UMA QUESTÃO ENVOLVENDO AÇÃO REIVINDICATÓRIA E AÇÃO RESCISÓRIA

20/03/2018 às 14:07
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O ARTIGO DISCUTE A QUESTÃO DE EFICÁCIA DE UMA AÇÃO EXECUTIVA DIANTE DA RESCISÓRIA.

UMA QUESTÃO ENVOLVENDO AÇÃO REIVINDICATÓRIA E AÇÃO RESCISÓRIA

Rogério Tadeu Romano

 

I - A AÇÃO REIVINDICATÓRIA


A ação de reinvindicação é ação executiva isso porque a imissão do autor vitorioso na posse objeto da demanda deve ser determinada na própria sentença de procedência do pedido. Expede-se, desde logo, o respectivo mandado ordenando que o autor seja imitido na posse, sem que o proprietário necessite promover uma demanda executória. Quem tem uma escritura pública de compra e venda de imóvel está para a função jurisdicional executiva, na mesma posição de quem tiver a posse de uma letra de câmbio, uma nota promissória. Ambos poderão apenas com uma demanda concluir o processo executório, como afirmou Ovídio Baptista(Curso de processo civil, volume II, 1990, pág. 159).

Na ação reivindicatória o que se pretende é obter a coisa(res) e não o cumprimento de uma obrigação, daí porque não teria o menor sentido exigir que a sentença condenasse o possuidor, por ela declarado possuidor ilegítimo, a cumprir uma obrigação que jamais existiria

A ação reivindicatória é uma pretensão fundada em direito real destinada a obter a posse da coisa, objeto de domínio. Aqui o demandante vai a juízo recuperar a coisa. Daí a natureza real.

Ensinou Pontes de Miranda(Tratado das ações, volume VII, § 17) que a natureza dessas ações é real, por meio do qual o proprietário busca obter a posse das coisas corpóreas integrantes de seu patrimônio. É ação que compete ao proprietário sem posse contra o possuidor não proprietário, ainda sendo necessário acrescentar que ela tem por fim a obtenção da posse contra o possuidor injusto da coisa reclamada.

O que é possuidor injusto?

Já dizia o artigo 489 do Código Civil de 1916 que era injusta a posse que seja precária, adquirida com violência ou clandestinidade. 

Para Ovídio Baptista(obra citada, pág. 162) não é, por certo, este o critério para determinar a injustiça da posse que fará cabível a ação de reivindicação. Poderá haver casos de posse que não seja nem clandestina nem violenta ou precária e, mesmo assim, frente ao proprietário seja considerada injusta, para autorizar a procedência da reivindicatória. Exemplifica-se: ocorre a posse injusta quando o demandado, no juízo petitório, havendo adquirido a coisa a non domino, desfruta do bem por ele adquirido sem qualquer dos vícios indicados no artigo 489 do Código Civil de 1916, é vencido na reivindicatória promovida pelo proprietário verdadeiro. Tendo o adquirente a non domino posse protegível pelos interditos possessórios, mesmo assim, sucumbirá frente à reivindicatória. 

 

II - OS EMBARGOS DE TERCEIROS

Há os embargos de terceiro estranho  a essa relação jurídica mencionada.

A teor do artigo 674 do novo CPC quem, não sendo parte do processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo, poderá requerer seu desfazimento ou sua inibição por meio de embargos de terceiros.

Havendo penhora que envolva  bem de terceiro em execução de que não é parte, cabe ao terceiro falar na ação de embargos de terceiros. Alguém que tem um bem que hipotecado ou penhorado tem interesse de agir nesse tipo de ação. O credor hipotecário quando não for intimado em ação promovida em que o bem em questão é penhorado poderá ajuizar tal ação.

Embargos de terceiro se constituem numa ação típica através da qual alguém se defende de uma turbação ou de um esbulho na posse de seus bens em consequência de litígio que lhe é estranho

É ação de  conhecimento, constitutiva negativa, de procedimento especial sumário, cuja finalidade é livrar o bem ou direito de posse ou propriedade de terceiro da constrição judicial que lhe foi injustamente imposta em processo de que não faz parte. O embargante pretende ou obter a liberação (manutenção ou reintegração na posse), ou evitar a alienação de bem ou direito indevidamente constrito ou ameaçado de o ser constrito, como dizem Nelson Néry Júnior e Rosa Maria Andrade (Código de processo civil comentado e Legislação Extravagante, 2004, pág. 1286). Porém, por ser um procedimento especial, a ação de embargos de terceiro consubstancia-se numa figura complexa, como preleciona Theodoro Júnior (Curso de direito processual civil, 2002, p. 278):

