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O novo Ministério

13/03/2018 às 11:15
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Qual a segurança pública que terá tratamento ministerial?

O nível de insegurança em nosso país chegou a patamares socialmente intoleráveis, tendo como principal motivo a repercussão das ocorrências de criminalidade violenta, com destaque para seu aspecto subjetivo. Alguma coisa teria que ser feita, e o senhor presidente acaba de criar o Ministério Extraordinário da Segurança Pública.

É aquela história: “é melhor decidir, ainda que errado, do que não decidir”. Contudo, em sendo extraordinário, abre a oportunidade de ser extinto, o que, acredito, seria bom, pois, a exemplo da decretação da intervenção no RJ, o governo exagerou novamente.

Essa tal de segurança pública, transformada em problema social, que pode ser enquadrado na salvaguarda social – mecanismo de defesa contra a ameaça-crime, com destaque para a criminalidade violenta – integrando a defesa social, não está devidamente dimensionada, delimitada. Aliás, nunca esteve, seja sob aspecto conceitual, contextual, estrutural e/ou comportamental, ensejando improvisações, intervenções pontuais, administração por susto.

O governo foi vítima da pouco conhecida e insuficiente Estratégia Nacional de Defesa (porque cuida apenas da Defesa Nacional, com ênfase no campo militar, e desconhece a Defesa Social, a principal origem daquela, excluídos eventuais conflitos internacionais). Trocando em miúdos, o Ministério da Defesa (MD) tem apenas um braço, que cuida da Defesa Nacional. Bastaria alocar os departamentos, que estão saindo do Ministério da Justiça e Segurança Pública, em um segundo braço, a ser criado no MD, para corrigir a atual orfandade da Defesa Social. Sem aumentar a estrutura governamental, com o ganho adicional de facilitar a coordenação da interligação, da interação e da operacionalização desses dois mecanismos de proteção (nacional e social) e sem custos adicionais.    

A missão do novo órgão é “coordenar e promover a integração da segurança pública em todo o território nacional em cooperação com os demais entes federativos”.

Lembrei-me da célebre frase de Garrincha “vocês combinaram com os russos?”, porque logo me veio a pergunta: o governo já definiu o que é segurança pública?     

Afinal, qual a segurança pública que terá tratamento ministerial? Aquela que a grande maioria da população entende como sendo sinônimo de contenção da criminalidade violenta e do crime organizado ou a outra, técnico-doutrinária, que sempre será uma utopia por definir, essa segurança, como sendo um ambiente em que todas as vulnerabilidades e ameaças à preservação da vida e a perpetuação da espécie humana estão totalmente controladas e, simultaneamente, há a crença de que isso está ocorrendo? Poderia ser o simplismo do conjunto de operações que visam a “correr atrás de ladrão e prender bandido” ou aquela que trabalha para a mantença da ordem social, até o estágio da grave perturbação dessa ordem que, ultrapassado, passa à autoridade federal, em razão da possibilidade de afetar a ordem nacional?

Certamente, há muitas questões a serem enfrentadas pelo novel ministério, iniciando, por exemplo, pelo posicionamento, mostrando a que veio; deve estimular estudos e pesquisas, visando a fixar doutrina própria para essa área; em conjunto com outros órgãos, prioritariamente deve sugerir políticas públicas, de Estado; em trabalho multidisciplinar, pesquisar, identificar e sugerir formas de correção de causas e efeitos da criminalidade violenta; resgatar a autoridade do agente penitenciário, reconhecendo-o como policial penal; evitar o emprego das FFAA na fase de (grave) perturbação da ordem nacional, equipando as polícias estaduais e, evoluindo o problema, priorizar o emprego da Força Nacional; e muito mais!...

Convém lembrar que reduzir a criminalidade violenta não é tarefa peculiar, somente de polícia. Exige um esforço de governo, multissetorial, que se inicia com a identificação dos fatores geradores da matriz de insegurança, as causas e os efeitos dessa criminalidade, que estão fora da área de competência das polícias. Se se fizer uma pesquisa retroativa, provavelmente vamos encontrar a origem da criminalidade violenta no surgimento e no desenvolvimento de um problema moral e ético. É que, a partir do início da década de 70, com o deslumbramento do milagre econômico e o surpreendente êxodo rural, que deram origem à superlotação das grandes cidades, aos poucos, regras sociais deixaram de ser obedecidas e os valores sociais deixaram de ser respeitados, gerando uma cidadania deformada. Certamente uma cruzada nacional, sinérgica, poderá minimizar essa doença social. Insiste-se em afirmar que educadores e assistentes sociais têm papel fundamental nessa campanha.

Enfim, cabe ao governo estabelecer metas para órgãos específicos, fixar a coordenação dessa atividade e definir interação de ministérios, visando a controlar vulnerabilidades e mitigar ameaças que dão origem e incrementam a criminalidade violenta.

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Sobre o autor
Amauri Meireles

Coronel Veterano da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais. Foi Comandante da Região Metropolitana de Belo Horizonte - MG. Membro do Instituto Brasileiro de Segurança Pública. Membro da Academia de Letras dos Militares Mineiros Capitão Médico João Guimarães Rosa. Possui graduação em Educação Física pela Escola de Educação Física do Exército (1996) e graduação em Curso Superior de Polícia - Polícia Militar do Estado de Minas Gerais (1983). Autor de vários livros sobre (in)segurança pública e defesa social, entre os quais destacam-se: Entendendo nossa (In)Segurança (2010) e Insegurança pública e Policiologia (2023).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MEIRELES, Amauri. O novo Ministério. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5368, 13 mar. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/64596. Acesso em: 5 dez. 2025.

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