibição da Administração exigir qualquer comprovação da capacidade técnico-operacional da licitante. No entanto, defendemos que é ilegal, tão somente, que a comprovação se dê por meio de atestados de experiência anterior, especialmente registrados em entidades profissionais, como o CREA. Tal afirmação não afasta a prerrogativa do ente público exigir provas da capacidade técnico-operacional por outros meios, tal como dispõe o § 6º do artigo em análise: 

§ 6º As exigências mínimas relativas a instalações de canteiros, máquinas, equipamentos e pessoal técnico especializado, considerados essenciais para o cumprimento do objeto da licitação, serão atendidas mediante a apresentação de relação explícita e da declaração formal da sua disponibilidade, sob as penas cabíveis, vedada as exigências de propriedade e de localização prévia. 

Portanto, é lícito e recomendável que a Administração exija a comprovação de que a licitante possui aparelhagem e mão de obra suficientes à boa execução do objeto do contrato por meio da relação explícita desses elementos, que poderá ser provada pela apresentação de notas fiscais, recibos de aquisição de equipamentos, ou ainda, contratos de aluguel ou comodato, além dos contratos de trabalho e/ou de prestação de serviços. Todavia, repita-se, não é lícita a exigência de atestados emitidos por pessoas jurídicas de direito público ou privado, especialmente registrados em entidades competentes. 

Os referidos atestados podem ser exigidos apenas para fins de comprovação da capacidade técnico-profissional, nos moldes do inc. I do § 1º do artigo em análise. Por exemplo, no caso de obras e serviços de engenharia, se exigir-se-á dos profissionais responsáveis, atestados de responsabilidade técnica (ART), ou ainda, certidão de acervo técnico (CAT), ambos devidamente registrados no CREA competente. 

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Em colaboração à tese aqui defendida, destaca-se, ainda, que o próprio CONFEA emitiu resolução em que se veda a emissão de CAT em nome de pessoa jurídica, sendo explícita ao determinar que essa se presta a comprovar a capacidade técnico-profissional da pessoa jurídica, desde que a pessoa física responsável pela obra ou serviço de engenharia pertença ao seu quadro técnico. Veja o disposto no art. 55 da Resolução nº 1.025/2009: 

Art. 55. É vedada a emissão de CAT em nome da pessoa jurídica. 

Parágrafo único. A CAT constituirá prova da capacidade técnico-profissional da pessoa jurídica somente se o responsável técnico indicado estiver a ela vinculado como integrante de seu quadro técnico. 

Pode-se argumentar, ainda, que o § 10 do art. 30 faz menção expressa à capacidade técnico-operacional, remetendo ao inciso I do § 1º, que trata, justamente, da possibilidade de exigência de atestados, no que segue: 

§ 10.  Os profissionais indicados pelo licitante para fins de comprovação da capacitação técnico-operacional de que trata o inciso I do § 1º deste artigo deverão participar da obra ou serviço objeto da licitação, admitindo-se a substituição por profissionais de experiência equivalente ou superior, desde que aprovada pela administração. (Destacamos.) 

Não há outra forma de avaliar esse dispositivo, senão pelo equívoco do legislador na utilização do termo técnico-operacional, quando pretendeu prescrever sobre a capacidade técnico-profissional. Isso fica bastante claro ao perceber que o dispositivo permite a alteração do profissional responsável técnico pela obra ou serviço por outro de experiência equivalente ou superior. Em nenhum momento o dispositivo tratou da capacidade da pessoa jurídica (aparelhagem, equipamentos etc.), senão em relação a possuir em seu quadro técnico profissional de experiência compatível com o objeto da licitação.  

Portanto, é ilegal a exigência de comprovação de capacidade técnico-operacional por meio de atestados ou certidões de experiência anterior, devendo tal comprovação ocorrer por meio de outros documentos que demonstrem que a licitante possui os requisitos materiais necessários à execução do objeto licitado. 

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Sobre o autor
Adriano Biancolini

Advogado em Curitiba (PR) no escritório Biancolini D'Ambrosio e Menzel Vieira Advogados, com experiência em atuação consultiva em licitações e contratos administrativos e funcionalismo público. Graduado pela Faculdade de Direito de Curitiba. Administrador do site Convir - A sua consultoria jurídica virtual (http://convir-adv.blogspot.com.br/)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BIANCOLINI, Adriano. A ilegalidade da exigência de atestados de experiência anterior para comprovação da capacidade técnico-operacional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5954, 20 out. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/64358. Acesso em: 17 nov. 2024.

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