“há, entre eles, uma natural carga declaratória, em torno da ilegitimidade do ato executivo impugnado. Há, também, um notável peso constitutivo, pois, reconhecido o direito do embargante, revogado terá de ser o ato judicial que atingiu ou ameaçou atingir seus bens. Há, enfim, uma carga de executividade igualmente intensa, porquanto a atividade jurisdicional não se limita a declarar e constituir. Vai além e, tão logo reconhecido o direito do embargante, atos materiais do juízo são postos em prática para liberar o bem constrito e pô-lo novamente sob a posse e disponibilidade efetivas do terceiro. A atividade material – característica dos procedimentos executivos lato sensu, como o da ação de despejo e dos interditos possessórios – está presente nos embargos de terceiro, já que, independentemente de uma posterior actio iudicati, medidas concretas de efetivação do comando jurisdicional em prol do embargante são atuadas de imediato, até mesmo em caráter liminar (art. 1.051).”.

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Tanto poderão ajuizá-lo o proprietário, inclusive o fiduciário e o possuidor.

§ 2º Considera-se terceiro, para ajuizamento dos embargos:

I – o cônjuge ou companheiro, quando defende a posse de bens próprios ou de sua meação, ressalvado o disposto no art. 843;

II – o adquirente de bens cuja constrição decorreu de decisão que declara a ineficácia da alienação realizada em fraude à execução;

III – quem sofre constrição judicial de seus bens por força de desconsideração da personalidade jurídica, de cujo incidente não fez parte;

IV – o credor com garantia real para obstar expropriação judicial do objeto de direito real de garantia, caso não tenha sido intimado, nos termos legais dos atos expropriatórios respectivos.

III - A RESCINDIBILIDADE DA SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO

Por outro lado, a rescindibilidade concerne a sentença que vale e é eficaz. O que só é rescindível, existe, vale e é eficaz.

Para desconstruir a coisa julgada formal e material formada há a ação rescisória, ação de natureza constitutiva negativa.

IV - UM PROBLEMA A RESOLVER

Veja-se o seguinte problema:
Reivindicou A a B imóvel(sentença x) e vendeu a terceiro, C. D reivindica-o de C(sentença y), com fundamento anterior à reivindicação contra B.

M.I.Carvalho de Mendonça(Da ação rescisória, 33 e seguintes) entendeu que somente resta a C reclamar contra A perdas e danos.

Por sua vez, Jorge Americano(Da ação rescisória, 2ª edição, 225), por sua vez, considerou que a solução seria reivindicar de D ou pedir perdas e danos.

Pontes de Miranda foi mais além(Tratado de ação rescisória, 5ª edição, pág. 542), traçando as seguintes situações:

a) Se o título de D foi anterior ou posterior a reivindicação por A, oriundo do fato de A, B reivindica o imóvel contra D;
b) Se foi posterior e por fato de outrem, portanto estranho a A, a reivindicação por D terá B de opor-se por ação de embargos de terceiro;
c) Se foi anterior ou posterior e por fato de B, a sentença z, que venha a rescindir a decisão x, apenas reafirmará a sentença y, pela qual D reivindicou de C.

No caso(a), a sentença z vai livrar de A das consequências da evicção, que sofrera C(fato em que aqueles dois juristas não mencionaram) e sujeita-lo às da evicção de D. No caso (b), nos embargos de terceiro é que se vai dirimir a contradição das sentenças. No caso (c), a jurisdicidade perfeitamente se estabelece,  e  A responderá a C, pela evicção, pois que, in hipótese, lhe vendera o bem imóvel. A ação rescisória rescinde a sentença x, supondo-se, aliás, cumulados os dois iudicia, o rescindente e o rescisório. Expôs Pontes de Miranda(obra citada, pág. 542) que a contradição é entre duas sentenças, a do iudicium rescissorium de B contra A e a do juízo de reivindicação de D contra C, portanto entre duas sentenças de reinvindicação. Se, na lide com D, B(caso b) perde os embargos de terceiro, ou, se já foi executada a sentença y na ação de reivindicação, não cabe a reivindicação contra D, que seria o remédio único, fica sem eficácia a sentença z.

V - A QUESTÃO NO REGISTRO DE IMÓVEIS

É necessário ver a questão com relação ao direito das coisas.

Elencada nos arts. 1245, 1246 e 1247 do Código Civil de 2002, a aquisição da propriedade imóvel pelo registro do título é a transferência entre vivos da propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis competente.

Enquanto não se registrar o título, que deve ser público, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.

O registro torna-se eficaz no momento da apresentação do título qo oficial do registro e assim que este prenotar no protocolo que é a chave do registro geral.

No sistema de registro de imóveis, no Brasil, se A constava do registro e C adquiriu dele o imóvel e obteve a transcrição, não há mais reivindicabilidade, incidindo o Código Civil.

Ocorre o mesmo se a aquisição é em virtude da posse de boa-fe(aquisição de non domino), como acontece em se tratando de títulos cambiários.

 

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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